O Ministério dos Apóstolos


A história bíblica termina no livro de Atos, que descreve o ministério da igreja primitiva. Em Atos vemos como a mensagem concernente a Jesus – a mensagem da redenção – propagou-se de Jerusalém até Roma, centro do mundo Ocidental.
O livro de Atos mostra a expansão da igreja:
a) Em Jerusalém;
b) De Jerusalém para a Judeia, Samaria e região.
c) De Antioquia até Roma.
a) A Igreja em Jerusalém – As primeiras experiências dos discípulos de Jesus em Jerusalém revelam muita coisa acerca da igreja primitiva. O livro de Atos mostra com que zelo esses cristãos divulgaram as notícias a respeito de Jesus. O livro inicia-se numa colina próxima a Jerusalém, onde Jesus estava prestes a ascender ao céu. Ele disse aos discípulos: “…ao descer sobre vós o ES, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém, como em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da terra” (At 1.8). Esse era o plano de Jesus para evangelizar o mundo. Poucos dias mais tarde os discípulos substituíram Judas, que se havia matado depois de trair a Jesus. Escolheram a Matias para completar o grupo dos doze. Então o Cristo ressurreto deu à igreja seu ES, que capacitou os cristãos a cumprirem a tarefa de âmbito mundial (At 1.8). Pedro falou à igreja no dia de Pentecoste, revelando a importância de Cristo como Senhor da salvação (At 2.14-40). O ES revestiu a igreja de poder para operar sinais e maravilhas que confirmavam a veracidade dessa mensagem (At 2.43). Especialmente significativa foi a cura de um mendigo operado pelos apóstolos à porta do templo ( At 3.1-10), o que colocou os apóstolos em conflito com as autoridades judaicas. A igreja mantinha estreita comunhão entre seus membros. Compartilhavam as refeições em seus lares; também adoravam juntos e repartiam os seus bens (At 2.44-46; 4.32-34). À medida que a igreja continuava a crescer, as autoridades governamentais começara a perseguir abertamente os cristãos. Pedro e alguns dos apóstolos foram presos, mas um anjo os libertou; convocados perante as autoridades, estas lhes deram ordens de parar com a pregação a respeito de Jesus (At 5.17-29). Os cristãos, porém, recusaram-se a obedecer; continuaram pregando, muito embora as autoridades religiosas os espancassem e os laçassem na prisão diversas vezes. A igreja crescia com tanta rapidez que os apóstolos precisaram de auxílio em algumas questões práticas de administração eclesiástica, principalmente no atendimento às viúvas. Para a execução desta tarefa ordenaram sete diáconos.
b) De Jerusalém para toda a Judeia – A segunda fase do crescimento da igreja começou com uma violenta perseguição dos cristãos em Jerusalém. Quase todos os crentes fugiram da cidade (At 8.1). Por onde quer que fossem, os cristãos davam testemunho, e o ES usava esse testemunho a fim de conquistar outras pessoas para Cristo (At 8.3…). Por exemplo, um dos sete auxiliares, chamado Filipe, conversou com um diplomata etíope; esse homem tornou-se cristão e levou as boas novas para sua pátria ( At 8.26-39). A esta altura a Bíblia descreve a conversão de Saulo de Tarso. Antes de converter-se, Saulo perseguia a Igreja. Ele obteve cartas das autoridades judaicas em Jerusalém que o autorizava a ir a Damasco efetuar a prisão dos cristãos ali e matá-los. No caminho, Cristo derrubou-o por terra e o desafiou. Saulo rendeu-se e assim começou uma nova vida na qual ele devia usar seu nome romano, Paulo em lugar de Saulo, o nome judaico. Paulo cheio do ES começou a pregar a respeito de Jesus na sinagoga judaica, e os dirigentes judeus o expulsaram de Damasco. Algum tempo depois (Gl 1.17-2.2), ele foi pra Jerusalém, onde estabeleceu uma relação com os apóstolos.
Devemos notar também que o ministério de Pedro, que foi especialmente marcado por milagres. Em Lida ele curou um homem chamado Enéias (At 9.32-35). Em Jope, Deus o usou para ressuscitar Dorcas (At 9.36-42). Por fim, recebeu de Deus uma visão que o convocava para Cesareia, onde apresentou o evangelho aos gentios (At 10.9-48). Ele foi o líder máximo dos apóstolos e seu ministério reanimou o entusiasmo da igreja primitiva. Apóstolo era uma pessoa a quem Cristo havia escolhido para um treinamento especial no ministério ( Gl 1.12). Os apóstolos lançaram o alicerce da igreja mediante a pregação do evangelho de Cristo (Ef 2.20; 1Co 3.10-11; Jd 3-21). Deususou Pedro para abrir a porta da salvação aos gentios.  Neste ponto a narrativa bíblica volta-se brevemente para a expansão do evangelho entre os gentios em Antioquia (At 11.19-30). É quando lemos acerca do martírio de Tiago em Jerusalém, e de como Pedro foi miraculosamente liberto da prisão. (At 12.1-19)
c) De Antioquia até Roma – O restante do livro de Atos descreve a expansão da igreja por intermédio do Apóstolo Paulo. Barnabé levou Paulo para Antioquia (At 11.19-26). Aí o ES chamou a Barnabé e a Paulo para serem missionários, e a igreja os ordenou para essa tarefa (At 13.1-3). Eles começavam pregando numa sinagoga judaica. Por conseguinte, a igreja primitiva constituía-se, antes de tudo, de convertidos dentre os judeus e de pessoas “tementes a Deus” (gentios que adoravam com os judeus). Na primeira viagem houve um dramático confronto com o diabo quando Deus usou a Paulo para derrotar o mágico (feiticeiro) Elimas (At 13.6-12). O jovem João Marcos acompanhava a Paulo e a Barnabé, mas, de Perge, resolveu voltar a Jerusalém, fato que deve ter causado grande desapontamento a Paulo (At 15.38). No sermão que Paulo proferiu na sinagoga em Antioquia da Pisídia (At 13.16-41) ele faz um resumo da história da redenção, acentuando seu cumprimento em Jesus. Ele declarou:  crer em Cristo é o único meio de libertar-se do pecado e da morte (At 13.38,39). Em listra, judeus hostis instigaram as multidões de sorte que Paulo foi apedrejado e dado por morto (At 14.8-19). A viagem terminou com Paulo e Barnabé voltando a Antioquia, onde relataram tudo quanto Deus havia feito por intermédio deles, e como a fé se espalhara entre os gentios (At 14.26-28). Mais tarde, surgiu na igreja uma séria desinteligência. Alguns cristãos argumentavam que os gentios convertidos tinha de observar as leis do AT, de modo especial a da circuncisão. O problema foi levado perante o concílio da igreja de Antioquia e de Jerusalém. Deus dirigiu esse concílio (reunido em Jerusalém) para declarar que os gentios não tinham de guarda a Lei a fim de serem salvos. Mas instruíram aos novos conversos a que se abstivessem de comer coisas sacrificadas aos ídolos, sangue e animais sufocados (At 15.1-29), para não escandalizarem os judeus. O concílio enviou uma carta a Antioquia; a igreja leu-a e a aceitou com sendo a vontade de Deus. Não demorou muito, Paulo resolveu visitar todas as igrejas que ele e Barnabé haviam estabelecido na primeira viagem missionária. E assim teve início a segunda viagem missionária (At 15.40-41), desta vez em companhia de Silas. Observe-se, especialmente, a visão que Deus deu a Paulo em Trôade, convocando-os para a Macedônia (At 16.9-10). Na Macedônia eles conduziram à fé pessoas “tementes a Deus” (gentios que criam em Deus) e também judeus. Um dia os missionários defrontaram-se com uma jovem escrava possuída do demônio. Seus donos auferiam lucro da capacidade que tinha a jovem de adivinhar. Paulo expulsou os demônios da jovem. e ela perdeu seus poderes, por isso seus senhores prenderam-nos (At 16.19-24). Na prisão, Paulo e Silas pregaram ao carcereiro. Foram libertados de manhã e se dirigiram para Tessalônica, onde muitos se converteram sob seu ministério. A seguir foram para Beréia, onde também alcançaram grande êxito (At 17.10-12). Em Atenas, Paulo pregou um grande sermão aos filósofos na colina de Marte. A próxima parada foi Corinto, onde Paulo e seus amigos permaneceram por um ano e meio. Daqui voltaram para Antioquia, passando por Jerusalém (At 18.18-22). Todo esse tempo, Paulo e seus companheiros continuaram a pregar nas sinagogas, e enfrentaram a oposição de alguns judeus que rejeitaram o evangelho (At 18.12-17). A terceira viagem missionária abrangeu muitas das mesmas cidades que Paulo havia visitado na segunda. Ele fez, também, uma rápida visita às igreja da Galácia e da Frígia (At 18.23). Em Efeso ele batizou doze dos discípulos de João Batista que haviam aceitado a Cristo, os quais receberam o ES (At 19.1-7). Durante quase dois anos ele pregou na escola de Tirano (At 19.9-10). De Éfeso, ele foi para a Macedônia e, finalmente, voltou a Filipos. Depois de uma breve estada nesta cidade, ele viajou para Trôade, onde um jovem chamado Êutico pegou no sono durante o sermão de Paulo e caiu de uma janela do terceiro andar, sendo dado por morto. Deus operou por meio de Paulo para trazer Êutico de volta à vida (At 20.7-12). Dali os missionários foram para Cesareia, passando por Mileto. Em Cesaréia o profeta Ágabo predisse o perigo que aguardava a Paulo em Jerusalém; ali ele enfrentou dificuldades e prisão. A Bíblia registra um discurso que ele fez ali em defesa de sua fé (At 22.1-21). Finalmente, as autoridades religiosas conseguiram enviá-lo para Roma a fim de ser julgado. A caminho, o navio que o transportava naufragou na ilha de Malta. Aqui  foi picado por uma cobra venenosa, mas não sofreu dano algum (At 28.7-8). Depois de passar três meses em Malta, ele e seus guardas navegaram para Roma. O Livro de Atos encerra com as atividades de Paulo em Roma. Lemos que ele pregou aos principais judeus (At 28.17-20). Durante dois anos morou numa casa alugada, continuando a pregar às pessoas que o visitavam (At 28.30-31).  Encerra-se a história da redenção registrada na Bíblia. O Evangelho tinha sido eficazmente plantado em solo gentio, e a maioria das Epístolas havia sido escritas. A igreja estava no processo de separar-se da sinagoga judaica e tornar-se um organização distinta.
Fonte: O Mundo do Novo Testamento – Editora Vida

A Guerra Santa (jihad no Corão)


guerra-santa
“Ó crentes! Ponde-vos em guarda! Lançai-vos contra os nossos inimigos em grupos ou em bloco. Há entre vós quem vai lentamente. Se os aflige uma desgraça dirão: ‘Alá me fez bem, porque não fui testemunho para eles’. Se os atinge um favor procedente de Alá dirão, como se não existisse amizade entre vós e Ele: ‘oxalá tivesse estado com eles e teria obtido uma grande vitória’.
Combatei na senda de Alá contra os que compram a vida mundana com a última! Àqueles que combatem na senda de Alá, quer estejam mortos, quer estejam vitoriosos, conceder-se-á uma enorme recompensa.
Como não combatereis na senda de Alá, em favor dos homens débeis, das mulheres das crianças que dizem: ‘Senhor nosso! Tirai-nos deste povo, cujas sendas são injustas! Dai-nos um defensor designado por Vós!’
Os que acreditam, combatem na senda de Alá. Os que não acreditam combatem na senda de Tagut: combatei os inimigos do demônio (…).
Não vistes àqueles aos que foi dito: ‘Deixai em repouso as vossas mãos! Cumpri a prece e dai esmola?’ Quando se lhes prescreveu o combate, uma parte deles temeu os inimigos como se fossem Deus, ou talvez com maior temor, e disseram entre si: ‘Senhor nosso! Por que nos ordenastes o combate? E se nós o atrasássemos um pouco?’. Respondei: ‘O gozo da vida é ínfimo e a última vida é melhor para quem é piedoso: não serão defraudados nem na quantidade da casca de uma tâmara’” (Corão 4, 73-79; Pedrero Sanches, 1999, p. 60).
Retirado do livroHistória da Igreja, Idade Média. Prof. Felipe Aquino. Ed. Cléofas.

A Igreja é Escatológica


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Escatologia é o estudo  sobre os “últimos acontecimentos”. A palavra vem do grego eschatón (= último). Se refere ao término da história da salvação. Sem isto não compreendemos a vida da Igreja. Os romanos diziam: “em tudo que faças, considera o fim, pois é o fim que dita o itinerário a percorrer”.
A realização da Igreja se dará plenamente só na eternidade.
O Concílio Vaticano II afirma:
“É no fim dos tempos que será gloriosamente consumada [a Igreja], quando, segundo se lê nos Santos Padres, todos os justos, desde Adão, do justo Abel até o último eleito, serão congregados junto ao Pai na Igreja universal” (LG,2).
“A Igreja à qual somos todos chamados em Jesus Cristo… só será consumada na glória celeste, quando chegar o tempo da restauração de todas as coisas; e, como o gênero humano, também o mundo inteiro, que está intimamente unido ao homem e por ele atinge o seu fim, será totalmente renovado em Cristo” (LG,48).
Muitas passagens das Escrituras mostram isso:
At 3,21 – “Enviará ele o Cristo que vos foi destinado, Jesus, aquele que o céu deve conservar até os tempos da restauração universal, da qual falou Deus pela boca dos seus santos profetas”.
Quando de sua vinda gloriosa, Cristo inaugurará o seu Reino definitivo e toda a criação será renovada.
1Cor 15,24-28 – “Depois, virá o fim, quando entregar o Reino a Deus, ao Pai, depois de haver destruído todo principado, toda potestade e toda dominação. Porque é necessário que ele reine, até que ponha todos os inimigos debaixo de seus pés… E, quando tudo lhe estiver sujeito, então também o próprio Filho renderá homenagem àquele que lhe sujeitou todas as coisas, a fim de que Deus seja tudo em todos”.
São Paulo nos ensina que este é o “misterioso” desígnio da vontade do Pai na plenitude dos tempos:
Ef 1,10 – “Reunir em Cristo todas as coisas que estão na terra e no céu”.
Col 1,20 – “E por seu intermédio reconciliar consigo todas as criaturas, por intermédio daquele que, ao preço do próprio sangue na cruz, restabeleceu a paz a tudo quando existe na terra e nos céus”.
São Pedro fala dessa renovação do mundo e da gloria da Igreja:
2Pe 3,10-13 -“Entretanto, virá o dia do Senhor como ladrão. Naquele dia os céus passarão com ruído, os elementos abrasados se dissolverão, e será consumida a terra com todas as obras que ela contém… Nós, porém, segundo sua promessa, esperamos novos céus e uma nova terra, nos quais habitará a justiça”.
Sabemos que São Pedro escreve numa linguagem apocalíptica, e que não pode ser interpretada ao pé da letra.
O que sabemos de certo é que haverá a consumação do universo e a glória da Igreja, segundo o desígnio de Deus.
Is 65,16 – “Eis que faço novos céus e nova terra; e ninguém mais se recordará das coisas passadas; elas já não voltarão à mente”.
Ap 21,1 – “Vi um céu novo e uma terra nova, pois o primeiro céu e a primeira terra haviam desaparecido”.
É interessante notar o que Jesus disse aos apóstolos:
Mt 19,28 – “No dia da renovação do mundo, quando o Filho do homem estiver sentado no trono da glória…”
Mt 28,20 – “Eis que estou convosco  até a consumação do século”.
Com relação à data em que acontecerá a renovação do mundo e a inauguração definitiva do Reino de Deus, ninguém sabe e não deve especular a respeito. Muitos se enganaram sobre isto e levaram muitos outros ao engano e ao desespero. Até  grandes santos da Igreja erraram neste ponto. Podemos citar alguns exemplos:
S. Hipólito de Roma (?235) – chegou a afirmar que o final do mundo seria no ano 500…
Santo Irineu (?202) – confirmava a tese do Ps Barnabé, de que o final seria no ano 6000 após a criação do mundo…
Santo Ambrósio (?397) e S. Hilário de Poitres (?367) – apoiaram a mesma tese anterior.
S. Gaudêncio de Bréscia (?405) – indicava o ano 7000 após a criação.
No século V, com a queda de Roma (476), S. Jeronimo (?420), S.João Crisóstomo (?407), S.Leão Magno (?461), defendiam que face à queda de Roma, o fim do mundo estava próximo…
No século VI e VII, S. Gregório Magno (?604) afirmava como próxima a vinda de Cristo…
Muitas vezes as profecias sobre a vinda de Cristo iminente são sugeridas pela necessidade que temos de encontrar uma “saída” para os tempos difíceis em que se vive. Por isso a Igreja é muito cautelosa nesse ponto, e sempre nos lembra:
At 1,7 – “Não toca a vós ter conhecimento dos tempos e momentos que o Pai fixou por sua própria autoridade”.
Mc 13,32 – “Quanto àquele dia e àquela hora, ninguém os conhece, nem mesmo os anjos do céu, nem mesmo o Filho, mas, sim, o Pai só”.
Santo Agostinho interpreta essa passagem dizendo que Jesus diz não saber esta data, porque está fora do depósito das verdades que Ele veio revelar aos homens; não pertence à sua missão de Salvador revelar essa data (In Ps 36 Migne 36,355).
O Magistério da Igreja quer que se respeite essa vontade de Deus de deixar oculta aos homens essa data.
No Concílio Universal de Latrão V, em 1516, foi decretado:
“Mandamos a todos os que estão, ou futuramente estarão incumbidos da pregação, que de modo nenhum presumam afirmar ou apregoar determinada época para os males vindouros para a vinda do Anticristo ou para o dia do juízo. Com efeito a Verdade diz: “Não toca a vós ter conhecimento dos tempos e momentos que o Pai fixou por Sua própria autoridade. Consta que os que até hoje ousaram afirmar tais coisas mentiram, e, por causa deles, não pouco sofreu a autoridade daqueles que pregam com retidão. Ninguém ouse predizer o futuro apelando para a Sagrada Escritura, nem afirmar o que quer que seja, como se o tivesse recebido do Espírito Santo ou de revelação particular, nem ouse apoiar-se sobre conjecturas vãs ou despropositadas. Cada qual deve, segundo o preceito divino, pregar o Evangelho a toda a criatura, aprender a detestar o vício, recomendar e ensinar a prática das virtudes,  a  paz e a caridade mútuas, tão recomendadas por nosso Redentor”.
Em 1318, o Papa João XXII, condenando os erros dos chamados Fraticelli disse:
“Há muitas outras coisas que esses homens presunçosos descrevem como que em sonho a respeito do curso  dos tempos e do fim do mundo, muitas  coisas a  respeito da vinda do Anticristo, que lhes parece estar às portas, e que eles  anunciam com vaidade lamentável. Declaramos que tais coisas  são, em parte, frenéticas,  em parte doentias, em parte fabulosas. Por isso nós os condenamos com os seus autores em vez de as divulgar ou refutar”(Curso de Escatologia – D. Estevão Bettencourt, págs. 123 /124).
A esperança da Igreja é a vida eterna onde o Reino de Deus será pleno. Jesus disse a Pilatos:
“Meu Reino não é deste mundo” (Jo 18,36).
Por isso, a Igreja aguarda vigilante a vinda do Senhor. Era a esperança dos Apóstolos:
Col 3,4 – “Quando Cristo, nossa vida, aparecer, então também vós  aparecereis  com ele na glória”.
1Jo 3,2 – “Caríssimos, desde agora somos filhos de Deus, mas não se manifestou ainda o que havemos de ser. Sabemos que, quando isto se manifestar, seremos semelhantes a Deus, por quanto o veremos como Ele é”.
Fil 3,20 – “Nós porém, somos cidadãos dos céus. É de lá que ansiosamente esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará nosso mísero corpo, tornando-o semelhante ao seu corpo glorioso, em virtude do poder que tem de sujeitar a si toda criatura”.
A Igreja sabe que é peregrina neste mundo. O termo Paróquia quer dizer “terra de exílio”. São Paulo expressa bem esta realidade:
2 Cor 5,6 – “Sabemos que todo o tempo que passamos no corpo é um exílio longe do Senhor. Andamos na fé e não na visão. Estamos, repito, cheios de confiança, preferindo ausentar-nos deste corpo para ir habitar junto do Senhor”.
E o Apóstolo suspirava estar com Cristo:
Fil 1,23 – “Sinto-me pressionado dos dois lados: por uma parte, desejaria desprender-me para estar com Cristo – o que seria imensamente melhor”.
Fil 1,21 – “Porque para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro”.
Antes, porém, de reinarmos com Cristo compareceremos diante dele:
2 Cor 5,10 – “Porque teremos de comparecer diante do tribunal de Cristo, a fim de cada um ser remunerado pelas obras da vida corporal, conforme tiver praticado o bem ou o mal”.
E a esperança do Apóstolo é grande:
Rom 8,18 – “Tenho para mim que os sofrimentos da presente vida não tem proporção alguma com a glória que há de revelar-se em nós “.
2 Tm 2,11-12 – “Eis uma verdade absolutamente certa: Se morrermos com Ele, com Ele viveremos. Se soubermos perseverar com Ele reinaremos”.
Tt 2,13 – “Na expectativa da nossa esperança feliz, a aparição gloriosa de nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo”.
Por esta esperança a Igreja busca a santidade, pois sabe que sem ela “ninguém pode ver o Senhor” (Hb 12,14).
Ser cristão em última instância, é desejar o céu, buscar a santidade e, para isso, desprender-se de todas as satisfações da terra, aspirando as celestes. Deus fez tudo nesta vida precário, passageiro, transitório, para que não nos acostumemos a viver na terra, como se aqui fosse o céu. O destino da Igreja é o céu, a terra é o caminho.
Os santos ansiavam pelo céu, diziam como santa Teresinha:
“Tenho  sede  do céu, dessa mansão bem-aventurada, onde se amará Deus sem restrições”.
São belas, sobre o céu, as palavras de São Paulo:
1 Cor 2,9 – “Os olhos não viram, nem ouvidos ouviram, nem coração humano imaginou o que Deus tem preparado para aqueles que o amam”.
2 Cor 5,1 – “Sabemos, com efeito, que, quando for destruída esta tenda em que vivemos na terra, temos no céu uma casa feita por Deus, uma habitação eterna, que não foi feita por mãos humanas”.
E não se importava com o próprio envelhecimento:
2 Cor 4,16 – “Ainda que em nós se destrua o homem exterior, o interior renova-se de dia para dia”.
Jesus nos chama a olhar para o céu:
Mt 6,19-21 – “Não ajunteis para vós tesouros na terra… Ajuntai para vós tesouros no céu… porque, onde está o teu tesouro, lá também está teu coração”.
A maioria dos homens, mesmo os cristãos, ainda têm o tesouro e o coração na terra; por isso suas vidas espirituais são tíbias e os frutos são poucos.
Mt 18,21 – “Se queres ser perfeito, vai, vende os teus bens, e dá aos pobres, terás um tesouro no céu”.
Não é sem razão que S.Leão Magno dizia que “as mãos do pobre são o Banco de Deus”.
Mc 8,36 – “Que aproveitará ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder a sua vida?”
Santo Agostinho perguntava:
“De que vale viver bem, se não me é dado viver sempre?”
Jo 14,2-3 – “Na cada do meu Pai há muitas moradas… vou preparar-vos um lugar. Depois de ir, e vos preparar um lugar, voltarei e tomar-vos-ei  comigo, para  que, onde  eu estou, também vós estejais”.
Infelizmente hoje, para o mundo, eternidade parece ser uma palavra morta. É a chamada “secularização”, o amor a este século, ao tempo presente. O materialismo, o relativismo, o liberalismo e o hedonismo (busca do prazer como fim) geraram a perda do infinito, do céu, onde está a grande realização do homem. Por isso hoje ele se arrasta como um verme e se desespera na lama da imoralidade, da depressão e do vazio.
Pagamos dolorosamente o preço da perda da fé e da esperança. Só Deus pode satisfazer “a fome” infinita que o homem traz em si – como ensina Santa Catarina de Sena, doutora da Igreja – pois, as criaturas não podem satisfazê-lo, uma vez que são inferiores ao homem. “Só Deus basta”.
O Corpo de Cristo, a Igreja, subsiste em três estados: militante, que está na terra a lutar; padecente, que se purifica no purgatório e triunfante, que já vive a bem-aventurança do céu. Ensina-nos o Concílio Vaticano II que:
“Até que o Senhor venha em sua majestade e com ele todos os anjos, e destruída a morte, todas as coisas lhe sejam sujeitas, alguns dentre os seus discípulos peregrinam na terra, outros, terminada esta vida, são purificados, enquanto outros são  glorificados, vendo claramente o próprio Deus trino e uno, assim como é”.
“A união dos que estão na terra com os irmãos que descansam na paz de Cristo, de maneira alguma se interrompe; pelo contrário,  segundo a fé perene da Igreja, vê-se fortalecida pela comunhão dos bens espirituais”(LG, 49).
Essa comunhão de bens espirituais, que é um verdadeiro intercâmbio de graças, é a riqueza da “Comunhão dos Santos”.
Diz a “Lumen Gentium” que:
“Pelo fato de os habitantes do Céu estarem unidos mais intimamente com Cristo, consolidam com mais firmeza na  santidade toda a Igreja. Eles não deixam de interceder por nós junto do Pai, apresentando os méritos que alcançaram na terra pelo único mediador de Deus e dos homens, Jesus Cristo. Por conseguinte, pela fraterna  solicitude deles, a nossa fraqueza recebe o mais valioso auxílio”(idem)
São Domingos, já moribundo dizia a seus irmãos:
“Não choreis! Ser-vos-ei mais útil após a minha morte e ajudar-vos-ei mais eficazmente do que durante a minha vida” (CIC, 956).
O mesmo dizia Santa Teresinha:
“Passarei meu céu fazendo bem na terra” (idem).
A Igreja acredita desde os primórdios na salutar “intercessão dos santos” e também na “comunhão com os falecidos”. E nos ensina que:
“A nossa oração por eles pode não somente ajudá-los, mas também tornar eficaz a sua intercessão por nós”(CIC, 958).
A primeira atestação da crença  numa oração dos justos falecidos em favor dos vivos, a Igreja viu no segundo livro de Macabeus. Judas Macabeus, enfrentando o adversário Nicanor, que desejava destruir o Templo, na época da perseguição do terrível Antíoco Epífanes (166-160) a.C., colocando toda a sua confiança em Deus, teve um sonho, uma espécie de visão:
“Ora, assim foi o espetáculo que lhe coube apreciar: Onias, que tinha sido sumo sacerdote, homem honesto e bom, modesto no trato e de caráter manso… estava com as mãos estendidas, intercedendo por toda a comunidade dos judeus. Apareceu da mesma forma, um homem notável pelos cabelos brancos e pela dignidade, sendo maravilhosa e majestosíssima a superioridade que o circundava. Tomando a palavra disse Onias: ‘Este é o amigo dos seus irmãos, aquele que muito reza pelo povo e por toda a cidade santa, Jeremias, o profeta de Deus’. Estendendo por sua vez a mão direita, Jeremias entregou a Judas uma  espada de ouro,  pronunciando essas palavras enquanto a entregava: ‘Recebe esta espada santa, presente de Deus, por meio da qual esmagarás os teus adversários’ “(2 Mac15, 12-15).
Esta visão de Judas Macabeus, mostra o grande sumo sacerdote Onias e o profeta Jeremias, ambos, então, já falecidos, intercedendo pelo povo de Deus.
Encontramos na Bíblia, a passagem em que Deus manda a Abimeleque que peça orações a Abraão:
“Ele rogará por ti e tu viverás” (Gen 20,7-17).
Ainda sobre a intercessão dos santos por nós, a Igreja deixou claro no Concílio de Trento (1545-1563):
“Os santos que reinam agora com Cristo, oram a Deus pelos homens. É bom e proveitoso invocar-lhes suplicantemente e recorrer às suas orações e intercessão, para que nos obtenham os benefícios de Deus, por Nosso Senhor Jesus Cristo, único Salvador e Redentor nosso. São ímpios os que negam que se devam invocar os santos que já gozam da eterna felicidade no céu. Os que afirmam que eles não oram pelos homens, os que declaram que lhes pedir por cada um de nós em particular é idolatria, repugna à palavra de Deus e se opõe à honra de Jesus Cristo, único Mediador entre Deus e os homens” (Sessão 25).
Enfim, a Igreja é a “comunhão dos santos”.
Na profissão de fé solene – o Credo do Povo de Deus – disse Paulo VI:
“Cremos na comunhão de todos os fiéis de Cristo, dos que são peregrinos na terra, dos defuntos que estão terminando a sua purificação, dos bem-aventurados do céu, formando todos juntos uma só Igreja, e cremos que nesta comunhão o amor misericordioso de Deus e dos seus santos está sempre à escuta das nossas orações” (CPD, 30).
A Eucaristia que celebramos é a antecipação litúrgica da feliz eternidade no Céu. Esta alegria que não tem fim, sempre foi representada pela festa de Bodas, do Noivo (Jesus) com a Noiva (a Igreja). A Eucaristia é a antecipação da consumação da glória da Igreja.  Diz o Catecismo que :
“À oferenda de Cristo unem-se não somente os membros que estão na terra, mas também os que já estão na glória do céu” (CIC, 1370).
O altar em torno do qual a Igreja celebra a Eucaristia, representa, ao mesmo tempo, dois mistérios: “o altar do sacrifício” e a “mesa do Senhor” (CIC nº 1383).
São João viu todo o esplendor da Igreja futura na visão do Apocalipse: a Cidade Santa, a Jerusalém celeste, a Noiva, a Esposa do Cordeiro, a filha de Sião:
“Vem, e mostrar-te-ei a noiva, a esposa do Cordeiro. Levou-me em espírito a um grande e alto monte e mostrou-me a Cidade Santa, Jerusalém, que descia do céu, de junto de Deus, revestida da glória de Deus” (Ap 21, 9-11).
Note que bela comparação:
“Assemelhava-se seu esplendor a uma pedra preciosa, tal como o jaspe cristalino. Tinha grande e alta muralha com doze portas, guardadas por doze anjos. Nas portas estavam gravados os nomes das doze tribos dos filhos de Israel… A muralha tinha doze fundamentos com os nomes dos doze Apóstolos do Cordeiro… O material da muralha era jaspe, e a cidade ouro puro, semelhante a puro cristal. Os alicerces da muralha da cidade eram ornados de toda espécie de pedras preciosas: o primeiro era jaspe,… Cada uma das doze portas era feita de uma só pérola e a avenida da cidade era de ouro, transparente como cristal” (Apc. 21, 11-21).
Este riquíssimo simbolismo tem grande significação em cada uma de suas palavras, e nos revela que esta cidade inimaginável na terra, só pode existir no céu; é a Igreja na sua glória consumada, onde cada um de nós é chamado a viver na comunhão de toda a família de Deus. Ele e o Cordeiro estão presentes, não haverá falta de nada… Vejamos como continua a descrição:
“Não vi nela, porém, templo algum, porque o Senhor é o seu templo, assim como o Cordeiro. A cidade não necessita de sol nem de lua para iluminar, porque a glória de Deus a ilumina, e a sua luz é o Cordeiro.
As nações andarão à sua luz, e os reis da terra levar-lhe-ão a sua opulência. As suas portas não fecharão diariamente, pois não haverá noite… Nela não entrará nada de profano nem ninguém que pratique abominações e mentiras, mas unicamente aqueles cujos nomes estão inscritos no livro da vida do Cordeiro” (Apc. 21. 22-27).
E continua a descrição da Cidade celeste:
“Não haverá aí nada execrável, mas nela estará o trono de Deus e do Cordeiro. Seus servos lhes prestarão um culto. Verão a sua face e o seu nome estará nas suas frontes. Já não haverá noite, nem se precisará da luz de lâmpada ou do sol, porque o Senhor Deus a iluminará, e hão de reinar pelos séculos dos séculos” (Ap 22, 1-5).
Esta longa narração mostra a vitória e a gloriosa consumação final da Igreja. E o Apocalipse termina com o Senhor dizendo:
“Felizes aqueles que lavam as suas vestes para ter direito à árvore da vida e poder entrar na cidade pelas portas”(22,14).
“O Espírito e a Esposa dizem: Vem! Possa aquele que ouve dizer também: Vem!… Aquele que atesta estas coisas diz: Sim! Eu venho depressa! Amém. Vem, Senhor Jesus!” (22, 17-21).
A glória futura da Igreja já está garantida, porque o seu Senhor já reina no céu, sentado à direita do Pai, aguardando o momento de consumar o seu Reino.
“Depois de falar com os discípulos, o Senhor Jesus foi levado ao céu, e sentou-se à direita de Deus”(Mc16,19).
São Paulo explica na Carta aos Efésios todo o esplendor de Cristo, “Cabeça da Igreja”, já glorificado no céu:
“Ele manifestou sua força em Cristo, quando o ressuscitou dos mortos e o fez sentar-se à sua direita nos céus, bem acima de toda autoridade, poder, potência, soberania ou qualquer título que se possa nomear não somente neste mundo, mas ainda no mundo futuro. Sim, Ele pôs tudo sob os seus pés e fez dele, que está acima de tudo, a cabeça da Igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que possui a plenitude universal”(Ef 1,20-22).
É preciso ter em mente que Jesus glorificado à direita do Pai, é o Verbo Encarnado, perfeitamente homem; assim, a humanidade, por Jesus, “já voltou ao paraíso”, que havia perdido pelo pecado. Desta forma São Paulo nos exorta a vivermos cientes de que a nossa vida “está escondida com Cristo em Deus”:
“Se portanto, ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo está sentado à direita de Deus. Afeiçoai-vos às coisas lá de cima, e não às da terra. Porque estais mortos e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, vossa vida, aparecer, então também vós aparecereis com Ele na glória” (Cl 3,1s)
 São Leão Magno(?431) dizia que:
“Onde a Cabeça está, aí devem estar também os membros do corpo”.
A Igreja tem plena consciência de que a sua glória está assegurada no céu, já que a “Cabeça” já está “sentada à direita do Pai”. Na missa da festa da Ascensão do Senhor, rezamos:
“Ó Deus todo poderoso, a ascensão do vosso Filho já é nossa vitória. Fazei-nos exultar de alegria e fervorosa ação de graças, pois, membros de seu Corpo, somos chamados na esperança a participar da sua glória”.
É nesta esperança que vive a Igreja:
“No mundo tereis tribulações. Mas tende coragem! Eu venci o mundo!”(Jo16,33).
Sabemos, como nos ensina São Paulo na carta aos tessalonicenses, que a Igreja passará pela terrível “provação final”,  que será também o momento de dar ao Senhor a prova maior do seu amor, e que será também a sua maior purificação. Após isto será consumada na sua glória. Então, “Deus  será  tudo  em  todos” (1Cor 15,28). Estará então restabelecida a “Família de Deus”,  que no Paraíso foi dispersa pelo pecado. Novamente Deus viverá no “jardim” celeste com o homem (Gen 2,5-8), com toda a intimidade e comunhão desejadas desde o princípio. A harmonia que o pecado rompeu será restabelecida plenamente. É a imagem maravilhosa que o Profeta nos dá do Reino do Messias, onde só haverá paz:
“Então o lobo será hóspede do cordeiro, a pantera se deitará ao pé do cabrito, o touro e o leão comerão juntos, e um menino pequeno os conduzirá; a vaca e o urso se fraternizarão, suas crias repousarão juntas, e o leão comerá palha com o boi.
A criança de peito brincará junto a toca da víbora, e o menino desmamado meterá a mão na caverna da áspide.
Não se fará mal nem dano em todo o meu monte santo, porque a terra estará cheia da ciência do Senhor, assim como as águas recobrem o fundo do mar”(Is 11, 6-9).
Sobre a “última provação” que a Igreja deverá enfrentar, fala o Catecismo da Igreja:
“Antes do Advento de Cristo, a Igreja deve passar por uma provação final que abalará a fé de muitos crentes (cf Lc 18,8; Mt 24,12). A perseguição que acompanha a peregrinação dela na terra (cf Lc 21,12; Jo 15,19-20) desvendará o “mistério da iniquidade” sob a forma de uma impostura  religiosa que  há de trazer aos homens uma solução aparente aos seus problemas, à custa da apostasia da verdade. A impostura religiosa suprema é a do Anticristo, isto é, a de um pseudomonadalismo em que o homem se glorifica a si mesmo em lugar de Deus e do seu Messias que veio na carne (cf 2Tes 2,4-12; 1 Ts 5,2-3; 2 Jo7; 1 Jo 2,18-22) (CIC, 675).
O Catecismo explica que a grande impostura religiosa anticrística será uma falsificação do Reino de Deus, a ser implantado na terra, pelo próprio homem, sem a necessidade de Deus. É o ateísmo sistemático – já denunciado no santo Concílio Vaticano II (GS 20,21) – que leva o homem a se rebelar “contra qualquer dependência de Deus”.
“Aqueles que professam tal ateísmo – disse o Concílio – sustentam que a liberdade consiste em o homem ser o seu próprio fim e o único artífice e demiurgo [criado] de sua própria história. E pretendem que esta posição não pode harmonizar-se com o reconhecimento do Senhor…” (GS, 20).
A Igreja sabe que só entrará na glória do Reino passando por uma “Paixão”semelhante a do seu Senhor. O Catecismo afirma que:
“O Reino não se realizará por um triunfo histórico da Igreja segundo um progresso ascendente, mas por uma vitória de Deus sobre o desencadeamento último do mal (cf Ap 20,7-10), que fará a sua Esposa descer do Céu (Ap 21,2-4).
Então, finalmente, “haverá um novo céu e uma nova terra”(Ap 21,1) e se realizará o que está escrito:
“Eis a tenda de Deus com os homens. Ele habitará com eles; eles serão o seu povo, e ele, Deus-com-eles, será o seu Deus. Ele enxugará toda a lágrima dos seus olhos, pois nunca mais haverá morte, nem luto, nem clamor, e nem dor haverá mais. Sim! As coisas antigas se foram! (Ap 21,3-4).

Rei e Santo? Pode um rei ser canonizado?


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Você sabia que existem vários reis que foram canonizados?
Por exemplo: São Luiz IX rei da França, Santo Olavo da Noruega, Santo Henrique II, imperador alemão, santa Isabel da Hungria, santa Isabel de Portugal, São Venceslau da Hungria, e muitos outros. Isso mostra que a santidade pode ser vivida mesmo nos palácios e no âmbito do poder, em qualquer lugar, depende de cada um.
Um belo Santo foi Santo Estevão da Hungria. Um dos reis e santo que marcou essa sua época, o difícil século X.  Era filho do duque dos terríveis húngaros magiares, tribo bárbara e guerreira que veio do mar Cáspio para as margens do rio Danúbio, nas ricas províncias da Panônia e Morávia (Hungria).
Aos 17 anos, Voik era seu nome,  se converteu devido a pregação de Santo Adalberto, bispo de Praga, e tomou o nome do primeiro  mártir cristão. Segundo uma tradição, o primeiro mártir da Igreja teria aparecido a sua mãe Sarolta, e tinha-lhe profetizado que o filho dela seria o primeiro a usar a coroa real na Hungria. Aos 18 anos, Estevão  foi proclamado duque dos húngaros. Desde o começo do governo, tomou como fundamental a conversão total do seu povo ao Cristianismo. Seu pai se fez cristão, mas sem muita convicção.
Estevão entregava-se a oração tanto na paz quanto na guerra. Era um santo que lutava por seu povo. Ele dizia a seu filho que “a prática da oração é a garantia da saúde do reino”. Fundou hospedarias em Roma, Constantinopla e Jerusalém, para os húngaros peregrinos. Sua grande obra foi a conversão do seu povo. Foi o primeiro apóstolo dos Húngaros. Deu ao reino uma legislação cristã, que é preservada ainda hoje. Criou várias sedes episcopais, levantou mosteiros e edificou instituições beneficentes.
Ele concebia o reino como um templo sustentado por dez colunas: a solidez da fé, o esplendor da Igreja, a pureza e sabedoria dos eclesiásticos, a fidelidade e fortaleza dos barões e cavaleiros, a generosidade com os estrangeiros, a reta administração da justiça, a sábia organização do conselho, o respeito às tradições dos maiores, o auxílio da oração e a piedade e misericórdia.
Ele deixou escrito ao filho: “O rei que não atende a voz da misericórdia, é tirano. Por isso meu filho, muito amado – doçura do meu coração, esperança da geração futura – recomendo-te que tenha entranhas de mãe, não só com os teus parentes, não só para com os chefes do exército e os potentados, mas para com todo o povo. As obras de piedade serão a base da tua felicidade. Sê paciente não só com os ricos, mas também com os necessitados. Sê forte, de maneira que nem a fortuna te levante, nem te desanime a adversidade. Sê humilde que Deus se encarregará de exaltar-te. Sê doce, sem esquecer a justiça e sem castigar irrefletidamente. Sê casto e evita os estímulos da concupiscência como latidos de morte. Estas são as pedras preciosas de uma coroa real. Sem elas perderás o reino da terra e também não conseguirás aquele que não acaba”. (Leite, José, Santos de cada dia, Editorial A. O. Braga, Portugal, p. 548).
Sua humildade era grande; não quis usar a coroa real até que o Papa Silvestre II o autorizasse, enviando-lhe uma coroa de ouro com uma cruz riquíssima. Sete anos antes de sua morte, Santo Estevão perdeu seu filho Santo Emerico, que Deus glorificou com milagres e prodígios. Por fim morreu em 15 de agosto de 1038. Sua festa foi fixada por Inocêncio IX a 2 de setembro, como recordação da vitória que nesse dia obtiveram as armas cristãs contra os turcos em Budapeste. Por ser o primeiro rei que consagrou sua nação a Nossa Senhora, tem uma estátua na Basílica de Nossa Senhora de Fátima e um vitral na capela do Calvário húngaro.
Prof. Felipe Aquino

A conversão de Clóvis, rei dos Francos


O primeiro rei dos francos foi Clódio. Em 430 se instalou na Gália tendo recebido nesse ano do imperador Valentiniano III (425-455), o título de legado, e mandou educar seu filho Meroveu na corte do imperador em Ravena, Itália, como era o costume.
Clovis-rei-dos-francos-frameOs francos souberam fazer carreira no Império. Quando Meroveu se tornou chefe, em 451, lutou contra os hunos de Átila, e seu filho Quilderico ajudou as forças galo-romanas a salvar Angers dos saxões.
Como esses francos ainda eram pagãos, e não tinham se tornado hereges arianos pelo famoso bispo Úlfilas, os bispos se aproximaram deles e os converteram. Isto se deu com a conversão do rei Clóvis, filho de Quilderico e da princesa Basina, e que aos quinze anos se tornou chefe. Clóvis foi instruído na fé pelo eremita São Vasta, depois bispo de Arras; ao escutar a narrativa da Paixão de Jesus, Clóvis exclama: “Ah! Se eu estivesse lá com os meus francos!”.
São Remígio, bispo de Reims se aproximou dele para trazê-lo a Igreja, e conseguiu. Clóvis já era o mais forte dos reis bárbaros, e a aliança com os bispos foi fundamental para isso, devido a sua autoridade. Esses foram os primeiros bárbaros que se converteram ao catolicismo.
Três séculos depois, outro rei descendente dos bárbaros, no ano 800, o franco Carlos Magno era também batizado e coroado imperador pelo Papa. Assim esses homens, na fé de Cristo e da Igreja mantiveram o Império, que consideravam fundamental para o mundo; e agora a tarefa era integrar nele os bárbaros. E somente a Igreja, poderia cumprir essa missão.
Santo Ávito, bispo de Vienne, influenciou a conversão de Clóvis; no ano de seu batismo lhe escreveu uma carta profética. Da mesma forma São Cesário de Arles. Clotilde, esposa de Clóvis, foi fundamental para a sua conversão; era uma princesa burgúndia, cuja beleza e sabedoria eram exaltadas por São Gregório de Tours. Ela era além de católica, modelo de piedade e virtude. Isto mostra a importância de uma mulher de fé ao lado de um rei, mesmo nos tempos bárbaros.
Ela se uniu em casamento a Clóvis, ainda pagão, quando ele tinha vinte e quatro anos, no ano 493, em Soissons, e foi fundamental na sua conversão. Ele tinha dado sua irmã Aldofleda em casamento com o rei bárbaro da Itália Teodorico, que era herege ariano, o que era um perigo para o catolicismo.
Clotilde tinha duas irmãs católicas; uma delas, Crona, fundou em Genebra a célebre abadia de São Vítor. Nunca como nos tempos bárbaros as mulheres santas, casadas e consagradas tiveram um papel tão fundamental sobre os seus esposos. São Paulo disse: “A mulher que crê santifica o marido que não crê” (1Cor 7,14); isto foi real nesses tempos, como é hoje. Clotilde levou o marido pagão a Jesus Cristo e à civilização. Mulher forte e ao mesmo tempo doce, piedosa e caridosa, igualmente como outra mulher fantástica, Santa Genoveva, velha religiosa que vivia no cume da montanha do rio Sena; e que foi venerada por Clóvis como santa.
Quando nasceu o primeiro filho de Clotilde e Clóvis, este morreu, e o marido lhe disse: “Os meus deuses tê-lo-iam curado, o teu não o salvou”. Em seguida nasceu um segundo que esteve gravemente enfermo; disse São Gregório de Tours que: “Clotilde orou tanto pela recuperação da criança que Deus o curou”.
Na batalha decisiva de Clóvis contra os alamanos, em 496, onde ele poderia perder tudo, quase desesperado, apelou para o Deus de Clotilde; e se comprometeu a receber o batismo se alcançasse a vitória. Foi o que aconteceu. Na verdade, nos desígnios de Deus, Clóvis cumpria uma missão que desconhecia. Com o seu batismo a Igreja conseguiu uma vitória decisiva, e se decidia o destino do Ocidente.
O Papa Santo Hormisdas (514-523) escreveu a São Remígio, ao nomeá-lo legado universal na Gália: “Convertestes esses povos, por meio de milagres que se podem comparar aos dos Apóstolos”. São Gregório de Tours relatou Clóvis chorando, com os braços para o céu em prece no meio da batalha contra os alamanos:
“Jesus Cristo, que Clotilde afirma ser o Filho do Deus da vida, tu que desejas vir em auxílio daqueles que desanimam e dar-lhes à vitória, desde que esperem em ti; eu invoco, devotamente o teu glorioso socorro. Se te dignares conceder-me a vitória sobre os meus inimigos, e se eu experimentar esse poder de que as pessoas que usam o teu nome afirmam ter tantas provas, acreditarei em ti e far-me-ei batizar em teu nome. Invoquei os meus deuses e nenhum socorro recebi […].”
E São Gregório acrescenta:
“Nesse mesmo momento os alamanos voltaram as costas e debandaram. E, vendo que o seu rei havia sido morto, submeteram-se a Clóvis dizendo: “Concedei-nos a vida, porque nós somos teus”. Repetia-se o que aconteceu com Constantino quase dois séculos antes. A cruz de Cristo lhe aparece no céu, e ele ouviu a voz: “Sob este símbolo vencerás!” (Rops, Vol. II, p. 197).
São Gregório de Tours narrou com detalhes o célebre batizado de Clóvis, por volta de 497, na catedral de Reims, na França, por São Remígio. Depois de Clóvis, em grupos de 300, três mil dos seus homens também receberam o batismo. “A religião do rei era a religião do seu povo”, era a lei dos antigos povos. Era o dia de Natal! Ao entrarem na igreja, ornamentada com panos brancos, o incenso perfumando o ar, e os inúmeros círios iluminando a basílica, os bárbaros perguntavam: “Será já o Paraíso?”.
Muitos bispos participavam. Clóvis ao ser batizado ouviu do bispo: “Inclina devagar a cabeça! Ó sicâmbrio! Adora o que queimaste e queima o que adoraste!” (Rops, Vol. II, p. 189). Os bárbaros francos iam para o batismo com a mesma naturalidade que iam para a guerra com o chefe. Esse modo de conversão global de um povo se enquadrava nas necessidades daquele tempo.
Conta a lenda que no momento em que São Remígio os crismava, desceu do céu uma pomba que segurava com o bico uma ampola cheia do santo óleo. Esse óleo foi usado na coroação de Carlos Magno.
Foi um momento fundamental, e fez com que a Igreja passasse a contar com a proteção dos francos e a Gália (atual França), tornou-se assim um centro de irradiação do Cristianismo. Foi uma data histórica para o Cristianismo e para o Ocidente, como a visão que Constantino teve da Cruz no século IV e a coroação de Carlos Magno em 800. A França se tornava “a filha mais velha da Igreja”. Santo Ávito disse essas palavras proféticas a Clóvis: “Graças a vós, esta parte do mundo resplandece com um brilho próprio, e no nosso Ocidente cintila o clarão de um novo astro. A vossa fé é a nossa vitória!” [Idem, p. 199]. A partir daí os francos venceriam outros bárbaros e todos se tornariam cristãos.
Santo Ávito parecia pressentir o Império cristão de Carlos Magno (†814) trezentos anos depois, bem como a França cristã da Idade Média de São Bernardo e de São Luiz IX. São Gregório de Tours disse que Clóvis foi em busca da unificação da Gália no catolicismo vencendo os arianos: “Marchemos, pois, contra eles, com a ajuda de Deus, e se os nossos inimigos forem vencidos, dominaremos todo o país”. De fato Deus estava do seu lado; em 507 bateu Alarico II, rei dos visigodos arianos em Vouillé, e a maioria das populações católicas estava livre. Alarico II tentou ainda um acordo com os bispos católicos, mas já era tarde.
Clóvis escolheu Paris como a sua capital e recebeu do imperador bizantino Anastácio o título honorífico de cônsul honorário. São Gregório de Tours disse que a partir daquele momento Clóvis foi tratado por “Augusto”, como um colega do Imperador. Isso é significativo em se tratando de um bárbaro, que os orientais rejeitavam.
Nesse terrível tempo dos bárbaros, só a aliança do Cristianismo com a força dos reis podia estabelecer a ordem; e Clóvis, agora cristão, entendeu isso. Assim se fortalecia a união da Igreja com o Estado, sem isso o mundo pereceria. O contrato entre os reis e a Igreja duraria por séculos e se tornava a legitimação divina do poder monárquico. O Cristianismo começava, então, a formação dos países e dos valores da Europa. Ora, quem são os franceses senão os bárbaros francos que se tornaram cristãos?
Mas a conquista dos bárbaros para Cristo não foi sem sangue dos mártires; eles perseguiram e mataram padres, bispos e papas. Mas a Igreja salvou e modelou a civilização ocidental. Depois de seis longos séculos surgiu então a “Cristandade”, a característica da Idade Média. Daniel Rops afirmou:
“Do século VI ao XIII, não haverá obra alguma de valor que não esteja na dependência da Igreja, e não se poderá citar um só nome que não seja eclesiástico – bispo, sacerdote ou monge” (Vol. II, p. 310).
Clóvis morreu em 511, em Paris, aos quarenta e cinco anos. Com ele surgia a primeira dinastia e monarquia francesa, a dos Merovíngios; seus filhos Clotário, Clodomiro e Quildeberto, além do bastardo Thierry, herdaram-na. As grandes vitórias de Clóvis deram muita força ao Cristianismo diante dos bárbaros; por isso, muitos deixaram seus deuses. Eles não tinham motivo para recusar o Batismo.
A quem possa estranhar o uso da força e das guerras nessa época, é preciso dizer que só pela aliança do Cristianismo com a força a serviço da justiça era possível estabelecer a ordem. A força é legítima quando está a serviço da justiça.
Logo depois da conversão dos francos, os burgúndios arianos também foram convertidos ao catolicismo com certa facilidade. Em seguida, os suevos se converteram com o trabalho de São Martinho de Braga. A conversão mais difícil foi a dos visigodos, na Espanha, que atacaram fortemente a Igreja, cujo rei mais importante no século V foi Eurico (466-484), ariano radical que muito mal fez à Igreja. A conversão desses se dará no século VI.
Prof. Felipe Aquino
Retirado do livro: “História da Igreja Antiga”, Editora Cléofas.

Mártires de ontem e de hoje


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“322 cristãos são mortos por mês (11 por dia!) no mundo por causa de sua religião.”
A História da Igreja mostra com clareza que em todos os lugares do mundo onde a semente do Evangelho foi lançada, teve de ser regada com o sangue dos mártires. Jesus já tinha avisado: “Se o mundo vos odeia, sabei que me odiou a mim antes que a vós… O servo não é maior que o seu Senhor. Se me perseguiram, também vos hão de perseguir” (João 18-20).
A perseguição começou com Jesus; foi caluniado, flagelado, coroado de espinhos, crucificado e morto entre dois ladrões. Antes Dele seu Precursor, João Batista, foi degolado. Logo em seguida foi Santo Estevão, apedrejado até a morte. Em seguida foi Tiago maior, morto por um dos Herodes. Pedro e Paulo morreram sob Nero e junto com eles milhares de cristãos derramaram seu sangue no Coliseu, no Circo de Nero e nos anfiteatros romanos em toda a volta do Mediterrâneo. Milhares de crianças, jovens, mulheres e velhos derramaram seu sangue para que a fé chegasse a nós.
O escritor cristão do século II, Tertuliano, escreveu em seu “Apologeticum” para o imperador sanguinário, Marco Aurélio, que não adiantava matar mais cristãos porque “o sangue dos mártires é semente de novos cristãos”. Quanto mais cristãos eram martirizados barbaramente, mais romanos se convertiam; até que em 313, depois de 250 anos de perseguição de Nero, Domiciano, Trajano, Aureliano, Marco Aurélio, Diocleciano, etc., Constantino se converteu, impediu a perseguição. Em 385 Teodósio, o Grande, decretou o fim do paganismo e Roma se tornou cristã. O sangue dos mártires venceu a fúria da grande águia romana e a espada dos Césares se “curvou diante da cruz de Cristo” (Daniel Rops).
Esse sangue foi derramado abundantemente no Japão, na China, no Vietnã, no Laos, no Cambodja, no México, em Cuba, na Espanha… em todos os continentes; e, mais do que nunca no século XX e XXI, pelos comunistas, nazistas e mulçumanos radicais. No Brasil, o nosso primeiro bispo, D. Pedro Sardinha, foi morto pelos índios e devorado.
A revolução francesa matou cerca de 17.000 padres e 30.000 religiosos. O Papa João Paulo II disse, com dados mostrados, que o século XX sozinho fez mais mártires do que toda a história anterior da Igreja. Ele nomeou uma Comissão destinada a recensear os mártires do século XX. Mais de dez mil relatos de martírio ocorrido chegaram a Roma, em cerca de dez línguas diferentes. 45% desses relatos vieram de Conferências Episcopais e 40% de Congregações ou Ordens Religiosas. Em setembro de 1998, a Igreja da Espanha tinha mandado 2075 relatórios; a da França, sessenta e a Espanha mais 2000 ; a Coréia, 200; a Polônia, 900. Quanto aos países dominados por governo anticatólico (Vietnã, China, Sudão…), as autoridades civis não permitiram.
Bento XVI beatificou 149 mártires da perseguição religiosa espanhola, assassinados entre 1936 e 1937, na revolução civil. Em outubro de 2007, Bento XVI realizou a beatificação mais numerosa da história da Igreja: a 498 “mártires do Século XX na Espanha (1930)”. Em agosto de 2010, beatificou 12 carmelitas martirizados na Espanha em 1930. Em julho de 2010 beatificou vinte e dois jovens martirizados pelo Rei Mwanga, em Uganda. Em 2009, mais de 200 mártires dessa Guerra Civil espanhola. No dia 29 de agosto de 2010, os cristãos na Índia celebraram a “jornada dos mártires da Índia”. Em novembro de 2012, Bento XVI beatificou 117 mártires vietnamitas. Em junho de 2013 o Papa Francisco reconheceu o martírio de 95 Servos de Deus assassinados durante a Guerra Civil Espanhola. E beatificou 134 mártires coreanos em Seul.
O representante do Vaticano na ONU, em Nova York, o arcebispo Celestino Migliore, núncio apostólico e observador permanente da Santa Sé nas Nações Unidas, em 28 de outubro de 2009, disse que “a religião cristã é a mais perseguida no mundo”. Mais de 200 milhões de cristãos sofrem discriminações.
Dom Eterovic, no sínodo dos bispos de 2009, referiu-se à quantidade de pessoas que foram assassinadas na África por defender sua fé nos últimos 15 anos. Foram mortos 521 agentes pastorais, entre africanos e outros missionários estrangeiros.
Em 20 de outubro de 2010 no Sínodo dos Bispos para o Oriente Médio, Dom Edmond Farhat, arcebispo titular de Biblos (Líbano) disse: “A ação de Deus continua na história. A Igreja no Oriente Médio vive agora seu caminho de cruz e de purificação, que leva à renovação e à ressurreição. Os sofrimentos e as angústias do presente são o choro do recém-nascido. Se duram, é porque este tipo de demônio que atormenta nossa sociedade só se afasta com a oração.”
A ONG OPEN DOORS, em seu relatório de 2014, informou que: 322 cristãos são mortos por mês (11 por dia!) no mundo por causa de sua religião, a maior parte deles vitima do extremismo islâmico. No Iraque, 70% dos cristãos deixaram o país desde 2003 para fugir da perseguição terrorista dos muçulmanos. 2014 foi o ano da era moderna em que mais cristãos foram perseguidos, torturados, presos ou mortos por causa de sua fé” (VEJA, pg. 30, n.2414/fev/2015).
Agora vimos essa brutal decapitação, fria e covarde, de 21 cristãos coptas, mostrados pela internet e TV, sendo fotografados e filmados. Cometeram o crime de ser cristãos, da mesma forma que seus irmãos mártires jogados aos leões de Roma, queimados vivos, eliminados nas câmaras de gás de Hitler e nos labirintos soviéticos. Cristo continua derramando seu sangue para salvar a humanidade. “Completo na minha carne o que falta a paixão de Cristo, no seu corpo que é a Igreja” (Col 1,24). Quando se mata uma baleia, há clamor mundial; quando se mata cristãos, a maioria se cala… Jesus continua sua Paixão silenciosa.
Prof. Felipe Aquino

História da Igreja: O Monaquismo

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Origem do Monaquismo
A palavra “monaquismo” vem do grego moncos = aquele que está só; designa uma forma de vida cristã totalmente consagrada a Deus no retiro, no silêncio, na oração, na penitência e no trabalho.
Houve formas de monaquismo pré-cristão na Índia, na Palestina (os essênios), no Egito (os terapeutas, os neoplatônicos)… O monaquismo cristão tem seus fundamentos imediatos no próprio Evangelho, onde o Senhor Jesus aconselha a deixar tudo e seguir incondicionalmente o Cristo; ver Lc 9,57-62; Mt 19, 16-22, lcor 7,8s. 25-35. Pode-se crer, na base do testemunho de S. Paulo em lcor 7, que já nas primeiras décadas do Cristianismo havia homens e mulheres que se abstinham do casamento para poder-se consagrar mais plenamente ao Reino de Deus.
No século III essa modalidade de vida ascética tomou a forma eremítica; os cristãos retiraram-se para o deserto, tendo como modelo S. Antão (251-356); este é considerado o “Patriarca do monaquismo”; filho de família rica, ouviu o apelo do Senhor proclamado na igreja e resolveu deixar tudo, retirando-se para o deserto do Egito, após ter providenciado a subsistência de sua irmã mais jovem. A “Vida de S. Antão”, escrita no século IV por S. Atanásio, exerceu grande influência sobre as gerações posteriores.
A vida eremítica teve expressões de grande generosidade: os monges viviam em silêncio, trabalhando com as mãos na confecção de cordames, cestas, esteiras e dedicando longas horas à oração; os jovens iam consultar os anciãos a respeito de seu tipo de ascese. Alguns eremitas se dedicaram a formas de penitência muito pessoais: por exemplo, S. Simão Estilita (?459) passou trinta anos sobre o topo de uma coluna de 40 cúbitos de altura; era conselheiro espiritual e defensor dos necessitados; teve vários imitadores, até mesmo entre as mulheres. Havia os monges reclusos, que ficavam fechados em cela estreita por muito tempo ou para sempre; existiam também os pascolantes, que vagueavam constantemente pelos campos e se alimentavam apenas de ervas. Mais: registravam-se também os giróvagos, que passavam de um mosteiro para outro, ficando como hóspedes em cada qual por três ou quatro dias; os sarabaítas, que, aos grupos de dois ou três, viviam em celas sem Superior nem Regra.
A vida eremítica foi cedendo aos poucos A vida cenobita ou comunitária. Esta apresentava suas vantagens, a saber: mais frequente ocasião de se praticar a caridade e controle da comunidade sobre atitudes e comportamentos, As vezes esdrúxulos, dos monges eremitas. S. Pacônio (?346) foi o primeiro organizador da vida cenobftica, que ele quis submeter a uma Regra e a um superior chamado “Abade” (= pai); a Regra visava a regulamentar a discipline dos monges na oração, no trabalho, no vestuário, na alimentação…, apresentando um caminho de santificação concebida pela sabedoria do Fundador. A casa dos cenobitas tomou o nome de monastérion em grego (donde mosteiro, em português). O primeiro mosteiro data de 320; fundou-o S. Pacônio em Tabenisi, a 575 km ao sul da moderna cidade do Cairo.
Os monges eram quase todos leigos, isto é, não recebiam as ordens sacras; o número de sacerdotes nos mosteiros correspondia As necessidades do serviço interno da comunidade. Só na Idade Média é que se difundiu o costume de conferir o presbiterado aos monges. São Pacônio era tão rigoroso neste particular que excluía por completo a possibilidade de ordenar algum monge, pois julgava que isto podia suscitar o desejo de honras a encargos de projeção. Conservam-se até hoje coletâneas de historietas e dizeres (Apoftegmas) dos Padres do deserto, cuja leitura revela a sabedoria e o heroísmo daqueles cristãos.
Estudada a origem do monaquismo, vejamos como evoluiu no Oriente e no Ocidente
O monaquismo no Oriente
O Oriente foi o berço do monaquismo, que se difundiu pelos lugares retirados (se não desertos) do Egito, da Palestina, da Síria…
Ao lado dos mosteiros masculinos, foi fundado grande número de mosteiros femininos. Estes tinham suas raízes especiais na prática de consagrar a virgindade ao Senhor seja mediante voto particular, seja mediante voto público de castidade (cf. lCor 7,37s); os escritores dos séculos III e IV Tertuliano (? 220), S. Cipriano (?258), Metódio de Olímpio (?311), S. Ambrósio (?397) deixaram escritos que louvam e recomendam a virgindade consagrada. S. Pacômio mesmo fundou dois mosteiros femininos. Geralmente tais mosteiros ficavam situados nas proximidades dos cenóbios masculinos, a fim de facilitar o intercâmbio espiritual, o mútuo auxílio econômico e a proteção em casos de assalto (como ocorriam As margens dos desertos). Houve mesmo mosteiros duplos – o masculino e o feminino – separados entre si pela igreja conventual. Esta disposição acarretava perigos de ordem moral; por isto o concílio regional de Agde (Gália) em 506 e o Imperador Justiniano em 546 proibiram a existência de mosteiros duplos. O concílio de Nicéia II em 787 proibiu, ao menos, a fundação de novos e baixou medidas relativas aos já existentes. Todavia no Ocidente esse tipo de instituição perdurou até o fim da Idade Média, com bons frutos espirituais, principalmente no século XII.
O grande legislador do monaquismo oriental foi S. Basílio Magno. Visitou as colônias de monges da Síria, da Palestina, do Egito e da Mesopotâmia. Depois entregou-se à vida oculta As margens do rio Iris (Ásia Menor), com homens do mesmo ideal.
Nesse retiro escreveu duas Regras cenobíticas, que ficaram famosas na história da espiritualidade; louvava os cenóbios como lugares em que se pode exercer a caridade fraterna mais do que no deserto, e como depositários da plenitude dos carismas do Espirito Santo, como ocorre na grande Igreja. S. Basílio atribuiu grande importância não só à oração, mas também ao estudo, especialmente ao da Teologia; procurou desta maneira fundir entre si o ideal dos antigos monges e o gênio da cultura monges basilianos (com casas no Paraná-Brasil).
Em certas regiões desenvolveu-se uma forma mista de monaquismo eremítico e cenobítico; os monges viviam em colônias chamadas lauras sob a guia de um abade, mas ocupando habitáculos distintos uns dos outros.
O Monaquismo no Ocidente
Começou sob a forma eremítica principalmente sob a inspiração de S. Atanásio, que escreveu a vida do primeiro eremita: S. Antão. Em algumas ilhas do mar mediterrâneo e em lugares retirados da Itália e da Gália registra-se a existência de anacoretas desde remotos tempos.
Todavia os ocidentais, dotados de senso prático e ativo, deram mais ênfase à vida cenobítica. Esta foi incentivada por grandes mestres como S. Ambrósio (? 397),
S. Jerônimo (?420), S. Agostinho (?430), S. Paulino de Nola (?431)… que tiveram de defender a vida monástica contra adversários, como Elvídio, Joviniano e Vigilâncio; Joviniano, por exemplo, levou vida austera no Oriente; mas no fim do século IV foi para Roma, onde desdisse o seu comportamento anterior; alegava que aqueles que tivessem recebido o Batismo com fé, já não podiam pecar; em conseqüência, não precisariam de ascese, mas antes poderiam satisfazer a todos os impulsos naturais; isto o levou a uma conduta licenciosa, que o Papa S. Cirício condenou excomungando Joviniano (392). S. Jerônimo respondeu a este num opúculo intitulado “Contra Joviniano (393). Em Joviniano revivia algo do gnosticismo dos séculos II e III.
Quatro figuras se destacam no monaquismo ocidental: S. Martinho de Tours S. Agostinho S. Bento de Núrsia e S. Columbano.
S. Martinho (? 397)
Martinho nasceu em 316 ou 317 na Panônia (Hungria de hoje). Recebeu o batismo aos 18 anos de idade e tornou-se eremita em Ligugé (França). Feito bispo em 371, empenhou-se pela difusão do monaquismo, ficando fiel ele mesmo ao seu ideal originário, pois uma coroa de monges se lhe juntou, levando vida comunitária com seu bispo.
Seu túmulo em Tours tornou-se um dos lugares mais visitados pelos peregrinos medievais; era o santo nacional dos francos. O seu manto, a respeito do qual se contavam milagres, era uma relíquia conservada em grande honra no reino dos francos.
A vida de S. Martinho escrita por Sulpício Severo, por volta de 400, compraz-se em exaltar a figura do Santo e exerceu grande influência sobre as gerações posteriores.
S. Agostinho (? 430)
Já antes de se converter, Agostinho, com trinta anos de idade, concebeu o projeto de levar com alguns amigos uma vida comum, retirada do mundo e despreocupada de solicitudes materiais. Todavia, quando quiseram executar tal ideal, verificaram que não poderiam contar com o consentimento de suas esposas (os casados) ou de suas eventuais esposas (os que tencionavam casar-se).
Uma vez convertido em Milão, voltou à África e, em Tagaste, tratou de reunir em torno de si alguns irmãos dispostos a renunciar aos bens materiais para levar vida monástica: queria viver com seus clérigos e irmãos leigos segundo a regra dos apóstolos: nada possuíam de próprio; tudo era comum, de modo que cada qual recebia da comunidade o que lhe fosse necessário. Da carta 121 de S. Agostinho uma secção foi extraída, tornando-se a Regra de S. Agostinho, que ainda hoje inspira o modo de viver de várias famílias religiosas (Agostinianos, Dominicanos …) – Certa vez alguns monges de Hadrumetum (Norte da África) não queriam trabalhar para poder dedicar-se inteiramente à oração; ao saber disto, S. Agostinho escreveu o opúsculo De opere monachorum (sobre o trabalho dos monges), que se apoiava nos dizeres de S. Paulo: “Quem não quer trabalhar, também não coma” (2Ts 3,10); este opúsculo tornou-se um monumento da civilização ocidental.
S. Bento de Núrsia (?547?)
É dito “o Patriarca dos monges ocidentais”. Nasceu por volta de 480 em Núrsia (Itália), de nobre família rural romana. Começou em Roma seus estudos de artes literárias, mas logo retirou-se para os montes Sabidos (Subiaco), onde levou vida eremítica por três anos. Descoberto e procurado por discípulos, fundou doze mosteiros na região de Vicevaro. Teve que deixar tal ambiente para ir residir em Monte Cassino (529), onde fundou o mosteiro-berço da Ordem Beneditina. Foi aí que escreveu a sua Regra, inspirada pelo senso de equilíbrio e discrição dos romanos. Valeu-se da tradição monástica anterior, tanto ocidental como oriental, e adaptou-a às condições de vida de sua época, procurando oferecer uma disciplina que permitisse aos fortes desenvolver os seus dons e, ao mesmo tempo, não afugentasse os fracos. Há quem julgue que S. Bento realizou sua obra legislativa a pedido do Papa Adapto ou até do Imperador Justiniano, desejosos de codificar e vivificar as diversas experiências de vida monástica até então ocorrentes no Ocidente.
Pode-se dizer que o lema de São Bento é Ora et labora (Ora e trabalha). Por isto deu importância primacial ao Oficio Divino ou à oração oficial de Igreja recitada no coro sete vezes durante o dia e uma vez durante a noite. O espírito de oração deve, pois, impregnar toda a vida do monge, inclusive o trabalho, que na época era principalmente o da lavoura e das oficinas (os monges era de origem goda, de pouca cultura; além do quê, a Itália era cenário de guerras, que deixavam pouca disposição para elevados estudos). A atividade intelectual nos mosteiros de S. Bento era originariamente a da lectio divina, ou seja, a da leitura meditada da S. Escritura.
Uma das notas típicas da Regra beneditina é o voto de estabilidade que fixa o monge física e juridicamente no seu mosteiro. Era oportuno para pôr termo às divagações dos monges, que redundavam não raro em fonte de decadência.
Aos poucos, os mosteiros beneditinos foram assumindo papel de relevo capital na história da Igreja, tanto no setor missionário quanto no da cultura em geral. Foram, em grande parte, os monges beneditinos que evangelizaram os anglo-saxões e outros povos germânicos (Inglaterra, Bélgica, Holanda, Norte da Alemanha…); ensinaram aos povos bárbaros que viviam nos arredores dos mosteiros, os princípios de nova cultura; transmitiram às crianças e aos adolescentes os conhecimentos científicos e a formação cristã mediante as escolas “monasteriais”. Foram também eles os copistas que salvaram da ruína os tesouros da cultura romana, que, através dos seus códigos e obras de arte, eles passaram para as gerações vindouras. Pode-se dizer que a grande obra cultural dos monges começou no próprio século VI.
São Columbano (?6l5)
Este é um monge irlandês que em 590 emigrou do seu mosteiro de Langor (Belfas, Irlanda do Norte),e com doze companheiros exerceu sua atividade no território da Gália, fundando diversos mosteiros, dos quais o principal foi o de Luxeuil. Era homem de ascese, que pregava a penitência. Aos monges irlandeses se deve a difusão da prática da direção espiritual, que foi associada, muitas vezes, à confissão sacramental. Contribuíram para a elaboração dos Códigos Penitenciais, que estabeleciam o tipo de penitência devido a cada tipo de pecado.
A Regra monástica escrita por S. Columbano prescrevia rigorosos exercícios de mortificação; até pequenas faltas eram punidas com penas corporais (que na época eram tidas como meio normal de coerção). Tal Regra teve grande voga no reino dos francos e na Itália Setentrional; mas já no fim do século VII foi cedendo o lugar à Regra de S. Bento, mais realista e mais adaptável a situações diversas.
A Igreja (e, com ela, o mundo ocidental) teve no Monaquismo um fecundo foco de vida espiritual, de teologia e de cultura geral.

História da Igreja: Igreja e os Povos Bárbaros

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A partir do século IV, deu-se o importante acontecimento das invasões bárbaras no Império Romano, que contribuiu fortemente para constituir a Cristandade da Idade Média; os novos povos, a princípio repelidos pelos habitantes do Império, acabaram fundindo-se com estes, resultando daí o cristão medieval, que configurou a Igreja da sua época.
A origem de tais invasões está no fato seguinte: os hunos, saindo dos desertos da Mongólia (Ásia), conquistaram uma parte da China, mas foram impelidos para o Ocidente por outros povos invasores. Entraram, portanto, na Europa Oriental e Setentrional, onde estavam alojados povos não conquistados pelos romanos: os godos, os alamanos, os francos, os lombardos… Estes, cedendo à pressão dos hunos, tiveram que invadir o Império Romano. As primeiras tentativas foram repelidas pelos romanos; mas na segunda metade do século IV o Império estava enfraquecido do ponto de vista militar e administrativo, de modo que não pôde resistir.
Em 376, os visigodos atravessaram o Danúbio; entraram na Grécia, na Ilíria (Iugoslávia) e chegaram até Milão (Itália). Não se consideravam conquistadores do Império, mas aliados dos romanos. Os vândalos, porém, os ostrogodos, os lombardos… se mostraram mais ferozes, de modo a acelerar a derrocada do Império. Roma caiu finalmente em 476 sob os golpes dos ostrogodos, chefiados por Teodorico (471-526); um dos generais deste, Odoacro, destituiu o último Imperador, Rômulo, e fez-se proclamar rei da Itália.
Vejamos qual a atitude dos cristãos frente aos novos povos.
O receio dos cristãos
A população do Império Romano, embora resultasse da justaposição de povos diferentes vencidos pelo Império, sentia-se una, pois compartilhava a mesma civilização, que era chamada “a România”. Esta era oposta à barbáries – palavra onomatopaica que tentava reproduzir a rudez e a dureza características dos invasores (bar + bar). Aliás, os romanos já haviam sido considerados bárbaros pelos gregos; transferiam então este tratamento para os germanos.
Para os romanos feitos cristãos, as invasões bárbaras eram motivo de especial pavor. Com efeito; para os discípulos de Cristo, Roma fora, de certo modo, um esteio da propagação do Evangelho: suscitara a paz romana e a fácil comunicação entre diversos povos, favorecendo assim a pregação missionária. – Verdade é que o Império Romano pagão e perseguidor é mal visto em certos escritos do Novo Testamento, que identificam Roma com a Babilônia prevaricadora; ver 1Pd 5,13; Ap 17,5. Todavia, apesar das perseguições, os cristãos eram beneficiados pelas estradas e pela unidade política do Império, de modo que alguns escritores da Igreja atribuíam a este uma função providencial. Em conseqüência, muitos pensadores julgavam que, se Roma caísse sob os golpes dos bárbaros, o mundo acabaria; tal era a ligação que estabeleciam entre Roma e a história. O escritor Latâncio, por exemplo, escrevia no começo do século IV:
“É visível que o mundo está ameaçado de queda próxima. A única circunstância que pode atenuar nossos receios, é o fato de que a cidade de Roma ainda subsiste em estado próspero. Mas, quando esta capital do universo for vencida e dela não restar senão um acervo de ruínas…, não teremos mais nenhum motivo para duvidar da iminência do fim do mundo. Esta cidade por si conserva e  sustenta tudo”(Instituições Divinas VII, XXV, 5)
Podemos sentir o estado de ânimo temeroso dos cristãos através das palavras de S. Jerônimo (? 420)), que foi um dos homens mais eruditos do seu tempo:
“Meu coração estremece pensando nos desastres do nosso tempo. Eis mais de vinte anos que entre Constantinopla e os Alpes Julianos o sangue é derramado diariamente… Quantas damas, quantas virgens de Deus, quantos corpos nobres e delicados não foram joguetes dessas feras selvagens? Os Bispos são levados em cativeiro, os sacerdotes assassinados juntamente com clérigos de diversas Ordens; as Igrejas são devastadas, os cavalos amarrados junto aos altares de Cristo como em estrebaria; os despojos dos mártires são extraídos da terra. Em toda parte, há luto, gemidos e a sombra da morte. O mundo romano desmorona, e a nossa cabeça orgulhosa não se dobra… Tivesse eu cem línguas, cem bocas, uma voz de bronze, nunca, nunca eu poderia contar tantas desgraças!”(epístola IX 16).
Em 410, o visigodo Alarico penetrou e saqueou Roma. S. Jerônimo comenta em 411:
“Hoje quis aplicar-me ao estudo de Ezequiel; mas, no momento preciso em que comecei a ditar, senti tal perturbação pensando na catástrofe do Ocidente – e principalmente na devastação de Roma – que, como diz o provérbio, as próprias palavras me faltaram. Por muito tempo fiquei em silêncio, bem consciente de que estamos na época das lágrimas.
Neste mesmo ano, depois que expliquei três livros de Ezequiel, uma subitânea invasão dos bárbaros… desencadeou-se como uma torrente sobre o Egito, a Palestina, a Fenícia, a Síria, tudo arrastando consigo. Foi graças à misericórdia de Cristo que escapei das mãos deles”(ep. 126,2).
No citado comentário sobre Ezequiel, ainda escreve S. Jerônimo:
“Quem teria acreditado que essa Roma, construída sobre vitórias obtidas em todo o universo, viesse um dia a desmoronar?… Quem teria acreditado que, para os seus povos, Roma viria a ser mãe e sepulcro?… Que todas as regiões do Oriente, do Egito e da África se cobririam de escravos (homens e mulheres) vindos de Roma, outrora senhora do universo? “(Prefácio ao livro III, XXV).
Todavia o horror dos cristãos havia de ceder a outros sentimentos.
Olhar mais otimista
O pavor foi substituído por confiança e esperança em virtude dos seguintes fatores:
1) Os invasores iam penetrando cada vez mais, e o mundo não acabava… Os cristãos foram vendo que se esboçava uma nova situação geral e que o Senhor parecia exigir deles que a assumissem, em vez de se fecharem na perplexidade. – Uma nova atitude aflorava à mente dos cristãos, sugerida pelo sacerdote Salviano de Marselha (? 480): em vez de deterem sua atenção apenas na  barbárie dos novos povos, fizessem os cristãos o seu exame de consciência; não bastava professar a fé católica, para esperar as bênçãos de Deus; era preciso viver de acordo com essa fé; Salviano aponta então os vícios da civilização romana, dada aos prazeres e espetáculos fúteis; os habitantes do Império são coniventes com graves abusos, como a embriaguez, a luxúria, a mentira, os falsos juramentos, o orgulho… Ao contrário, dizia o escritor, os invasores têm seus traços de vida positivos: amam uns aos outros, ao passo que os romanos se odeiam mutuamente; são castos, principalmente os godos e os saxões; ignoram as impurezas do circo e do teatro; o deboche, entre eles, é crime, enquanto para os romanos é motivo de vã glória. Há pobres viúvas e órfãos que escolheram viver em meio aos godos e não se dão por frustrados. Os bárbaros são hereges, sim (professavam o arianismo), mas isto é culpa dos romanos, que lhes transmitiram a heresia.
Os historiadores reconhecem exagero nos dizeres de Salviano. Pouco depois São Cesário, Bispo de Arles (? 452), descreveria vivamente as depravações dos bárbaros. Como quer que seja, as observações de Salviano evidenciam que entre os cristãos ia ocorrendo uma sadia reconsideração dos acontecimentos; esta levava à emenda de vida pessoal e não ao desânimo. Os cristãos deveriam adaptar-se à nova situação e procurar continuar a trabalhar, salvando dos escombros o que pudessem salvar.
2)Os bárbaros levaram ao Império Romano envelhecido seus valores próprios: eram povos de mentalidade inculta, infantil e carente; reconheciam a insuficiência de sua civilização e de suas crenças e abriam-se com facilidade para o patrimônio da cultura romana, que evidentemente era superior. Ao lado dos seus defeitos morais, tinham seus traços de dignidade: acentuado sentimento de honra, espírito de solidariedade com a família e a sua estirpe, matrimônio rigidamente monogâmico, fidelidade à palavra empenhada… A Igreja bem poderia valorizar esse patrimônio moral e lançar dentro dos seus moldes as sementes do Evangelho.
3) As invasões bárbaras contribuíam para extinguir a cultura pagã do antigo Império Romano, que conservava seus redutos ainda no século VI. A mensagem de Cristo assumida pelos novos povos permitiria construir um mundo relativamente novo, mais homogeneamente cristão. Para conseguir isto, a Igreja dispunha de elementos importantes: grandes Bispos, dotados de irradiação, e os mosteiros, que eram focos de espiritualidade, cultura e missão evangelizadora.
A evangelização dos bárbaros
Quase todos os povos germânicos reconheciam três divindades principais: Ziu (deus supremo do céu), Donar ou Thor (deus do trovão) e Wodam ou Odin (deus das tempestades e dos mortos). As suas crenças religiosas, porém, estavam abaladas por terem deixado as suas terras de origem e terem entrado em contato com civilizações e religiões estrangeiras. Estavam, portanto, abertos ao anúncio de uma mensagem religiosa mais sólida.
Não é possível reconstituir com minúcias o processo de conversão de cada povo germânico ao Cristianismo. Apenas se podem apresentar os seguintes traços seguros:
1) Tal conversão não se deu, como na antiguidade, em virtude de ação missionária dos cristãos junto aos familiares e amigos, mas ocorreu por efeito da decisão do chefe da respectiva tribo; os súditos costumavam seguir o exemplo do chefe.
2) Entre os germanos, a vida civil e o culto religioso estavam estritamente associados entre si. Por isto a conversão de uma tribo não era apenas um fato religioso, mas constituía também um acontecimento político.
3) Na conversão dos germanos ao Cristianismo, antes de Carlos Magno, não houve recurso a meios violentos. Todavia algumas tribos, como as dos visigodos e dos vândalos, usaram de violência contra os cristãos.
4) Os germanos, com exceção dos francos, fizeram-se cristãos primeiramente sob a forma do arianismo, seguindo o exemplo dos visigodos. Algumas hordes permaneceram arianas até o seu ocaso (ostrogodos, vândalos); outras o abandonaram para tornar-se católicas, ainda que tardiamente (visigodos, suevos, burgúndios…).
Examinemos em particular a conversão dos visigodos e a dos francos.
Os visigodos
Os visigodos foram os primeiros povos germânicos a abraçar o Cristianismo. No século III alguns de seus indivíduos se tornaram católicos por obra de prisioneiros ou de missionários com quem tiveram contato. Todavia o grande arauto da fé, entre eles, foi Úlfilas (311-383); ordenado Bispo dos godos por Eusébio, Bispo ariano de Nicomédia, pregou durante mais de quarenta anos a fé ariana entre os seus compatriotas; traduziu para o godo quase toda a Bíblia e admitiu a língua goda na liturgia. Úlfilas assim trabalhou com o apoio dos Imperadores Constâncio (337-361) e Valente (364-378), que procuravam fazer do arianismo a religião do Estado.
Os visigodos constituíram um foco missionário do mundo germânico oriental, de modo que, sob o seu influxo, todos os povos germânicos orientais acolheram a doutrina de Cristo sob a forma ariana.
Os francos
Dentre as tribos germânicas, a dos francos havia de desempenhar papel especialmente importante na história da Igreja. Na segunda metade do século V passaram das margens do Reno para a Gália. O seu rei Clodoveu ou Clóvis (481-511) casara-se com a princesa católica Clotilde. Esta o persuadiu de mandar batizar os dois filhos. Mais tarde, Clodoveu achou-se em difícil situação ao enfrentar o exército dos alamanos; fez então o voto de tornar-se cristão, caso vencesse. Tendo sido bem sucedido, recebeu o Batismo das mãos do Bispo S. Remígio de Rheims no Natal de 496, juntamente com 3.000 homens do seu séquito. Entre os motivos da decisão do rei, estava o desejo de obter o apoio dos Bispos para o jovem reino franco.
A conversão de Clóvis e dos francos teve enorme importância: visto que os outros chefes germânicos eram pagãos ou arianos, Clóvis apresentou-se aos povos católicos do Ocidente como o protetor da religião ortodoxa. Este fato mereceu, para a França, o título de “filha mais velha da Igreja”. Clóvis, também dito “o novo Constantino”, e seus sucessores tiveram grande ingerência nos assuntos internos da Igreja – o que equivale a um certo cesaropapismo no Ocidente. A corte desses reis não dava o exemplo de autêntica vida cristã, pois era afetada por crimes e impudicícia; a Igreja empenhou-se por salvar da decomposição o reino dos francos e fazê-lo baluarte da história dos próximos séculos.

Como se deu a queda do Império Romano do Ocidente?


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As invasões bárbaras impossibilitaram o Império Romano de se expandir territorialmente como fazia antes. Ele utilizava os prisioneiros de guerra e escravos, mas, com o fim da expansão houve a diminuição do número desses, o que gerou baixa na produção, inflação alta e aumento dos preços, aumento de impostos, que levaram às revoltas sociais. Com isso houve atraso nos salários dos soldados romanos, que se recusavam a defender Roma, o que também facilitou as invasões bárbaras.
Todos estes motivos levaram à queda de Roma em 476 d.C., data considerada como início da Idade Média e fim da Idade Antiga. O bárbaro Odoacro depôs o último e jovem imperador do Ocidente, Rômulo Augusto (475-476), e enviou as insígnias imperiais ao imperador do Oriente. Essa queda foi também motivada por um jogo de intrigas contra o imperador. Sete anos mais tarde Odoacro (476-483) foi vencido pelo ostrogodo Teodorico (483-526).
Na mesma época a África cristã gemia sob os vândalos. Por outro lado, o imperador bizantino Zenão I (474-491) não podia apoiar o Ocidente porque lutava contra outros inimigos. E, ainda pior, em 482, houve o cisma de Acácio (483-519) que separou o Oriente do Papa por 35 anos.
Na verdade, o grande Império, o maior que o mundo já conheceu caiu porque tinha se condenado a si mesmo; estava apodrecido. Quando morreu Teodósio, o Grande, em 395, o seu jovem filho Arcádio (395-408) ficou com o Oriente, foi tutelado pelo ministro Rufino, despreparado; e Honório (395-423), um menino de onze anos ficou com o Ocidente, ajudado pelo general vândalo bárbaro Estilicão. Este e Rufino eram inimigos mortais, e os distúrbios logo começaram. Honório acabou assassinando Estilicão em 408.
Vimos que Honória, filha de Gala Placídia, irmã do imperador Honório, pediu Átila em casamento; se casou com Ataulfo, bárbaro sucessor de Odoacro; e depois se casou com um general bárbaro. Tudo isso mostra o caos em que estava o Império antes de desabar definitivamente no Ocidente.
Outro fator que enfraqueceu o Império foi o gigantismo estatal que fortaleceu os administradores de alto escalão, os condes e chefes de província, que obtinham cada vez mais terras, destruindo a autoridade central e dando origem ao sistema feudal. As forças vivas foram paralisadas. São os vícios que crescem quando o Estado ultrapassa suas atribuições e quer absorver tudo.
O escritor Orósio falou de “romanos que preferiam conhecer a pobreza e a independência no meio dos bárbaros a suportar o peso dos impostos no meio dos romanos”. Outro escritor, o sacerdote Salviano, disse que “os pobres desesperados suspiravam pela chegada do inimigo e suplicavam a Deus que lhes enviasse os bárbaros” (Rops, Vol. II, p. 79).
O Cristianismo não teve tempo de eliminar os ambientes contaminados pelo paganismo: jogos sangrentos, luxo, ócio, superstições (astrologia, magia negra), imoralidades (abortos, prostituição, divórcio, controle drástico da natalidade) como mostraram Santo Agostinho e São Jerônimo. Como disse o bispo de Lião, Santo Euquério, era um mundo de “cabelos brancos”.
São Jerônimo disse: “São os nossos pecados que fazem a força dos bárbaros, foram os nossos vícios que venceram os exércitos!”. Não havia mais remédio para essa civilização; era o fim; e outra haveria de surgir pelas mãos da Igreja. Nós somos descendentes da ordem que nasceu desse caos, diz Thomas Woods. A Igreja deu um novo rumo e sentido à vida. Como disse Rops: “A santidade salvou a Igreja, e a Igreja salvou o mundo”. A Igreja teve de assumir tudo. O representante do povo já não era o burocrata corrompido e incompetente, nem o soldado, mas o bispo. Ele passou a ser o “defensor da cidade”.
Em 455 os vândalos de Genserico tomaram Roma. Valentiniano III (425-455) acabava de ser assassinado por Petrônio Máximo (455) – vingança por ter degolado pessoalmente o general Aécio em 454. Mas Petrônio foi logo morto pelo povo e o Império estava acéfalo. Então, Leão Magno (400-460) enfrentou Genserico em 455, e conseguiu diminuir os horrores do saque do bárbaro.
Eudóxia, viúva de Valentiniano III, chamou à Itália os vândalos de Genserico e partiu com eles. O Império ainda sobreviveu vinte anos com fracos imperadores: Ricimer, Avito (455-456) que se tornou bispo, Majoriano (457-461), Líbio Severo (461-465), Olíbrio (467-472), Glicério (473-474), e Rômulo Augusto (475-476).
O último imperador romano do Ocidente tinha sua autoridade praticamente restrita à cidade de Roma. Os bárbaros, que antes faziam parte do exército romano, depuseram-no em 476, colocando no poder seu chefe, Odoacro, que se intitulou rei da Itália. Assim acabou definitivamente a autoridade do Império Romano do Ocidente.
Em 483, Teodorico, que sucedeu Odoacro, rei dos ostrogodos, conseguiu fixá-los. Após a morte de Teodorico, os seus filhos Teodorico II e Eurico alargaram as possessões que, se estendiam já do Atlântico aos Alpes do Sul, e do Loire a Gibraltar.
Os bárbaros assimilavam a língua e grande parte dos costumes romanos enquanto introduziam os hábitos e termos germânicos. Terminava assim o Império do Ocidente, mas a civilização persistia: as instituições políticas, como o Senado e o Consulado subsistiram entre os bárbaros. Em 493, Teodorico tomou o poder na Itália, fazendo-se reconhecer como representante legítimo do imperador bizantino. Permaneceram o latim como língua oficial e as estruturas sociais; o grande obstáculo então eram as diferenças de religiões: o choque entre o catolicismo e o arianismo dos bárbaros.
Só graças à reconquista da Itália pelos exércitos bizantinos no século VI, pelo imperador Justiniano I, o Grande (527-565), é que se conseguiu restabelecer a unidade imperial, reconquistando também o norte da África e parte da Espanha; o reino vândalo foi destruído em 534, enquanto que na Península Ibérica a monarquia visigótica foi seriamente enfraquecida. As medidas de Justiniano I durariam pouco tempo pelo impacto do surgimento do Islamismo no século VII.
Praticamente o Império ficou sem imperador até surgir no século VIII o grande Carlos Magno. No entanto, Odoacro, após se apoderar do Império, em 476, enviou ao imperador bizantino as insígnias do Império, colocou tudo em suas mãos; e os chefes bárbaros que comandaram o Ocidente, passaram a ter títulos de funcionários romanos. Teodorico se considerava rei em nome do imperador bizantino e Clóvis, rei dos francos, foi nomeado cônsul pelo imperador bizantino.
Assim, de certa forma o Império se manteve, e ressurgiu com Carlos Magno em 800 (Sagrado Império da Nação Franca, e depois no ano 1000 com os Otões e Henriques (Sagrado Império Romano Germânico). E este Império sobreviveu até 1806 quando Francisco II vencido por Napoleão renunciou o título de “Imperador romano da nação germânica”, para tomar o título de “Imperador da Áustria”.
Prof. Felipe Aquino
Retirado do livro: História da Igreja, A Idade Antiga. Ed. Cléofas.

A história do Conclave


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Jesus mesmo escolheu o primeiro Chefe da Sua Igreja: Simão, a quem chamou de Pedro (=Kephas, Pedra). “Sobre ti Kephas edificarei a minha Igreja” (Mt 16,17). Com a morte de Pedro, crucificado de cabeça para baixo pelo imperador Nero, a Igreja entendeu que precisava continuar a missão de levar o Evangelho a todas as nações, e então, a comunidade nascente escolheu São Lino (67-79); depois Santo Anacleto (79-90), depois São Clemente (90-101), Evaristo (101-107), Alexandre (107-116); Sisto (116-125), Telésforo (125-138), Higino (138-142); Pio (143-155), Aniceto (155-165), Sotero (166-174), Eleutério (174-189), e assim por diante. Essa lista dos doze primeiros papas nos é dada por Santo Irineu de Lião (†202), em sua obra “Contra os hereges”.
No começo da vida da Igreja era a comunidade de Roma quem elegia o Papa; o povo cristão, os diáconos, presbíteros e bispos. Com o tempo a Igreja foi se expandindo e a escolha do Papa começou a sofrer mudanças. Em meados do século XI, o Papa Nicolau II (1058-1061), definiu em sua bula “In Nomine Domini” que somente Cardeais-Bispos poderiam participar da eleição. Em 1179, o Papa Alessandro III estendeu a eleição a todos os Cardeais, sendo que o eleito deveria ter no mínimo dois terços dos votos, essa última condição é válida em nossos dias.
Em 1274, a Igreja teve o primeiro Conclave oficialmente. O Papa Gregório X (1271-1268), através da constituição apostólica “Ubi periculum”, estabeleceu que os Cardeais eleitores deveriam reunir-se em uma sala do palácio do falecido pontífice, dez dias após a sua morte, e ali permanecerem isolados.
Certas vezes demorava muito para o papa ser eleito por causa das ingerências das famílias nobres (Médicis, Corsinis, Crescêncios, Túsculus, Bórgias, etc. ) e dos imperadores alemães. Por exemplo, uma vez em Viterbo, o Conclave demorou 33 meses para eleger o papa.
Então, caso o Papa não tivesse sido eleito após três dias desde o início do Conclave, a refeição dos Cardeais era reduzida, e se após cinco dias ainda não tivessem eleito o papa, a comida era reduzida a pão, água e vinho. Gregório XVI (1621-1623) publicou duas Constituições, o voto secreto.
Os soberanos católicos tinham o poder de vetar alguns Cardeais indesejados. Isso ocorreu até o ano de 1904, quando o Papa São Pio X, através da Constituição “Commissum nobis”, aboliu o direito de veto das nações católicas.
Em 1970, o Papa Paulo VI definiu  que só poderiam votar no Conclave os cardeais com menos de oitenta anos, e estabeleceu que o número máximo de Cardeais eleitores era de 120, o que vale até hoje.
O Papa João Paulo II em 1996 pelo documento “Universi dominici gregis”,  estabeleceu o local para a clausura dos Cardeais (a Domus Sanctae Marthae), e eliminou a possibilidade de eleição por aclamação e por comprometimento.
Prof. Felipe Aquino

A grande fortuna da Igreja


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Muitas pessoas, inclusive católicos, não conhecem a verdadeira riqueza da Igreja…
Concordo com os adversários da Igreja; ela é riquíssima; e acumulou nos seus vinte séculos uma fortuna incalculável! E já é hora de toda esta riqueza ser dividida com todos os homens, especialmente os pobres, mas também os ricos, porque são eles exatamente os que mais precisam dela.
Na verdade a Igreja é rica desde a sua origem, porque o seu Criador e mentor é o próprio Deus; é Dele que vem toda a sua riqueza. Ela é o próprio Corpo de Cristo (1Cor12,27). Ela é rica também, porque é a “Igreja dos Santos”, como disse George Bernanos. Os Santos são a sua grande riqueza, como que reprodução do próprio Cristo.
Ela é a Igreja de Pedro de Cafarnaum, que deixou as redes para seguir o Senhor; é a Igreja de Paulo de Tarso, que rodou o mundo até Roma, para ali ser martirizado por ela. Ela é a Igreja dos Padres: Agostinho de Hipona, que enfrentou o pelagianismo e o maniqueísmo; Atanásio, que enfrentou o arianismo; Irineu, que enfrentou o gnosticismo; Inácio de Antioquia, que enfrentou os leões; Policarpo, que enfrentou a fogueira,… Tomás de Aquino, que escreveu a Suma-Teológica e transformou a Filosofia; Teresa D’Ávila e João da Cruz, que reformaram os Carmelos masculino e feminino; Jerônimo, que traduziu a Bíblia para o latim; Basílio, Gregório de Nissa, Gregório de Nazianzo, Afonso de Ligório, e tantos outros…
Sim, é uma Igreja riquíssima! Ela é a Igreja daqueles que, de tanto amor por ela, derramaram o seu sangue nas arenas romanas, nas espadas dos imperadores, nos cárceres comunistas… Pedro, Paulo, Tiago,… Inácio de Antioquia, Policarpo, Sebastião, Perpétua, Felicidade, Cecília,… Maximiliano Kolbe…
Ela é a Igreja das belas ordens religiosas de Bento, Domingos, Agostinho, Benedito, Francisco, Inácio de Loyola, João Bosco e tantos outros…
É a Igreja dos Santos Apóstolos, revestidos do próprio Cristo, um a um martirizados pela sua fidelidade ao Senhor…
É a Igreja dos Santos Inocentes que, ainda na tenra idade, derramaram o seu sangue inocente pelo menino Deus…
É a Igreja das Santas Virgens: Maria, Ana, Inez, Cecília, Luzia, Teresinha, Mazzarello, Clara de Assis,… que formam um verdadeiro exército de Esposas do Senhor.
Sim, é uma Igreja riquíssima!
Além de ser a rica Igreja dos Santos, dos Profetas, dos Mártires, dos Apóstolos, das Virgens, dos Confessores… é também a Igreja dos Papas. É a Igreja de João Paulo I com o seu sorriso inesquecível; de João XXIII, do Concílio Vaticano II, de Paulo VI com o seu apaixonado amor à Igreja; de Gregório, que a posteridade chamou de Magno, e que criou o canto que recebeu o seu nome.
Ela é a grande e rica Igreja de Leão Magno, detendo as grandes heresias às portas da Igreja, enfrentando os bárbaros Átila e Genserico às portas de Roma. É a Casa de Pedro, que é o princípio de tudo e a Pedra sobre a qual os outros se sucederam. É a Igreja dessa cadeia viva e ininterrupta de 266 Pontífices, o “doce Cristo na Terra”, como dizia S. Catarina de Sena.
Todos os Santos se inclinaram diante do Papa, e nenhum foi nada sem este. Paulo, o apóstolo dos gentios, foi ao encontro de Pedro; Francisco, o enamorado da Pobreza, ajoelhou-se diante de Inocêncio III; Teresinha suplicou a Leão XIII que a deixasse entrar no Carmelo aos quinze anos…
Que outra Igreja teve um Pio IX que proclamou Maria Imaculada; e José, Padroeiro Universal da Igreja ?
Que outra Igreja tem um João Paulo II, operário, ator de teatro, esquiador, sacerdote, poliglota, bispo, diplomata, cardeal – Cardeal da Igreja do Silêncio e da Polônia Mártir?
A Igreja é riquíssima, de fato, pois é a Igreja dos Santos e dos Papas.
É a Igreja dos Sacramentos que o Senhor derramou do seu Coração ferido pela lança no alto da Cruz. É a Igreja da salvação universal de todos os homens… É a barca de Pedro que salva do dilúvio do pecado!
Esta é a verdadeira fortuna da Igreja, acumulada sobre o sangue dos Mártires, na fidelidade dos Confessores, na riqueza dos Padres, no discernimento dos Doutores, na pureza das Virgens, no sangue dos Inocentes, na palavra dos Apóstolos, no rumo dos Patriarcas, na lei dos Profetas e na infalibilidade dos Papas.
Sim, é riquíssima!… Quanto ao resto, é dispensável falar; pois, basta lembrar que o seu território hoje, não passa de um pequeno pedaço de terra com menos de 30 ha, o Vaticano.
Prof. Felipe Aquino
Retirado do livro: Entrai pela porta estreita, Ed. Cléofas.

Os Monges e os Mosteiros


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Os monges e os mosteiros tiveram um papel determinante na evangelização dos bárbaros na Idade Média. Cada mosteiro, com sua escola monástica, tornava-se um centro de vida religiosa e educacional. Ensinavam metalurgia, agricultura, introduziam novas culturas, foram pioneiros na tecnologia, realizavam descobertas científicas, aperfeiçoavam a paisagem europeia, socorriam os andarilhos e cuidavam dos náufragos. Os monges também preservaram a literatura, estudaram música e os escritos dos historiadores e filósofos.
Falando do papel da Igreja nos tempos bárbaros, Chateaubriand (1960), escreveu:
“Os mosteiros foram como espécies de fortalezas em que a civilização se abrigou sob a insígnia de algum santo… A cultura da alta inteligência conservou-se ali com a verdade filosófica, que renasceu da verdade religiosa. Sem a inviolabilidade e o tempo disponível do claustro, os livros e as línguas da Antiguidade não nos teriam sido transmitidos e o elo que ligava o passado ao presente ter-se-ia rompido” (O Gênio do Cristianismo).
São João Crisóstomo (349-407), doutor da Igreja, Patriarca de Constantinopla, chamado de “boca de fogo”, conta que já no seu tempo (347-407) era comum ao povo de Antioquia enviar seus filhos para serem educados pelos monges. São Bento instruiu filhos dos nobres romanos.
São Bonifácio estabeleceu uma escola em cada mosteiro fundado na Alemanha. Na Inglaterra, Santo Agostinho de Cantuária e seus monges, criaram escolas por toda parte onde foram.
Retirado do livro: História da Igreja, Idade Média. Prof. Felipe Aquino. Ed. Cléofas.

As dez pragas do Egito


As dez pragas do Egito (Êx 7,14-12, 36)
egitoPor volta de 1250 a.C. estava o povo de Israel cativo no Egito e sujeito a duros trabalhos forçados. Atendendo ao clamor dos infelizes escravizados, o Senhor decretou libertá-los, por meio de Moisés, chefe do povo, enviado à presença do Faraó, para intimar o monarca, em nome de Deus, a libertar os israelitas. Mas o Faraó não se rendeu ao pedido; por isto, o Senhor houve por bem demonstrar-lhe o seu poder, desencadeando dez pragas sobre o Egito, das quais somente a décima conseguiu dobrar a dureza de coração do rei. Eis a lista dos flagelos assim ocasionados:
1. Conversão das águas do rio Nilo em sangue envenenado: Êx 7,17-25.
2. Invasão de rãs nos rios e nas casas do Egito: 7,26-8, 11.
3. Onda de mosquitos: 8,12-15.
4. Sanha de moscas venenosas ou de vespas: 8,l6-28.
5. Peste sobre o gado: 9,1-7.
6. Tumores e pústulas nos homens e no bestiame: 9,8-12.
7. Geada: 9,13-35.
8. Invasão de gafanhotos: 10,1-20.
9. Trevas sobre o país: 10,21-27.
10. A morte dos primogênitos dos egípcios: 12,29s.
O Autor Sagrado mostra que essas pragas foram uma intervenção explícita do Senhor. Mas segundo os exegetas, a imaginação humana, no decorrer dos séculos parece ter exagerado a índole extraordinária dos acontecimentos.
Os estudos mostram que as pragas do Egito foram flagelos que acontecem naquele país por fatores naturais e por causa de circunstâncias particulares, os quais seriam longos para serem explicados aqui. Essas pragas foram pois milagres, não tanto em si mesmos, mas pelo modo como se verificaram: tiveram origem, sim, por ordem de Moisés, no momento predito por ele, e cessaram por ordem dele; desenvolveram-se com força fora do comum, poupando, porém, a região de Gessen, onde estavam os israelitas (cf. 8,18; 9,6s.26).
Como já dissemos, Deus, sem graves razões, não viola às leis da natureza; procura, antes, servir-se do curso habitual da natureza para realizar os seus maravilhosos desígnios.
A persistência do Faraó em não atender o pedido de Moisés, apesar das pragas, insinua que o monarca não se impressionou pelas nove primeiras pragas; porque estas não lhe pareciam fenômenos até então muito extraordinários. Veja que os seus magos também faziam alguns efeitos extraordinários.
Retirado do livro: “Ciência e Fé em Harmonia”

Onde estão os originais dos Evangelhos?

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Sabemos que os originais (autógrafos) dos Evangelhos, tais como saíram das mãos de Mateus, Marcos, Lucas e João, se perderam, dada a fragilidade do material usado (pele de ovelha ou papiro), mas isto não impede que a História provê a sua existência.

Ficaram-nos as cópias (manuscritos) antigas desses originais, que são os papiros, os códices unciais (escritos em caracteres maiúsculos sobre pergaminho), os códices minúsculos (escritos mais tarde em caracteres minúsculos) e os lecionários (textos para uso litúrgico).

Conhecem-se cerca de 5236 manuscritos (cópias) do texto original grego do Novo Testamento, comprovados como autênticos pelos especialistas. Estão assim distribuídos: 81 papiros; 266 códices maiúsculos; 2754 códices minúsculos e 2135 lecionários.
Número Conteúdo Local Data (Século)
p1 Evangelhos Filadélfia (USA) III
p2 Evangelhos Florença (Itália) VI
p3 Evangelhos Viena (Áustria) VI/VII
p4 Evangelhos Paris III
p5 Evangelhos Londres III
p6 Evangelhos Estrasburgo IV
p7 Atos Berlim IV
a) Os papiros são os mais antigos testemunhos do texto do Novo Testamento. Estão assim distribuídos pelo mundo:
Em resumo, existem 76 papiros do texto original do Novo Testamento. Acham-se ainda em Leningrado (p11, p68), no Cairo (p15, p16), em Oxford (p19), em Cambridge (p27), em Heidelberg (p40), em Nova York (p59, p60, p61), em Gênova (p72, p74, p75),…
Desses papiros alguns são do ano 200, o que é muito importante, já que o Evangelho de São João foi escrito por volta do ano 100. São, por exemplo, do ano 200, aproximadamente, o papiro 67, guardado em Barcelona.
Códice Conteúdo Local Data (Séc.)
Aleph 01 N.T. Londres IV
(Sinaítico)
A 02 N.T. Londres V
(Alexandrino)
B 03 N.T. Roma IV
(Vaticano) (menos Ap.)
C 04 N.T. Paris V
(Efrém rescrito)
D 05 Evangelhos Cambridge VI
(Beza) Atos
D 06 Paulo Paris VI
(Claromantono)
b) Os códices unciais são verdadeiros livros de grande formato, escritos em caracteres maiúsculos (unciais). Uncial vem de “uncia”, polegada em latim. Eis a relação de alguns deles:
Em resumo, há mais de duzentos códices unciais, espalhados por Moscou (K 018; V 031; 036); Utrecht (F 09); Leningrado (P 025); Washington (W 032); Monte Athos (H 015; 044); São Galo (037)…
Desses dados é fácil entender que a pesquisa e o estudo dos manuscritos do Novo Testamento não dependem de concessão do Vaticano, pela simples razão que a sua maioria não está em posse da Igreja. Só há um código datado do século IV, no Vaticano.
As pesquisas sempre foram realizadas independentemente da autorização da Igreja Católica, o que dissipa qualquer dúvida.
Os manuscritos bíblicos são manuscritos da humanidade; muitos foram levados do Oriente, por estudiosos e outros interessados, para as bibliotecas dos países ocidentais, onde se acham guardados até hoje.
Como vimos, existem hoje mais de cinco mil cópias manuscritas do Novo Testamento datadas dos dez primeiros séculos.
Algumas são papiros dos séculos II-III. O mais antigo de todos é o papiro de Rylands, conservado em Manchester (Inglaterra) sob a sigla P. Ryl. Gk. 457; do ano 120 aproximadamente, e contém os versículos de João 18,31-33.37.38.
Ora, se observarmos que o Evangelho de São João foi escrito por volta do ano 100, verificamos que temos um manuscrito que é, então, cópia do próprio original.
As pequenas variações encontradas nessas cinco mil cópias são meramente gramaticais ou sintáticas e que não alteram o seu conteúdo. Os estudiosos, analisando este grande número de manuscritos antigos, concluem que é possível reconstruir a face autêntica original do Novo Testamento, que é o que hoje usamos.
Uma comparação muito interessante é confrontarmos esse tipo de testemunhas do texto original do Novo Testamento, com as obras dos clássicos latinos e gregos usados pela humanidade.
Verificamos que é muito privilegiada a documentação hoje existente para se construir a face autêntica do Novo Testamento.
Escritor Época do Tempo decorrido entre o escritor e a 1ª cópia de sua obra
Virgílio 19 a.C. 350 anos
Tito Lívio 17 d.C. 500 anos
Horácio 8 a.C. 900 anos
Júlio César 44 a.C. 900 anos
Córnélio Nepos 32 a.C. 1200 anos
Platão 347 a.C. 1300 anos
Tucídides 395 a.C. 1300 anos
Eurípedes 407 a.C. 1600 anos
As primeiras cópias das obras desses escritores, consideradas hoje autênticas, foram mais tardias que as primeira cópias dos Evangelhos, e, mesmo assim são plenamente reconhecidas.
Eis alguns dados conhecidos:
Escritor
Vemos, então, que a transmissão desses clássicos antigos, gregos e latinos, tão usados pela humanidade, com total credibilidade, tiveram uma transmissão mais precária do que o Novo Testamento, com os seus mais de 5000 manuscritos, muito mais próximos de seus originais. Se a humanidade não põe em dúvida a autenticidade desses textos latinos e gregos, então, jamais poderá questionar a autenticidade do Novo Testamento.
As fontes dos primeiros séculos confirmam a autenticidade do Novo Testamento. Vejamos apenas uns poucos exemplos. Atente bem para as datas.
Evangelho de Mateus — No ano 130, Bispo Pápias, de Hierápolis na Frígia, região da Ásia Menor, que foi uma das primeiras a ser evangelizada pelos Apóstolos, fala do Evangelho de São Mateus dizendo:
“Mateus, por sua parte, pôs em ordem os dizeres na língua hebraica, e cada um depois os traduziu como pôde” (Eusébio, História da Igreja III, 39,16).
Quem escreveu essas palavras foi o bispo Eusébio, de Cesaréia na Palestina, quando por volta do ano 300 escreveu a primeira história da Igreja. Ele dá o testemunho histórico de Pápias.
Note que Pápias nasceu no primeiro século, isto é, no tempo dos próprios Apóstolos; S. João ainda era vivo. Portanto este testemunho é inequívoco.
Outro testemunho importante sobre o Evangelho de Mateus é dado por Santo Irineu (†200), do segundo século. Ele foi discípulo do grande bispo S. Policarpo de Esmirna, que foi discípulo de S. João evangelista. S. Irineu na sua obra contra os hereges gnósticos, também fala do Evangelho de Mateus, dizendo:
“Mateus compôs o Evangelho para os hebreus na sua língua, enquanto Pedro e Paulo em Roma pregavam o Evangelho e fundavam a Igreja”. (Adv. Haereses II, 1,1)
Evangelho de São Marcos — É também o Bispo de Hierápolis, Pápias (†130) que dá o primeiro testemunho do Evangelho de Marcos, conforme escreve Eusébio:
“Marcos, intérprete de Pedro, escreveu com exatidão, mas sem ordem, tudo aquilo que recordava das palavras e das ações do Senhor; não tinha ouvido nem seguido o Senhor, mas, mais tarde…, Pedro. Ora, como Pedro ensinava, adaptando-se às várias necessidades dos ouvintes, sem se preocupar em oferecer composição ordenada das sentenças do Senhor, Marcos não nos enganou escrevendo conforme recordava; tinha somente esta preocupação, nada negligenciar do que tinha ouvido, e nada dizer de falso” (Eusébio, História da Igreja, III, 39,15).
Evangelho de São Lucas — O Prólogo do Evangelho de S.Lucas, usado comumente no século II, dava testemunho deste Evangelho, ao dizer:
“Lucas foi sírio de Antioquia, de profissão médica, discípulo dos apóstolos, mais tarde seguiu Paulo até a confissão (martírio) deste, servindo irrepreensivelmente o Senhor. Nunca teve esposa nem filhos; com oitenta e quatro anos morreu na Bitínia, cheio do Espírito Santo. Já tendo sido escritos os evangelhos de Mateus, na Bitínia, e de Marcos, na Itália, impelido pelo Espírito Santo, redigiu este Evangelho nas regiões da Acaia, dando a saber logo no início que os outros Evangelhos já haviam sido escritos”.
Evangelho de São João — é Santo Ireneu (†202) que dá o seu testemunho:
“Enfim, João, o discípulo do Senhor, o mesmo que reclinou sobre o seu peito, publicou também o Evangelho quando de sua estadia em Éfeso.
Ora, todos esses homens legaram a seguinte doutrina: …Quem não lhes dá assentimento despreza os que tiveram parte com o Senhor, despreza o próprio Senhor, despreza enfim o Pai; e assim se condena a si mesmo, pois resiste e se opõe à sua salvação — e é o que fazem todos os hereges”. (Contra as heresias)
É por isso que a Igreja, meu amigo, com toda a sua seriedade, e fazendo uso da ciência, depois de examinar todas as coisas, com todo o rigor que lhe é peculiar, não tem dúvida de nos apresentar os Evangelhos como rigorosamente históricos.
A Constituição Apostólica Dei Verbum, do Concílio Vaticano II,diz:
“A santa Mãe Igreja, segundo a fé apostólica, tem como sagrados e canônicos os livros completos tanto do Antigo como do Novo Testamento, com todas as suas partes, porque, escritos sob a inspiração do Espírito Santo, eles têm Deus como Autor e nesta sua qualidade foram confiados à Igreja” (DV,11).
O Catecismo da Igreja afirma com segurança:
“A Igreja defende firmemente que os quatro Evangelhos, cuja historicidade afirma sem hesitação, transmitem fielmente aquilo que Jesus, Filho de Deus, ao viver entre os homens, realmente fez e ensinou para a eterna salvação deles, até ao dia que foi elevado” (n° 126).
Outros estudos mais recentes confirmaram a autenticidade dos Evangelhos, especialmente com as descobertas dos manuscritos de Qumran, na Palestina, próximo do Mar Morto, no ano 1949. Aí foram encontrados cópias da Bíblia, do século primeiro, inclusive pequenos fragmentos dos Evangelhos. Não há mais o que discutir!

Os Movimentos pela pobreza na Idade Média

Nos séculos XII e XIII houve um grande crescimento do poder temporal da Igreja. O prestígio do papa era imenso no campo político e havia riqueza e luxo espalhados na Europa. E tudo isso invadia os bispados e aos mosteiros. Com a intenção de enfrentar esse problema houve duas correntes opostas, uma que se desviou e se tornou herética, porque se revoltou não só contra o luxo que havia na Igreja, mas contra a própria Igreja. E houve outra corrente, a dos mendicantes; essa era saudável e fiel a Igreja.
alimentos-1O grande erro dessa corrente desviada é que não soube distinguir entre o luxo e o que havia de essencial: a Igreja. Caíram no erro de “jogar fora a água suja da bacia junto com a criança que havia tomado banho”. Nessa corrente fazem parte, entre outros, os cátaros e os valdenses; o que tornou-se um dos motivos para a Inquisição.
Os cátaros ou albigenses ou bugros, como já vimos, eram dualistas, maniqueístas. Admitiam um Princípio mau, criador da matéria, que se manifestou no Antigo Testamento; e um Princípio bom, que criou os espíritos e se manifestou no Novo Testamento. Afirmavam que o Princípio mau conseguiu seduzir parte dos espíritos celestes, que foram encarcerados em corpos humanos e aqui precisariam de Redenção.
O Redentor foi Cristo, Espírito superior aos anjos e subordinado a Deus, que morreu apenas em aparência (docetismo). Por isso, os cátaros rejeitavam tudo o que fosse material: o aparato visível da Igreja, o sacerdócio e a hierarquia, os sacramentos, o casamento, os altares, as imagens, as relíquias. Além disso, o juramento, a guerra e a própria autoridade civil. Alguns praticavam a “endura”, isto é, deixar-se morrer de fome ou fazer-se matar pelos próprios parentes. Assim, eles destruíam não somente a Igreja, o espiritual, mas também a sociedade civil e a autoridade. Isto gerou uma revolta popular contra os hereges, e provocou duzentos anos depois a Inquisição, em 1231.
Os valdenses tiveram sua origem por um grupo de seguidores fundado por um rico comerciante Pedro Valdes ou Valdo, de Lião, França. Lendo a Bíblia, distribuiu o que possuía no ano de 1176 e começou a peregrinar, pregando a penitência. Reuniram-se então, homens e mulheres, que enviados por ele, realizavam pregações. Eram chamados “os Pobres de Lião”. Como realizavam as pregações sem a permissão do bispo de Lião, e, além disso, criticavam o clero, foram proibidos de realizar tais práticas. Recorreram, porém, ao Concílio do Latrão III (1179), que lhes permitiu pregar, mas desde que tivessem mandato episcopal.
Os valdenses não se sujeitaram a esta cláusula, de modo que foram excomungados. Passaram então a viver escondidos e procurando adeptos. Proferiam votos de pobreza, obediência e castidade e submeteram-se aos bispos, presbíteros e diáconos ordenados por Valdes. Obedeciam somente a Bíblia, que eles traduziam para o vernáculo. Negavam o culto aos Santos, os sufrágios pelos defuntos; tornaram-se muito atuantes, expandindo-se para a Alemanha, a Boêmia, a Polônia, a Hungria… No século XVI os Valdenses da Lombardia anexaram-se ao Calvinismo e subsistem até hoje em pequeno número.
Outro movimento foi o “Joaquimismo”, e deve-se a Joaquim de Fiore (†1202). Em fins do século XI, foi um abade cisterciense, muito penitente. Autor de uma teoria sobre a história do mundo e da Igreja, dizia que haveria três fases na história: a era pré-cristã seria a do Pai, idade da letra, da carne, dos casados e dos leigos; a era cristã seria a do Filho, intermediária entre a carne e o espírito; seria a época dos clérigos, que duraria 42 gerações de 30 anos cada qual (cf. Mt 1,17). E, por fim, terminado este período em 1260, viria a era do Espírito Santo e dos monges (carismáticos), sem clérigos nem sacramentos.
Estas ideias encontraram apoio na corrente dos Franciscanos Espirituais; estes proclamaram São Francisco como o novo legislador e profeta enviado por Deus, e os Franciscanos Espirituais como a Ordem dos tempos finais. As obras de Joaquim foram condenadas num Sínodo de Arles após 1263, mas o movimento joaquimista continuou. As teorias joaquimistas foram professadas por grupos de peregrinos que se flagelavam em público, por volta do ano 1260.
A eleição de um “papa angélico”, o eremita Pedro de Morone (Celestino V – 1294), foi em parte inspirada pelo Joaquimismo, e outros adversários dos papas do século XIV (Bonifácio VIII, João XXII…), que tinham as mesmas ideias. Joaquim de Fiore morreu amado por muitos dos seus contemporâneos, que o tinham na conta de profeta. Antes de falecer, sujeitou-se à Santa Igreja.
Outro movimento semelhante foi a Ordem dos Apóstolos ou dos lrmãos Apostólicos, fundada por Gerardo Segarelli. Foi rejeitado pela Ordem Franciscana, pois apresentava sintomas de uma mente doentia. Logo um pequeno grupo começou a segui-lo. Pregavam a pobreza agressivamente, anunciavam que o fim da Igreja estava próximo. Por necessidade, tiveram que se refugiar no monte Zebello, perto de Vercelli, Itália, donde saíam para saquear as fazendas vizinhas para o próprio sustento; viviam em comunhão de bens e de mulheres.
Houve também os Irmãos e Irmãs do Espírito Livre que afirmavam que quem estava unido a Deus, não pecava, quaisquer que fossem as suas ações; o que lhes permitia entregar-se às paixões. Consideravam a oração e os sacramentos inúteis e mesmo prejudiciais para os irmãos perfeitos. Vê-se claramente como a heresia gera um mal cada vez maior. Um abismo chama outro abismo (cf. Sl 41,8), diz o salmista.
A corrente que defendia a pobreza na Igreja, de maneira correta, sem se revoltar contra ela foi a dos reformadores mendicantes, que souberam manter-se fiéis à Igreja, embora combatessem o seu luxo. Entre estes estão São Francisco de Assis (1182-1226) e São Domingos de Gusmão (1170-1221), além de Roberto de Arbrissel (†1117), fundador da Ordem de Frontevault, e São Norberto de Xanten (†1134), fundador da Ordem Premonstratense.
Houve um movimento chamado Patária, que teve origem na segunda metade do século XI na Lombardia, especialmente em Milão. A Patária (do milanês patta = trapo; donde pattari = trapeiros), congregava o povo simples contra a rica nobreza e o alto clero a ela aparentado. Apregoavam a pobreza, tendo em vista especialmente a simonia e o matrimônio dos clérigos, males frequentes na Lombardia. Foram os primeiros chefes do movimento os clérigos milaneses Arialdo, Landulfo e Anselmo, bispo de Lucca, que foi eleito Papa Alexandre II (1061-1073), precedendo São Gregório VII na luta contra as investiduras. Quando o Papado, sob Nicolau II, enviando o cardeal Hildebrando a Milão, este aliou-se à Pataria, favorecendo assim o movimento com um forte apoio. O Movimento conseguiu que o fraco arcebispo Guido se submetesse com o clero da catedral de Milão ao legado pontifício Pedro Damião e reconhecesse seus direitos eclesiásticos (1060). A história da Pataria daí em diante até a morte de Erlembaldo, cavaleiro irmão de Landulfo (1075) seguiu da mesma forma na luta contra a investidura leiga.
Retirado do livro: História da Igreja, Idade Média. Prof. Felipe Aquino. Ed. Cléofas.

Você sabe o que é Patrística?

augustinus_073_09Chamamos de “Padres da Igreja” (Patrística) aqueles grandes homens da Igreja, aproximadamente do século II ao século VII, que foram no Oriente e no Ocidente como que “Pais” da Igreja, no sentido de que foram eles que firmaram os conceitos da nossa fé, enfrentaram muitas heresias e, de certa forma foram responsáveis pelo que chamamos hoje de Tradição da Igreja; sem dúvida, são  a sua fonte mais rica. Padre ou Pai da Igreja, se refere a um escritor leigo, sacerdote ou bispo, da Igreja antiga, considerado pela Tradição como um testemunha da fé.
Normalmente se considera o período da Patrística o que vai dos Apóstolos até Santo Isidoro de Sevilha (560-536) no Ocidente; e até a morte de São João Damasceno (675-749), no Oriente, o gigante que corajosamente combateu o iconoclasmo. Esses gigantes da fé católica ao longo desses sete séculos defenderam e formularam a fé, a liturgia, a catequese, a moral, a disciplina, os costumes e os dogmas cristãos; por isso são chamados de “Pais da Igreja” porque lhes traçaram o caminho.
Quando o Papa João Paulo II esteve no Brasil a primeira vez em 1981 se referiu a eles dizendo que “são eles os melhores intérpretes da Sagrada Escritura”. Então, precisamos conhecer os seus ensinamentos para podermos compreender melhor a Bíblia. Chamamos de Patrologia o estudo sobre a vida, as obras e a doutrina desses Pais da Igreja. No século XVII criou-se expressão a “Teologia Patrística” para indicar a doutrina dos Padres.
Certa vez disse o Cardeal Henri de Lubac: “Todas as vezes que, no Ocidente tem florescido alguma renovação, tanto na ordem do pensamento como na ordem da vida – ambas estão sempre ligadas uma à outra – tal renovação tem surgido sob o signo dos Padres”.
Esses gigantes da fé e da Igreja, souberam fixar para sempre o que Jesus nos deixou através dos Apóstolos. Eles foram obrigados a enfrentar as piores heresias que a Igreja conheceu deste o seu início. Nesta luta eles amadureceram os conceitos teológicos uma vez que tiveram de enfrentar muitos hereges, de dentro da própria Igreja, especialmente  nos Concílios Ecumênicos. Neste combate árduo em defesa da fé, onde muitos foram perseguidos, exilados e até martirizados, eles formularam a fé que hoje professamos sem erro.
Desde o primeiro século já encontramos o gigante de Antioquia, Santo Inácio (†107), provavelmente sagrado Bispo pelo próprio São Pedro. S. Inácio nos deixou as suas belas Cartas escritas às comunidades por onde passou no caminho que o levou ao martírio em Roma, no Coliseu, desde Antioquia. A caminho do martírio ele escreveu belas cartas aos romanos, magnésios, tralianos, efésios, erminenses e a São Policarpo, bispo  e mártir de Esmirna. No segundo século encontramos o grande Santo Irineu de Lião (†200) enfrentando os gnósticos que sorrateiramente penetraram na Igreja e ameaçavam destruir a fé cristã. Contra eles Santo Irineu escreveu uma longa obra Contra os Hereges. Tão difícil foi esse combate que o Santo o comparou a alguém que precisa cortar todas as árvores de uma floresta para finalmente poder captar a fera que nela se esconde.






Os Padres da Igreja tiveram uma participação fundamental nos primeiros Concílios Ecumênicos, como o de Niceia, no ano 325, que condenou o arianismo que negava a divindade de Jesus; o Concílio de Constantinopla I, em 381, que condenou o macedonismo que negava a divindade do Espírito Santo; e os outros concílios que enfrentaram e condenaram as heresias cristológicas e trinitárias.
Os Padres da Igreja estiveram um tanto esquecidos, mas a partir dos anos 40 surgiu na Europa, de modo especial na França, um forte movimento voltado à Patrística. Esse movimento foi liderado pelo Cardeal Henri de Lubac e Jean Daniélou, o qual deu origem à coleção “Sources Chréstiennes”, com mais de 300 títulos.No Concílio Vaticano II cresceu ainda mais esse movimento de redescoberta da Patrística por causa do desejo da renovação da liturgia, da exegese, da espiritualidade e da teologia a partir dos primórdios da Igreja. Foi a sede de “voltar às fontes” do cristianismo.
Desses Padres , alguns foram Papas, nem todos; a maioria foi bispo, mas há diáconos,  presbíteros e até leigos. Entre eles muitos foram titulados de Doutor da Igreja, sempre por algum Papa, por terem ensinado de maneira extraordinária os dogmas e as verdades da nossa fé.
Segue a relação dos mais importantes Padres da Igreja:cpa_escola_da_fe_i
São Clemente de Roma (+102), Papa (88-97); Santo Inácio de Antioquia (+110); Aristides de Atenas (+130); São Policarpo de Esmira (+156); Pastor de Hermas (+160); Aristides de Atenas (+160); Santo Hipólito de Roma (160-235); São Justino (+165); Militão de Sardes (+177); Atenágoras (+180); São Teófilo de Antioquia (+181); Orígenes de Alexandria (184-254); Santo Ireneu (+202); Tertuliano de Cartago (+220); São Clemente de Alexandria (+215); Metódio de Olimpo (séc. III); São Cipriano de Cartago (210-258); Novaciano (+257); Santo Atanásio (295 -373), Alexandria; Santo Efrém (306 – 373), diácono, Mesopotânia; São Hilário de Poitiers (310 – 367), bispo; São Cirilo de Jerusalém (315 – 386) bispo; São Basílio Magno (330 – 369) – bispo,  Cesareia; São Gregório Nazianzeno (330 – 379), bispo; Santo Ambrósio (340 – 397), bispo, Treves – Itália; Eusébio de Cesareia (+340); São Gregório de Nissa (+340); Prudêncio (384-405); São Jerônimo (348-420), presbítero  Strido, Itália; São João Cassiano (360-407); São João Crisóstomo – (349-407), bispo; Santo Agostinho (354-430), bispo; Santo Efrém (+373); Santo Epifânio (+403); São Cirilo de Alexandria (370-442), bispo; São Pedro Crisólogo (380 – 451), bispo, Itália; São Leão Magno (400-461), papa  Toscana, Itália; São Paulino de Nola (+431); Sedúlio (séc. V); São Vicente de Lerins (+450); São Pedro Crisólogo (+450); São Bento de Núrcia (480-547); SãoVenâncio Fortunato (530-600); Santo Ildefonso de Toledo (617-667); São Máximo Confessor (580-662); São Gregório Magno (540-604), Papa; Santo Ildefonso de Sevilha (+636); São João Damasceno (675-749), bispo, Damasco.
Prof. Felipe Aquino

História da Igreja: A Fundação do Estado Pontifício

Os precedentes
1. Sabemos que em 476 os ostrogodos tomaram a cidade de Roma, fazendo cair o Império Romano antigo. De então por diante dominaram a Itália e procuraram estender seu poder a outros territórios da Europa. Os bizantinos, a princípio, reconheceram o domínio ostrogodo na península itálica.
2698Todavia em 553 o reino ostrogodo, já muito debilitado interiormente, após vinte anos de guerra acabou cedendo à pressão dos bizantinos. Estes então fizeram da península itálica uma província do Império bizantino, que tinha seu exarca (= governador) em Ravena.
Em 568 os lombardos abandonaram a Panônia (Hungria) e invadiram o Norte da Itália; deixaram, porém, intata a cidade de Ravena, sendo bizantina. – O jugo bizantino desagradava profundamente aos habitantes do Centro e do Sul da península, porque exercia excessiva pressão fiscal, tinha funcionários corruptos e não dava a devida atenção às populações constantemente ameaçadas pelos lombardos. Doutro lado, o Papado ia aumentando cada vez mais o seu prestígio moral e político o Papa era tirado como o defensor dos pequeninos, que a ele recorriam, atribulados e carentes.
A estima devotada ao Bispo de Roma (= Papa) fazia que muitos nobres, ao morrer ou ao ingressar no mosteiro, legassem seus bens e territórios ao Pontífice. Assim teve origem, aos poucos, o chamado “Patrimônio de São Pedro”, que constava de terras na Itália e nas ilhas adjacentes. Esses bens, de extensão cada vez maior, permitiam ao Papa assumir posição de certa independência diante do Imperador bizantino e do representante deste em Ravena: o Pontífice tinha sob a sua jurisdição civil grande número de cidadãos, que trabalhavam sob a tutela papal ou eram socorridos por esta nos hospitais, asilos e orfanatos pontifícios.historiaigrejadademedia
Em consequência, durante todo o século VIl foi-se afirmando naturalmente o poder temporal do Papa, em virtude do desenrolar mesmo dos acontecimentos.
2. No século VIII novos fatos se desencadearam.
Em 717 o Imperador bizantino Leão III abriu a discussão em torno do culto das imagens ( ver capítulo 17).
A posição iconoclasta dos monarcas aumentou muito a animosidade entre orientais e latinos; teria produzido uma cisão política se os Papas não tivessem conservado sua lealdade ao Imperador.
Em 739 os lombardos, que não deixavam de hostilizar as populações itálicas, cercaram Roma. O Papa Gregório III pouca esperança tinha de receber auxílio de Bizâncio, que se mostrava avessa aos latinos, além de estar militarmente enfraquecida. Resolveu então, a conselho do Senado Romano, recorrer aos francos, que constituíam um reino católico próspero; o seu mordomo, Carlos Martelo, tinha, poucos anos antes, em 732, vencido os árabes muçulmanos em Poitiers. Era a primeira tentativa de desviar o eixo Roma-Bizâncio para o Ocidente. Carlos Martelo, porém, não conferiu o auxílio solicitado, por precisar dos lombardos na luta contra os sarracenos (árabes).
O sucessor de Gregório III, o Papa Zacarias (740-752) conseguiu ter paz com os lombardos durante vinte anos. Além disto, travou bom relacionamento com o reino dos francos, que eram o fundamento dos eventos futuros.
A criação do Estado Pontifício
Em 747, Pepino, homem inteligente e ambicioso, mas religioso e bem intencionado com a Igreja, tornou-se o mordomo do palácio real dos francos (os reis então reinavam, mas não governavam, enquanto os mordomos governavam sem coroa). Pepino quis por termo à situação ambígua do governo dos francos; por isto recorreu ao Papa Zacarias, pedindo-lhe que recobrisse com a sua autoridade a falta de sangue real e reconhecesse a dinastia de Pepino e dos seus descendentes (os carolíngios); o Pontífice concordou com Pepino, pois este, se não era o rei de direito, era o rei de fato. Em 751 Pepino foi eleito rei dos francos na dieta (= assembléia política) de Soissons, e, a seguir, ungido por S. Bonifácio e outros bispos. Sucedeu assim ao último rei da dinastia anterior (merovíngia): Quilderico III.
Pepino em breve teve a ocasião de mostrar sua gratidão ao Papa. O rei lombardo Aistulfo (749-56), depois de ter tomado Ravena aos bizantinos, ameaçava Roma. De novo abandonado pelo Imperador Constantino V Coprônimo, o Papa Estêvão II pediu o auxílio dos francos; foi mesmo à França, aparecendo em 754 no palácio régio em Ponthion (perto de Paris). Pepino recebeu-o com todas as honras e prometeu-lhe proteção contra os lombardos; era movido a isto não por meros interesses políticos, mas por veneração sincera para com o sucessor de S. Pedro. De Ponthion o rei levou o Papa para Paris, onde este o ungiu, assim como aos seus dois filhos Carlos e Carlomano, reis dos francos; além disto, conferiu-lhes o título de “patrícios romanos”, título que implicava o dever de proteger Roma e a sua Igreja. Finalmente a amizade entre Pepino e o Papa deu ocasião a novo pacto travado em 754 em Quierzy: Pepino se obrigava não somente a defender a lgreja em Roma, mas também a libertar os territórios bizantinos ocupados pelos lombardos. Em duas campanhas militares (755 e 756) Pepino venceu Aistulfo e, apesar dos protestos de Bizâncio, doou solenemente por escrito ao Papa os territórios de Comacchio, o exarcado e a Pentápole (Rimini, Pesaro, Fano, Sinigaglia, Ancona); o documento de doação foi colocado sobre o túmulo de São Pedro. Estava assim fundado o Estado Pontifício (756), praticamente independente de Bizâncio, sob a jurisdição do Papa e a proteção dos francos. Na verdade, tal gesto correspondia ao papel que o Pontífice já vinha exercendo em favor das populações ameaçadas da península itálica.
Existe um documento intitulado Constitutum ou Donatio Constantini segundo o qual o Imperador Constantino Magno doava ao Papa S. Silvestre (314-335) e a seus sucessores, em agradecimento pelo batismo e a cura da lepra, poder e dignidade imperiais; além disto, conferia-lhe o domínio sobre o palácio do Latrão, sobre Roma e todas as cidades dos territórios ocidentais; pelo quê, Constantino transferia a sua residência para Bizâncio. Este documento faz parte de uma coleção falsa de leis – os decretais do Pseudo-isidoro -, que teve origem no século IX. Por toda a Idade Média a Donatio Constantini foi considerada autêntica. Todavia a partir do século XV a sua ingenuidade foi contestada, de modo que hoje em dia é reconhecida como falso documento.
A Consolidação do Estado Pontifício
No reino dos francos, Pepino reinou até a morte, mantendo sempre boas relações com o Papado. Sucederam-lhe os dois filhos, Carlos (Magno) e Carlomano, que dividiram o reino entre si. Em 771, porém, Carlomano faleceu, deixando como único soberano Carlos Magno, homem violento, mas de boas intenções, que teve significado indelével na história.
A princípio Carlos desenvolveu política pouco favorável ao Papa; queria aproximar-se dos lombardos, inclusive mediante uma aliança matrimonial ilegítima (Carlos Magno repudiara sua esposa Himiltrude para unir-se a uma princesa lombarda). Censurado pelo Papa, Carlos separou-se da mulher ilegítima e continuou a política de seu pai, propícia ao Estado Pontifício.
A grande figura de Carlos correspondia a do Papa Adriano I, eleito em 772, pouco depois da unificação dos francos. O rei Desidério, dos lombardos, resolveu atacar de novo os territórios pontifícios, inclusive marchando sobre Roma. O Pontífice apelou para os francos: em 773, Carlos interveio cercando Pavia, a capital dos lombardos; durante o sítio, na Páscoa de 774 o rei dos francos foi a Roma e lá confirmou a doação que Pepino fizera a Estêvão II, além disto, doou-lhe as cidades de Imola, Bolonha e Ferrara.
Poucos meses após estes fatos, caiu Pavia; o rei Desidério, dos lombardos, entregou-se e assim extinguiu-se definitivamente o reino autônomo dos lombardos; Carlos assumiu oficialmente o título, de “Rei dos francos e dos lombardos e Patrício dos Romanos”.
Em 781 desapareceu também todo vestígio de dominação bizantina sobre o Estado Pontifício; aliás, esse domínio já era mais teórico do que real nos últimos decênios; os legados de Carlos Magno expulsaram os bizantinos de seus últimos redutos na península. Os Papas desde então datam os seus documentos, contando os anos do seu pontificado, e mandam cunhar as suas moedas.
Todavia, emancipando-se dos bizantinos, o Papa caiu sob a influência, cada vez mais penetrante, dos francos. Ninguém negava, naquele fim de século, que o Estado Pontifício fazia parte do Reino franco. Fazia parte, porém, de modo diferente do que ligava os demais territórios aos francos; com efeito, os outros príncipes da Itália eram vassalos do rei dos francos e dos lombardos; nomeados por este, administravam em nome dele. Quanto ao Papa, não era vassalo nem funcionário do rei; o que o ligava ao rei dos francos, era um “pacto de amor e fidelidade”, pacto que ligava mais do que uma aliança entre iguais, menos porém do que um ato de vassalagem. Era o título de “Patrício”, o cargo de Protetor do Estado Pontifício, que abria a Carlos Magno a porta para se ingerir continuamente neste: frequentemente aparecem missi (enviados) francos no território papal, que representam o rei nas eleições de bispos, transmitem desejos ou protestos do rei não somente em matéria de administração temporal, mas também no tocante ao governo interno da Igreja.
Carlos Magno Imperador
Em 795 morreu o Papa Adriano I, que teve por sucessor Leão III. Este comunicou logo sua eleição a Carlos Magno, mandando-lhe as chaves do túmulo de S. Pedro e a bandeira da cidade de Roma, ao mesmo tempo que lhe prometia fidelidade. Carlos Magno respondeu felicitando o Papa; depois disto, mandava-lhe conselhos e instruções, como se fosse o verdadeiro chefe político e religioso dos cristãos.
A posição de Leão III era insegura, por causa de acusações que contra ele levantavam os sobrinhos do seu antecessor. Carlos Magno então foi a Roma em novembro de 800 a fim de por termo à controvérsia. Aos 23/12/800 reuniu-se um Sínodo em Roma, sob a presidência de Carlos: fiel à antiga norma do Direito eclesiástico (“a Sé Apostólica por ninguém pode ser julgada”), a assembléia absteve-se de julgar o Papa; este repeliu com juramento as acusações que lhe eram feitas.
Dois dias depois, ocorreu acontecimento de enorme importância. Na noite de Natal de 800, quando na basílica de S. Pedro Carlos se levantava após ter rezado diante do túmulo de S. Pedro, Leão III impôs sobre a sua cabeça preciosa coroa, enquanto o povo aclamava: “A Carlos Augusto, coroado por vontade de Deus, grande e pacífico Imperador Romano, vida e vitória!” – Esta cerimônia não causou surpresa; parecia preparada. Se de fato foi previamente combinada, julga-se que a iniciativa partiu de Carlos, pois este não era homem que deixasse que lhe impusessem um acontecimento de tal envergadura.histigrejamediamenor
Este evento significava a renovação do Império Romano Ocidental, que perecera em 476 e que era restaurado em sentido novo: o “Patrício Romano” se tornava Imperador Romano no Sacro Império Romano, como era chamado a partir do século XIII Como se compreende, a Itália e o Papado ficavam definitivamente subtraídos à jurisdição de Constantinopla. O novo título implicava, para Carlos, um aumento de autoridade moral e política diante dos demais soberanos do Ocidente e uma dignidade religiosa que o confirmava na função de proteger a Igreja.
Após a coroação, as relações de Carlos com o Papa continuaram amistosas, embora o Papa tivesse que se queixar, não raro, da intrusão de funcionários francos no Estado Pontifício, enquanto os legados papais com dificuldade eram ouvidos na corte imperial.
O Imperador muito se interessou pela formação do clero; mandou elaborar um repertório de sermões típicos para facilitar a pregação; incentivou o canto-chão. Mas em geral nomeava bispos e abades (mesmo dentre os leigos) e exigia dos prelados serviço ao Estado (hospedagem do rei em viagem, missões políticas, participação em certas campanhas…). Exortava bispos e Papa ao cumprimento de seus deveres, sendo que ao Papa atribuía a função de rezar como Moisés (ef. Ex 17,10-13). Dos leigos exigia que soubessem ao menos o Pai-Nosso e o Credo.
Em síntese, Carlos Magno foi um herói cristão, que teve suas fraquezas, mas a quem a posteridade deve reconhecer o mérito de haver tentado criar um Ocidente cristão.

Por que a Igreja é tão atacada?


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“Perguntou-lhe então Pilatos: És, portanto, rei? Respondeu Jesus: Sim, eu sou rei. É para dar testemunho da verdade que nasci e vim ao mundo. Todo o que é da verdade ouve a minha voz” (João 18,37).
Jesus veio ao mundo para salvá-lo, ensinando a verdade de Deus que nos liberta e salva; Ele é sinal de contradição.
Quando seus pais o levaram para apresentarem-no a Deus no Templo de Jerusalém, o velho Simeão profetizou: mãe: “Eis que este menino está destinado a ser uma causa de queda e de soerguimento para muitos homens em Israel, e como um sinal de contradição, a fim de serem revelados os pensamentos de muitos corações” (Lc 2, 34-35).
Jesus veio como a Luz de Deus a brilhar nas trevas do mundo pagão; como disse o evangelista São João: “Nele havia a vida, e a vida era a luz dos homens. A luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam” (Jo 1,4-5). Falando de João Batista, o evangelista diz: “Este veio como testemunha, para dar testemunho da luz, a fim de que todos cressem por meio dele. Não era ele a luz, mas veio para dar testemunho da luz. Era a verdadeira luz que, vindo ao mundo, ilumina todo homem. Estava no mundo e o mundo foi feito por Ele, mas o mundo não o reconheceu. Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam.” (v. 7-11).cpa_jesus_sinal_de_contradi_o
E Jesus deixou a Igreja, Seu Corpo Místico, para continuar Sua obra de salvação da humanidade, pela Verdade que salva (cf. Cat. n. 851).
O mundo de trevas e de pecado odeia a Cristo e a Igreja porque tornam visível o seu mal; e o mundo sem Deus não suporta isso. Assim, vemos hoje no Ocidente, outrora todo cristão, um laicismo anticristão e anticatólico como nunca vimos antes.
A Lei da Igreja é a Lei de Cristo. “Eu vim ao mundo para dar testemunho da Verdade”. “Eu sou a verdade” (Jo 14, 6); não apenas “uma” verdade, mas “a” verdade; a única. Mostrou ao mundo que sem a verdade não há salvação: “Se permanecerdes na minha palavra, sereis meus verdadeiros discípulos; conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” (Jo 8,32). Ele é o Verbo que “se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a glória que o Filho único recebe do seu Pai, cheio de graça e de verdade. (Jo 1, 14)
“Ora, este é o julgamento: a luz veio ao mundo, mas os homens amaram mais as trevas do que a luz, pois as suas obras eram más. Porquanto todo aquele que faz o mal odeia a luz e não vem para a luz, para que as suas obras não sejam reprovadas. Mas aquele que pratica a verdade, vem para a luz. Torna-se assim claro que as suas obras são feitas em Deus” (Jo 3,21).
Aqueles que fazem o mal amam as trevas, as caladas das noites para praticar os crimes, as corrupções, os conchavos…
Cristo não recuou diante das ofensas e perseguições; hoje a Igreja precisa imitá-lo como fez nesses dois mil anos.
São Mateus narrou no capitulo 10 do seu Evangelho, as recomendações que Jesus deu aos Doze Apóstolos; e lhes deixou claro a perseguição que sofreriam. Quase todos morreram martirizados por causa de Jesus. E hoje esse martírio continua.
“Cuidai-vos dos homens. Eles vos levarão aos seus tribunais e açoitar-vos-ão com varas nas suas sinagogas. Sereis por minha causa levados diante dos governadores e dos reis: servireis assim de testemunho para eles e para os pagãos… Sereis odiados de todos por causa de meu nome, mas aquele que perseverar até o fim será salvo. Se vos perseguirem numa cidade, fugi para uma outra. Em verdade vos digo: não acabareis de percorrer as cidades de Israel antes que volte o Filho do Homem. O discípulo não é mais que o mestre, o servidor não é mais que o patrão. Basta ao discípulo ser tratado como seu mestre, e ao servidor como seu patrão. Se chamaram de Beelzebul ao pai de família, quanto mais o farão às pessoas de sua casa! Não temais aqueles que matam o corpo, mas não podem matar a alma; temei antes aquele que pode precipitar a alma e o corpo na geena… Não julgueis que vim trazer a paz à terra. Vim trazer não a paz, mas a espada… Eu vim trazer a divisão entre o filho e o pai, entre a filha e a mãe, entre a nora e a sogra, e os inimigos do homem serão as pessoas de sua própria casa”. (Mt 10,17-42)a_minha_igreja_nova_capa
Mais do antes hoje se nota uma aversão a Cristo e à Igreja Católica porque ela é fiel a Ele e a seus ensinamentos. Especialmente nas universidades se nota uma repulsa à Igreja Católica e às verdades que ela ensina; e procura-se a todo custo mostrar aos jovens que ela é obscurantista, como se fosse contra a ciência, e destaca-se os erros dos filhos da Igreja sem mostrar a beleza de tudo quanto a Igreja fez e faz pelo mundo.
Há no Ocidente hoje uma verdadeira Cristofobia. O Papa Bento XVI desde o início do seu pontificado tem condenado o que chama de “ditadura do relativismo” que quer proibir as pessoas de serem e pensarem diferente do que se chama hoje de “politicamente correto” (ser a favor do aborto, eutanásia, cultura marxista, casamento de homossexuais, coabitação livre, manipulação de embriões, útero de aluguel, inseminação artificial, sexo livre, camisinha, contracepção, etc.).
Vai se formando uma mentalidade, uma cultura social, no sentido de fazer, inclusive os cristãos, acharem “normal” essas imoralidades. Começamos a ver jovens e adultos cristãos acharem que a Igreja está “exagerando em suas exigências”, e que “é preciso ser mais tolerante…” É bom lembrar que Jesus amava o pecador, mas era intolerante com o pecado. “Vai e não peques mais”.

História da Igreja: A Inquisição Espanhola

Origem da inquisição Espanhola
Pedro_Berruguete_-_Saint_Dominic_Presiding_over_an_Auto-da-fe_(1475)Os reis Fernando e Isabel, visando a plena unificação de seus domínios, tinham consciência de que existia uma instituição eclesiástica, a inquisição – oriunda na Idade Média com o fim de reprimir um perigo religioso e civil dos séculos XI/XII (a heresia cátara ou albigense); a este perigo pareciam assemelhar-se as atividades dos marranos (judeus) e mouriscos (árabes) na Espanha do século XV.
1. A Inquisição Medieval, que nunca fora muito ativa na península ibérica, achava-se a mais ou menos adormecida na segunda metade do séc. XV Aconteceu, porém, que durante a Semana Santa de 1478 foi descoberta em Sevilha uma conspiração de marranos, a qual muito exasperou o público. Então lembrou-se o rei Fernando de pedir ao Papa, reavivasse na Espanha a antiga Inquisição, e a reavivasse sobre novas bases, mais promissoras para o reino, confiando sua orientação ao monarca espanhol.
Sixto IV, assim solicitado, resolveu finalmente atender ao pedido de Fernando (ao qual, depois de hesitar algum tempo, se associara Isabel). Enviou, pois, aos reis da Espanha o Breve de 19 de novembro de 1478, pelo qual “conferia plenos poderes a Fernando e Isabel para nomearem dois ou três inquisidores, arcebispos, bispos ou outros dignitários eclesiásticos, recomendáveis por sua prudência e suas virtudes, sacerdotes seculares ou regulares, de quarenta anos de idade ao menos, e de costumes irrepreensíveis, mestres ou bacharéis em Teologia, doutores ou licenciados em Direito Canônico, os quais deveriam passar de maneira satisfatória por um exame especial.histigrejamediamenor
Tais inquisidores ficariam encarregados de proceder contra os judeus batizados reincidentes no judaísmo e contra todos os demais culpados de apostasia. o Papa delegava a esses oficiais eclesiásticos a jurisdição necessária para instaurar os processos dos acusados conforme o Direito e o costume; além disto, autorizava os soberanos espanhóis a destituir tais Inquisidores e nomear outros em seu lugar, caso isto fosse oportuno” (L.Pastor, Histoire des Papes IV 370).
Note-se bem que, conforme este edito, a inquisição só estenderia sua ação a cristãos batizados, não a judeus que jamais houvessem pertencido a lgreja; a instituição era, pois, concebida como órgão promotor de disciplina entre os filhos da Igreja, não como instrumento de intolerância em relação às crenças não-cristãs.
Procedimentos da Inquisição
Apoiados na Licença pontifícia, os reis da Espanha aos 17 de setembro de 1480 nomearam inquisidores, com sede em Sevilha, os dois dominicanos Miguel Morillo e Juan Martins, dando-lhes como assessores dois sacerdotes seculares. os monarcas.promulgaram também um compêndio de “Instruções”, enviado a todos os tribunais da Espanha, constituindo como que um código da Inquisição, a qual assim se tornava uma espécie de órgão do Estado civil.
Os Inquisidores entraram logo em ação, procedendo geralmente com grande energia. Parecia que a inquisição estava a serviço não da Religião propriamente, mas dos soberanos espanhóis, os quais procuravam atingir criminosos mesmo de categoria meramente política.
Em breve, porém, fizeram-se ouvir em Roma queixas diversas contra a severidade dos Inquisidores. Sixto IV então escreveu sucessivas cartas aos monarcas da Espanha, mostrando-lhes profundo descontentamento por quanto acontecia em seu reino e baixando instruções de moderação para os juízes tanto civis como eclesiásticos.
Merece especial destaque neste particular o Breve de 2 de agosto de 1482, que é o Papa, depois de promulgar certas regras coibitivas do poder dos Inquisidores, concluía com as seguintes palavras:
“Visto que somente a caridade nos toma semelhantes a Deus. rogamos e exortamos o Rei e a Rainha, pelo amor de Nosso Senhor Jesus Cristo, a fim de que imitem Aquele de quem é característico ter sempre compaixão e perdão.
Queiram, portanto, mostrar-se indulgentes para com os seus súditos da cidade e da diocese de Sevilha que confessam o erro e imploram a misericórdia!”
Contudo, apesar das frequentes admoestações pontifícias, a Inquisição Espanhola ia-se tornando mais e mais um órgão poderoso de influência e atividade do monarca nacional. Para comprovar isto, basta lembrar o seguinte: a Inquisição no território espanhol ficou sendo instituto permanente durante três séculos a fio. Nisto diferia bem da Inquisição Medieval, a qual foi sempre intermitente, tendo em vista determinados erros oriundos em tal e tal localidade. A manutenção permanente de um tribunal inquisitório impunha avultadas despesas, que somente o Estado podia tomar a seu cargo; foi o que se deu na Espanha: os reis atribuíam a si todas as rendas materiais da inquisição (impostos, multas, bens confiscados) e pagavam as respectivas despesas; consequentemente alguns historiadores, referindo-se à Inquisição Espanhola, denominaram-na “Inquisição Régia!”
Emancipada de Romahistoria-igreja-_dade-media
A fim de completar o quadro até aqui traçado, passemos a mais um pormenor característico do mesmo.
Os reis Fernando e Isabel visavam a corroborar a Inquisição, emancipando-a do controle mesmo de Roma (…). Conceberam então a ideia de dar à instituição um chefe único e -plenipotenciário – o lnquisidor-Mor -, o qual julgaria na Espanha mesma os apelos dirigidos a Roma. Para este cargo, propuseram à Santa Sé um religioso dominicano, Tomás de Torquemada (“a Turrecremata”, em latim), o qual em outubro de 1483 foi realmente nomeado Inquisidor-Mor para todos os territórios de Fernando e Isabel. Procedendo à nomeação escrevia o Papa Sixto IV a Torquemada:
“Os nossos caríssimos filhos em Cristo, o rei e a rainha de Castela e Leão, nos suplicaram para que te designássemos como Inquisidor do mal da heresia nos seus reinos de Aragão e Valença, assim como no principado de Catalunha” (Bullar.ord. Praedicatorum /// 622).
O gesto de Sixto IV só se pode explicar por boa fé e confiança. O ato era, na verdade, pouco prudente (…).
Com efeito; a concessão benignamente feita aos monarcas seria pretexto para novos e novos avanços destes: os sucessores de Torquemada no cargo de Inquisidor-Mor já não foram nomeados pelo Papa, mas pelos soberanos espanhóis (de acordo com critérios nem sempre louváveis). Para Torquemada e sucessores, foi obtido da Santa Sé o direito de nomearem os Inquisidores regionais, subordinados ao Inquisidor-Mor.
Mais ainda: Fernando e Isabel criaram o chamado “Conselho Régio da Inquisição”, comissão de consultores nomeados pelo poder civil e destinados como que a controlar os processos da Inquisição; gozavam de voto deliberativo em questões de Direito civil, e de voto consultivo em temas de Direito Canônico.
Uma das expressões mais típicas da autonomia arrogante do Santo ofício espanhol é o famoso processo que os Inquisidores moveram contra o arcebispo primaz da Espanha, Bartolomeu Carranza, de Toledo. Sem descer aos pormenores do acontecimento, notaremos aqui apenas que durante dezoito anos contínuos a Inquisição Espanhola perseguiu o venerável prelado, opondo-se a legados papais, ao Concilio Ecumênico de Trento e ao próprio Papa, em meados do séc. XVI.
Frisando ainda um particular, lembraremos que o rei Carlos III (1759-1788) constituiu outra figura significativa do absolutismo régio no setor que vimos estudando. Colocou-se peremptoriamente entre a Santa Sé e a Inquisição, proibindo a esta que executasse alguma ordem de Roma sem licença prévia do Conselho de Castela, ainda que se tratasse apenas de proscrição de livros. O Inquisidor-Mor, tendo acolhido um processo sem permissão do rei, foi logo banido para localidade situada a doze horas de Madrid; só conseguiu voltar após apresentar desculpas ao rei, que as aceitou, declarando:
“O Inquisidor Geral pediu-me perdão, e eu Iho concedo,- aceito agora os agradecimentos do tribunal,- protegê-lo-ei sempre, mas não se esqueça desta ameaça de minha cólera voltada contra qualquer tentativa de desobediência” (cf. Desdevises du Dezart, L’Espagne de I’Ancien Regime. La Société 101s).
A história atesta outrossim como a Santa Sé repetidamente decretou medidas que visavam a defender os acusados frente à dureza do poder régio e do povo. A Igreja em tais casos distanciava-se nitidamente da lnquisição Régia, embora esta continuasse a ser tida como tribunal eclesiástico.
Assim aos 2 de dezembro de 1530, Clemente VII conferiu aos Inquisidores a faculdade de absolver sacramentalmente os delitos de heresia e apostasia; destarte o Sacerdote poderia tentar subtrair do processo público e da infâmia da Inquisição qualquer acusado que estivesse animado de sinceras disposições para o bem. Aos 15 de junho de 1531, o mesmo Papa Clemente VII mandava aos Inquisidores tomassem a defesa dos mouriscos que, – ocabrunhados de impostos pelos respectivos senhores e patrões, poderiam conceber ódio contra o Cristianismo. Aos 2 de agosto de 1546, Paulo III declarava os mouriscos de Granada aptos para todos os cargos civis e todas as dignidades eclesiásticas. Aos 18 de janeiro de 1556, Paulo IV autorizava os sacerdotes a absolver em confissão sacramental os mouriscos.
Compreende-se que a Inquisição Espanhola, mais e mais desvirtuada pelos interesses às vezes mesquinhos dos soberanos temporais, não podia deixar de cair em declínão. Foi o que se deu realmente nos séculos XVIII e XIX. Em consequência de uma revolução, o Imperador Napoleão I interveio no governo da nação, aboliu a Inquisição Espanhola por decreto de 4 de dezembro de 1808. o rei Fernando VII, porém, restaurou-a em 1814, a fim de punir alguns de seus súditos que haviam colaborado com o regime de Napoleão.
Finalmente, quando o povo se emancipou do absolutismo de Fernando VIl, restabelecendo o regime liberal no país, um dos primeiros atos das Cortes de Cadiz foi a extinção definitiva da Inquisição em 1820. A medida era, sem dúvida, mais do que oportuna, pois punha termo a uma situação humilhante para a Sta. Igreja.
Tomás de Torquemada
Tomás de Torquemada nasceu em Valladolid (ou, segundo outros, em Torquemada) no ano de 1420 Fez-se Religioso dominicano, exercendo por 22 anos o cargo de Prior do convento de Santa-Cruz em Segóvia. Já aos 11 de fevereiro de 1482 foi designado por Sixto IV para moderar o zelo dos Inquisidores espanhóis. No ano seguinte o mesmo Pontífice o nomeou Primeiro Inquisidor de todos os territórios de Fernando e Isabel.
Extremamente austero para consigo mesmo, o frade dominicano usou de semelhante severidade nos seus procedimentos judiciários. Dividiu a Espanha em quatro setores inquisitoriais, que tinham como sedes respectivas as cidades de Sevilha, Córdova, Jaen e Villa (Ciudad) Real. Em 1484 redigiu, para uso dos Inquisidores, uma “Instrução”, opúsculo que propunha normas para os processos inquisitoriais, inspirando-se em tramites já usuais na Idade Média; esse libelo foi completado por dois outros do mesmo autor, que vieram a lume respectivamente em 1490 e 1498.
O rigor de Torquemada foi levado ao conhecimento da Sé de Roma; o Papa Alexandre VI, como dizem algumas fontes históricas, pensou então em destitui-lo de suas funções; só não o terá feito por deferência a corte da Espanha. O fato é que o Pontífice houve por bem diminuir os poderes de Torquemada, colocando a seu lado quatro assessores munidos de iguais faculdades (Breve de 23 de junho de 1494).
Quanto ao número de vítimas ocasionadas pelas sentenças de Torquemada, as cifras referidas pelos cronistas são tão pouco coerentes entre si que nada se pode afirmar de preciso sobre o assunto.
Tomás de Torquemada ficou sendo, para muitos, a personificação da intolerância religiosa, homem de mãos sanguinolentas (…).paraentenderainquisico
Os historiadores modernos, porém, reconhecem exagero nessa maneira de conceituá-lo; levando em conta o caráter pessoal de Torquemada, julgam que este Religioso foi movido por sincero amor é verdadeira fé, cuja integridade lhe parecia comprometida pelos falsos cristãos; daí o zelo extraordinário com que procedeu. A reta intenção de Torquemada ter-se-á traduzido de maneira pouco feliz.
De resto, o seguinte episódio contribui para desvendar outro traço, menos conhecido, do frade dominicano: em dada ocasião, foi levada ao Conselho Régio da Inquisição a proposta de se impor aos muçulmanos ou a conversão ao Cristianismo ou o exílio.
Torquemada opôs-se a essa medida, pois queria conservar o clássico princípio de que a conversão ao Cristianismo não pode ser extorquida pela violência; por conseguinte, a Inquisição deveria restringir sua ação aos cristãos apóstatas; estes, e somente estes, em virtude do seu Batismo, tinham um compromisso com a Igreja Católica. Como se vê Torquemada, no fervor mesmo do seu zelo, não perdeu o bom senso neste ponto. Exerceu suas funções até a morte, aos 16/09/1498.

Igreja Católica: Mãe das Universidades


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Os estudantes universitários normalmente têm um conhecimento pouco profundo sobre a Idade Média; e porque muitos são mal informados, acham que foi um período de ignorância, superstição e repressão intelectual por parte da Igreja católica. No entanto, foi exatamente na Idade Média que surgiu a maior contribuição intelectual para o mundo: o sistema universitário. A universidade foi um fenômeno totalmente novo na história da Europa. Nada como ele existiu no mundo grego ou romano afirmam os historiadores.
O ensino superior na Idade Média era ministrado por iniciativa da Igreja. A Universidade medieval não tem precedentes históricos; no mundo grego houve escolas públicas, mas todas isoladas. No período greco-romano cada filósofo e cada mestre de ciências tinham “sua escola”, o que implicava justamente no contrário de uma Universidade. Esta surgiu na Idade Média, pelas mãos da Igreja Católica, e reunia mestres e discípulos de várias nações, os quais constituíam poderosos centros de saber e  de erudição.
Por volta de 1100, no meio de uma grande fermentação intelectual, começam as surgir as Universidades; o orgulho da Idade Média cristã, irmãs das Catedrais. A sua aparição é um marco na história da civilização Ocidental que nenhum historiador tem coragem de negar. Elas nasceram às sombras das Catedrais e dos mosteiros. Logo receberam o apoio das autoridades da Igreja e dos Papas. Assim, diz Daniel Rops, “a Igreja passou a ser a matriz de onde saiu a Universidade” (A Igreja das Catedrais e das Cruzadas, p. 345).
Tudo isso nesta bela época que alguns teimam em chamar maldosamente de “obscura” Idade Média. A razão e a fé sempre caminharam juntas na Igreja.
A raiz das Universidades está no século IX com as escolas monásticas da Europa, especialmente para a formação dos monges, mas que recebiam também estudantes externos. Depois, no século XI surgiram as escolas episcopais; fundadas pelos bispos, os Centros de Educação nas cidades, perto das Catedrais. No século XII, surgiram centros docentes debaixo da proteção dos Papas e Reis católicos, para onde acorriam estudantes de toda Europa.
A primeira Universidade do mundo Ocidental foi a de Bolonha (1158), na Itália, que teve a sua origem na fusão da escola episcopal com a escola monacal camaldulense de São Félix. Em 1200 Bolonha tinha dez mil estudantes (italianos, lombardos, francos, normandos, provençais, espanhóis, catalães, ingleses germanos, etc.). A segunda, e que teve maior fama foi a Universidade de Paris, a Sorbone, que surgiu da escola episcopal da Catedral de Notre Dame. Foi fundada pelo confessor de S. Luiz IX, rei de França, Sorbon. Ali foram estudar muitos grandes santos como Santo Inácio de Loyola, São Francisco Xavier e São Tomás de Aquino. A universidade de Paris (Sorbonne) era chamada de “Nova Atenas” ou o “Concílio perpétuo das Gálias”, por ser especialmente voltada à teologia.
O documento mais antigo que contém a palavra “Universitas” utilizada para um centro de estudo é uma carta do Papa Inocêncio III ao “Estúdio Geral de Paris”. A universidade de Oxford, na Inglaterra surgiu de uma escola monacal organizada como universidade por estudantes da Sorbone de Paris. Foi apoiada pelo Papa Inocêncio IV (1243-1254) em 1254.
Salamanca é a Universidade mais antiga da Espanha das que ainda existem, fundada pela Igreja; seu lema é “Quod natura non dat, Salmantica non praestat” (O que a natureza não nos dá, Salamanca não acrescenta”. Entre as universidades mais antigas está a de Santiago de Compostela. A cidade foi um foco de cultura desde 1100 graças ao prestígio de sua escola capitular que era um centro de formação de clérigos vinculados à Catedral. A Universidade de Valladolid é anterior à de Compostela já que em 1346 obteve do  papa Clemente VI a concessão  de todas as faculdades, exceto a de Teologia.
Em 1499, o Cardeal Cisneros fundou a famosa universidade “Complutense” mediante a Bula Pontifícia concedida pelo Papa Alexandre VI. Nos anos de 1509-1510 já funcionavam cinco Faculdades: Artes e Filosofia, Teologia, Direito Canônico , Letras e Medicina.
Até 1440 foram erigidas na Europa 55 Universidades e 12 Institutos de ensino superior, onde se ministravam cursos de Direito, Medicina, Línguas, Artes, Ciências, Filosofia e Teologia. Todos fundados pela Igreja. O Papa Clemente V (1305-1314) no Concilio universal de Viena em 1311, mandou que se instaurassem nas escolas superiores cursos de línguas orientais (hebreu, caldeu, árabe, armênio, etc.), o que em breve foi feito também  em Paris, Bolonha, Oxford, Salamanca e Roma.
A atual Universidade de Roma, La Sapienza – onde tristemente estudantes e professores impediram o Papa Bento XVI de proferir a aula inaugural em 2008 –  foi fundada há sete séculos, em 1303, pelo Papa Bonifácio VIII (1294-1303), com o nome de “Studium Urbis”.
Das 75 Universidades criadas de 1500, 47 receberam a Bula papal de fundação, enquanto muitas outras, que surgiram espontaneamente ou por decisão do poder secular, receberam em seguida a confirmação pontifícia, com a concessão da Faculdade de Teologia ou de Direito Canônico. (Sodano, 2004).
As universidades atraíam multidões de estudantes, da Alemanha, Itália, Síria, Armênia e Egito. Vinham para a de Paris chegavam a 4000, cerca de 10% da população.
Só na França havia uma dezena de universidades: Montepellier (1125), Orleans (1200), Toulouse (1217), Anger (1220), Gray, Pont-à-Mousson, Lyon, Parmiers, Norbonne e Cabors. Na Itália: Salerno (1220), Bolonha (1111), Pádua, Nápoles e Palerno. Na Inglaterra: Oxford (1214), nascida das Abadias de Santa Frideswide e de Oxevey, Cambridge. Além de Praga na Boêmia, Cracóvia (1362), Viena (1366), Heidelberg (1386). Na Espanha: Salamanca e Portugal, Coimbra. Todas fundadas pela Igreja. Como dizer que a Idade Média cristã foi uma longa “noite escura” no tempo? As universidades medievais foram centros de intensa vida intelectual, onde os grandes homens se enfrentavam em discussões apaixonadas nos grandes problemas. E a fé era o fermento que fazia a cultura crescer.
Graças ao latim todos se entendiam, era a língua universal e acadêmica; esta permitia aos sábios comunicar-se de um ponto a outro da Europa Ocidental. Havia uma unidade interna e de obediência aos mesmos princípios; era o reflexo de uma civilização vigorosa, segura de sua força e de si mesma.
A partir de 1250, o grego foi ensinado nas escolas dominicanas e, a partir de 1312 nas universidades de Sorbonne, Oxford, Bolonha e Salamanca. Abria-se assim um novo campo ao pensamento que desencadeou uma onda de paixão filosófica no nascimento da Escolástica-teologia e filosofia unidas para provar uma proposição de fé.
Santo Agostinho, Cassidoro, Santo Isidoro de Sevilha, Rábano Mauro e Alamino, os grandes mestres da Antigüidade, se apoiavam sobretudo nas Sagradas Escrituras. Agora o intelectual cristão da Idade Média quer demonstrar que os dogmas estão de acordo com a razão e que são verdadeiros. É a “teologia especulativa”, onde a filosofia é amiga da teologia. Os problemas do mundo são estudados agora sob esta dupla ótica.
A Universidade medieval era um mundo turbulento e cosmopolita; os estudantes de Paris estavam repartidos em quatro nações: os Picardos, os Ingleses, os Alemães e os Franceses.  Os professores também vinham de diversas partes do mundo: havia Sigério de Brabante (Bélgica), João de Salisbury (Inglaterra), S. Alberto Magno (Renânia), S. Tomás de Aquino e São Boaventua da Itália.
Os problemas que apaixonavam os filósofos, eram os mesmos em Paris, em Oxford, em Edimburgo, em Colônia ou em Pavia. O mundo estudantil era também um mundo itinerante: os jovens saiam de casa para alcançar a Universidade de sua escolha; voltavam para sua terra nas festas.  O sistema universitário que temos hoje com cursos de graduação, pós-graduação, faculdades, exames e graus veio diretamente do mundo medieval.
Os papas sabiam bem da importância das universidades nascentes para a Igreja e para o mundo, e por isso intervinham em sua defesa muitas vezes. O Papa Honório III (1216-1227) defendeu os estudantes de Bolonha em 1220 contra as restrições de suas liberdades. O Papa Inocêncio III (1198-1216) interveio quando o chanceler de Paris insistiu em um juramento à sua personalidade. O Papa Gregório IX (1227-1241) publicou a Bula “Parens Scientiarum” em nome dos mestres de Paris, onde garantiu à Universidade de Paris (Sorbonne) o direito de se auto-governar, podendo fazer suas leis em relação aos cursos e estudos, e dando à Universidade uma jurisdição papal, emancipando-a da interferência da diocese.
O papado foi considerado a maior força para a autonomia da Universidade, segundo A. Colban (1975). Era comum as universidades trazerem suas queixas ao Papa em Roma. Muitas vezes o Papa interveio para que as universidades pagassem os salários dos professores; Bonifácio VIII (1294-1303), Clemente V (1305-1314), Clemente VI (1342-1352), e Gregório XI (1370-1378) fizeram isso.
“Na universidade e em outras partes, nenhuma outra instituição fez mais para promover o saber do que a Igreja Católica”, garante Thomas  Woods (p. 51).histigrejamediamenor
O processo para se adquirir a licença para ensinar era difícil. Para se ter ideia da solenidade e importância do ato, basta dizer que a pessoa para ser licenciada se ajoelhava diante do Vice-chanceler, que dizia:
“Pela autoridade dos Apóstolos Pedro-Paulo, dou-lhe a licença de ensinar, fazer palestras, escrever, participar de discussões… e exercer outros atos do magistério, ambos na Faculdade de Artes em Paris e outros lugares, em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém” [Daly, 1961; p. 135].
Uma riqueza da universidade medieval é que era atenta às finalidades sociais. Não se aceitava a ideia de uma cultura desinteressada, ou um saber exclusivamente para seu próprio benefício pessoal. “Deve-se aprender apenas para a própria edificação ou para ser útil aos outros; o saber pelo saber é apenas uma vergonhosa curiosidade”, já havia dito São Bernardo (1090-1153).
Para Inocêncio IV (1243-1254) a Universidade era o “Rio da ciência que rege e fecunda o solo da Igreja universal”, e Alexandre IV (1254-1261) a chamava de: “Luzeiro que resplandece na Casa de Deus” (Daniel Rops, p.348).
Portanto, são maldosos ou ignorantes da História aqueles que insistem em se referir à Idade Média e à Igreja como promotoras da inimizade à Ciência e perseguidora dos cientistas.
Prof. Felipe Aquino

As grandes e numerosas Catedrais da Idade Média

As belíssimas Catedrais foram um marco da Idade Média, que até hoje são admiradas. Do século XII em diante tivemos a construção de numerosas delas. Foi um tempo de glória da arquitetura e arte da Idade Média, que desmente cabalmente os que a querem chamar de “Idade das Trevas”.
catedraisidademediaAs Catedrais foram por excelência as obras de arquitetura e arte mais representativas da Idade Média ocidental cristã. Nelas a sociedade humana dessa época exprimiu e revelou toda a sua criatividade, profunda espiritualidade, capacidade técnica e talentos. Os castelos medievais e as maravilhosas Catedrais continuam de pé, desafiando os séculos (Ferguson, 1970, p. 220).
Paul Johnson (2003), historiador da arte, disse: “As catedrais medievais da Europa são as obras de arte mais talentosas da humanidade em todo o teatro das artes”.
As Catedrais góticas da Europa são especialmente impressionantes. A sua impressionante coerência geométrica não é por acaso; é fruto do pensamento católico. Os pensadores católicos estavam persuadidos das ligações entre as matemáticas, a geometria em particular, e Deus. O Ocidente cristão identificava a matemática com o divino. Esse pensamento levou os construtores das catedrais a conceberem a arquitetura como aplicação da geometria, e a geometria como aplicação da teologia, e o projeto de uma catedral gótica como uma imitação do divino Mestre.
Os estudiosos acreditavam que a geometria era um meio de ligar o ser humano e Deus, e que era um veículo para revelar à humanidade os segredos dos Céus. Da mesma forma consideravam que a harmonia da música era baseada na mesma causa da formação da ordem cósmica e que o Cosmos era uma obra de arquitetura e Deus era esse Arquiteto.
Assim como o grande Geômetra criou o mundo em ordem e harmonia, então o arquiteto gótico, em seu limitado modo, devia imitar a Deus de acordo com os seus princípios de proporção e beleza. É impressionante a proporcionalidade geométrica das catedrais. Alguns exemplos disso são a Catedral de Salisbury na Inglaterra e a de São Remi em Reims na França. O coro da Catedral de São Remi está entre os mais perfeitos símbolos da Santíssima Trindade na arquitetura gótica. Para destacar o número “três”, usaram três janelas de luz cada uma em cada um dos três ápices principais.
O gosto pela precisão geométrica não era mera coincidência. Santo Agostinho em sua obra De Música, que se tornou o tratado de estética mais influente da Idade Média, considerava a arquitetura e a música as mais nobres das artes, uma vez que sua proporção matemática eram aquelas do próprio universo, e que elevavam as nossas mentes à contemplação da ordem divina.
histigrejamediamenorA ênfase dada na luz e nas janelas das catedrais góticas mostra a importância do significado da luz na teologia. Santo Agostinho tinha concebido o conhecimento adquirido pelo homem como uma iluminação divina. Deus ilumina a mente com o conhecimento; isso servia de inspiração para o arquiteto gótico medieval. A luz física era uma maneira de evocar pensamentos da sua fonte divina; elevava o pensamento do mundo para Cristo, “a Luz do Mundo”.
Como os olhos adoradores se dirigiam para os céus, a graça de Deus, em forma da luz do Sol era imaginada fluir em bênção, encorajando a exaltação. Os pecadores eram convidados a se converter e a buscar a perfeição contemplando o mundo espiritual onde Deus habita – um mundo sugerido pela perfeição da arquitetura. Tudo na catedral gótica revelava esta inspiração sobrenatural.
Enquanto a predominância das linhas horizontais dos templos gregos e romanos simbolizava uma religião influenciada pelo natural, as catedrais góticas em forma de agulhas apontadas para o céu, simbolizavam uma visão sobrenatural.
Nenhum período da História produziu trabalhos tão grandes e majestosos de arquitetura. A luz que se espalhava nas catedrais góticas simbolizava a luz do século XIII, caracterizado por suas universidades, ensino e escolaridade, bem como o fervor religioso e o heroísmo de um São Francisco de Assis, São Domingos de Gusmão, e tantos outros.
Foi a estrutura mental dos escolásticos, como Santo Tomás de Aquino e Santo Alberto Magno, que fez surgir a Catedral gótica. A beleza, harmonia e majestade desta obra espelhavam o pensamento escolástico da época onde cada questão fazia parte de um edifício do pensamento famoso.
O estilo gótico, surgiu na Idade Média cristã como um progresso essencialmente técnico, que consistia numa diminuição das pressões exercidas pelas abóbadas, as quais podiam elevar-se pelo afilamento das flechas e o equilíbrio dos arcobotantes leves e colunas com coruchéus. As abóbadas atingiram alturas cada vez maiores: 32 m na Catedral de Paris; 37 m em Chartres; 42 m em Amiens; 48 m em Beauvais. Por outro lado a abóbada melhorava a acústica das catedrais. No período de 1170 a 1270 construíram-se na França mais de 500 grandes igrejas góticas. (Fremantle, 1970, p. 127; Duby, 1979, pp. 121, 281; Perroy, 1957, 166-167).
A figura da Catedral da Idade Média é um marco histórico. Com a sua imensa magnitude ela domina a cidade e se impõe sobre tudo o mais. Assim são as catedrais de Reims, Bolonha, Córdoba, Florença, Gênova, Milão, Paris, Monreale, Nápoles, Roma, Sevilha, Amiens, Beauvais, Chartres, Notre-Dame, Rouen, Veneza, Viena, Verona, São Paulo etc. Muitas cidades ainda hoje podem exibir uma grande catedral, que construída na Idade Média, símbolo de fé autêntica e amor a Deus. Com suas imponentes torres avançando para o Céu elas revelam a profunda aspiração do homem do seu tempo. Elas surgiram no ponto alto da Idade Média juntamente com a Cruzada, a Universidade, as Peregrinações e as Sumas teológicas.
Poucos sabem que o imperador Carlos V foi coroado em São Petrônio, em Bolonha. E há fatos marcantes na vida dessas obras de arte e de fé. Os carros que transportavam os materiais para a construção da catedral de Chartres eram puxados por homens pecadores que procuravam saldar a sua dívida com Deus. A Catedral de Monreale, dedicada à Virgem Maria, foi construída pelos muçulmanos que a admiravam. A Catedral de Milão é um voto oferecido por Gian Galeazzo Visconti. A argamassa usada na construção da catedral de Viena foi temperada com vinho (Marchi, 1991).
Cesare Marchi viajou pelo mundo para estudar quinze das mais importantes Catedrais medievais e narrou a impressionante história de cada uma delas em seu livro Grandes Pecadores, Grandes Catedrais. A Catedral é a opus Dei, a obra de Deus. Tudo o que ela possui é para a glória de Deus! A beleza, a arte, o requinte são a expressão maior e total da fé. Atrás de cada um desses elementos há um longo passado. Raul Glaber, um monge conhecido, cronista do ano mil disse que “o branco manto das igrejas cobria o mundo”. Para isso o homem medieval precisou aprender a talhar bem a pedra, a pintura com a técnica do afresco, os vitrais que contavam toda a espécie de histórias, a arquitetura, a arte etc.
A partir de 1050, e por toda parte, em todos os países onde a Igreja guiava os homens, houve uma febre na construção de Catedrais. As Catedrais de Cremona, de Piacenza, de Ferrosa, de Santa Maria do Trastevere em Roma, de Cambridge, Oxford, Glasgow, Worms, Hildesheim, Salomanea, Coimbra, são contemporâneas das francesas, já citadas; bem como as de Assis, Rochester, Worcester, Westminster na Inglaterra; Magdeburgo, Frankfurt e Colônia na Alemanha.
Muitas dessas Catedrais foram construídas no mesmo lugar de outras, que por serem cobertas de madeira, muitas vezes sofreram incêndios. A maioria dessas Catedrais são colossais, uma vez que as multidões as ocupavam totalmente. Havia também o desejo do povo de oferecer a Deus uma digna e bela morada. As cidades competiam entre si.
É lógico que esta fecundidade artística e espiritual tem causas profundas e não é fruto de mero entusiasmo passageiro ou fruto da improvisação. Foram cerca de 300 anos de cultura. As obras não são cópias umas das outras. Os grandes artistas estavam presentes. A Igreja e a fé católica foram a grande inspiradora de todo esse trabalho, o guia que mostrou aos artistas o seu fim. O mundo ocidental nunca será suficientemente grato a ela, pois, buscando louvar a Deus fez os homens reconhecerem “o valor único da arte”, como disse Jacques Maritain.
Os grandes autores dessas obras imensas foram ainda os monges da Igreja. Até o século XII a arte foi monástica. As igrejas das abadias precederam as Catedrais dos bispos, e abriu-lhes os caminhos. A Igreja da abadia de Cluny tinha 30 metros de altura e sua nave tinha mais de cem metros, rodeada por sete campanários. Cluny estava na vanguarda da escultura e da arquitetura ocidental; era a arte para o serviço e para a glória de Deus. Eles desenvolveram as técnicas das grandes abóbadas. E também o desenvolvimento dos vitrais se deve aos monges. Infelizmente o vandalismo do século XIX destruiu a formidável e imensa igreja de Cluny. Seria impossível escrever os nomes de todos esses monges artistas geniais.
Um deles, Suger, abade de Saint-Denis, filho de um pobre servo de gleba, foi um gênio que se destacou na teologia, política, diplomacia e em todas as artes. Ele empregava todos os meios possíveis para “tornar a casa de Deus mais admirável”. Esta arte monástica durou tanto quanto a Idade Média e a ultrapassou. Tudo era harmonioso nas abadias, e ainda hoje os seus claustros são admirados pelos turistas do mundo todo.
Os bispos eram os principais construtores das catedrais, mas não estavam só, estava com eles o povo cristão que os amava e admirava. Este povo tinha orgulho de sua Catedral, de sua enorme nave, de sua alta cúpula e de seus campanários onde o sino os chamava para rezar. Algo que poucos sabem é que a famosa Torre de Piza, na Itália, era o campanário da Catedral da cidade; ambas revestidas de mármore branco, ao lado da enorme igreja dos batismos.
Um registro do bispo Geoffroy d’Eu, um dos construtores da Catedral de Amiens, diz em 1236 que a construção foi “decidida de pleno acordo com o clero da cidade e o povo”. Todo o povo participava das obras com as suas próprias mãos e com seu entusiasmo.
Cidades modestas levantavam grandes Catedrais; pois elas eram um empreendimento social como as construções hoje dos grandes metrôs, barragens e estradas. O povo entendia que ao mesmo tempo que construía para Deus trabalhava também para si próprio. Um texto do arcebispo de Rouen ao seu irmão de episcopado de Amiens, conta-nos sobre esses mutirões, que eram voluntários:
“Viam-se homens vigorosos, orgulhosos do seu nascimento e da sua riqueza, acostumados a uma vida de ócio, atrelarem-se a uma carroça com correias e transportarem pedra, cal, madeira e muito mais… Às vezes, mil pessoas e mais, homens e mulheres, puxavam as carroças, tão pesada era a carga. E tudo num tal silêncio que não se ouvia uma única voz ou murmúrio. Quando paravam ao longo do caminho, apenas se ouvia a confissão dos pecados e uma oração pura e suplicante a Deus, pedindo perdão das faltas cometidas. Os padres exortavam à concórdia, calavam-se os ódios, as inimizades desapareciam, as dívidas eram perdoadas e os espíritos reentravam na unidade. Se aparecia alguém tão afinado ao mal que não queria perdoar e seguir o conselho dos padres, a sua oferenda era lançada fora do (carro) e ele mesmo expulso com ignomínia da sociedade do povo santo” (Daniel Rops, Vol. III, p. 395).
E as doações do povo eram generosas. Para reconstruir a catedral que ficara pequena, começava com a oferta do bispo, dos cônegos, dos burgueses ricos e dos senhores da região. O rei também contribuía generosamente. Fazia-se depois uma coleta em toda a cidade e arredores, e ninguém deixava de dar a sua oferta, mesmo os pobres e as viúvas. Eudes de Chateauroux, cardeal, disse: “Foi com os óbolos de mulheres, já idosas, que se construiu, em grande parte a catedral de Paris” (Idem).
Às vezes um grupo de artesãos doava vitrais. Tudo isto era também um meio de fazer penitências, que só os pecadores públicos não podiam participar, no entanto, os usurários podiam restituir assim o dinheiro mal adquirido. Daniel Rops conta que em Paris até a “corporação” das “mulheres da vida”, pediu ao bispo que as autorizasse a doar um vitral ou um cálice, o que foi aceito.
O que é que movia esse povo a construir tantas maravilhas pelo mundo? A resposta é a fé. Essa mesma fé que levou adiante a Cruzada para libertar o Santo Sepulcro na Terra Santa.
As mãos que as construíram eram hábeis, inteligentes, lúcidas; dominavam um ofício e uma técnica. Esses arquitetos chamados de mestres de obras, possuíam vasta cultura, sabiam o latim, adquiriam novos conhecimentos em suas viagens. O epitáfio de um deles, Pedro de Montreau, qualifica-o de “doutor dos canteiros” (doctor latomorum). Muitos desses arquitetos eram escultores.historiaigrejadademedia
A Biblioteca Nacional da França guarda o caderno pessoal de notas de um desses artistas famosos do século XIII, Villard de Honnecourt; trinta e três folhas de pergaminho. Tudo o interessava: as suas reflexões e desenhos se completavam. Ele fala do seu ofício com muito prazer. Seus escritos deixam claro que as catedrais não eram obras de amadores ou ignorantes. Nada foi feito por acaso e sem um projeto; as abóbadas eram calculadas matematicamente; a geometria espacial e a trigonometria eram usadas, e a estereotomia (ciência do corte da pedra) estava em evidência, sendo a resistência dos materiais já conhecida.
Até hoje o homem moderno não sabe o segredo de fabricação que fazem os vitrais românicos de um brilho admirável, mesmo com as técnicas de pintura no vidro de hoje. Há vigas de madeira na Catedral de Notre-Dame do século XIII, que até hoje não foram atacadas por insetos. Não se sabe que processo eles usaram para a conservação da madeira. Esses mestres de obras não frequentavam escolas de Belas Artes, porém, havia famílias inteiras que se dedicavam a esse trabalho. A verdadeira formação se fazia junto a um mestre. De fato, a escola acontecia na prática, nos canteiros de obras. Começava no corte e polimento das pedras e se completava nas viagens pela Europa.
Esses artistas eram homens de ofício e de fé. Eles não eram como muitos artistas modernos que fazem a arte sacra proclamando que não têm fé. Como pode esta arte ter vida e transmitir alguma beleza? Como pode ter valor? Michel Quoist, escritor francês e sacerdote, disse que a beleza da matéria é proporcional ao espírito que a penetra. Entre os documentos que existem sobre as construções das catedrais não há nenhum que mostre conflito de interesses financeiros. Se a construção era de uma Ordem religiosa, o artista era alimentado com os monges e recebia um pagamento anual. Trabalhar para Deus já era um mérito que não podia ser avaliado em dinheiro.
Esses mestres de obra criaram as formas mais apaixonantes de toda a história da arte, e ainda hoje podemos rezar nas mesmas catedrais que rezaram São Luís de França, São Bernardo, São Francisco de Assis, São Domingos e tantos outros santos há cerca de oito séculos.
Jacques Maritain comparou a catedral gótica à Suma Teológica de Santo Tomás: uma solução elegante de geometria e física sendo que nada há nela de falso. Lefrançois-Pielion a definiu bem: “Um desenho arquitetônico revestido de beleza” (Daniel Rops, Vol. III, p. 409). Nela a técnica e a espiritualidade se encontram e se abraçam. Nesses “mestres de obras circulava a seiva da fé.
Os campanários góticos, usados para colocar os sinos, atingiam alturas incríveis: 82 metros em Reims, 123 metros em Chartres, 142 metros em Estrasburgo e 160 metros em Ulm.
Retirado do livro: História da Igreja, Idade Média. Prof. Felipe Aquino. Ed. Cléofas.

O Sistema Feudal

Este foi um sistema típico da Idade Média. Com a queda de Roma em 476 nas mãos dos bárbaros, houve a confusão nas terras do Império ou no Ocidente da Europa, invadido por diversas tribos bárbaras.
Não havia mais um poder central que garantisse a ordem pública, então, aconteceu o “cada um para si”; e pequenos poderes foram surgindo: cada dono de um pedaço de terra procurava assegurar a si mesmo e aos seus servidores aquilo que o Estado não oferecia: paz, defesa contra os invasores, cultivo da terra, pequeno comércio. Este se tornava difícil, porque os transportes eram precários; não havia exército, nem polícia, para fiscalizar as estradas ameaçadas por bandidos.
estado-feudalA terra era a única fonte de subsistência para o homem; então, os camponeses, incapazes de garantir à sua família a segurança, procuravam a proteção de vizinhos mais poderosos (senhores feudais), que os defendessem com suas armas em troca de uma parte das colheitas desses camponeses. Havia assim entre o homem do campo (servo da gleba) e o senhor, um contrato sério, firmado por juramento, que naquela época, possuía um valor sagrado. Tanto o senhor como o agricultor se beneficiavam desse contrato. Surgiram os feudos.historiaigrejadademedia
Nesses tempos de grande insegurança os fracos procuravam a proteção dos mais fortes. Então, um homem livre se recomendava a um homem poderoso, a um “senhor” (susserano), e prometia por juramento servi-lo com lealdade tornando-se seu “vassalo”. Em troca recebia do seu senhor proteção e um pedaço de terra chamada feudo (do latim feodum).
No começo o feudo era vitalício, depois se tornou hereditário e o vassalo o transmitia a seu filho. Entre o senhor e o vassalo havia um compromisso pessoal, aquele que não o cumprisse seria traidor. O vassalo era também soldado do seu senhor e o acompanhava em suas excursões. No entanto, o vassalo, “servo da gleba” não era um escravo como conhecemos no século XVI. Ele tinha muito mais dignidade.
Na Idade Média o fundamento das relações de homem para homem é a dupla noção de fidelidade. Carlos Magno disciplinou a hierarquia feudal reconhecendo a legitimidade do duplo juramento entre susserano e vassalo: a fidelidade de um lado e a proteção do outro. Henri Pourrat disse que “o sistema feudal foi a organização viva imposta pela terra aos homens da terra” (Pernoud, 1997, p. 29).
Há um rito neste juramento: o vassalo presta “juramento e homenagem” ao seu senhor: fica na sua frente, de joelhos, de cinturão desfeito e coloca sua mão sobre a do senhor. Gestos que significam o abandono, a confiança, a fidelidade. Declara-se seu vassalo e confirma-lhe a dedicação de sua pessoa. Em troca, e para selar o pacto que doravante os liga, o susserano beija o vassalo: é um laço de afeição pessoal que deve reger as relações entre os dois homens. Era uma magnífica homenagem à pessoa humana, que se perdeu nos séculos XVI e XVII, pois perdeu a força moral.
Beaumonoir disse que “o senhor deve mais reconhecimento ao seu vassalo, que ele próprio deve ao senhor”. E Philippe de Novare nota: “Aqueles que recebem serviço e nunca o recompensam bebem o suor dos seus servos, que é veneno mortal para o corpo e para a alma” (Idem, p. 33). O servo de gleba da Idade Média nada tem a ver com os escravos da Idade Moderna.
Diz Règine Pernoud: “Como é de justiça, exige-se da nobreza mais dignidade e retidão moral que dos outros membros da sociedade. Por uma mesma falta, a pena infligida a um nobre será muito superior a que é destinada a um plebeu” (Idem, p. 34).
Neste sistema, o senhor por sua vez, podia se recomendar a outro senhor mais forte que ele e este último ao rei. Este, colocado na cabeça da hierarquia feudal, é simultaneamente um administrador e um justiceiro. O princípio fundamental é que, segundo a doutrina de Santo Tomás de Aquino: “O povo não é feito para o príncipe, mas o príncipe para o povo”. E assim formou-se o Sistema Feudal: uma hierarquia de vassalos e de susseranos (senhores).
Este sistema surgiu por causa do enfraquecimento do Estado, especialmente da França e Itália, motivado pela invasão dos bárbaros, especialmente os vikings (normandos) e húngaros magiares, terríveis devastadores. Os duques e condes que administravam os ducados e condados (grandes regiões) em nome do rei, resolveram que esses ducados e condados seriam doravante o seu feudo hereditário, e passaram a exercer neste seu feudo, em proveito próprio, os direitos que até então, pertenciam ao rei, por exemplo: fazer guerra a outro feudo, cobrar impostos, exercer a justiça etc. Cada um construía em seu feudo um castelo forte, a sua fortaleza. Daí surgem as cidades amuralhadas.
A sociedade feudal se compunha de três tipos de pessoas: o nobre, que governava, ocupava os castelos, orgulhava-se de ser guerreiro, caçador e promotor de torneios; o camponês, que trabalhava no campo, e o clero, que se dedicava à religião. O servo da gleba era tratado como pessoa, à diferença do escravo romano, que era considerado “res”, coisa. O senhor feudal não tinha direito sobre a vida deles, como tinha o senhor do escravo romano. Isso foi um grande avanço social.
O servo da gleba negociava com o seu senhor, isto é, isento de coação por parte de algum chefe: o senhor não poderia expulsá-lo de seu território, nem ele poderia fugir. O servo devia cultivar a terra, cavando-a, semeando-a e colhendo os frutos, tanto em seu proveito como em proveito daquele que lhe dava tutela. Fora disto, o servo gozava de todos os direitos do homem livre: podia casar-se e fundar uma família; a sua terra passaria para os filhos após a sua morte, assim como os bens que ele pudesse adquirir. O senhor feudal tinha obrigações correspondentes: não lhe era lícito vender, alienar ou abandonar a terra do servo.
Assim a Europa foi dividida em inúmeros feudos independentes, sem um poder central, e valia a lei do mais forte; o oposto da civilização e do regime das leis. Desta forma houve uma espécie de nova barbarização da Europa. Cada um desses pequenos Estados feudais era mais ou menos autônomo ou tinha sua legislação própria. Podia haver reis ou senhores de territórios maiores, nos quais existiam outros senhores feudais; esses reis, porém, não gozavam de autoridade centralizada como a do Império Romano. Nem mesmo Carlos Magno, que em 800 se tornou o imperador do Sacro Império Romano da Nação Franca, nem os imperadores Otões, que no século X governaram o Sacro Império Romano da Nação Germânica, restauraram o poder central do antigo Império.histigrejamediamenor
O regime feudal, que começou no século V, foi-se espalhando e consolidando até o começo das monarquias absolutas, das quais a primeira foi a de Filipe IV, o Belo, da França (1285-1314). A volta dos governos centralizados se deve, em grande parte, à restauração do Direito Romano que começou no século XIII.
O rei nos tempos feudais era “senhor entre outros senhores”. Devia procurar manter o equilíbrio entre seus vassalos e entre estes e o próprio soberano, servindo-se, para isto, do sistema de casamentos e heranças.
O sistema feudal foi prejudicial em muitos pontos para a Igreja porque os senhores feudais queriam dominar as dioceses, paróquias e mosteiros que estavam em seus feudos, e queriam indicar os párocos, bispos e abades dos mosteiros. Foi a chamada “investidura leiga”, que muito prejudicou a Igreja, porque os senhores feudais negociavam os cargos sagrados (simonia), colocando bispos e abades, muitas vezes sem condições, para exercer essas funções. Isso gerou uma decadência de costumes num clero mal formado.
Retirado do livro: História da Igreja, Idade Média. Prof. Felipe Aquino. Ed. Cléofas.

A Igreja e o ensino na Idade Média

O Dr. Thomas Woods, PhD em História pela Universidade de Harvard nos EUA, disse em um dos seus livros que:
fd33359e7b1157f96e453878b851530e“Bem mais do que o povo hoje tem consciência, a Igreja Católica moldou o tipo de civilização em que vivemos e o tipo de pessoas que somos. Embora os livros textos típicos das faculdades não digam isto, a Igreja Católica foi a indispensável construtora da Civilização Ocidental. A Igreja Católica não só eliminou os costumes repugnantes do mundo antigo, como o infanticídio e os combates de gladiadores, mas, depois da queda de Roma, ela restaurou e construiu a civilização”. [Woods, 2005, pg. 7]
Um dos pontos mais importantes da atuação da Igreja na Idade média cristã, foi no campo da Ciência. Sem a Igreja não haveria a beleza da arquitetura, da música, da arte sacra, das universidades, dos castelos, do direito, da economia, etc.histigrejamediamenor
No séc. VI São Cesário de Arles já expunha no Concílio de Vaison (529) a necessidade imperiosa de criar escolas no campo; e os bispos se dedicaram a isto. Da mesma forma foi a Igreja que montou para Carlos Magno (†814) a sua política escolar; e retomou a tarefa educadora no séc. X após o fim do seu Império.
O III Concílio de Latrão (1179), em Roma, presidido pelo Papa Alexandre III (1159-1181), ordenou ao clero que abrisse escolas por toda a parte para as crianças, gratuitamente. Obrigou a todas as dioceses terem ao menos uma. Essas escolas foram as sementes das Universidades que logo surgiam: Sorbone (Paris), Bolonha (Itália), Canterbury (Inglaterra), Toledo e Salamanca (Espanha), Salerno, La Sapienza, Raviera na Itália; Coimbra em Portugal.
No séc. XII havia só na França 70 abadias com escolas. Todos os grandes bispos também quiseram ter escolas; na França, no séc. XII havia mais de 50 escolas episcopais. Dos sete aos vinte anos as crianças e os jovens eram recebidos nessas escolas sem distinção de classes. Havia escolas só para meninas e moças. As disciplinas dividiam-se em “trivium” (gramática, dialética e retórica) e “quadrivium” (artimética, geometria, astronomia e música). Mas um grande pedagogo da época Thierry de Chartres, mostrou que o “trivium e o quadrivium” eram apenas um meio e que o fim era “formar almas na verdade e na sabedoria”.
Em muitas escolas os alunos tinham ensino técnico de como trabalhar o ouro, prata e cobre. Aos poucos surgiam as especializações: Chartres (letras), Paris (teologia), Bolonha (direito), Salerno e Montpellier (medicina).
O Concílio geral de Latrão III, aprovou o seguinte cânon:
“A Igreja de Deus, qual mãe piedosa, tem o dever de velar pelos pobres aos quais pela indigência dos pais faltam os meios suficientes para poderem facilmente estudar e progredir nas letras e nas ciências. Ordenamos, portanto, que em todas as igrejas catedrais se proveja um benefício (rendimento) conveniente a um mestre, encarregado de ensinar gratuitamente aos clérigos dessa igreja e a todos os alunos pobres” (can. 18, Mansi XXII 227s).
O IV Concílio ecumênico do Latrão (1215), renovou este decreto. Teodulfo, bispo de Orléans no séc. VIII, promulgou o seguinte decreto: “Os sacerdotes mantenham escolas nas aldeias, nos campos; se qualquer dos fiéis lhes quiser confiar os seus filhos para aprender as letras não os deixem de receber e instruir, mas ensinem-lhes com perfeita caridade. Nem por isto exijam salário ou recebam recompensa alguma a não ser por exceção, quando os pais voluntariamente a quiserem oferecer por afeto ou reconhecimento” (Sirmond, Concilia Galliae II 215).
É muito significativo um dos últimos depoimentos sobre a acusação de que a Igreja obstruiu a ciência na Idade Média, proferido em 1957 por um grupo de estudiosos que, sem intenção confessional alguma, escreveram a história da ciência antiga e medieval:historiaigrejadademedia
“Parece-nos impossível aceitar a dupla acusação de estagnação e esterilidade levantada contra a Idade Média latina. Por certo a herança (cultural) antiga não foi totalmente conhecida nem sempre judiciosamente explorada;… mas não é menos verdade que de um século para outro – mesmo de uma geração a outra dentro do mesmo grupo – há evolução e geralmente progresso. A Igreja… na Idade Média salvou e estimulou muito mais do que freou ou desviou. Por isto, embora só queira apelar para a Antigüidade, a Renascença é realmente a filha ingrata da Idade Média” (La science antique et médiévale, sous la direction de René Taton, Presses Universitaires de France. Paris 1957, 581s).
Esses poucos dados mostram o quanto a Igreja fez pelo ensino e pelo saber na Idade Média, bem ao contrário do que muitos pensam: que a Igreja foi contra a ciência e o ensino.
Prof. Felipe Aquino

O que eram Ordens Mendicantes que apareceram na Idade Média?


Ordens MendicantesNo início do século XIII tivemos os fundadores das Ordens “Mendicantes” (viviam em grande parte de esmolas), eram pregadores itinerantes, mas integrados no seio da Igreja. Cultivavam a pobreza não só individual, mas também comunitária; os irmãos viviam de trabalho manual ou de esmolas.
histigrejamediamenor Provavelmente, todos eram leigos no início. Estabeleciam-se em centros populosos e renunciavam à estabilidade no mesmo lugar.
Constituíram as chamadas Ordens Terceiras (a Primeira Ordem era a dos frades; a Segunda Ordem das freiras), aceitavam as pessoas casadas, proporcionando-lhes algo da vida regular.
No mundo obrigavam-se a observar normas de oração e práticas de penitência e caridade.historiaigrejadademedia
Estiveram nessas Ordens, São Luís, rei da França, Santa Elisabete da Turíngia, Santa Catarina de Sena… Entre os Terciários inscreveram-se no fim do século XIII pessoas solteiras, que renunciavam as propriedades e viviam em comum; do que resultaram novas Ordens, ditas “dos Terciários Regulares”.
Retirado do livro: História da Igreja, Idade Média. Prof. Felipe Aquino. Ed. Cléofas.

A Idade Média, os monges e o progresso


livros03Em síntese: O Prof. Léo Moulin, agnóstico ou ateu belga, reconhece a benéfica influência do Cristianismo e, em especial, da Regra de São Bento na evolução da cultura e da civilização. Mostra como a Regra de São Bento, legislando para os monges, fez transbordar sobre toda a sociedade medieval e posterior certos princípios de disciplina, diligência e ordem no trabalho, que propiciaram a criação de grandes empresas industriais e culturais. São Bento, aliás, hauriu das Escrituras Sagradas a sua mentalidade; ora a Bíblia incute ao homem certo otimismo em relação à natureza, obra de Deus Criador, que confiou ao casal humano o mandato de explorar e dominar as criaturas inferiores. A mesma fonte bíblica deu a saber ao homem que o universo foi criado com sabedoria e lógica; a própria razão humana, sendo dom de Deus, merece a confiança do homem; conscientes disto, os medievais cultivaram a inteligência, resultando daí grande número de Universidades e belas obras de arte (catedrais, especialmente), que supõem dinamismo, coragem e saber científico entre os homens da Idade Média. Esta, portanto, não foi o período obscuro do qual sem o devido conhecimento de causa.
Costuma-se comentar a influência que o Calvinismo, fundado no século XVI, exerceu sobre o desenvolvimento comercial e econômico dos países que o adotaram. O senso religioso levou os calvinistas a se dedicarem “religiosamente” às suas atividades profissionais, donde resultou (em parte, ao menos) a rede colonial da Inglaterra e da Holanda.
Todavia é menos conhecida a influência sadia que a fé católica exerceu sobre os monges e as populações medievais em favor do progresso da civilização. Aliás, deve-se dizer que o Cristianismo, bem entendido e vivido, foi e será sempre  um estímulo  para a construção de um mundo mais humano, fraterno e, por conseguinte, mais feliz.
O Prof. Léo Moulin, agnóstico e ateu, belga de 82 anos de idade, tem-se manifestado sobre o assunto. Já em PR 310/1988, pp. 115-120 foi publicada uma entrevista desse mestre sobre a Idade Média, acentuando os seus valores positivos. Léo Moulin voltou à temática em 1990 por ocasião do nono centenário do nascimento de São Bernardo (1090-1153), desta vez focalizado mais explicitamente o papel dos monges da Idade Média no progresso da civilização. Visto que a questão é de grande importância para dissipar equívocos, passamos a resumir tópicos de um artigo do Prof. Moulin publicado na revista “JESUS”, dezembro de 1990, pp. 103-107, com o título “Luminosissimo Medioevo!”
histigrejamediamenorInvenções e Descobertas
A Idade Média ocidental ocupa lugar importante na história do desenvolvimento tecnológico, pois registrou uma série de invenções e descobertas que lhe dão preeminência sobre quanto ocorreu na mesma época fora do âmbito europeu. Sejam recordados: a bússola, as lentes de óculos, a roda com aros, o relógio mecânico com pesos e rodas (“invenção mais revolucionária do que a da pólvora e a da máquina a vapor”, conforme Ernst Junger), o canhão (em 1327), a caravela (em 1430), a própria imprensa, a  ferradura de cavalo, que permite ao animal correr sobre terrenos inóspitos, os moinhos de água, de maré, de vento…
Isto tudo fez que o Ocidente se encontrasse em melhores condições de civilização do que outras partes do mundo no século XVI.
A Regra de São Bento
Antes de todas estas, houve outra grandiosa “invenção”, que é a Regra de São Bento (+ 547).¹ Nesta encontramos elementos necessários ao bom andamento de uma empresa moderna.
Com efeito. Além do Ora (Oração), São Bento ensina o valor e a sistematização do Labora (Trabalho). Imagina, sim, o seu discípulo como um operário (RB Prol 14) que trabalha com mãos e ferramentas na oficina do Mosteiro (RB 4, 75-78). O trabalho é essencial à identidade monástica, seja o manual, seja o intelectual, seja o artístico ou artesanal. No decorrer da Regra, São Bento ilustra as motivações do Labora:
– o trabalho corresponde a um gênero de vida pobre, que exige a labuta pessoal para poder manter-se; cf. RB 48,8;
– o trabalho é serviço à comunidade e aos hóspedes, a exemplo do que fez Cristo; cf. Rb 48, 1-25; 53, 1-23;
– o trabalho é desenvolvimento dos talentos que Deus entregou ao homem e cuja aplicação ele vai julgar; cf. Rb 4,75-77;
– o trabalho ajuda os pobres e evita a ociosidade, que é inimiga da alma; cf. RB 48,1.
São Bento quer que o trabalho seja executado “bem”, “com serenidade”, “sem tristeza” e “sem murmuração”; cf. RB 34,6; 35, 13; 40, 8s; 53, 18.
Trabalhar em comum é, para São Bento, um valor, tanto que os monges culpados de faltas graves são excomungados não só da oração e da refeição comunitárias, mas também do trabalho com os irmãos: “Que seja suspenso da mesa e do oratório o irmão culpado de faltas mais graves… Esteja sozinho no trabalho que lhe for determinado” (Rb 25, 1.3).
A Regra de São Bento, portanto, formou os monges (e, consequentemente, a sociedade) no sentido da diligência e da disciplina do trabalho. De  modo especial, ela incutiu (e incute) dois valores muito estimados no mundo industrial moderno:
– a pontualidade. São Bento não transige a respeito. Prevê sérias punições para quem chega atrasado à oração litúrgica ou ao refeitório (RB 43); ao sinal dado de madrugada, levantem-se todos sem demora (Rb 22); quem recebe uma ordem, deve executá-la prontamente (Rb 5);
– atenção ao que se faz. São Bento formula uma norma decisiva: “Controlar a todo momento os atos de sua própria vida. Actus vitae suae omni hora custodire” (RB 4,48). É preciso, pois, estar presente de corpo e alma àquilo que se faz, sejam grandes, sejam pequenas coisas. A Regra prevê punições leitura, à qual todos devem prestar atenção, de modo que ninguém converse e só se ouça a voz do leitor (RB 38, 5). Haja absoluta limpeza, especialmente na cozinha (RB 35,6-11). A perda ou a quebra de qualquer objeto durante o trabalho requer satisfação da parte de quem comete a falha (RB 46, 1-4).
São Bento também pede que os monges não se entristeçam se a necessidade do lugar ou a pobreza exigirem que se ocupem em trabalhos extraordinários, “porque então são verdadeiros monges se vivem do trabalho de suas mãos, como também os nossos Pais e os Apóstolos” (RB 48,8).
Estes princípios de ordem ascética, inspirados pelo amor à disciplina do Evangelho, contribuíam para que os mosteiros se tornassem grandes centros agrícolas e artesanais em toda a Idade Média, irradiando em torno de si amor ao trabalho, organização e método modelares para a posteridade. Essa sistemática não tinha em vista simplesmente produção e lucro materiais, mas era inspirada pelo espírito de fé e apoiada em razões monásticas. Assim, por exemplo, um texto do século XI explica por que foi adotado um moinho de água na comunidade: “…a fim de que os monges tenham mais tempo para dedicar-se à oração”.
Em seu afã de trabalhar para exercer disciplina e evitar a ociosidade (inimiga da alma), os monges dedicaram-se a quase todas as atividades produtivas: exploraram minas de carvão, salinas, metalurgia, marcenaria, construção… Assim, por exemplo, os monges cistercienses fabricaram fornos para produzir tijolos grandes, dotados de furos para facilitar a sua cozedura e manipulação; eram os chamados “tijolos de São Bernardo!. Montaram na Borgonha fábricas de telhas, que eles espalharam por diversas regiões.
Aliás, a própria Regra de São Bento pede que o mosteiro tenha em suas dependências tudo de que necessita para viver: “Seja o mosteiro construído de tal modo que todas as coisas necessárias, isto é, água moinho, horta e os diversos ofícios se exerçam dentro do mosteiro, para que não haja necessidade de que os monges vagueiem fora, pois de nenhum modo isto convém às suas almas” (RB 66,6s). Ora esta norma da Regra não podia deixar de ser forte estímulo para a criatividade dos monges. O capítulo 57 da mesma Regra trata dos artesãos que, com a autorização e a bênção do Abade, trabalham no mosteiro como monges, e pede que os preços dos respectivos artefatos sejam mais baixos do que os preços do comércio de fora: “Quanto aos preços, não se insinue o mal de avareza, mas venda-se sempre um pouco mais barato do que pode ser vendido pelos seculares, para que em tudo seja Deus glorificado” (RB 57, 7-9).
Sabemos ainda que em 1215 os maiorais da Inglaterra, tanto leigos quanto clérigos, obtiveram do rei João sem Terra o reconhecimento da Magna Carta (Libertatum), Grande Carta das Liberdades, que promulgava direitos da população e que se tornou o fundamento da Constituição liberal da Inglaterra e o embrião dos posteriores sistemas políticos parlamentares. Ora, um século antes disto, em 1115 a Ordem Cisterciense¹ concebera o sistema de governo mais prático que se conhece: o Capitulum Generale (Capítulo Geral), assembleia internacional da qual fazem parte representantes de todos os mosteiros e dotada de poder legislativo. A instituição do Capitulum Generale foi adotada por Ordens e Congregações Religiosas posteriores e tornou-se modelo para o regime de muitas sociedades de caráter  internacional.
É preciso ainda apontar duas características da mentalidade medieval, de grande importância na história subsequente.
Duas notas marcantes
Confiança na razão
Para os medievais, o mundo era obra de um Deus sábio e lógico, distinto do próprio mundo (em oposição a todo panteísmo). Por conseguinte, o mundo lhes aparecia como algo que pode ser conhecido pelo homem mediante a sua razão; não é um fantasma nem uma armadilha. Dizia no século XII o teólogo francês Guilherme de Conches: “Deus respeita as próprias leis”. E no século seguinte Santo Alberto Magno (+ 1280) afirmava: “Natura est ratio. A natureza é a razão ou é racional”. Em consequência, os estudiosos medievais se aplicaram ao raciocínio e à pesquisa (como a podiam realizar na sua época) com plena confiança no acume da razão, sem, porém, cair no racionalismo, pois acima da razão admitiam as luzes e as verdades da fé…
Um dos exemplos mais clássicos desse tipo de estudiosos é o inglês Rogério Bacon (1214-1294), chamado “Doutor Admirável”. Ingressou na Ordem dos Franciscanos em 1257 e pôs-se a comentar as obras de Aristóteles. Posteriormente dedicou-se à pesquisa científica, recorrendo a um método experimental, que foi precursor do método adotado por Francis Bacon (1561-1626); assim procedendo, fez descobertas no setor da ótica. Planejou diversas invenções mecânicas: máquinas a vapor, barcos máquinas voadores… Em seus escritos encontrou-se uma fórmula da pólvora, que ele pode ter tomado dos árabes numa época em que os europeus quase não a conheciam. Deixou obras famosas: Opus Maius, Opus Minus e Opus Tertium.
Os resultados dessa confiança dos medievais na razão humana fizeram-se sentir nos séculos subsequentes: em 1608 contavam-se mais de cem Universidades na Europa e nenhuma no resto do mundo (exceto na América Latina, onde os espanhóis expandiam a sua cultura). Dessas Universidades, mais de oitenta tiveram origem na Idade Média, como genuína expressão da cultura medieval. Diz-se com razão que as Universidades e as catedrais exprimem autenticamente a Idade Média; na verdade, os medievais atingiram o primado mundial de altura de cúpula na catedral de Amiens (1221), com 42,30 metros, mede 142 metros de altura: só foi ultrapassada pela Torre Eiffel de Paris em 1889, com 320 metros.
Dinamismo
A Escritura Sagrada transmite aos seus leitores uma atitude dinâmica em relação ao universo que os cerca. Logo em suas primeiras páginas formula o desígnio divino: “Façamos o homem à nossa imagem, como nossa semelhança; domine sobre os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos, todas as feras e todos os répteis que rastejam sobre a terra” (Gn 1, 26). E após a criação do homem se lê a ordem divina: “Enchei a terra e submetei-a; dominai sobre os peixes do mar, as aves do céu e todos os animais que rastejam sobre a terra” (Gn 1, 28).
O salmo 8, por sua vez, canta o poder do homem sobre os seres que o cercam:
“Que é o homem para que dele te recordes?… e o filho do homem, para que dele tenhas cuidado? Não obstante, Tu o fizeste um pouco inferior aos anjos…e lhes deste poder sobre as obras de tuas mãos, tudo colocaste debaixo dos seus pés”.
No Novo Testamento lê-se que Cristo, ao encerrar sua missão pública, mandou aos apóstolos que fossem pregar o Evangelho no mundo inteiro; cf. Mt 28, 18-20.historiaigrejadademedia
Por conseguinte, a atitude do esforço, da luta, do empreendimento, da resposta ao desafio…é muito familiar ao cristão. Pode-se dizer que foram os cristãos que realizaram os progressos da ciência (tenha-se em vista o mundo ocidental comparado com o oriental ou asiático e africano!), as grande aventuras da conquista intelectual, econômica, marítima… Foram otimistas e dinâmicos, conseguindo belos e valiosos resultados.
Estas poucas observações são suficientes para percebermos a notável contribuição do Cristianismo para o avanço da cultura, da ciência e da civilização… na história da humanidade. E, dentro do Cristianismo, merece certamente relevo especial o monaquismo ocidental tal como São Bento (+ 547) o concebeu e a Ordem Cisterciense, com São Bernardo à frente, o desenvolveu.
***
¹ Citaremos a Regra de São Bento usando a sigla RB; os números seguintes indicarão respectivamente capítulo e versículo(s). A abreviatura Prol significa Prólogo.
É de notar que não sem motivo o Papa Paulo VI em 1964 declarou São Bento “Patrono do Ocidente”. Este deve muitos dos seus valores aos escritos e à obra de São Bento.
¹Cisterciense é o monge Cister; segue a Regra de São Bento tal como foi entendida pelos reformadores de Cister, entre os quais está São Bernardo de Claraval (+ 1153).
Revista: “PERGUNTE E RESPONDEREMOS”
D. Estevão Bettencourt, osb
Nº 347 – Ano – 1991 – p. 177

Um cristão da Idade Média

cidMedievalescolaA maior dificuldade para se estudar e entender bem a História, em especial a História bimilenar da Igreja, é saber compreender os acontecimentos do passado com a mentalidade da época em que aconteceram, para se ter um juízo perfeito dos fatos. Se quisermos julgar os fatos do passado com a mentalidade de hoje, cometeremos graves injustiças. Infelizmente isso acontece, e muito, com historiadores movidos mais por razões ideológicas, especialmente os “politicamente corretos”, que para atender ás suas ideologias distorcem o significado dos acontecimentos. É comum isso em alguns autores ligados à teologia da libertação.
O historiador Arlindo Rupert diz com muita propriedade o seguinte:histigrejamediamenor
“Se quisermos compreender a história, sentir as atitudes dos nossos maiores, muitas delas para o homem de hoje chocantes e paradoxais, procuremos estudar a mentalidade de cada época, o sentido social do tempo, os critérios em que se estribava a legislação vigente… Assim poderemos entender melhor certos episódios históricos, tais como a chamada intolerância religiosa, a inquisição, a distinção entre cristão-novo e cristão-velho, o fato da escravatura… Aliás, nós homens do findar do século XX somos, com frequência, assaz ingênuos e incoerentes. Condenamos episódios passados que nos parecem monstruosos e calamos fenômenos históricos em adições contemporâneas ainda mais volumosas e cruéis, porque apresentados sob o disfarce de intenções aparentemente legítimas ou em nome de leis sociais que parecem validas e aceitáveis” (A Igreja no Brasil, vol. I, Santa Maria, 1981, pg. 17).
Como disse L.M. Carli, “O verdadeiro progresso jamais condena as suas fases anteriores; passa de um bem para outro melhor, sem, porém, considerar um mal aquilo que antigamente era um bem” (A Igreja Viva, São Paulo, 1971, p. 125). O homem moderno condena com facilidade e rapidez levianas a Idade Média, sem conhece-la.
Na Idade Média, formou-se a Cristandade, depois de seis séculos de longos e árduos trabalhos da Igreja, que foi a única Instituição que ficou de pé. Ela educou e evangelizou aquela massa bárbara que dominou Roma definitivamente em 476, quando o bárbaro Odoacro derrubou o último imperador romano do Ocidente, Rômulo Augustulo. A Europa se transformou num mosaico de povos bárbaros lutando entre si e disputando os despojos romanos. Nesses seiscentos anos toda a Europa foi evangelizada, mas dentro da cultura de época, ainda com forte conotação e violência bárbara. O povo convertido ao cristianismo amava a Igreja, lotava as grandes e majestosas catedrais e respeitavam os dogmas, mas não tinha ainda um comportamento moral adequado; o Sermão da Montanha não tinha ainda mudado os costumes bárbaros de outrora.
Para se ter ideia desta realidade, conto aqui um episódio narrado por Daniel Rops em sua coleção sobre a História da Igreja. Conta ele que um bárbaro convertido ao cristianismo, tendo-se separado da esposa, e querendo desposar outra mulher, foi pedir autorização a um bispo para isso, o que lhe foi negado. De pronto o homem puxou da espada para cortar a cabeça do bispo. Quando este inclinou a cabeça, o bruto lhe disse: não vou lhe dar a honra do martírio; e guardou a espada.historiaigrejadademedia
É um episódio marcante. De um lado o cristão ainda bruto acreditava no céu, no martírio e na sua beleza; de outro lado vivia uma vida ainda sem respeitar a moral. Este fato ajuda-nos a compreender um pouco a mentalidade cristã da Idade Média. É claro que nela houve grandes santos e santas, S. Francisco de Assis, S. Domingos de Gusmão, S. Gregório Magno, S. Columbano, S. Beda Venerável e tantos outros que viveram a moral impecável.
Sem entender isso não é possível entender porque havia a intolerância religiosa por parte de todos, a Inquisição, as Cruzadas, etc. Muito juízo errado se faz do passado por não se conhecer sua cultura e a base de suas leis.
Prof. Felipe Aquino

História da Igreja: Introdução à Idade Média


Nome e limites 
IdadeMediaO nome “Idade Média” foi criado pelos autores liberais do século XVI para designar o período que vai da antiguidade clássica até o Renascimento nos séculos XV/XVI (escolhemos, por convenção, o ano de 1450 como término da idade Média). Esta expressão devia, na mente dos seus criadores, designar uma etapa da história, sem cultura; o nome não revela a essência dessa época; apenas diz que foi traço de união (obscuro e insignificante, como diziam) entre a brilhante cultura greco-romana e o ressurgimento desta no século XV. Em nossos dias, embora se conserve a denominação, reconhece-se que a idade Média produziu valores culturais de primeira grandeza e duradouros: forjou ânimos heroicos (os cavaleiros, os monges…), produziu notáveis estudos especulativos (tenham-se em vista as Universidades Medievais e seus grandes doutores), produziu obras de arte até hoje admiradas (o estilo românico, o gótico, o teatro…), progrediu no campo da ciência e da técnica (especialmente no da navegação…). Os estudiosos contemporâneos que têm estudado os documentos e monumentos medievais, vem trazendo a tona testemunhos que dissipam os preconceitos sobre a idade Média e põem em relevo as suas notas positivas.
O ponto de partida da Idade Média é o fim do século VII. As invasões bárbaras abriram uma nova época na vida política, cultural e eclesiástica do Ocidente. É verdade que os bárbaros começaram suas invasões no Império Romano já no século III da nossa era; todavia só a partir do século VIII exerceram influxo preponderante no desenrolar da história. É preciso, porém, reconhecer que os séculos IV/VII foram séculos de transição lenta, durante a qual elementos da história medieval já subsistiam ao lado dos da história antiga.histigrejamediamenor
Foram, pois, as relações dos novos povos com a igreja que deram a nota própria à Idade Média, ou seja, ao período de tempo que vai do século VIII ao século XV. Este último representa a dissolução do espírito medieval mais ou menos homogêneo, pois foram então trazidos à baila elementos da cultura greco-romana, que os renascentistas quiseram não somente estudar, mas assimilar e viver, dando origem a nova fase da história, impregnada de mentalidade e conduta ética sempre menos cristãs, tendente ao naturalismo e ao racionalismo (Idade Moderna, que vai até o Tratado do latrão em 1929).
A Igreja e os povos germânicos
O início da Idade Média tem de comum com o início da Idade Antiga o fato de que Igreja, em ambos os casos, se via diante de um mundo não cristão, com o qual ela devia travar relações para poder viver: eram, de um lado, o Império Romano pagão, e, de outro lado, os povos germânicos que tinham derrubado o Império. Todavia dentro dessas situações comuns salientam-se diferenças importantes:
No início da Idade Antiga, a Igreja era um grãozinho de mostarda, que se encontrava com três culturas muito diversas: a judaica, a grega e a romana; só aos poucos, pela força que lhe era imanente, o Cristianismo conseguiu vencer e assimilar esses três elementos adversos.
No início da Idade Média, ao contrário, o grãozinho esta evoluído; é um organismo forte, que não se encontra com uma potência que lhe possa fazer frente no campo da cultura. Os germanos eram culturalmente pobres; a Igreja, que tinha seu centro em Roma, representava, para eles, a cultura simplesmente dita; cultura (civilização) e Roma ainda eram termos equivalentes no fim da Idade antiga.
Aconteceu, portanto, que os novos povos, postos em contato com a Igreja através dos missionários, não só abraçaram a fé cristã, mas também a civilização mais elevada que lhes era transmitida pelo Cristianismo. Na Idade Antiga a Igreja só conseguiu imprimir traços cristãos a uma cultura já existente sobre bases pagãs. A Igreja medieval, ao contrário, elaborou desde os fundamentos uma cultura e um ambiente de vida conformes ao espírito cristão (embora a fraqueza, humana também se exercesse na Idade Média): o curso do ano civil passou a ser designado pela ocorrência das etapas eclesiásticas; o fluxo da semana culminava no domingo (dia do Senhor); as etapas do dia eram divididas pelo toque dos sinos; a configuração das cidades dependia de posição de igreja ou do mosteiro que ficava no centro do povoado; as leis eram abertas com a profissão de fé no Deus Trino (…) Em consequência, a cultura européia na Idade Média se tornou unitariamente cristã.
Esta penetração da Igreja na vida civil fez-se notar especialmente no setor da política: Estado e Igreja se viram intimamente associados na procura de algo que, por causa da fragilidade humana, nunca pôde ser devidamente realizado: a Cidade de Deus, em que o Papado e o Império deveriam colaborar entre si para implantar o espírito do Evangelho em todas as manifestações da vida pública. Assim em 800 sob Carlos Magno foi instaurado o Sacro Império Romano da Nação Franca, que tentou viver o regime dito “de cristandade”, mas foi prejudicado pelo cesaropapismo do Imperador. O prestígio dos francos foi de pouca duração, cedendo em 962 ao Sacro Império Romano da Nação Alemã, inaugurado por Oto o Grande. O próprio Papado, por razões óbvias e compreensíveis, passou a ter o seu território independente (o Estado Pontifício) a partir de 756 – o que provocou litígios com os Imperadores germânicos; estas divergências em vez de redundar na construção de uma única sociedade cristã de âmbito universal, prepararam a ruptura religiosa entre a nação alemã, representada por Lutero, e o Papado no século XVI.
Já que os germanos não tinham sistemas filosóficos a opor ao Cristianismo, abraçaram a fé cristã numa atitude objetiva e fiel. Isto explica que a Idade Média não tenha conhecido grandes heresias. Houve, sim, controvérsias sobre o Adopcionismo (resquício do Nestorianismo) na Espanha do século VIII (…) sobre a predestinação no século IX (…) sobre a Eucaristia nos séculos IX e XI (…) sobre a maneira de viver a pobreza no século XIV (…). Pode-se dizer, porém, que os medievais usufruíram tranquilamente das luzes projetadas definitivamente sobre as grandes verdades da fé pelos Concílios dos primeiros séculos.
Os germanos não deixaram de trazer sua contribuição para a configuração de Igreja e da sociedade medievais:
– o espírito corporativo. Os novos povos organizavam sua vida segundo famílias, tribos, povos, alianças de povos, corporações econômicas, confraternidades religiosas (…). Ora as corporações formaram a trama da vida medieval: corporações de artes, ofícios, profissões liberais, estudantes, associações religiosas (…). A própria instituição do Império, na idade Média, era concebida como a maior das corporações, que tinha por fim manter a paz na Europa. – No mundo romano, ao contrário, o senso corporativo desaparecia diante do senso despótico: uma cidade aos poucos dominava as demais cidades; as associações não eram bem vistas, mas constituíam iniciativas de direito privado apenas;
– a fantasia e o afeto. Estes marcaram profundamente a devoção medieval e a sua mística exuberante (Mestre Eckhart, ? 1327; João Teuler, ? 1361; Henrique Suso, ? 1366; Matilde de Magdeburgo, ? 1285; S. Ângelo de Foligno, ? 1309, S. Catarina de Sena, ? 1380). A piedade popular tornou-se rica em manifestações nem sempre devidamente iluminadas pela razão e pela fé (crença fácil em fenômenos demoníacos, em aparição de defuntos, em eficácia de bruxaria …). O contato com a Terra Santa decorrente das Cruzadas imprimiu à devoção dos fiéis grande amor à santíssima humanidade de Cristo com sua Paixão dolorosa (daí o percurso da Via Sacra mesmo fora da Terra Santa); a consideração da infância de Jesus e da figura da Virgem dolorosa também conheceu grande incremento entre os medievais.
O ambiente geográfico da Idade Média
Além das invasões germânicas, outro acontecimento de grande importância na Idade Média foi o cisma bizantino (1054): os cristãos do Oriente, em geral foram-se separando dos do Ocidente, formando comunidades eclesiais autocéfalas na Ásia Menor (Bizâncio), na Grécia, na Rússia (…).
O Cisma foi, desde remotas épocas, preparado por tensões de ordem política, linguística e cultural. Já a transferência da capital do Império de Roma para Constantinopla fez que, aos poucos, esta cidade assumisse o título de Segunda Roma, com direitos e prerrogativas iguais ou superiores aos da antiga Roma; os mal-entendidos foram abrindo brechas crescentes entre os dois hemisférios da Cristandade.
O Cisma reduziu enormemente o cenário geográfico da História da Igreja medieval. Ademais as regiões não separadas foram recobertas pelos invasores muçulmanos, que, além de ocupar o Oriente próximo, penetraram o Norte da África e a Península Ibérica. Assim o quadro da história da Igreja se reduziu aos países romano-germânicos, ânglicos, escandinavos e eslavos: Itália, França, Península Ibérica, Inglaterra, Alemanha, Escandinávia, Polônia e um ou outro território a Leste da Europa. Aliás, o deslocamento da história do Oriente para o Ocidente, verificado na história da Igreja, é fenômeno da história universal; com efeito, notemos que a civilização originária da Mesopotâmia passou para a Síria, a Palestina, o Egito; atravessou a Grécia e tomou sua sede mais notória em Roma; todavia, enquanto o Oriente ia perdendo seu poder exterior e político, continuava a reger cultural e religiosamente o Ocidente (os próprios judeus, tendo perdido sua independência política no Oriente, comunicaram ao Ocidente o seu depósito religiosa).
Notemos, porém, que, se o Oriente saiu do cenário da história medieval, ele não deixou de ter sua importância para a Igreja como tal: 1) porque a capital do Império Oriental, Constantinopla, foi sempre um muro forte, que, durante toda a idade Média, protegeu o Ocidente cristão contra as invasões dos não cristãos, possibilitando à Igreja Ocidental ter a sua vida livre; 2) porque o Oriente sempre cultivou os valores mais antigos e tradicionais do Cristianismo (a Liturgia e a contemplação, o monaquismo, a literatura dos Padres de Igreja); o Oriente, portanto, sempre foi um manancial, onde os latinos se abeberaram e revigoraram.
Os cristãos orientais, embora muito prejudicados pela invasão muçulmana, continuaram a desenvolver sua vida eclesial sem grandes mudanças. Por isto se diz que não tiveram Idade Média.
Costuma-se dividir a Idade Média em três períodos:historiaigrejadademedia
1) Idade Média Ascendente (692-1054);
2) Idade Média Alta (1054-1294);
3) Idade Média Decadente (1294-1450).
Na Idade Média Ascendente temos um período de formação, em que a Igreja vai penetrando aos poucos a vida dos povos germânicos e constituindo com eles a cultura medieval. Surge o Estado Medieval, um único e grande Império, que congrega germanos e romanos em duas fases sucessivas: a dos carolíngios (francos) e a dos otônicos (germânicos). O Estado assume uma consagração eclesiástica (unção do Imperador); a partir de 800 procura realizar o ideal de um Santo Império, o da Civitas Dei sob Carlos Magno. Por seu lado, a Igreja assume oficialmente uma missão política: é criado em 756 o Estado Pontifício na Itália, e muitos bispos são incumbidos de funções sociais e políticas junto aos senhores do seu tempo. Todavia nesse entrelaçamento de Estado e Igreja é o Estado quem predomina – o que aparece no mal das Investiduras e da simonia. – O que caracteriza este período, é o universalismo:… na política (um só grande Império, que quer continuar o Império Romano universal), … na religião (o Papa é o único Chefe religioso no Ocidente).
Na Alta Idade Média, a Igreja, tendo-se arraigado na vida europeia, luta para libertar-se do braço secular, e luta com sucesso sob a reforma monástica de Cluny e o Papa Gregório VII (1073, Canossa). O Papa alcança um prestígio que até então nunca tivera na vida interna da Igreja e nas relações com os soberanos seculares. A vida eclesiástica floresce em muitas manifestações brilhantes: novas Ordens Religiosas, figuras de místicos, sábios e doutores que ilustram as grandes Universidades do século XIII (século áureo da Escolástica), monumentos majestosos de arte românica e gótica (…).
Na Idade Média Decadente, o universalismo homogêneo, objetivo, que caracterizava as duas épocas anteriores, cede a particularismo e nacionalismo na vida política (dissolve-se o Império universal para dar lugar a Estados pequenos nacionais); cede também ao individualismo ou ao esquecimento da Tradição na vida cristã. Esse nacionalismo e esse individualismo passaram funestamente aos séculos posteriores; os povos evangelizados e disciplinados pela Igreja nos séculos florescentes da idade Média voltaram-se aos poucos, com progressiva violência, contra Ela. As principais manifestações dessa época são: o Exílio de Avinhão (1305-78), que significa lamentável sujeição do Papado ao poder francês, e o Grande Cisma Ocidental (1378-1417), que confundiu as ideias sobre o primado romano e suscitou uma série de teorias eclesiológicas aberrantes da Tradição. A própria disciplina da Igreja cedeu a relaxamento. Estes fatores prepararam, cada qual a seu modo, a cisão protestante no século XVI.

História da Igreja: A figura de Joana D´Arc


Joana
Os precedentes
O cenário histórico em que aparece Joana d’Arc, é o da guerra dita “dos Cem Anos” (1337-1453) entre a França e a Inglaterra.
Em 1415 Henrique V da Inglaterra invadiu a França com o intuito de derrubar o rei Carlos VI. Os invasores encontraram apoio da parte da Borgonha, cujo duque Filipe o Bom reconheceu Henrique V da Inglaterra como legítimo soberano da França; ao mesmo tempo, Carlos VI, cuja saúde mental estava abalada, deserdou seu filho e nomeou o monarca inglês herdeiro e regente do país. Em 1422, morreram Henrique V e Carlos VI. o filho deste, Carlos VII fez-se coroar em Poitiers, e estabeleceu sua corte em Bourges, enquanto os ingleses caminhavam em território francês e assediavam a cidade de Orleães. Carlos VII era figura fraca, que nada fazia para deter os invasores, mas, ao contrário, permitia que homens ineptos e gozadores dirigissem o seu povo.
Foi então que entrou em ação uma jovem de 17 anos, que prometia salvar a França.
lntervenção de Joana
Joana nasceu em Domrémy, de família camponesa, aos 6 de janeiro de 1412. Não aprendeu a ler e escrever, mas possuia profundo senso religioso. Aos 13 anos de idade, começou a ouvir certas vozes, que ela identificou com as de S. Miguel Arcanjo, S. Catarina de Alexandria e S. Margarida de Antioquia, virgem e mártir; exortavam-na a ir socorrer a França.
A este propósito já se põe uma questão debatida: as revelações que Joana anunciava e que se repetiram até a sua morte, não terão sido mero fenômeno de alucinação? – Note-se que a alucinação significa um estado patológico, fonte de falsos juízos e de comportamento moral descontrolado. Ora em toda a conduta de Joana d’Arc não há vestígios de prostração física nem de aberração intelectual ou de incoerência de dizeres e atitudes; ao contrário, clarividência e firmeza notáveis se manifestaram. Torna-se, por conseguinte, difícil, se não ilógico, sustentar a tese das “alucinações”.
Somente três anos mais tarde, em 1428, a jovem resolveu atender aos apelos celestes. Um tio levou-a então à presença do capitão Robert de Baudricourt, delegado do rei em Vancouleurs. Vendo-a, o oficial desprezou-a, devolvendo-a a seu pai; este ameaçou afogá-la. Joana voltou a procurar o capitão, impressionando-o por sua energia. Roberto mandou-a ter com o rei Carlos VII, acompanhada por uma escolta de seis homens, que deviam defendê-la na caminhada por estradas perigosas. A donzela pediu e obteve também um cavalo e trajes masculinos (mais adaptados à missão militar que ela empreendia). Chegando em Chinon aos 6 de março de 1429, Joana identificou o rei dissimulado entre os seus cortesões. Logo lhe pediu soldados para ir levantar o cerco de Orleães. Todavia aquela jovem de 17 anos, vestida de trajes masculinos, não inspirava confiança. Tendo insistido, Joana foi submetida a interrogatórios e exames sobre a fé e a moral pelo espaço de três semanas; já que o laudo resultou favorável, Carlos VII reconheceu o possível valor do empreendimento de Joana.
A situação para a França era tão grave que somente uma intervenção do céu poderia salvar a nação. O rei concedeu-lhe então um pequeno batalhão destinado a ir socorrer a sitiada cidade de Orleães, que estava para cair. Joana não combateria, mas estimularia os guerreiros, empunhando um estandarte branco, sobre o qual estava a figura de Cristo entre dois anjos. Finalmente, aos 8 de maio de 1429 os ingleses muito imprevistamente levantaram o cerco de Orleães, dando entrada na cidade a Joana d’Arc e sua tropa.
Assim vitoriosa, a jovem quis levar Carlos VII a Reims para que recebesse a sagração régia – o que se deu a 17 de julho de 1429. Ao lado do monarca, a benemérita heroína Ihe disse então: “Gentil roi, maintenant est faict le plaisir de Dieu (…) Gentil rei, agora está feito o prazer de Deus”.
Joana dava por finda a sua missão, quando o rei Ihe pediu continuasse a guerra. A donzela, dócil, muito se empenhou pela reconquista de Paris, mas aos 23 de maio de 1430, perto de Compiégne, foi presa pelos burgúndios, aliados dos ingleses. Estes a compraram pelo preço de 10.000 francos-ouro, e a levaram para Ruão, onde Joana deveria ser julgada. Aos ingleses interessava não apenas manter a donzela encarcerada, mas também destruir o seu prestígio aos olhos do público. – Este plano haveria de ser executado mediante pretextos religiosos que, para os homens da época, eram os mais persuasivos.
Mentalidade do século XV
Não se poderiam entender adequadamente o processo e as maquinações empreendidos contra Joana d’Arc se não se levasse em conta a mentalidade de ingleses e franceses da época:
a) Joana dera à sua missão militar um caráter religioso, dizendo que Deus queria por seu intermédio libertar a França. – Por conseguinte, os inimigos, para desprestigiá-la, tentariam demonstrar que Joana de modo nenhum podia ser enviada de Deus, por estar sob a influência do demônio, como herege, bruxa, impostora, etc. – Caso isto ficasse comprovado, também o rei Carlos VII perderia a sua autoridade; seria evidente que se aliara a uma filha de Satanás, por obra da qual havia sido sagrado. Os franceses poderiam então perder a esperança de obter a vitória final.
b) A mentalidade popular da época era levada a crer que vitória obtida em guerra era sinal de que Deus apoiava o vencedor. Ora os ingleses haviam conseguido um triunfo retumbante em Azincourt (1415), onde cinco mil guerreiros tinham prostrado toda a cavalaria francesa, lutando um soldado contra seis cavaleiros. Tão fulgurante vitória, pensava-se, só teria sido alcançada com a colaboração do céu; donde podiam muitos concluir que Joana contradizia ao curso dos acontecimentos sobre o qual Deus já proferira o seu juízo.
c) A própria conduta de Joana se prestava a deturpações… As calamidades que assolavam a França havia cerca de 75 anos, excitavam a imaginação popular, provocando o surto sucessivo de falsos taumaturgos e visionários. Como naquela hora se distinguiria Joana de uma Catarina de la Rochelle ou do pastor Guilherme de Gévaudan, comprovadas vítimas da ilusão? – Além disto, o espírito medieval podia facilmente escandalizar-se com a figura de uma jovem vestida de cavaleiro a cavalgar junto com uma tropa de soldados; ora tal era o caso de Joana. Ninguém concebia que uma virgem cristã se pudesse apresentar nesses termos. Compreende-se então que muitos dos contemporâneos da heroína se tenham podido iludir a seu respeito.
d) Será preciso levar em conta também a colaboração da Universidade de Paris, setor de grande autoridade, que os ingleses ganharam para a sua causa. O espírito que então animava os professores dessa instituição, não era muito sadio. Tendiam a considerar-se os luzeiros da S. Igreja; os mais moderados entre eles ficavam céticos ao ouvir falar de Joana; muitos, porém, lhe eram energicamente contrários. A pobre camponesa, com seus poucos anos de idade, deixava-se guiar por pretensas visões mais do que pelas idéias dos professores; queira passar por mais perita do que os capitães do exército, sem pedir vênia nem autorização aos doutos lentes!
À luz destas características da mentalidade da época, analisemos agora.
O desfecho da história de Joana
Os ingleses, tendo que apelar para motivos religiosos na sua ação contra a jovem guerreira, encontraram apoio valioso na pessoa do bispo de Beauvais, Pierre Cauchon, todo devotado à causa dos invasores e, por isto, refugiado em Ruão, território possuído pelos ingleses.
Não foi difícil encontrar pretexto para se iniciar um processo contra Joana: as suas apregoadas mensagens celestiais forneciam fundamento a acusações de bruxaria e heresia! Cauchon foi constituído presidente do respectivo tribunal. Para dar ao júri o aspecto e a autoridade de tribunal da Inquisição (tribunal oficial da S. Igreja!), chamaram a participar da mesa o Vice-inquisidor de Ruão, Jean Lemaitre. Cauchon convidou ainda grande número de assessores e jurados, aos quais o governo inglês fez saber que tinha meios para os coagir, caso rejeitassem participar do processo; 113 juristas aceitaram a intimação, dos quais 80 pertenciam à Universidade de Paris.
O júri era de todo ilegítimo, pois Cauchon não tinha sobre Joana nem a autoridade de bispo diocesano nem a de legado pontifício. A Santa Sé não fora em absoluto informada da constituição de tal tribunal.
Contudo o processo foi encaminhado. A jovem sofreu maus tratos físicos e morais; submetida a interrogatórios capciosos, que visavam a arrancar-lhe a confissão de heresia e superstição, respondeu sempre com simplicidade e nobreza; chegou a apelar para o Santo Padre: “Peço que me leveis à presença do Senhor nosso, o Papa: diante dele responderei tudo o que tiver que responder Tudo que eu disse, seja levado a Roma e entregue ao Sumo Pontífice, para o qual dirijo o meu apelo!” Em vão, porém, apelou.
Finalmente, após peripécias diversas, Joana foi fraudulentamente condenada qual herege, relapsa, apóstata, idólatra. Entregue ao braço secular, sofreu a morte pelas chamas aos 30 de maio de 1431, enquanto olhava para o Crucifixo e orava. Na última manhã de sua vida, ainda dizia Joana a Cauchon: “Eu morro por causa de V.S.; se me tivésseis colocado nos cárceres da Igreja (….), isto não teria acontecido.”
A opinião pública viu-se profundamente abalada pelo ocorrido. Apesar de todas as acusações, a massa do povo ainda tinha Joana na conta de vítima da injustiça de seus inimigos. Consequentemente, pouco depois de entrar solenemente em Ruão (dezembro de 1449), o rei Carlos VII deu início a uma revisão do processo condenatório, revisão que terminou favorável a jovem. Seguiu-se em 1445 o inquérito pontifício, já que Joana fora abusivamente sentenciada em nome da Inquisição: após numerosos interrogatórios, o arcebispo de Reims, aos 7 de julho de 1456, perante numerosa assembléia de clérigos e leigos em Ruão, publicou a conclusão do “processo do processo”, reabilitando a memória da donzela.
De modo oficial e solene, a Igreja restaurou a memória de Joana d’Arc, reconhecendo-lhe os méritos e a santidade em 1920.
histigrejamediamenorPor que tanto se fez esperar essa completa reabilitação?
Os tempos que se seguiram ao ano de 1456, foram de reação contra o espírito e a vida da Idade Média: na época da Renascença o adjetivo “gótico” vinha a ser sinônimo de “bárbaro”; quebravam-se os vitrais das catedrais para substitui-los por vidraças brancas; o famoso poeta Pierre de Ronsard (?1585), imitador dos clássicos gregos e latinos, qualificava o período medieval de “séculos grosseiros”; mais tarde, Voltaire (.?1778) e ainda Anatole France (? 1924) mostravam-se diretamente infensos à jovem guerreira de Domrémy. Foi preciso que a opinião pública em geral proferisse um juízo mais objetivo sobre a Idade Média para se pensar em exaltar a figura tão caracteristicamente medieval de Joana d’Arc.
Em conclusão: A condenação de Joana d’Arc é fato histórico profundamente doloroso. Jamais, porém, poderá ser considerado fora do contexto do séc. XV, que bem o marca e ilumina.
Trata-se de um processo inspirado por interesses políticos e nacionais e justificado perante a opinião pública do séc. XV mediante pretextos religiosos (pretextos que podiam impressionar naquela época). Lamentavelmente houve prelados e clérigos que se prestaram ao papel de juízes de Joana d’Arc. Não procederam, porém, em nome da autoridade suprema da Igreja, mas, sim, por autoridade a eles conferida pelo rei da Inglaterra.
Entende-se, pois, que a S. Igreja, de maneira oficial e solene, tenha procedido à reabilitação e canonização de Joana d’Arc.
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Por D. Estevão Bettencourt,osb

A escrita bíblica


Os livros da Bíblia foram escritos em três línguas muito antigas: o hebraico (todos os livros protocanônicos do AT), aramaico (Ev. Mateus); grego (livros do NT).
deadseascrollO hebraico era escrito sem vogais até o século VII dC. Somente nos séculos VII a X dC, os rabinos judeus fizeram a vocalização do texto hebraico introduzindo as vogais (texto massorético). O leitor colocava mentalmente as vogais entre as consoantes, o que podia gerar dúvidas. Por exemplo,  a palavra “ah”, podia significar irmão, primo ou parente. O hebraico não tinha superlativo e não separava as palavras.
O aramaico era parecido com o hebraico, falado pelos arameus, comerciantes na Mesopotâmia; adotado pelos judeus desde o século V aC; foi a língua falada por Jesus. O hebraico aos poucos ficou apenas sendo usado  no culto divino. O grego era a língua de um  povo culto; era falada em todo o império romano, e foi muito usada por escritores judeus, uma vez que este povo se espalhou por todo o império.
Os escritores antigos não dividiam o texto sagrado em capítulos e versículos. Os cristãos é que o fizeram para fazer as citações e para a Liturgia. Eusébio de Cesaréia (†340) dividiu os Evangelhos em 1162 capítulos. Na idade média, o arcebispo Estêvão Langton, de Cantuária (†1228), distribuiu o texto latino do AT e do NT em capítulos; esta divisão foi introduzida no texto hebraico do AT e no texto grego dos LXX e do NT e está em uso até hoje.
A divisão dos capítulos e versículos como temos hoje é do século XVI. Santes Pagnino de Lucca (†1554) dividiu o AT e o NT em versículos numerados. Roberto Estêvão, tipógrafo francês,  refez a distribuição do NT em 1551.
Os textos da Bíblia foram escritos em material frágil (pergaminho ou papiro); por isso, os originais se perderam ou não se conservaram; mas temos cópias dos originais.
Com a descoberta dos manuscritos de Qumran, em 1947, em Israel, às margens do Mar Morto, que datam do século I aC e I dC, foi possível recuar mil anos na tradição manuscrita. Antes de 1947 não possuíamos cópias dos textos hebraicos do AT anteriores aos séculos IX/X depois de Cristo; tínhamos apenas os manuscritos da idade média, e viu-se que há identidade com os documentos descobertos em Qumran, o que quer dizer que os textos se foram transmitindo fielmente através dos séculos. Isto se deu porque os judeus guardavam ciosamente a sua literatura religiosa e não permitiam que ela se deteriorasse.
Os gêneros  literários
Como a Bíblia é a Palavra de Deus, escrita no linguajar humano, ela utiliza dos gêneros literários que são os artifícios das linguagens dos homens para se expressar. O gênero literário a ser usado depende do assunto a ser transmitido. Eis alguns tipos: leis, genealogias, oráculos proféticos, poemas, poesia, parábolas, epopéias, orações, hino litúrgico, sermões, conto de amor, salmo, relato histórico (santa Ceia, por exemplo), crônicas, midraxe, cartas, fábulas, apocalipse, etc; para cada caso temos um jeito de escrever.
Cada gênero literário tem a sua forma de interpretação própria; ora, não se pode interpretar o texto de uma lei da mesma forma que uma parábola! É por isso que não se pode interpretar  a Bíblia ao pé da letra; daí surgem muitos erros. É preciso lembrar também que a Bíblia foi escrita num intervalo de tempo de aproximadamente 14 séculos, 1400 anos, desde o séc XIII aC. até  o século I depois de Cristo.escoladafeii
Isto implica em conceitos diferentes dos nossos; portanto, não se pode ler a Bíblia com a mesma mentalidade e valores do nosso tempo. Algo que era normal naquele tempo pode hoje nos parecer um absurdo; mas Deus quis usar o homem para transmitir a sua Palavra.
Na Bíblia não há erros; esses são parte de quem a interpreta. Muitas vezes o que para nós hoje tem um sentido, para o autor sagrado quer dizer outra; às vezes ele está usando apenas um artifício de linguagem e nós interpretamos ao pé da letra. Daí a dificuldade de se interpretar certas partes da Escritura. Por isso Jesus deixou o Sagrado Magistério da Igreja (Papa e bispos) para que a sua interpretação não tenha erro.
Prof. Felipe Aquino

História da Festa de Corpus Christi


No final do século XIII surgiu em Lieja, Bélgica, um Movimento Eucarístico cujo centro foi a Abadia de Cornillon fundada em 1124 pelo Bispo Albero de Lieja. Este movimento deu origem a vários costumes eucarísticos, como por exemplo, a exposição e bênção do Santíssimo Sacramento, o uso dos sinos durante a elevação na Missa e a festa do Corpus Christi.

Santa Juliana de Mont Cornillon, priora da Abadia, foi escolhida, por Deus para criar esta Festa. A santa desde jovem teve uma grande veneração ao Santíssimo Sacramento. Esperava que algum dia tivesse uma festa especial ao Sacramento da Eucaristia. Este desejo, conforme a tradição foi intensificado por uma visão que teve da Igreja sob a aparência de lua cheia com uma mancha negra, que significava a ausência dessa solenidade.

Juliana comunicou esta imagem a Dom Roberto de Thorete, bispo de Lieja, também ao douto Dominico Hugh, mais tarde cardeal legado dos Países Baixos e Jacques Pantaleón, mais tarde o Papa Urbano IV. A festa mundial de Corpus Christi foi decretada em 1264, 6 anos após a morte de irmã Juliana em 1258, com 66 anos. Santa Juliana de Mont Cornillon foi canonizada em 1599 pelo Papa Clemente VIII.

Dom Roberto não viveu para ver a realização de sua ordem, já que morreu em 16 de outubro de 1246, mas a festa foi celebrada pela primeira vez no ano seguinte, na quinta-feira após à festa da Santíssima Trindade. Mais tarde um bispo alemão conheceu os costumes e o levou por toda atual Alemanha.

Milagre de Bolsena
Certa vez, quando o padre Pedro de Praga, celebrou uma Missa na cripta de Santa Cristina, em Bolsena, Itália, aconteceu um milagre eucarístico: da hóstia consagrada começaram a cair gotas de sangue sobre o corporal após a consagração. Alguns dizem que isto ocorreu porque o padre teria duvidado da presença real de Cristo na Eucaristia.

O Papa Urbano IV (1262-1264), que residia em Orvieto, cidade próxima de Bolsena, onde vivia S. Tomás de Aquino, informado do milagre, então, ordenou ao Bispo Giacomo que levasse as relíquias de Bolsena a Orvieto. Isso foi feito em procissão. Quando o Papa encontrou os fiéis caminhando na entrada de Orvieto, teria então pronunciado diante da relíquia eucarística as palavras: “Corpus Christi”.

Ainda hoje se conservam, em Orvieto, os corporais onde se apóia o cálice e a patena durante a Missa e também se pode ver a pedra do altar em Bolsena, manchada de sangue.

Instituição da Festa
O Santo Padre movido pelo prodígio, e pelo pedido de vários bispos, fez com que se estendesse a festa do Corpus Christi a toda a Igreja por meio da bula “Transiturus” de 8 setembro do mesmo ano, fixando-a para a quinta-feira depois da oitava de Pentecostes.

O decreto de Urbano IV teve pouca repercussão, porque o Papa morreu logo em seguida (2 de outubro de 1264), um pouco depois da publicação do decreto, prejudicando a difusão da festa. Mas o Papa Clemente V tomou o assunto em suas mãos e, no Concílio Geral de Viena (1311) ordenou mais uma vez a adoção desta festa.

Em 1317 é promulgada uma recopilação de leis, por João XXII, e assim a festa é estendida a toda a Igreja. Na diocese de Colônia na Alemanha, a festa de Corpus Christi é celebrada antes de 1270.
Procissão
Na paróquia de Saint Martin em Liège, em 1230, quando começou as homenagens ao Santíssimo Sacramento a procissão eucarística acontecia só dentro da igreja. Em 1247, aconteceu a primeira procissão eucarística pelas ruas de Liège, já como festa da diocese. Depois se tornou festa nacional na Bélgica.

Nenhum dos decretos fala da procissão com o Santíssimo como um aspecto da celebração. Porém estas procissões foram dotadas de indulgências pelos Papas Martinho V e Eugênio IV, e se fizeram bastante comuns a partir do século XIV.

Finalmente, o Concílio de Trento declara que muito piedosa e religiosamente foi introduzido na Igreja de Deus o costume, que todos os anos, o santíssimo seja levado em procissão pelas ruas e lugares públicos.

Todo católico deve participar dessa Procissão por ser a mais importante de todas que acontecem durante o ano, pois é a única onde o próprio Senhor sai às ruas para abençoar as pessoas, as famílias e a cidade.

Tapetes, arte e religiosidade
Em muitos lugares criou-se o belo costume de enfeitar as casas com oratórios e flores e as ruas com tapetes ornamentados, tudo em honra do Senhor que vem visitar o seu povo.

No dia dedicado ao Corpo de Deus (Corpus Christi), várias cidades brasileiras, organizam procissões, que percorrem as ruas enfeitadas com tapetes. A confecção de tapetes de rua é uma magnífica manifestação de arte popular

Utilizando diversos tipos de materiais, como serragem colorida, borra de café, farinha, areia e alguns pequenos acessórios, como tampinhas de garrafas, flores e folhas, as pessoas montam, com grande arte, um tapete pelas ruas, formando desenhos relacionados ao Santíssimo.

Por este tapete passa a procissão, o sacerdote vai á frente carregando o ostensório e em seguida pelas pessoas que participam da festa. Tudo isto tem muito sentido e deve ser preservado.osegredodasagradaeucaristia

Devoção no Brasil
A tradição de fazer o tapete com folhas e flores vem dos imigrantes açorianos. Essa tradição praticamente desapareceu em Portugal continental, onde teve origem, mas foi mantida nos Açores e nos lugares em que chegaram seus imigrantes, como por exemplo Florianópolis-SC.

As procissões portuguesas eram esplendorosas: tropas, fidalgos, cavaleiros, andores, danças e cantos. A imagem de São Jorge, padroeiro de Portugal, seguia a procissão montada em um cavalo, rodeada de oficiais de gala.

O barroco enriqueceu esta festa com todas as suas características de pompa. Em todo o Brasil esta festa adquiriu contornos do barroco português. Corpus Christi é celebrado desde a época colonial com uma abundância de cores. A tradição de enfeitar as ruas surgiu em Ouro Preto, cidade histórica do interior de Minas Gerais.

Prof. Felipe Aquino

História da Igreja: O Século XI – Gregório VII


A primeira metade do século XI
Os primeiros decênios do século XI ainda foram humilhantes para o Papado; ver capítulo 19. O despreparo moral dos que subiram à cátedra de S. Pedro, em boa parte, se devia à intromissão de grupos estranhos, que lutavam entre si para manipular o Papado: os nobres de Roma e arredores, os príncipes de Espoleto e da Toscana, os Imperadores da Germânia. Não poucos dos Papas da época obscura da Igreja foram homens de vida digna e doutrina ortodoxa, sufocados, porém, pela ingerência de facções civis. – O povo de Deus tinha consciência dos males que afetavam seus pastores: as crônicas de Liutprando de Cremona, tidas como tendenciosas, dão a entender que entre os cristãos havia horror perante os insucessos do Papado; estimavam o Papa e percebiam o hiato entre o ideal e a realidade.
Pode-se dizer que a réplica à dolorosa situação começa com a eleição do bispo Suidgero de Bamberga, que tomou o nome de Clemente II (1046-47). Os romanos conferiram então ao Imperador o título de Patrício Romano, que permitia ao monarca designar o Papa nas próximas vacâncias da sede pontifícia. Esta ficava, mais do que nunca, subordinada à ação do Imperador. Este estado de coisas não duraria muito, pois não era o ideal. Clemente II iniciou a obra de reforma da disciplina da Igreja, mas faleceu prematuramente.
S. Leão IX (1048-1054) foi um dos mais dignos Papas da história, dotado de energia e do desejo de reforma. Chamou para junto de si conselheiros de diversas regiões, entre os quais o monge Hildebrando, de Cluny, que ele constituiu arquidiácono e tesoureiro da Igreja Romana. Três males afetavam o clero na época, prejudicando duramente a vida da Igreja:
1) as investiduras leigas. Os bispados eram feudos ou territórios que deviam vassalagem ao monarca. Quando  o senhor feudal era um leigo nobre, este desenvolvia a política que atendia aos seus interesses e aos de sua família, não raro em oposição ‘a política do rei ou Imperador. Ao contrario, quando o senhor feudal era um bispo, este, não tendo descendentes, era mais disposto a colaborar com o soberano; além do que, morto o bispo, o feudo voltava ao monarca, que tinha a liberdade de instituir o senhor feudal do seu agrado. Por isto os reis e Imperadores da época praticavam abusivamente o que se chamava “a investidura leiga”, isto é, nomeavam os bispos e conferiam-lhes as insígnias do poder temporal; ficava à Igreja apenas a tarefa de conferir a ordem sacra ao nomeado, isto é, o báculo e a mitra. Como se compreende, este costume, que teve origem no reino dos francos, acarretava não raro a escolha de bispos sem vocação, mais políticos do que pastores. – A Igreja tinha que se libertar de tal abuso;
2) a simonia ou a compra e a venda de bispados e outros bens eclesiásticos. Este mau costume estava frequentemente ligado ao anterior;
3) o nicolaísmo (ver Ap 2,6.15) ou o concubinato dos clérigos.
São Leão IX viajou pela Itália, a França e a Alemanha, disseminando, com resultado, os princípios de renovação da disciplina eclesiástica. O Papado assim ganhou prestígio e autoridade.
A obra iniciada por S. Leão IX devia frutificar plenamente no pontificado de S. Gregório VII.
S. Gregório VII e Canossa
No mesmo dia do enterro de seu antecessor Alexandre II, aos 22/04/1073, foi aclamado Papa, pela voz do povo romano, o cardeal-arquidiácono Hildebrando, com o nome de Gregório VII. Os cardeais eleitores confirmaram o voto popular.
Gregório era nativo da Toscana. Fez-se monge na famosa abadia de Cluny (França). que era um foco ardente de piedade e virtude. Quando S. Leso IX passou por esse mosteiro, levou consigo o jovem monge, que serviu à Igreja sob cinco Papas consecutivos. Era homem ardoroso e enérgico, que tinha um grande programa, ao qual consagrou toda a sua vida: estabelecer a reta ordem, na qual os reis e príncipes, sob o primado do Papa, colaborassem concordes na construção de uma sociedade cristã. Era este, aliás, o ideal já acalentado por S. Agostinho (? 430) na sua obra “Da Cidade de Deus” e, depois, por S. Gregório Magno (590-604) e S. Nicolau I (858-67). Duas palavras condensavam o programa de Gregório VII: justiça (o direito de Deus) e paz (a união do poder eclesiástico e do poder civil); o Papa dizia que, como o corpo humano é dirigido por dois olhos, assim a Igreja deve ser guiada pelo Sacerdócio e o Império em harmonia.
A intenção de Gregório se formulava como se segue: “Que a Santa Igreja, Esposa de Deus, Senhora e Mãe Nossa, retomando o seu brilho originário, permaneça livre, casta e católica (universal)” (epístola 46).
Na execução deste plano, Gregório era movido por um zelo sincero, que se, depreende das seguintes palavras: “Muitas vezes roguei ao Senhor Jesus que ou me tire desta vida ou me torne útil à Mãe de todos” (Registr. II 49).
Quando Gregório assumiu o pontificado, o rei Henrique IV da Alemanha estava excomungado, pois mantinha contatos com bispos simoníacos, que haviam sido excomungados. Além disto, era ameaçado por uma revolta dos saxões. Por isto prestou penitência e prometeu colaborar com o Papa na reforma da disciplina.
Logo em 1074 Gregório VII reuniu um Sínodo no Latrão (Roma), que (l) proibia o exercício do ministério a todo clérigo simoníaco; 2) proibia a celebração da Liturgia a qualquer clérigo fornicador, e exigia dos fiéis que não participassem das cerimonias celebradas por um concubino. Estas normas tinham suas raízes em determinações de Concílios regionais dos séculos IV/VI. Nada inovavam, portanto, embora a praxe contrária estivesse muito espalhada.
No seguinte Sínodo (1075) Gregório deu mais um passo, voltando-se contra a investidura leiga; a liberdade da Igreja exigia a instituição canônica dos bispos em lugar da nomeação por príncipes seculares, e exigia que a Igreja dispusesse dos seus bens sem impedimentos.
Esta legislação devia levar a um conflito com Henrique IV. Em junho de 1075 o Imperador conseguiu vencer os saxões e esqueceu quanto prometera ao Papa: ocupou e distribuiu bispados da Itália, inclusive o de Milão, que não estava vago, e voltou a se relacionar com seus conselheiros excomungados. Diante disto, o Papa propôs conversações a Henrique, ao mesmo tempo que o ameaçava de excomunhão e deposição, caso se mostrasse recalcitrante. O monarca respondeu convocando um Sínodo para Worms (janeiro 1076), que, com a participação de 26 bispos, declarou o Papa deposto; Henrique mesmo escreveu um violento manifesto “a Hildebrando, não Papa, mas falso monge”, exortando-o, a título de Patrício Romano, a descer da cátedra apostólica. Mais: numa carta ao povo romano, o Imperador estimulava os fiéis a fazer nova eleição papal. Num Sínodo de Piacenza, os bispos locais consentiram na sentença de Worms.
Gregório, porém, estava apoiado por diversas correntes de cristãos. Intrépido, no Sínodo quaresmal de 1076 pronunciou a excomunhão sobre Henrique, desligou os seus súditos do juramento de fidelidade e proibiu a obediência ao soberano excomungado. Os bispos favoráveis a Henrique foram suspensos ou excomungados.
Henrique percebeu então que sua posição era arriscada. A maioria dos bispos e dos príncipes leigos da Alemanha resolveram considerá-lo deposto, caso não estivesse absolvido da excomunhão dentro de um ano. Em conseqüência, o rei, em pleno inverno de 1077, desceu à Itália e foi bater às portas do castelo da Condessa Matilde em Canossa (Apeninos), para onde o Papa se tinha retirado. Passou três dias consecutivos (25-27/01/1077), diante das portas, descalço e revestido de cilícios, pedindo a absolvição; depois de longas conversações, nas quais Matilde e o abade Hugo de Cluny (padrinho de Henrique) patrocinaram a causa do monarca, o Papa no quarto dia concedeu ao rei a reconciliação e a Eucaristia. O Imperador jurou ainda submeter seu litígio com os príncipes alemães ao arbítrio do Papa.
Gregório VII, ao absolver Henrique, foi movido por intenções pastorais, e não políticas. A humilhação do monarca redundaria em vantagens para este, porque de certo modo o reabilitava e fortalecia perante os príncipes alemães.
Os príncipes e bispos alemães, que se tinham oposto a Henrique, não se deram por satisfeitos com a absolvição deste; por causa de interesses políticos, queriam desembaraçar-se do rei. Em conseqüência, elegeram rei o duque Rodolfo da Suábia, que logo prometeu ao Papa obediência e eleições canônicas. Assim estourou a guerra civil na Alemanha, que terminou com a vitória de Henrique. Este exigiu do Papa a excomunhão do seu adversário e ameaçava eleger um antipapa, caso não fosse atendido. Gregório VII não se dobrou, mas o Sínodo quaresmal de 1080 de novo excomungou Henrique e desligou os súditos do juramento de fidelidade; além disto, renovava a proibição de investidura leiga.
A segunda excomunhão de Henrique não causou a mesma impressão que a primeira. A maioria dos bispos alemães colocou-se do lado do rei. Este, assim apoiado, conseguiu que um Sínodo em Brixen decretasse a excomunhão e a deposição do Papa acusado de simonia, heresia, necromancia e subversão da ordem! Em seu lugar, foi eleito o antipapa Clemente III (1080-1 100). Este foi logo excomungado por Gregório VII; Henrique desceu então com suas tropas para a Itália e em 1083, após três anos de cerco e distribuição de muito dinheiro, logrou apoderar-se de Roma, exceto o Castel Sant’Angelo, onde se refugiara o Papa. Este justificava sua resistência perseverante, dizendo: “Evidentemente é mais nobre lutar durante muito tempo em favor da liberdade da Santa Igreja do que submeter-se a mísera e diabólica servidão” (Registr. VIII 26).
O antipapa Celemente III, secundado por treze cardeais, foi instalado no palácio do Latrão e na Páscoa de 1084 coroou Henrique Imperador na basílica de São Pedro.
Gregório VII parecia condenado a cair nas mãos dos adversários, quando lhe foi em auxílio o duque normando Roberto de Guiscard. O numeroso exército de Roberto obrigou os alemães a se afastar de Roma. Todavia o saque também sofrido por obra dos normandos excitou grandemente a população contra Gregório; este, consequentemente, não pôde mais permanecer na sua cidade, mas teve de se refugiar em Salerno (Itália meridional), que estava sob domínio normando (1085). No seu exílio, o Papa gozava de liberdade; em fins de 1084 reuniu um Sínodo, que renovou a excomunhão de Clemente III e Henrique IV; depois disto, mandou legados a diversos países para proclamarem a sentença.historiaigrejadademedia
Em 1085, Gregório, alquebrado por muitas fadigas, mas de ânimo ainda enérgico, veio a falecer. Atribuem-lhe como últimas palavras: “.Dilexi iustitiam e odivi iniquitatem; propterea morior in exsilio. – Amei a justiça e odiei a iniquidade; por isto morro no exílio”. A morte no exílio não era senão uma derrota aparente: o plano de purificação e libertação da Igreja não seria mais entravado; os sucessores de Gregório colheram os frutos que este semeou; o Papado cresceu em prestígio moral, jurídico e político, devendo atingir o apogeu da sua influência nos tempos de Inocêncio III (1198-1216).
Num juízo objetivo, deve-se dizer que Gregório VII foi um dos maiores Papas da Idade Média, embora tenha sido combatido posteriormente como ditador e imperialista. Soube subordinar todos os interesses da Santa Sé à sua função pastoral, pois não hesitou em absolver e reabilitar o adversário que havia de desferir o golpe mortal contra o Papa; soube ser um mau político para ser um bom Sacerdote; desde que, em consciência, julgou que Henrique podia merecer a reconciliação, concedeu-lha, ainda que em detrimento dos interesses temporais do Papado. Na realidade, Gregório procurou dar a César o que é de César: aspirou a criar, dentro de um Estado cristão, a harmonia entre o poder espiritual e o temporal; haveria a existência paralela do Sacerdócio e do Império, cada qual colaborando em sua esfera para realizar a síntese da Cidade de Deus: o Estado deveria proteger materialmente a Igreja, e esta haveria de sustentar espiritualmente o Estado. Tais princípios estão espalhados pela ampla correspondência deixada por Gregório.
O pontificado de Gregório VII teve outros aspectos, além do que foi até aqui apresentado. O Papa não se descuidou da Igreja universal esparsa em toda a Europa, na Ásia e na África, como atestam as suas cartas; estas manifestam a amplidão de seus horizontes e a energia com que sempre abordou os desafios da sua missão. Foi o primeiro a conceber a ideia de uma Cruzada (coisa muito santa naquela época): A frente de grande exército, queria pessoalmente dirigir-se A Terra Santa, afim de libertar o Sepulcro do Senhor em Jerusalém e promover a união com os gregos cismáticos (1074); na sua ausência, confiaria o patrimônio da Igreja Romana ao rei Henrique IV da Alemanha – o que bem mostra quão pouco pensava em conflito no início do seu pontificado.
Você conhece a história da Batalha de Lepanto?
Saiba mais sobre um dos casos que se tornaram inesquecíveis na história da Igreja, marcado pela poderosíssima proteção de Nossa Senhora!
Somos o “Corpo de Cristo”, e Maria, Mãe de Cristo, logo é também a Mãe de seu Corpo que é a Igreja. É por essa razão que durante o Concílio Vaticano II o Papa Paulo VI declarou solenemente que: “Maria é Mãe da Igreja, isto é, Mãe de todo o povo cristão, tanto dos fiéis como dos Pastores” (discurso a 21 de novembro de 1964). Mais tarde, em 30 de junho de 1968, na Profissão de Fé, conhecida como o “Credo do Povo de Deus”, repetiu essa afirmação de forma ainda mais compromissiva:historiadaigrejaantiga (1)
“Nós acreditamos que a Santíssima Mãe de Deus, nova Eva, Mãe da Igreja, continua no Céu e sua missão maternal em relação aos membros de Cristo, cooperando no nascimento e desenvolvimento da vida divina nas almas dos remidos”. “O conhecimento da verdadeira doutrina católica sobre a Bem-aventurada Virgem Maria continuará sempre uma chave para a compreensão exata do mistério de Cristo e da Igreja”.
Para exemplificar a proteção poderosíssima de Nossa Senhora à Igreja, gostaria de citar um dos casos que se tornaram inesquecíveis na história da Igreja.
Um deles foi o da batalha de Lepanto, no mar da Grécia, em 1571, onde Maria se mostrou de fato a grande “Auxiliadora dos Cristãos”, título este que o Papa S. Pio V acrescentou na Ladainha Lauretana de Nossa Senhora, após a milagrosa vitória da esquadra cristã, organizada pelo Papa e comandada pelo Príncipe Dom João d’Áustria, sobre as forças muçulmanas, que ameaçavam invadir a Europa e escravizá-la ao Império Otomano.
São Pio V enviou para o Imperador uma bandeira, na qual estava bordada a imagem de Jesus crucificado. A preparação dos soldados consistiu em um tríduo de jejuns, orações e procissões, suplicando a Deus a graça da vitória, pois o inimigo não era apenas uma ameaça para a Igreja, mas também para a civilização. Tendo recebido a Santa Eucaristia, partiram para a batalha. No dia 7 de outubro de 1571, invocando o nome de Maria, Auxíliadora dos Cristãos, travaram dura batalha nas águas de Lepanto. Três horas de combate foram necessárias… A vitória coube aos cristãos, que ao grito de “Viva Maria”, hastearam a bandeira de Cristo.
O Papa mandou um cardeal benzer as armas dos soldados, pedindo que levassem o santo Rosário como a arma mais forte. Era uma guerra de legítima defesa da Europa invadida, depois que os turcos tomaram Constantinopla em 1453, e agora ameaçavam destruir o Ocidente cristão. Foi uma batalha decisiva. Os muçulmanos sempre tentaram, e ainda tentam destruir o cristianismo, e conquistar o mundo para Alá, pela força das armas, é a guerra santa: Jihad.
A Europa estremeceu, e estava em risco a civilização cristã e a religião católica, que custou tanto sangue dos mártires. S. Pio V implorou a proteção da Virgem Maria em favor do povo cristão, pedindo à Virgem que afastasse, de uma vez por todas, o perigo do islamismo ameaçador.
No dia 7 de outubro de 1571, na grande e temida batalha de Lepanto, na Grécia, os cristãos venceram definitivamente os turcos. As forças cristãs eram minoria, os turcos tinham cerca de trezentos barcos de guerra no mar da Grécia, mas, por ação de Nossa Senhora, milagrosamente, as forças turcas foram aniquiladas.
O Papa quis então demonstrar sua gratidão à Mãe da Igreja e dos homens, e mandou incluir na Ladainha a invocação, “Auxiliadora dos Cristãos, rogai por nós”.
A festa litúrgica de Nossa Senhora Auxiliadora, tão cara a D. Bosco, a quem ela apareceu em sonho na infância, veio com o Papa Pio VII, em 1816, depois de mais uma maravilhosa demonstração de carinho e proteção dela para com o Papa e a Igreja.
Napoleão era imperador da França e, por não ser atendido pelo Papa em seus desejos de grandeza que queriam subjugar a autoridade do Pontífice, mandou prendê-lo, submetendo-o a maus-tratos na prisão de Fontainebleau.
O Papa, sem nada poder fazer, recorreu à proteção de Nossa Senhora para não perder a coragem e não vacilar, prometendo-lhe, que, se saísse da prisão iria coroar a imagem de Nossa Senhora de Savona, por onde passara a caminho do cárcere.1012191_602753276421773_1864993989_n
Depois de um bom tempo Napoleão perdeu o trono, vencido nos campos de batalha, e foi feito prisioneiro na mesma prisão de Fontainebleau, onde mandara prender o Santo Padre. Ali assinou a rendição aos ingleses. Castigo de Deus.
O Papa pôde então sair da prisão; foi até Savona cumprir seu voto coroando a imagem de Nossa Senhora de Savona. Depois entrou em Roma, aplaudido pelo povo, carinhosamente. Em agradecimento a Maria, instituiu a festa de Nossa Senhora, fixando-lhe a data de 24 de maio, dia de sua entrada triunfal em Roma.
Esses fatos históricos, mostram que Maria não é apenas a protetora de cada um de nós, mas também da Santa Igreja que seu Filho lhe confiou aos pés da Cruz.
Prof. Felipe Aquino

Grandes Heresias

Desde o princípio da Cristandade, a Igreja sempre se confrontou e combateu os falsos ensinamentos ou heresias.
heresiasHoje em dia basta darmos uma olhada no catálogo telefônico para encontrarmos em qualquer cidade do mundo, uma denominação religiosa que nos diga exatamente aquilo que queremos ouvir. Algumas ensinam que Jesus não é Deus, ou que Ele é a única pessoa da Trindade, ou que existem muitos deuses (três dos quais são o Pai, o Filho e o Espírito Santo) ou que nós podemos nos tornar “deuses”, ou que uma pessoa uma vez salva, jamais poderá perder sua salvação, ou que não existe inferno, ou que o homossexualismo é apenas mais uma expressão da sexualidade humana, portanto um estilo de vida aceitável para um cristão, ou qualquer outro tipo de ensinamento.
A Bíblia nos advertiu que isso ocorreria. O Apóstolo Paulo avisou ao seu aluno Timóteo: “Porque virá o tempo em que os homens já não suportarão a sã doutrina da salvação. Levados pelas suas próprias paixões e pelo prurido de escutar novidades, ajustarão mestres para si. Apartarão os ouvidos da verdade e se atirarão às fábulas”. (2Tim. 4,3-4).
» O que é heresia?
Antes de darmos uma olhada nas grandes heresias da história da Igreja, cumpre-nos dar algumas palavras sobre a natureza da heresia. Isso é muito importante já que o termo em si carrega um forte peso emocional e frequentemente é mal utilizado. Heresia não significa o mesmo que incredulidade, cisma, apostasia ou qualquer outro pecado contra a fé. O Catecismo da Igreja Católica define a heresia do seguinte modo:historiadaigrejaantiga
“Incredulidade é negligenciar uma verdade revelada ou a voluntária recusa em dar assentimento de fé a uma verdade revelada. Heresia é a negação após o batismo de algumas verdades que devem ser acreditadas com fé divina e Católica, ou igualmente uma obstinada dúvida com relação às mesmas; apostasia é o total repúdio da fé cristã; cisma é o ato de recusar-se a submeter-se ao Romano Pontífice ou à comunhão com os membros da Igreja sujeitos a ele” (CIC  §2089).
Para ser culpado de heresia, uma pessoa deve estar obstinada (incorrigível) no erro. Uma pessoa que está aberta à correção ou que simplesmente não tem consciência de que o que ela está dizendo é contrário ao ensinamento da Igreja, não pode ser considerada como herética.
A dúvida ou negação envolvida na heresia deve ser pós-batismal. Para ser acusado de heresia, uma pessoa deve ser antes de tudo um batizado. Isso significa que aqueles movimentos que surgiram da divisão do Cristianismo ou que foram influenciados por ele, mas que não administram o batismo ou que não batizam validamente, não podem ser considerados heresias mas apenas religiões separadas (exemplos incluem Muçulmanos que não possuem batismos e Testemunhas de Jeová que não batizam validamente).
E, finalmente, a dúvida ou negação envolvidos na heresia devem estar relacionados a uma matéria que deve ser crida com “fé Católica e divina” – em outras palavras, alguma coisa que tenha sido definida solenemente pela Igreja como verdade divinamente revelada (por exemplo, a Santíssima Trindade, a Encarnação, a Presença Real de Cristo na Eucaristia, o Sacrifício da Missa, a Infalibilidade Papal, a Imaculada Conceição e Assunção de Nossa Senhora).
É especialmente importante saber distinguir heresia de cisma e apostasia. No cisma, uma pessoa ou grupo se separa da Igreja Católica sem repudiar nenhuma doutrina definida. Já na apostasia, uma pessoa repudia totalmente a fé cristã e não mais se considera cristã.
É interessante notar como, de uma forma ou outra, a imensa maioria destas heresias permanece…
Esclarecidas as diferenças, vamos dar uma conferida nas maiores heresias da história da Igreja e quando elas começaram:
» Os Judaizantes (Séc. I)
A heresia Judaizante pode ser resumida pelas seguintes palavras dos Atos dos Apóstolos 15,1: “Alguns homens, descendo da Judéia, puseram-se a ensinar aos irmãos o seguinte: ‘Se não vos circuncidais segundo o rito de Moisés, não podeis ser salvos'”.
Muitos dos primeiros Cristãos eram Judeus, e esses trouxeram para a Fé cristã muitas de suas práticas e observâncias judaicas. Eles reconheciam em Jesus Cristo o Messias anunciado pelos profetas e o cumprimento do Antigo Testamento, mas uma vez que a circuncisão era obrigatória no Antigo Testamento para a participação na Aliança com Deus, muitos pensavam que ela era também necessária para a participação na Nova Aliança que Cristo veio inaugurar. Portanto eles acreditavam que era necessário ser circuncidado e guardar os preceitos mosaicos para se tornar um verdadeiro cristão. Em outras palavras, uma pessoa deveria se tornar judeu para poder se tornar cristão.
Uma forma “light” desta heresia é a dos Adventistas de Sétimo Dia e outras seitas sabatistas.
» Gnosticismo (Séc. I e II)
“A matéria é má!” – Esse é o lema dos Gnósticos. Essa foi uma idéia que eles “tomaram emprestado” de alguns filósofos gregos e isso vai contra o ensinamento Católico, não apenas porque contradiz Gênesis 1,31: “Deus contemplou toda a sua obra, e viu que tudo era muito bom”, bem como outras partes da Sagrada Escritura, mas porque nega a própria Encarnação. Se a matéria é má, então Jesus não poderia ser verdadeiro Deus e verdadeiro homem, pois em Cristo não existe nada que seja mau. Assim muitos gnósticos negavam a Encarnação alegando que Cristo apenas “parecia” como homem, mas essa sua humanidade era apenas ilusória.
Alguns Gnósticos, reconhecendo que o Antigo Testamento ensina que Deus criou a matéria, alegavam que o Deus dos Judeus era uma divindade maligna bem diferente do Deus de Jesus Cristo, do Novo Testamento. Eles também propunham a crença em muitos seres divinos, conhecidos como “aeons” que servem de mediadores entre o homem e um inatingível Deus. O mais baixo de todos esses “aeons” que estava em contato direto com os homens teria sido Jesus Cristo.
Esta heresia permanece de maneira quase igual na chamada “Nova Era”. Em outras formas, aliás, ela não deixa de ser a heresia de base de muitas outras, como o protestantismo (com sua negação dos Sacramentos e da Maternidade Divina da Santíssima Virgem, decorrentes de uma visão gnóstica segundo a qual a religião verdadeira é puramente espiritual: Igreja invisível, sem meios visíveis de transmissão de graça etc.).
» Montanismo (final do Séc. II)
Montanus iniciou inocentemente sua carreira pregando um retorno à penitência e ao fervor. Todavia ele alegava que seus ensinamentos estavam acima dos ensinamentos da Igreja porque ele era diretamente inspirado pelo Espírito Santo. Logo, logo ele começou a ensinar sobre uma eminente volta de Cristo em sua cidade natal na Frígia. Seu movimento enfatizava sobretudo a continuidade dos dons extraordinários como falar em línguas e profecias.
Montano afirmava que a Igreja não tinha capacidade de perdoar pecados mortais. Esta heresia, de uma certa forma, está presente em muitas seitas atuais, cuja rigidez de costumes traz esta idéia no fundo. Um exemplo seria a “Assembléia de Deus”, ou até a seita suicida africana.
» Sabelianismo (Princípio do Séc. III)
Os Sabelianistas ensinavam que Jesus Cristo e Deus Pai não eram pessoas distintas, mas simplesmente dois aspectos ou operações de uma única pessoa. De acordo com eles, as três pessoas da Trindade existem apenas em referência ao relacionamento de Deus com o homem, mas não como uma realidade objetiva.
Esta visão também está presente em muitos movimentos “ecumênicos” protestantes atuais, especialmente entre as seitas mais antigas. Nosso Senhor para eles dissolve-se em uma vaga “divindade”.
» Arianismo (Séc. IV)
Uma das maiores heresias que a Igreja teve que confrontar foi o Arianismo. Arius ensinava que Cristo não era Deus e sim uma criatura feita por Deus. Ao disfarçar sua heresia usando uma terminologia ortodoxa ou semi-ortodoxa, ele foi capaz de semear grande confusão na Igreja, conquistando o apoio de muitos Bispos e a rejeição de alguns. O Arianismo foi solenemente condenado no ano 325 pelo Primeiro Concílio de Nicéia, o qual definiu a divindade de Cristo e no ano 381 pelo Primeiro Concílio de Constantinopla, o qual definiu a divindade do Espírito Santo. Esses dois Concílios deram origem ao Credo Niceno que os Católicos recitam nas Missas Dominicais.
Os “Testemunhas de Jeová” têm esta crença, assim como os Unitarianos.
» Pelagianismo (Séc. V)
Pelagius, um monge gaulês deu início a essa heresia que carrega seu nome. Ele negava que nós herdamos o pecado de Adão e alegava que nos tornamos pessoalmente pecadores apenas porque nascemos em solidariedade com uma comunidade pecadora a qual nos dá maus exemplos. Da mesma forma, ele negava que herdamos a santidade ou justiça como resultado da morte de Cristo na cruz e dizia que nos tornamos pessoalmente justos através da instrução e imitação da comunidade cristã, seguindo o exemplo de Cristo.
Pelagius declarava que o homem nasce moralmente neutro e pode chegar ao céu por seus próprios esforços. De acordo com ele, a graça de Deus não é verdadeiramente necessária, mas apenas facilita uma difícil tarefa.
É uma visão que ainda hoje encontramos na Teologia da Libertação, por exemplo: o que importa é o esforço do homem, a graça de Deus é bem vinda mas não é necessária, etc. É por isso que os TL dão tanto valor à “auto-estima”, nome chique para o pecado do Orgulho: para eles é importante amar A SI sobre todas as coisas, pois a salvação (ou a utopia socialista, no caso…) viria apenas através do esforço do homem.
» Nestorianismo (Séc. V)
Essa heresia sobre a pessoa de Cristo foi iniciada por Nestorius, bispo de Constantinopla que negava a Maria o título de Theotokos (literalmente “Mãe de Deus”). Nestorius alegava que Maria deu origem apenas à pessoa humana de Cristo em seu útero e chegou a propor como alternativa o título Christotokos (“Mãe de Cristo”).historiaigrejadademedia
Os teólogos Católicos ortodoxos imediatamente reconheceram que a teoria de Nestorius dividia Cristo em duas pessoas distintas (uma humana e outra divina, unidos por uma espécie de “elo perdido”), sendo que apenas uma estava no útero de Maria. A Igreja reagiu no ano 431 com o Concílio de Éfeso, definindo que Maria realmente é Mãe de Deus, não no sentido de que ela seja anterior a Deus ou seja a fonte de Deus, mas no sentido de que a Pessoa que ela carregou em seu útero era de fato o Deus Encarnado.
Creio que todo mundo já identificou o protestantismo pentecostal neste heresia, não? Bom, isso na verdade é, no protestantismo, apenas uma maneira a mais de menosprezar a Encarnação. Note-se que S. João escreveu seu Evangelho em resposta aos gnósticos, e fez questão de comecá-lo pela Encarnação. Isto ocorre porque a base gnóstica do protestantismo (e tbm, de uma certa maneira, do nestorianismo) recusa-se a admitir que Nosso Senhor tenha realmente assumido a nossa natureza. É por isso, por exemplo, que Lutero afirmava que o pecado do homem não é jamais apagado, mas apenas encoberto por Deus. Para ele, Nosso Senhor mentiria, afirmando que o homem não tem pecado, para que ele entre no Céu. É mais fácil para um gnóstico crer em um deus que minta que em um Deus que se faz verdadeiramente homem, com mãe e tudo.
» Monofisismo (Séc. V)
O Monofisismo originou-se como uma reação ao Nestorianismo. Os monofisistas (liderados por um homem chamado Eutyches) ficaram horrorizados pela implicação Nestoriana de que Cristo era duas pessoas com duas diferentes naturezas (divina e humana). Então eles partiram para o outro extremo alegando que Cristo era uma pessoa com uma só natureza (uma fusão de elementos divinos e humanos). Portanto eles passaram a ser reconhecidos como Monofisistas devido à sua alegação de que Cristo possuía apenas uma natureza (Grego: mono= um; physis= natureza).
Os teólogos Católicos ortodoxos imediatamente reconheceram que o Monofisismo era tão pernicioso quanto o Nestorianismo porque esse negava tanto a completa humanidade como a completa divindade de Cristo. Se Cristo não possuia a natureza humana em sua plenitude então Ele não poderia ser verdadeiramente homem e se Ele não possuía a natureza divina em plenitude, então Ele também não era verdadeiramente Deus.
Esta heresia persiste em alguns círculos católicos bem-intencionados, mas errados, que subestimam a importância da natureza humana de Cristo.
» Iconoclastas (Séc. VII e VIII)
Essa heresia surgiu quando um grupo de pessoas conhecidos como iconoclastas (literalmente, destruidores de ícones) apareceu. Esses alegavam que era pecaminoso fazer estátuas ou pinturas de Cristo e dos Santos apesar de exemplos bíblicos que provam que Deus mandou que se fizesse estátuas religiosas (por exemplo, em Ex 25,18-20 e 1Cr 28,18-19), inclusive representações simbólicas de Cristo (Num 21,8-9 e Jo 3,14).
Tem um em cada esquina hoje em dia…
» Catarismo (Séc. XI)
O Catarismo foi uma complicada mistura de religiões não-Católicas trabalhadas com uma terminologia Cristã. O Catarismo se dividia em muitas seitas diferentes que tinham em comum apenas o ensinamento de que o mundo tinha sido criado por uma divindade má (portanto toda matéria é má) e que por isso devemos adorar apenas a divindade do bem.
Os Albigenses formavam uma das maiores seitas Cátaras. Eles ensinavam que o espírito foi criado por Deus e que por isso era bom, enquanto o corpo teria sido criado pelo Mal, portanto o espírito deveria ser libertado do corpo. Ter filhos era considerado pelos albigenses um dos maiores males já que isso era o mesmo que aprisionar um outro “espírito” na carne. Obviamente o casamento era proibido, embora a fornicação fosse permitida. Tremendos jejuns e severas mortificações eram paticadas e seus líderes adotavam uma vida de voluntária pobreza.
Alguns aspectos da gnose cátara hoje são parte integrante da mentalidade geral em nossa sociedade: o horror à concepção, o amor à fornicação (infelizmente há católicos que aderem a esta mentalidade e praticam sem as necessárias razões graves a abstinência periódica de relações conjugais nos dias férteis)…
» Protestantismo (Séc. XVI)
Os grupos Protestantes se dividem em uma ampla variedade de diferentes doutrinas. Todavia, virtualmente todos alegam acreditar no princípio da Sola Scriptura (“apenas a Escritura” – idéia que defende o uso apenas da Bíblia ao formular sua teologia) e Sola Fide (“apenas pela Fé – a idéia de que somos justificados somente pela Fé). Apesar disso, existe pouca concordância sobre o que essas duas doutrinas-chave realmente significam. Por exemplo, Lutero acreditava que a fé salvífica é expressa pelo batismo, pelo qual, segundo ele, uma pessoa renasce e seus pecados são perdoados, ao passo que muitos Fundamentalistas alegam ser essa uma falsa pregação e que o batismo é meramente um símbolo.
A grande diversidade de doutrinas Protestantes advêm da doutrina do julgamento privado, a qual nega a infalível autoridade da Igreja e alega que cada indivíduo pode interpretar a Escritura por si próprio. Essa idéia é rejeitada pela própria Bíblia em 2Ped 1,20, que nos dá a primeira regra para a interpretação bíblica: “Antes de tudo, sabei que nenhuma profecia da Escritura é de interpretação pessoal”. Uma significante tática dessa heresia é a tentativa de confrontar a Igreja com a Bíblia, negando que o magistério possua qualquer autoridade infalível para ensinar ou interpretar as Escrituras.
A doutrina do julgamento privado resultou em um enorme número de diferentes denominações. De acordo com o The Christian Sourcebook, existiam aproximadamente 21,000 denominações em 1986, com 270 novas se formando a cada ano. Virtualmente todas elas são Protestantes.
» Jansenismo (Séc. XVII)
Jansenius, bispo de Yvres, França deu início a essa heresia num jornal em que ele escreveu sobre Santo Agostinho, no qual ele redefinia a doutrina sobre a graça. Entre outras doutrinas, seus seguidores negavam que Cristo morreu pela salvação de todos os homens, alegando que Ele havia morrido apenas por aqueles que serão finalmente salvos (ou seja, os eleitos). Este e outros erros Jansenistas foram oficialmente condenados pelo Papa Inocêncio X em 1653.
O jansenismo, infelizmente, é hoje encontrado em muitos meios ditos “tradicionalistas”. Este debate é frequentemente provocado pelas objeções que muitos fazem à má tradução do Cânon Romano, que traz “por todos” (e não “para muitos”) como tradução de “pro multis”. Esta tradução está errada como tradução, mas não é teologicamente errada, pois afirma ser o Sacrifício de Cristo suficiente para todos. Os neo-jansenistas, porém, afirmam que teologicamente também está errada.
» Modernismo (Séc. XX)
Os modernistas ensinam, essencialmente, que o homem é incapaz de compreender a realidade e que as “verdades” são meramente idéias relativas. Para o modernista não existem verdades absolutas. As doutrinas que foram infalivelmente definidas pela Igreja podem portanto serem mudadas com os tempos, ou rejeitadas ou reinterpretadas para se adaptarem às modernas preferências.
O Modernismo está entre as mais sérias heresias porque permite a uma pessoa rejeitar qualquer doutrina que foi definida, inclusive aquelas mais cêntricas como a divindade e ressurreição de Cristo. Essa heresia permite a reintrodução de todos os erros das heresias anteriores, bem como novos ensinamentos falsos que os antigos heréticos jamais imaginaram.HistóriadaIgrejaModernaeContemp
O Modernismo é especialmente grave porque ele frequentemente advoga suas crenças usando uma terminologia aproximadamente ortodoxa. O erro é frequentemente expresso através de uma nova interpretação simbólica, por exemplo: Cristo não ressuscitou fisicamente dos mortos, mas a história de sua ressurreição produz uma importante verdade. Uma das táticas mais comuns usadas pela maioria dos modernistas é insistir na premissa de que eles estão dando a interpretação ortodoxa das verdades do Catolicismo.
Da última vez que estive lá, o ninho desta espécie ficava na lista “católicos” da Summer.
As heresias sempre nos acompanharam desde o início da Igreja até os nossos tempos atuais. Geralmente elas sempre tiveram início por membros da hierarquia da Igreja, mas eram combatidas e corrigidas pelos Concílios e Papas. Felizmente temos a promessa de Cristo de que as heresias jamais prevalecerão contra a Igreja: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mat 16,18), pois a Igreja é verdadeiramente, nas palavras do Apóstolo Paulo, “coluna e sustentáculo da verdade” (1Tim 3,15).
Por: Gercione Lima
As Artes, as Letras, a Teologia e a Liturgia no século IV
602074_nA arte cristã se desenvolveu no século IV libertada das influências pagãs. Com a conversão de Constantino a arte cresceu em forma de basílicas, objetos cristãos, ornamentos evangélicos, mosaicos cristãos, etc. Prudêncio falou das basílicas de Constantino, com: “pinturas multicores, refletindo nos lagos o seu ouro […]. Tetos com vigas de ouro, que fazem de toda a sala como o nascer do sol. Nos vãos vitrais rutilantes, semelhantes a prados repintados de flores” (Rops, Vol. I, p. 517).
Os Padres da Igreja veem nesta arte uma utilidade apologética. Disse São Basílio que “o que a linguagem da história ensina pelo ouvido, mostra-o o silencioso desenho pela reprodução”. E São Gregório de Nissa disse que o desenho nas paredes “presta os maiores serviços” e o mosaico “torna dignas da história as pedras que pisamos com os pés”. Depois Victor Hugo chamou a catedral da Idade Média de a “Bíblia de Pedra”. Surge assim nas paredes das igrejas um “livro de piedade e espiritualidade” que poderão ler os iletrados. Nasce com esta arte um novo sistema de ensino e tradição onde a figura gloriosa de Jesus está no centro. As esculturas em baixo relevo são abundantes nas igrejas e nos sarcófagos. O Cristianismo orientou a arte para o louvor a Deus e a Lei de Cristo.hist_igreja_menor
Também as letras cristãs se desenvolveram, pois muitos intelectuais foram conquistados pelo Evangelho; e a literatura cristã foi substituindo a pagã. Os Padres da Igreja foram impregnados pelos clássicos antigos, como Virgílio, que Santo Ambrósio citava e imitava, mas fugindo de uma retórica vazia. Cícero era citado e imitado da mesma forma, mas com um novo espírito cristão.
Eusébio de Cesareia (265-340) erudito e estudioso, escreveu a sua História Eclesiástica, sem o qual não conheceríamos muitos acontecimentos dos três primeiros séculos. Escreveu também a Crônica ou História Universal, onde retomou a obra de Julio Africano e estabeleceu um paralelo entre a Bíblia e a história profana; e nos deixou a “Vida de Constantino”. Eusébio foi o precursor de outros historiadores cristãos como Sulpício Severo, Orósio, Sócrates, Sozomeno e Teodoreto.
Na poesia cristã teremos o nome do grande Prudêncio (348-410), advogado espanhol; e Santo Efrém com seus milhões de versos a Virgem Maria. Com os Padres da Igreja, em grande número, se desenvolveu a teologia, a exegese, a filosofia e outras disciplinas, tanto em Alexandria, como em Antioquia na Capadócia.
Às margens do Mar Negro, encontramos os gigantes “Padres da Capadócia”: São Basílio Magno, doutor da Igreja; seu irmão São Gregório de Nissa e o amigo São Gregório Nazianzeno, doutor da Igreja, que foram decisivos na elucidação do mistério da Santíssima Trindade. E na África teremos o gênio Santo Agostinho. São Jerônimo, de Roma, e São João Crisóstomo de Constantinopla, serão dois grandes personagens das letras cristãs.
No século IV a Igreja praticamente concluiu a definição dos Livros Canônicos. Em 367 d.C. na Páscoa, Santo Atanásio escreveu uma epístola onde relacionou os livros aceitos como canônicos pelos cristãos; no parágrafo 7 listou também os livros que hoje conhecemos como “deuterocanônicos” do Antigo Testamento [rejeitados pelos protestantes], deixando de lado apenas os livros dos Macabeus.
A Igreja estabeleceu o cânon bíblico mais tarde em 393 e 397, nos concílios regionais de Hipona e Cartago no tempo de Santo Agostinho e pelo Papa Inocêncio I (401-417), em 405, ao dirigir-se ao bispo de Tolosa.
Veremos nesse século surgir a força extraordinária do monaquismo que começou no Egito com Santo Antão e os “Padres do deserto”, e que foi levado para o Ocidente por Santo Atanásio em seu refúgio em Roma e por outros santos.
No século IV houve um grande marco litúrgico; as cerimônias tiveram mais precisão e solenidade com características próprias no Oriente e Ocidente, porém os mesmos elementos essenciais; as diferenças são apenas em pormenores. O Concílio de Niceia (325) falou dos quarenta dias da Quaresma em preparação da Páscoa. Foram fixadas as grandes festas da Páscoa, Ascensão do Senhor e Pentecostes. O Natal foi fixado no Ocidente para o dia 25 de dezembro para cristianizar e substituir a festa do deus Sol invictus, festa pagã da religião Mitra. No Oriente adotou-se a data de 6 de janeiro. E surgiu, sobretudo com São Basílio e Santo Ambrósio, o canto dos Salmos.
Nesse século havia uma vida sacramental considerável; os fiéis comungavam não só aos domingos, mas até quatro vezes por semana em Cesareia; e São Basílio Magno (330-369) incentivava a comunhão diária. Santo Ambrósio escreveu Os mistérios, sobre os Sacramentos, sobretudo insistiu na presença real de Cristo na Eucaristia após as palavras da consagração.
São Cirilo de Jerusalém (315-386) assim falava aos fiéis:
“Na cavidade da mão recebe o Corpo de Cristo; dize Amém e com zelo santifica os olhos ao contato do corpo santo […]. Depois aproxima-te do cálice. Dize Amém e santifica-te tomando o Sangue de Cristo. A seguir, toca de leve os teus lábios, ainda úmidos, com tuas mãos, e santifica os olhos, a testa e os outros sentidos.”
Santo Efrém Sírio (306-444) falava da Eucaristia como “Glória ao remédio da vida”. Santo Agostinho (354-430) a chamava de “o pão de cada dia, que se torna como o remédio para a nossa fraqueza de cada dia.” E ainda dizia:
“Ó reverenda dignidade do sacerdote, em cujas mãos o Filho de Deus se encarna como no Seio da Virgem. A virtude própria deste alimento divino é uma força de união que nos une ao Corpo do Salvador e nos faz seus membros a fim de que nos transformemos naquilo que recebemos.”historia_da_igreja_antiga
São Cirilo de Alexandria (370-444) dizia que ao comungarmos o Corpo de Cristo nos transformamos em “Cristóforos”, portadores de Cristo. Nesse século cresce também a veneração aos santos, que se iniciou nos séculos anteriores com o culto aos mártires.
Eusébio de Cesareia (260-340) diz:
“Temos o costume de nos reunir sobre os seus túmulos, de fazer ali as nossas orações e de honrar assim as suas almas bem-aventuradas.”
Surgem muitas jaculatórias, talvez a mais famosa dirigida ao Mestre: “Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tende piedade de nós!”.
Retirado do livro: História da Igreja, A Idade Antiga. Ed. Cléofas.

O que foram as Cruzadas?


Entenda o que, de fato, foram as Cruzadas que aconteceram na Idade Média
As “Cruzadas medievais” foram as expedições dos cristãos do Ocidente para libertar do domínio muçulmano o S. Sepulcro de Cristo em Jerusalém, que estava sendo destruído pelos turcos otomanos, muçulmanos. Começaram em 1095 e terminam em 1291, quando os turcos retomaram a Terra Santa. Não se pode entender um episódio do passado sem conhecer a mentalidade da época; senão cometemos grande injustiça.
A peregrinação a Jerusalém e aos lugares santos sempre foi uma das expressões de fé mais caras aos cristãos. No séc. IV a lmperatriz Helena, mãe de Constantino, foi à Palestina para descobrir e restaurar os testemunhos da vida, da morte e da ressurreição de Cristo, e ali construiu as grandes basílicas do Santo Sepulcro, da Natividade, da Anunciação e outras. São Jerônimo (†421), resolveu estudar a Bíblia na Terra Santa, estabelecendo-se na gruta de Belém. Aos poucos, no país de Jesus, foram surgindo numerosos mosteiros de homens e mulheres.
No séc. VII a expansão árabe muçulmana arrasou muitas comunidades cristãs na Síria, Palestina, Egito, norte da África, e Espanha em seguida. Jerusalém em 638 foi ocupada e, em parte, transformada em cidade Árabe muçulmana. As condições dos cristãos dali, e dos peregrinos, tornaram-se difíceis. O califa muçulmano Hakim, em 1009 mandou destruir a basílica do S. Sepulcro em Jerusalém e durante dez anos moveu perseguição a cristãos e judeus. Em 1071 Jerusalém caiu nas mãos dos Turcos seldjucitas. Os cristãos sofreram opressão, prisão, torturas, sequestros e mortes. Note, então, que toda violência, começou com os muçulmanos, e os cristãos agiram em legítima defesa.
O povo na Idade Média era profundamente cristão. Os valores da fé eram, o que fazia que a vida valesse a pena de ser vivida. E já havia as grandes Universidades de Paris (Sorbone), Oxford, Bolonha, Nápoles, etc. fundadas pela Igreja. Tudo que se ligasse com a fé, revestia-se de grande significado para os medievais.
Havia nessa época os famosos Cavaleiros, que serviam a Deus na bravura destemida, e até mesmo na guerra, quando a honra de Deus exigia a intervenção da espada. Eram como que “monges armados” que faziam voto de pobreza, obediência e castidade. Criaram-se assim as “Ordens militares” como os Templários e outras. Nestas o Cavaleiro se consagrava a Deus para O servir com destemor.
Sobre os Templários, dizia S. Bernardo († 1153): “Não sei se os devo chamar monges ou cavaleiros; talvez seja necessário dar-lhes um e outro nome, pois eles unem, à brandura do monge a coragem do cavaleiro” (De laude nova emilidae (IV,8).
O entusiasmo da fé explica que as multidões se prontificaram a partir para terras longínquas, desconhecidas, sujeitas a surpresas e ciladas, sem reabastecimento seguro, sem guias peritos, sem planos de viagem muito definidos, mas conscientes de que Deus o queria – “Deus lo volt”, foi o brado que no Concílio de Clermont, no ano de 1095, convocado pelo Papa Urbano II, deu origem às Cruzadas. Costuravam uma cruz de pano vermelho no ombro direito e partiam na fé.
Infelizmente, as ideias religiosas dos primeiros cruzados foram sendo, aos poucos, no decorrer de dois séculos, destruídas, de sorte que a imagem do Cavaleiro se foi modificando. Essa é a imagem que predomina em certos tratados sobre as Cruzadas.
Muitos pregadores puseram-se a percorrer a Europa, incitando os homens a participar. Grande multidão de ouvintes, de origem social diversa, assumiu então a cruz. Os expedicionários, provenientes da França, da Inglaterra, da Itália, eram dotados de benefícios espirituais pelo Papa; a quem ousasse violar ou roubar as suas propriedades durante a respectiva ausência, sofreria a pena de excomunhão.
Uma primeira Cruzada Popular, chefiada por Pedro o Eremita e Gualtero “sem Haveres”, fracassou, pois os seus membros ou pereceram na estrada ou foram exterminados pelos turcos. Foram afoitos e mal preparados.
A primeira Cruzada séria foi em 1096; quatro exércitos de senhores feudais chegavam a Constantinopla: Balduíno de Hainaut e Godofredo de Bouillon; os franceses do norte, da Normandia e os normandos da Itália. A cidade de Nicéia, perto de Constantinopla, foi reconquistada dos turcos, e voltou a ser domínio do lmperador bizantino. Após dois anos e meio de lutas os cruzados venceram o exército do califa Solimão em Doriléia e tomaram as importantes cidades de Edessa (1097) e Antioquia (1098), chegaram finalmente a Jerusalém e dela se apoderaram (1099). Essa sangrenta expedição custou a vida a cerca de meio-milhão de homens, terminou com a fundação de quatro centros latinos: o reino de Jerusalém, o principado de Antioquia, os condados de Edessa e de Trípolis, aos quais foram atribuídos governantes latinos. As grandes cidades da costa palestinense foram ocupadas por navegantes e comerciantes ocidentais. Os peregrinos recomeçaram a afluir à Terra Santa. Para protegê-los e defendê-los, foram criadas as Ordens de Cavaleiros Militares (Hospitalários, Templários, etc.).
Houve outras Cruzadas porque os territórios latinos no Oriente eram constantemente ameaçados. A segunda foi em 1147 porque os turcos reconquistaram e destruíram Edessa. Exortados por S. Bernardo, o rei de França, Luís VII, e o da Germânia, Conrado III, uniam suas tropas num só exército. Mas não conseguiram tomar nem Damasco, e regressaram sem êxito em 1149.
A terceira Cruzada foi em 1190. O sultão Saladino apoderou-se de Jerusalém em 1187. Por um apelo do Papa Urbano III, o rei Filipe Augusto da França, Frederico Barbaroxa da Alemanha, e Ricardo Coração de Leão, da Inglaterra, se uniram e partiram. Mas Frederico morreu afogado no rio Cydnus (Cilícia), o que provocou a dispersão do seu exército (1190). Os reis da França e da Inglaterra dirigiram-se por mar a S. João de Acre, que conseguiram ocupar em 1191. Embora lutassem juntos, os reis não eram unidos. Filipe Augusto, doente, voltou à Europa, e Ricardo também voltou em 1192.
Na quarta Cruzada o Papa Inocêncio III (1198-1216) aspirava a libertação de Jerusalém. Mas a Cruzada se afastou da sua orientação, sob a influência de Filipe da Suábia, de Veneza e dos gregos. Os cruzados conquistaram Constantinopla fazendo da mesma a capital de um Império latino, que durou até 1261, quando Miguel o Paleólogo retomou Constantinopla.
A quinta Cruzada, de 1219 a 1221, foi assumida por alemães e húngaros, que se dirigiram para o Egito; mas a cheia do Nilo obrigou-os a retirar-se. Na sexta Cruzada, chamada de “peregrinação sem fé” (1228-1229), o rei Frederico II, excomungado pelo Papa, resolveu empreender uma Cruzada, não tanto para libertar o S. Sepulcro, quanto para unir em sua pessoa os títulos de Imperador da Alemanha e rei de Jerusalém; obteve do sultão do Egito, por dez anos, o domínio sobre Jerusalém, Belém e Nazaré. Terminado esse prazo, Jerusalém recaiu nas mãos dos Árabes.
A sétima e oitava Cruzadas foram realizadas pelo grande rei São Luís IX, da França, para reconquistar a Cidade Santa. Em 1248, atacou o sultão Eyoub no Egito. Como em 1221, também dessa vez os cristãos tomaram Damieta, mas caíram diante de Mansourah. Foram todos encarcerados, só conseguindo a liberdade mediante enorme preço de resgate.historiaigrejadademedia
Em 1270, S. Luís renovou seus esforços, conseguindo a muito custo constituir um exército para empreender nova expedição. Mas o rei atingido de peste, faleceu em 25 de agosto de 1270. Após estes fatos, a pressão dos exércitos turcos se intensificou. Em 1291 encerrou-se a era das Cruzadas.
É verdade que também houve as “Cruzadas das crianças”?
Houve ainda as “Cruzadas das crianças”, significativa do espírito da época. Em 1212, um jovem pastor, chamado Estêvão, dizendo-se enviado por Deus, convocou as crianças da França para uma Cruzada. O exército de 30.000 jovens embarcou em Marselha. Dois condutores de frota haviam se comprometido a transportá-los ao Oriente gratuitamente; todavia venderam-nos aos mercadores de escravos no Egito. A maioria dos participantes morreu; um pequeno número recuperou mais tarde a liberdade.
Na mesma época, na Alemanha, vinte mil jovens, dirigidos por Alexandre, imperito, fracassaram.
Na verdade as Cruzadas não foram um fracasso ou um contra-testemunho dos cristãos. Não se pode deixar de sublinhar em primeiro lugar o que de positivo as Cruzadas representam. A fé e o amor dos cristãos, na Idade Média, demonstraram a grandeza do seu amor a Cristo. E, além disso, as Cruzadas trouxeram benefícios no plano cultural e científico. O contato entre latinos, gregos (bizantinos) e árabes trouxe um avanço na matemática, medicina, indústria, comércio e outros ramos das atividades humanas; desenvolveu a navegação e modificou as condições econômicas da sociedade feudal. Preparou o grande surto das artes e das ciências exatas nos séculos XV/XVI.
Entendendo bem o contexto medieval, as Cruzadas não foram uma “mancha negra”; ao contrário, atestam – segundo o contexto da época – a unidade dos povos da Alta Idade Média, que encontraram na sua fé a força para realizar façanhas heroicas, porém marcadas as limitações humanas. O homem moderno não consegue compreender o que isto significava para o homem medieval.
Prof. Felipe Aquino

A escrita bíblica

deadseascrollOs livros da Bíblia foram escritos em três línguas muito antigas: o hebraico (todos os livros protocanônicos do AT), aramaico (Ev. Mateus); grego (livros do NT).
O hebraico era escrito sem vogais até o século VII dC. Somente nos séculos VII a X dC, os rabinos judeus fizeram a vocalização do texto hebraico introduzindo as vogais (texto massorético). O leitor colocava mentalmente as vogais entre as consoantes, o que podia gerar dúvidas. Por exemplo,  a palavra “ah”, podia significar irmão, primo ou parente. O hebraico não tinha superlativo e não separava as palavras.
O aramaico era parecido com o hebraico, falado pelos arameus, comerciantes na Mesopotâmia; adotado pelos judeus desde o século V aC; foi a língua falada por Jesus. O hebraico aos poucos ficou apenas sendo usado  no culto divino. O grego era a língua de um  povo culto; era falada em todo o império romano, e foi muito usada por escritores judeus, uma vez que este povo se espalhou por todo o império.
Os escritores antigos não dividiam o texto sagrado em capítulos e versículos. Os cristãos é que o fizeram para fazer as citações e para a Liturgia. Eusébio de Cesaréia (†340) dividiu os Evangelhos em 1162 capítulos. Na idade média, o arcebispo Estêvão Langton, de Cantuária (†1228), distribuiu o texto latino do AT e do NT em capítulos; esta divisão foi introduzida no texto hebraico do AT e no texto grego dos LXX e do NT e está em uso até hoje.
A divisão dos capítulos e versículos como temos hoje é do século XVI. Santes Pagnino de Lucca (†1554) dividiu o AT e o NT em versículos numerados. Roberto Estêvão, tipógrafo francês,  refez a distribuição do NT em 1551.
Os textos da Bíblia foram escritos em material frágil (pergaminho ou papiro); por isso, os originais se perderam ou não se conservaram; mas temos cópias dos originais.
Com a descoberta dos manuscritos de Qumran, em 1947, em Israel, às margens do Mar Morto, que datam do século I aC e I dC, foi possível recuar mil anos na tradição manuscrita. Antes de 1947 não possuíamos cópias dos textos hebraicos do AT anteriores aos séculos IX/X depois de Cristo; tínhamos apenas os manuscritos da idade média, e viu-se que há identidade com os documentos descobertos em Qumran, o que quer dizer que os textos se foram transmitindo fielmente através dos séculos. Isto se deu porque os judeus guardavam ciosamente a sua literatura religiosa e não permitiam que ela se deteriorasse.
Os gêneros  literários
Como a Bíblia é a Palavra de Deus, escrita no linguajar humano, ela utiliza dos gêneros literários que são os artifícios das linguagens dos homens para se expressar. O gênero literário a ser usado depende do assunto a ser transmitido. Eis alguns tipos: leis, genealogias, oráculos proféticos, poemas, poesia, parábolas, epopéias, orações, hino litúrgico, sermões, conto de amor, salmo, relato histórico (santa Ceia, por exemplo), crônicas, midraxe, cartas, fábulas, apocalipse, etc; para cada caso temos um jeito de escrever.
Cada gênero literário tem a sua forma de interpretação própria; ora, não se pode interpretar o texto de uma lei da mesma forma que uma parábola! É por isso que não se pode interpretar  a Bíblia ao pé da letra; daí surgem muitos erros. É preciso lembrar também que a Bíblia foi escrita num intervalo de tempo de aproximadamente 14 séculos, 1400 anos, desde o séc XIII aC. até  o século I depois de Cristo.escoladafeii
Isto implica em conceitos diferentes dos nossos; portanto, não se pode ler a Bíblia com a mesma mentalidade e valores do nosso tempo. Algo que era normal naquele tempo pode hoje nos parecer um absurdo; mas Deus quis usar o homem para transmitir a sua Palavra.
Na Bíblia não há erros; esses são parte de quem a interpreta. Muitas vezes o que para nós hoje tem um sentido, para o autor sagrado quer dizer outra; às vezes ele está usando apenas um artifício de linguagem e nós interpretamos ao pé da letra. Daí a dificuldade de se interpretar certas partes da Escritura. Por isso Jesus deixou o Sagrado Magistério da Igreja (Papa e bispos) para que a sua interpretação não tenha erro.
Prof. Felipe Aquino

História da Festa de Corpus Christi

eucaristiasacramentoNo final do século XIII surgiu em Lieja, Bélgica, um Movimento Eucarístico cujo centro foi a Abadia de Cornillon fundada em 1124 pelo Bispo Albero de Lieja. Este movimento deu origem a vários costumes eucarísticos, como por exemplo, a exposição e bênção do Santíssimo Sacramento, o uso dos sinos durante a elevação na Missa e a festa do Corpus Christi.

Santa Juliana de Mont Cornillon, priora da Abadia, foi escolhida, por Deus para criar esta Festa. A santa desde jovem teve uma grande veneração ao Santíssimo Sacramento. Esperava que algum dia tivesse uma festa especial ao Sacramento da Eucaristia. Este desejo, conforme a tradição foi intensificado por uma visão que teve da Igreja sob a aparência de lua cheia com uma mancha negra, que significava a ausência dessa solenidade.

Juliana comunicou esta imagem a Dom Roberto de Thorete, bispo de Lieja, também ao douto Dominico Hugh, mais tarde cardeal legado dos Países Baixos e Jacques Pantaleón, mais tarde o Papa Urbano IV. A festa mundial de Corpus Christi foi decretada em 1264, 6 anos após a morte de irmã Juliana em 1258, com 66 anos. Santa Juliana de Mont Cornillon foi canonizada em 1599 pelo Papa Clemente VIII.

Dom Roberto não viveu para ver a realização de sua ordem, já que morreu em 16 de outubro de 1246, mas a festa foi celebrada pela primeira vez no ano seguinte, na quinta-feira após à festa da Santíssima Trindade. Mais tarde um bispo alemão conheceu os costumes e o levou por toda atual Alemanha.

Milagre de Bolsena
Certa vez, quando o padre Pedro de Praga, celebrou uma Missa na cripta de Santa Cristina, em Bolsena, Itália, aconteceu um milagre eucarístico: da hóstia consagrada começaram a cair gotas de sangue sobre o corporal após a consagração. Alguns dizem que isto ocorreu porque o padre teria duvidado da presença real de Cristo na Eucaristia.

O Papa Urbano IV (1262-1264), que residia em Orvieto, cidade próxima de Bolsena, onde vivia S. Tomás de Aquino, informado do milagre, então, ordenou ao Bispo Giacomo que levasse as relíquias de Bolsena a Orvieto. Isso foi feito em procissão. Quando o Papa encontrou os fiéis caminhando na entrada de Orvieto, teria então pronunciado diante da relíquia eucarística as palavras: “Corpus Christi”.

Ainda hoje se conservam, em Orvieto, os corporais onde se apóia o cálice e a patena durante a Missa e também se pode ver a pedra do altar em Bolsena, manchada de sangue.

Instituição da Festa
O Santo Padre movido pelo prodígio, e pelo pedido de vários bispos, fez com que se estendesse a festa do Corpus Christi a toda a Igreja por meio da bula “Transiturus” de 8 setembro do mesmo ano, fixando-a para a quinta-feira depois da oitava de Pentecostes.

O decreto de Urbano IV teve pouca repercussão, porque o Papa morreu logo em seguida (2 de outubro de 1264), um pouco depois da publicação do decreto, prejudicando a difusão da festa. Mas o Papa Clemente V tomou o assunto em suas mãos e, no Concílio Geral de Viena (1311) ordenou mais uma vez a adoção desta festa.

Em 1317 é promulgada uma recopilação de leis, por João XXII, e assim a festa é estendida a toda a Igreja. Na diocese de Colônia na Alemanha, a festa de Corpus Christi é celebrada antes de 1270.
Na paróquia de Saint Martin em Liège, em 1230, quando começou as homenagens ao Santíssimo Sacramento a procissão eucarística acontecia só dentro da igreja. Em 1247, aconteceu a primeira procissão eucarística pelas ruas de Liège, já como festa da diocese. Depois se tornou festa nacional na Bélgica.

Nenhum dos decretos fala da procissão com o Santíssimo como um aspecto da celebração. Porém estas procissões foram dotadas de indulgências pelos Papas Martinho V e Eugênio IV, e se fizeram bastante comuns a partir do século XIV.

Finalmente, o Concílio de Trento declara que muito piedosa e religiosamente foi introduzido na Igreja de Deus o costume, que todos os anos, o santíssimo seja levado em procissão pelas ruas e lugares públicos.

Todo católico deve participar dessa Procissão por ser a mais importante de todas que acontecem durante o ano, pois é a única onde o próprio Senhor sai às ruas para abençoar as pessoas, as famílias e a cidade.

Tapetes, arte e religiosidade
Em muitos lugares criou-se o belo costume de enfeitar as casas com oratórios e flores e as ruas com tapetes ornamentados, tudo em honra do Senhor que vem visitar o seu povo.

No dia dedicado ao Corpo de Deus (Corpus Christi), várias cidades brasileiras, organizam procissões, que percorrem as ruas enfeitadas com tapetes. A confecção de tapetes de rua é uma magnífica manifestação de arte popular

Utilizando diversos tipos de materiais, como serragem colorida, borra de café, farinha, areia e alguns pequenos acessórios, como tampinhas de garrafas, flores e folhas, as pessoas montam, com grande arte, um tapete pelas ruas, formando desenhos relacionados ao Santíssimo.

Por este tapete passa a procissão, o sacerdote vai á frente carregando o ostensório e em seguida pelas pessoas que participam da festa. Tudo isto tem muito sentido e deve ser preservado.osegredodasagradaeucaristia

Devoção no Brasil
A tradição de fazer o tapete com folhas e flores vem dos imigrantes açorianos. Essa tradição praticamente desapareceu em Portugal continental, onde teve origem, mas foi mantida nos Açores e nos lugares em que chegaram seus imigrantes, como por exemplo Florianópolis-SC.

As procissões portuguesas eram esplendorosas: tropas, fidalgos, cavaleiros, andores, danças e cantos. A imagem de São Jorge, padroeiro de Portugal, seguia a procissão montada em um cavalo, rodeada de oficiais de gala.

O barroco enriqueceu esta festa com todas as suas características de pompa. Em todo o Brasil esta festa adquiriu contornos do barroco português. Corpus Christi é celebrado desde a época colonial com uma abundância de cores. A tradição de enfeitar as ruas surgiu em Ouro Preto, cidade histórica do interior de Minas Gerais.

Prof. Felipe Aquino

História da Igreja: O Século XI – Gregório VII

Gregorio VIIA primeira metade do século XI
Os primeiros decênios do século XI ainda foram humilhantes para o Papado; ver capítulo 19. O despreparo moral dos que subiram à cátedra de S. Pedro, em boa parte, se devia à intromissão de grupos estranhos, que lutavam entre si para manipular o Papado: os nobres de Roma e arredores, os príncipes de Espoleto e da Toscana, os Imperadores da Germânia. Não poucos dos Papas da época obscura da Igreja foram homens de vida digna e doutrina ortodoxa, sufocados, porém, pela ingerência de facções civis. – O povo de Deus tinha consciência dos males que afetavam seus pastores: as crônicas de Liutprando de Cremona, tidas como tendenciosas, dão a entender que entre os cristãos havia horror perante os insucessos do Papado; estimavam o Papa e percebiam o hiato entre o ideal e a realidade.
Pode-se dizer que a réplica à dolorosa situação começa com a eleição do bispo Suidgero de Bamberga, que tomou o nome de Clemente II (1046-47). Os romanos conferiram então ao Imperador o título de Patrício Romano, que permitia ao monarca designar o Papa nas próximas vacâncias da sede pontifícia. Esta ficava, mais do que nunca, subordinada à ação do Imperador. Este estado de coisas não duraria muito, pois não era o ideal. Clemente II iniciou a obra de reforma da disciplina da Igreja, mas faleceu prematuramente.
S. Leão IX (1048-1054) foi um dos mais dignos Papas da história, dotado de energia e do desejo de reforma. Chamou para junto de si conselheiros de diversas regiões, entre os quais o monge Hildebrando, de Cluny, que ele constituiu arquidiácono e tesoureiro da Igreja Romana. Três males afetavam o clero na época, prejudicando duramente a vida da Igreja:
1) as investiduras leigas. Os bispados eram feudos ou territórios que deviam vassalagem ao monarca. Quando  o senhor feudal era um leigo nobre, este desenvolvia a política que atendia aos seus interesses e aos de sua família, não raro em oposição ‘a política do rei ou Imperador. Ao contrario, quando o senhor feudal era um bispo, este, não tendo descendentes, era mais disposto a colaborar com o soberano; além do que, morto o bispo, o feudo voltava ao monarca, que tinha a liberdade de instituir o senhor feudal do seu agrado. Por isto os reis e Imperadores da época praticavam abusivamente o que se chamava “a investidura leiga”, isto é, nomeavam os bispos e conferiam-lhes as insígnias do poder temporal; ficava à Igreja apenas a tarefa de conferir a ordem sacra ao nomeado, isto é, o báculo e a mitra. Como se compreende, este costume, que teve origem no reino dos francos, acarretava não raro a escolha de bispos sem vocação, mais políticos do que pastores. – A Igreja tinha que se libertar de tal abuso;
2) a simonia ou a compra e a venda de bispados e outros bens eclesiásticos. Este mau costume estava frequentemente ligado ao anterior;
3) o nicolaísmo (ver Ap 2,6.15) ou o concubinato dos clérigos.
São Leão IX viajou pela Itália, a França e a Alemanha, disseminando, com resultado, os princípios de renovação da disciplina eclesiástica. O Papado assim ganhou prestígio e autoridade.
A obra iniciada por S. Leão IX devia frutificar plenamente no pontificado de S. Gregório VII.
S. Gregório VII e Canossa
No mesmo dia do enterro de seu antecessor Alexandre II, aos 22/04/1073, foi aclamado Papa, pela voz do povo romano, o cardeal-arquidiácono Hildebrando, com o nome de Gregório VII. Os cardeais eleitores confirmaram o voto popular.
Gregório era nativo da Toscana. Fez-se monge na famosa abadia de Cluny (França). que era um foco ardente de piedade e virtude. Quando S. Leso IX passou por esse mosteiro, levou consigo o jovem monge, que serviu à Igreja sob cinco Papas consecutivos. Era homem ardoroso e enérgico, que tinha um grande programa, ao qual consagrou toda a sua vida: estabelecer a reta ordem, na qual os reis e príncipes, sob o primado do Papa, colaborassem concordes na construção de uma sociedade cristã. Era este, aliás, o ideal já acalentado por S. Agostinho (? 430) na sua obra “Da Cidade de Deus” e, depois, por S. Gregório Magno (590-604) e S. Nicolau I (858-67). Duas palavras condensavam o programa de Gregório VII: justiça (o direito de Deus) e paz (a união do poder eclesiástico e do poder civil); o Papa dizia que, como o corpo humano é dirigido por dois olhos, assim a Igreja deve ser guiada pelo Sacerdócio e o Império em harmonia.
A intenção de Gregório se formulava como se segue: “Que a Santa Igreja, Esposa de Deus, Senhora e Mãe Nossa, retomando o seu brilho originário, permaneça livre, casta e católica (universal)” (epístola 46).
Na execução deste plano, Gregório era movido por um zelo sincero, que se, depreende das seguintes palavras: “Muitas vezes roguei ao Senhor Jesus que ou me tire desta vida ou me torne útil à Mãe de todos” (Registr. II 49).
Quando Gregório assumiu o pontificado, o rei Henrique IV da Alemanha estava excomungado, pois mantinha contatos com bispos simoníacos, que haviam sido excomungados. Além disto, era ameaçado por uma revolta dos saxões. Por isto prestou penitência e prometeu colaborar com o Papa na reforma da disciplina.
Logo em 1074 Gregório VII reuniu um Sínodo no Latrão (Roma), que (l) proibia o exercício do ministério a todo clérigo simoníaco; 2) proibia a celebração da Liturgia a qualquer clérigo fornicador, e exigia dos fiéis que não participassem das cerimonias celebradas por um concubino. Estas normas tinham suas raízes em determinações de Concílios regionais dos séculos IV/VI. Nada inovavam, portanto, embora a praxe contrária estivesse muito espalhada.
No seguinte Sínodo (1075) Gregório deu mais um passo, voltando-se contra a investidura leiga; a liberdade da Igreja exigia a instituição canônica dos bispos em lugar da nomeação por príncipes seculares, e exigia que a Igreja dispusesse dos seus bens sem impedimentos.
Esta legislação devia levar a um conflito com Henrique IV. Em junho de 1075 o Imperador conseguiu vencer os saxões e esqueceu quanto prometera ao Papa: ocupou e distribuiu bispados da Itália, inclusive o de Milão, que não estava vago, e voltou a se relacionar com seus conselheiros excomungados. Diante disto, o Papa propôs conversações a Henrique, ao mesmo tempo que o ameaçava de excomunhão e deposição, caso se mostrasse recalcitrante. O monarca respondeu convocando um Sínodo para Worms (janeiro 1076), que, com a participação de 26 bispos, declarou o Papa deposto; Henrique mesmo escreveu um violento manifesto “a Hildebrando, não Papa, mas falso monge”, exortando-o, a título de Patrício Romano, a descer da cátedra apostólica. Mais: numa carta ao povo romano, o Imperador estimulava os fiéis a fazer nova eleição papal. Num Sínodo de Piacenza, os bispos locais consentiram na sentença de Worms.
Gregório, porém, estava apoiado por diversas correntes de cristãos. Intrépido, no Sínodo quaresmal de 1076 pronunciou a excomunhão sobre Henrique, desligou os seus súditos do juramento de fidelidade e proibiu a obediência ao soberano excomungado. Os bispos favoráveis a Henrique foram suspensos ou excomungados.
Henrique percebeu então que sua posição era arriscada. A maioria dos bispos e dos príncipes leigos da Alemanha resolveram considerá-lo deposto, caso não estivesse absolvido da excomunhão dentro de um ano. Em conseqüência, o rei, em pleno inverno de 1077, desceu à Itália e foi bater às portas do castelo da Condessa Matilde em Canossa (Apeninos), para onde o Papa se tinha retirado. Passou três dias consecutivos (25-27/01/1077), diante das portas, descalço e revestido de cilícios, pedindo a absolvição; depois de longas conversações, nas quais Matilde e o abade Hugo de Cluny (padrinho de Henrique) patrocinaram a causa do monarca, o Papa no quarto dia concedeu ao rei a reconciliação e a Eucaristia. O Imperador jurou ainda submeter seu litígio com os príncipes alemães ao arbítrio do Papa.
Gregório VII, ao absolver Henrique, foi movido por intenções pastorais, e não políticas. A humilhação do monarca redundaria em vantagens para este, porque de certo modo o reabilitava e fortalecia perante os príncipes alemães.
Os príncipes e bispos alemães, que se tinham oposto a Henrique, não se deram por satisfeitos com a absolvição deste; por causa de interesses políticos, queriam desembaraçar-se do rei. Em conseqüência, elegeram rei o duque Rodolfo da Suábia, que logo prometeu ao Papa obediência e eleições canônicas. Assim estourou a guerra civil na Alemanha, que terminou com a vitória de Henrique. Este exigiu do Papa a excomunhão do seu adversário e ameaçava eleger um antipapa, caso não fosse atendido. Gregório VII não se dobrou, mas o Sínodo quaresmal de 1080 de novo excomungou Henrique e desligou os súditos do juramento de fidelidade; além disto, renovava a proibição de investidura leiga.
A segunda excomunhão de Henrique não causou a mesma impressão que a primeira. A maioria dos bispos alemães colocou-se do lado do rei. Este, assim apoiado, conseguiu que um Sínodo em Brixen decretasse a excomunhão e a deposição do Papa acusado de simonia, heresia, necromancia e subversão da ordem! Em seu lugar, foi eleito o antipapa Clemente III (1080-1 100). Este foi logo excomungado por Gregório VII; Henrique desceu então com suas tropas para a Itália e em 1083, após três anos de cerco e distribuição de muito dinheiro, logrou apoderar-se de Roma, exceto o Castel Sant’Angelo, onde se refugiara o Papa. Este justificava sua resistência perseverante, dizendo: “Evidentemente é mais nobre lutar durante muito tempo em favor da liberdade da Santa Igreja do que submeter-se a mísera e diabólica servidão” (Registr. VIII 26).
O antipapa Celemente III, secundado por treze cardeais, foi instalado no palácio do Latrão e na Páscoa de 1084 coroou Henrique Imperador na basílica de São Pedro.
Gregório VII parecia condenado a cair nas mãos dos adversários, quando lhe foi em auxílio o duque normando Roberto de Guiscard. O numeroso exército de Roberto obrigou os alemães a se afastar de Roma. Todavia o saque também sofrido por obra dos normandos excitou grandemente a população contra Gregório; este, consequentemente, não pôde mais permanecer na sua cidade, mas teve de se refugiar em Salerno (Itália meridional), que estava sob domínio normando (1085). No seu exílio, o Papa gozava de liberdade; em fins de 1084 reuniu um Sínodo, que renovou a excomunhão de Clemente III e Henrique IV; depois disto, mandou legados a diversos países para proclamarem a sentença.historiaigrejadademedia
Em 1085, Gregório, alquebrado por muitas fadigas, mas de ânimo ainda enérgico, veio a falecer. Atribuem-lhe como últimas palavras: “.Dilexi iustitiam e odivi iniquitatem; propterea morior in exsilio. – Amei a justiça e odiei a iniquidade; por isto morro no exílio”. A morte no exílio não era senão uma derrota aparente: o plano de purificação e libertação da Igreja não seria mais entravado; os sucessores de Gregório colheram os frutos que este semeou; o Papado cresceu em prestígio moral, jurídico e político, devendo atingir o apogeu da sua influência nos tempos de Inocêncio III (1198-1216).
Num juízo objetivo, deve-se dizer que Gregório VII foi um dos maiores Papas da Idade Média, embora tenha sido combatido posteriormente como ditador e imperialista. Soube subordinar todos os interesses da Santa Sé à sua função pastoral, pois não hesitou em absolver e reabilitar o adversário que havia de desferir o golpe mortal contra o Papa; soube ser um mau político para ser um bom Sacerdote; desde que, em consciência, julgou que Henrique podia merecer a reconciliação, concedeu-lha, ainda que em detrimento dos interesses temporais do Papado. Na realidade, Gregório procurou dar a César o que é de César: aspirou a criar, dentro de um Estado cristão, a harmonia entre o poder espiritual e o temporal; haveria a existência paralela do Sacerdócio e do Império, cada qual colaborando em sua esfera para realizar a síntese da Cidade de Deus: o Estado deveria proteger materialmente a Igreja, e esta haveria de sustentar espiritualmente o Estado. Tais princípios estão espalhados pela ampla correspondência deixada por Gregório.
O pontificado de Gregório VII teve outros aspectos, além do que foi até aqui apresentado. O Papa não se descuidou da Igreja universal esparsa em toda a Europa, na Ásia e na África, como atestam as suas cartas; estas manifestam a amplidão de seus horizontes e a energia com que sempre abordou os desafios da sua missão. Foi o primeiro a conceber a ideia de uma Cruzada (coisa muito santa naquela época): A frente de grande exército, queria pessoalmente dirigir-se A Terra Santa, afim de libertar o Sepulcro do Senhor em Jerusalém e promover a união com os gregos cismáticos (1074); na sua ausência, confiaria o patrimônio da Igreja Romana ao rei Henrique IV da Alemanha – o que bem mostra quão pouco pensava em conflito no início do seu pontificado.

Você conhece a história da Batalha de Lepanto?

batalhadelepantoSaiba mais sobre um dos casos que se tornaram inesquecíveis na história da Igreja, marcado pela poderosíssima proteção de Nossa Senhora!
Somos o “Corpo de Cristo”, e Maria, Mãe de Cristo, logo é também a Mãe de seu Corpo que é a Igreja. É por essa razão que durante o Concílio Vaticano II o Papa Paulo VI declarou solenemente que: “Maria é Mãe da Igreja, isto é, Mãe de todo o povo cristão, tanto dos fiéis como dos Pastores” (discurso a 21 de novembro de 1964). Mais tarde, em 30 de junho de 1968, na Profissão de Fé, conhecida como o “Credo do Povo de Deus”, repetiu essa afirmação de forma ainda mais compromissiva:historiadaigrejaantiga (1)
“Nós acreditamos que a Santíssima Mãe de Deus, nova Eva, Mãe da Igreja, continua no Céu e sua missão maternal em relação aos membros de Cristo, cooperando no nascimento e desenvolvimento da vida divina nas almas dos remidos”. “O conhecimento da verdadeira doutrina católica sobre a Bem-aventurada Virgem Maria continuará sempre uma chave para a compreensão exata do mistério de Cristo e da Igreja”.
Para exemplificar a proteção poderosíssima de Nossa Senhora à Igreja, gostaria de citar um dos casos que se tornaram inesquecíveis na história da Igreja.
Um deles foi o da batalha de Lepanto, no mar da Grécia, em 1571, onde Maria se mostrou de fato a grande “Auxiliadora dos Cristãos”, título este que o Papa S. Pio V acrescentou na Ladainha Lauretana de Nossa Senhora, após a milagrosa vitória da esquadra cristã, organizada pelo Papa e comandada pelo Príncipe Dom João d’Áustria, sobre as forças muçulmanas, que ameaçavam invadir a Europa e escravizá-la ao Império Otomano.
São Pio V enviou para o Imperador uma bandeira, na qual estava bordada a imagem de Jesus crucificado. A preparação dos soldados consistiu em um tríduo de jejuns, orações e procissões, suplicando a Deus a graça da vitória, pois o inimigo não era apenas uma ameaça para a Igreja, mas também para a civilização. Tendo recebido a Santa Eucaristia, partiram para a batalha. No dia 7 de outubro de 1571, invocando o nome de Maria, Auxíliadora dos Cristãos, travaram dura batalha nas águas de Lepanto. Três horas de combate foram necessárias… A vitória coube aos cristãos, que ao grito de “Viva Maria”, hastearam a bandeira de Cristo.
O Papa mandou um cardeal benzer as armas dos soldados, pedindo que levassem o santo Rosário como a arma mais forte. Era uma guerra de legítima defesa da Europa invadida, depois que os turcos tomaram Constantinopla em 1453, e agora ameaçavam destruir o Ocidente cristão. Foi uma batalha decisiva. Os muçulmanos sempre tentaram, e ainda tentam destruir o cristianismo, e conquistar o mundo para Alá, pela força das armas, é a guerra santa: Jihad.
A Europa estremeceu, e estava em risco a civilização cristã e a religião católica, que custou tanto sangue dos mártires. S. Pio V implorou a proteção da Virgem Maria em favor do povo cristão, pedindo à Virgem que afastasse, de uma vez por todas, o perigo do islamismo ameaçador.
No dia 7 de outubro de 1571, na grande e temida batalha de Lepanto, na Grécia, os cristãos venceram definitivamente os turcos. As forças cristãs eram minoria, os turcos tinham cerca de trezentos barcos de guerra no mar da Grécia, mas, por ação de Nossa Senhora, milagrosamente, as forças turcas foram aniquiladas.
O Papa quis então demonstrar sua gratidão à Mãe da Igreja e dos homens, e mandou incluir na Ladainha a invocação, “Auxiliadora dos Cristãos, rogai por nós”.
A festa litúrgica de Nossa Senhora Auxiliadora, tão cara a D. Bosco, a quem ela apareceu em sonho na infância, veio com o Papa Pio VII, em 1816, depois de mais uma maravilhosa demonstração de carinho e proteção dela para com o Papa e a Igreja.
Napoleão era imperador da França e, por não ser atendido pelo Papa em seus desejos de grandeza que queriam subjugar a autoridade do Pontífice, mandou prendê-lo, submetendo-o a maus-tratos na prisão de Fontainebleau.
O Papa, sem nada poder fazer, recorreu à proteção de Nossa Senhora para não perder a coragem e não vacilar, prometendo-lhe, que, se saísse da prisão iria coroar a imagem de Nossa Senhora de Savona, por onde passara a caminho do cárcere.1012191_602753276421773_1864993989_n
Depois de um bom tempo Napoleão perdeu o trono, vencido nos campos de batalha, e foi feito prisioneiro na mesma prisão de Fontainebleau, onde mandara prender o Santo Padre. Ali assinou a rendição aos ingleses. Castigo de Deus.
O Papa pôde então sair da prisão; foi até Savona cumprir seu voto coroando a imagem de Nossa Senhora de Savona. Depois entrou em Roma, aplaudido pelo povo, carinhosamente. Em agradecimento a Maria, instituiu a festa de Nossa Senhora, fixando-lhe a data de 24 de maio, dia de sua entrada triunfal em Roma.
Esses fatos históricos, mostram que Maria não é apenas a protetora de cada um de nós, mas também da Santa Igreja que seu Filho lhe confiou aos pés da Cruz.
Prof. Felipe Aquino

Grandes Heresias

heresiasDesde o princípio da Cristandade, a Igreja sempre se confrontou e combateu os falsos ensinamentos ou heresias.
Hoje em dia basta darmos uma olhada no catálogo telefônico para encontrarmos em qualquer cidade do mundo, uma denominação religiosa que nos diga exatamente aquilo que queremos ouvir. Algumas ensinam que Jesus não é Deus, ou que Ele é a única pessoa da Trindade, ou que existem muitos deuses (três dos quais são o Pai, o Filho e o Espírito Santo) ou que nós podemos nos tornar “deuses”, ou que uma pessoa uma vez salva, jamais poderá perder sua salvação, ou que não existe inferno, ou que o homossexualismo é apenas mais uma expressão da sexualidade humana, portanto um estilo de vida aceitável para um cristão, ou qualquer outro tipo de ensinamento.
A Bíblia nos advertiu que isso ocorreria. O Apóstolo Paulo avisou ao seu aluno Timóteo: “Porque virá o tempo em que os homens já não suportarão a sã doutrina da salvação. Levados pelas suas próprias paixões e pelo prurido de escutar novidades, ajustarão mestres para si. Apartarão os ouvidos da verdade e se atirarão às fábulas”. (2Tim. 4,3-4).
» O que é heresia?
Antes de darmos uma olhada nas grandes heresias da história da Igreja, cumpre-nos dar algumas palavras sobre a natureza da heresia. Isso é muito importante já que o termo em si carrega um forte peso emocional e frequentemente é mal utilizado. Heresia não significa o mesmo que incredulidade, cisma, apostasia ou qualquer outro pecado contra a fé. O Catecismo da Igreja Católica define a heresia do seguinte modo:historiadaigrejaantiga
“Incredulidade é negligenciar uma verdade revelada ou a voluntária recusa em dar assentimento de fé a uma verdade revelada. Heresia é a negação após o batismo de algumas verdades que devem ser acreditadas com fé divina e Católica, ou igualmente uma obstinada dúvida com relação às mesmas; apostasia é o total repúdio da fé cristã; cisma é o ato de recusar-se a submeter-se ao Romano Pontífice ou à comunhão com os membros da Igreja sujeitos a ele” (CIC  §2089).
Para ser culpado de heresia, uma pessoa deve estar obstinada (incorrigível) no erro. Uma pessoa que está aberta à correção ou que simplesmente não tem consciência de que o que ela está dizendo é contrário ao ensinamento da Igreja, não pode ser considerada como herética.
A dúvida ou negação envolvida na heresia deve ser pós-batismal. Para ser acusado de heresia, uma pessoa deve ser antes de tudo um batizado. Isso significa que aqueles movimentos que surgiram da divisão do Cristianismo ou que foram influenciados por ele, mas que não administram o batismo ou que não batizam validamente, não podem ser considerados heresias mas apenas religiões separadas (exemplos incluem Muçulmanos que não possuem batismos e Testemunhas de Jeová que não batizam validamente).
E, finalmente, a dúvida ou negação envolvidos na heresia devem estar relacionados a uma matéria que deve ser crida com “fé Católica e divina” – em outras palavras, alguma coisa que tenha sido definida solenemente pela Igreja como verdade divinamente revelada (por exemplo, a Santíssima Trindade, a Encarnação, a Presença Real de Cristo na Eucaristia, o Sacrifício da Missa, a Infalibilidade Papal, a Imaculada Conceição e Assunção de Nossa Senhora).
É especialmente importante saber distinguir heresia de cisma e apostasia. No cisma, uma pessoa ou grupo se separa da Igreja Católica sem repudiar nenhuma doutrina definida. Já na apostasia, uma pessoa repudia totalmente a fé cristã e não mais se considera cristã.
É interessante notar como, de uma forma ou outra, a imensa maioria destas heresias permanece…
Esclarecidas as diferenças, vamos dar uma conferida nas maiores heresias da história da Igreja e quando elas começaram:
» Os Judaizantes (Séc. I)
A heresia Judaizante pode ser resumida pelas seguintes palavras dos Atos dos Apóstolos 15,1: “Alguns homens, descendo da Judéia, puseram-se a ensinar aos irmãos o seguinte: ‘Se não vos circuncidais segundo o rito de Moisés, não podeis ser salvos'”.
Muitos dos primeiros Cristãos eram Judeus, e esses trouxeram para a Fé cristã muitas de suas práticas e observâncias judaicas. Eles reconheciam em Jesus Cristo o Messias anunciado pelos profetas e o cumprimento do Antigo Testamento, mas uma vez que a circuncisão era obrigatória no Antigo Testamento para a participação na Aliança com Deus, muitos pensavam que ela era também necessária para a participação na Nova Aliança que Cristo veio inaugurar. Portanto eles acreditavam que era necessário ser circuncidado e guardar os preceitos mosaicos para se tornar um verdadeiro cristão. Em outras palavras, uma pessoa deveria se tornar judeu para poder se tornar cristão.
Uma forma “light” desta heresia é a dos Adventistas de Sétimo Dia e outras seitas sabatistas.
» Gnosticismo (Séc. I e II)
“A matéria é má!” – Esse é o lema dos Gnósticos. Essa foi uma idéia que eles “tomaram emprestado” de alguns filósofos gregos e isso vai contra o ensinamento Católico, não apenas porque contradiz Gênesis 1,31: “Deus contemplou toda a sua obra, e viu que tudo era muito bom”, bem como outras partes da Sagrada Escritura, mas porque nega a própria Encarnação. Se a matéria é má, então Jesus não poderia ser verdadeiro Deus e verdadeiro homem, pois em Cristo não existe nada que seja mau. Assim muitos gnósticos negavam a Encarnação alegando que Cristo apenas “parecia” como homem, mas essa sua humanidade era apenas ilusória.
Alguns Gnósticos, reconhecendo que o Antigo Testamento ensina que Deus criou a matéria, alegavam que o Deus dos Judeus era uma divindade maligna bem diferente do Deus de Jesus Cristo, do Novo Testamento. Eles também propunham a crença em muitos seres divinos, conhecidos como “aeons” que servem de mediadores entre o homem e um inatingível Deus. O mais baixo de todos esses “aeons” que estava em contato direto com os homens teria sido Jesus Cristo.
Esta heresia permanece de maneira quase igual na chamada “Nova Era”. Em outras formas, aliás, ela não deixa de ser a heresia de base de muitas outras, como o protestantismo (com sua negação dos Sacramentos e da Maternidade Divina da Santíssima Virgem, decorrentes de uma visão gnóstica segundo a qual a religião verdadeira é puramente espiritual: Igreja invisível, sem meios visíveis de transmissão de graça etc.).
» Montanismo (final do Séc. II)
Montanus iniciou inocentemente sua carreira pregando um retorno à penitência e ao fervor. Todavia ele alegava que seus ensinamentos estavam acima dos ensinamentos da Igreja porque ele era diretamente inspirado pelo Espírito Santo. Logo, logo ele começou a ensinar sobre uma eminente volta de Cristo em sua cidade natal na Frígia. Seu movimento enfatizava sobretudo a continuidade dos dons extraordinários como falar em línguas e profecias.
Montano afirmava que a Igreja não tinha capacidade de perdoar pecados mortais. Esta heresia, de uma certa forma, está presente em muitas seitas atuais, cuja rigidez de costumes traz esta idéia no fundo. Um exemplo seria a “Assembléia de Deus”, ou até a seita suicida africana.
» Sabelianismo (Princípio do Séc. III)
Os Sabelianistas ensinavam que Jesus Cristo e Deus Pai não eram pessoas distintas, mas simplesmente dois aspectos ou operações de uma única pessoa. De acordo com eles, as três pessoas da Trindade existem apenas em referência ao relacionamento de Deus com o homem, mas não como uma realidade objetiva.
Esta visão também está presente em muitos movimentos “ecumênicos” protestantes atuais, especialmente entre as seitas mais antigas. Nosso Senhor para eles dissolve-se em uma vaga “divindade”.
» Arianismo (Séc. IV)
Uma das maiores heresias que a Igreja teve que confrontar foi o Arianismo. Arius ensinava que Cristo não era Deus e sim uma criatura feita por Deus. Ao disfarçar sua heresia usando uma terminologia ortodoxa ou semi-ortodoxa, ele foi capaz de semear grande confusão na Igreja, conquistando o apoio de muitos Bispos e a rejeição de alguns. O Arianismo foi solenemente condenado no ano 325 pelo Primeiro Concílio de Nicéia, o qual definiu a divindade de Cristo e no ano 381 pelo Primeiro Concílio de Constantinopla, o qual definiu a divindade do Espírito Santo. Esses dois Concílios deram origem ao Credo Niceno que os Católicos recitam nas Missas Dominicais.
Os “Testemunhas de Jeová” têm esta crença, assim como os Unitarianos.
» Pelagianismo (Séc. V)
Pelagius, um monge gaulês deu início a essa heresia que carrega seu nome. Ele negava que nós herdamos o pecado de Adão e alegava que nos tornamos pessoalmente pecadores apenas porque nascemos em solidariedade com uma comunidade pecadora a qual nos dá maus exemplos. Da mesma forma, ele negava que herdamos a santidade ou justiça como resultado da morte de Cristo na cruz e dizia que nos tornamos pessoalmente justos através da instrução e imitação da comunidade cristã, seguindo o exemplo de Cristo.
Pelagius declarava que o homem nasce moralmente neutro e pode chegar ao céu por seus próprios esforços. De acordo com ele, a graça de Deus não é verdadeiramente necessária, mas apenas facilita uma difícil tarefa.
É uma visão que ainda hoje encontramos na Teologia da Libertação, por exemplo: o que importa é o esforço do homem, a graça de Deus é bem vinda mas não é necessária, etc. É por isso que os TL dão tanto valor à “auto-estima”, nome chique para o pecado do Orgulho: para eles é importante amar A SI sobre todas as coisas, pois a salvação (ou a utopia socialista, no caso…) viria apenas através do esforço do homem.
» Nestorianismo (Séc. V)
Essa heresia sobre a pessoa de Cristo foi iniciada por Nestorius, bispo de Constantinopla que negava a Maria o título de Theotokos (literalmente “Mãe de Deus”). Nestorius alegava que Maria deu origem apenas à pessoa humana de Cristo em seu útero e chegou a propor como alternativa o título Christotokos (“Mãe de Cristo”).historiaigrejadademedia
Os teólogos Católicos ortodoxos imediatamente reconheceram que a teoria de Nestorius dividia Cristo em duas pessoas distintas (uma humana e outra divina, unidos por uma espécie de “elo perdido”), sendo que apenas uma estava no útero de Maria. A Igreja reagiu no ano 431 com o Concílio de Éfeso, definindo que Maria realmente é Mãe de Deus, não no sentido de que ela seja anterior a Deus ou seja a fonte de Deus, mas no sentido de que a Pessoa que ela carregou em seu útero era de fato o Deus Encarnado.
Creio que todo mundo já identificou o protestantismo pentecostal neste heresia, não? Bom, isso na verdade é, no protestantismo, apenas uma maneira a mais de menosprezar a Encarnação. Note-se que S. João escreveu seu Evangelho em resposta aos gnósticos, e fez questão de comecá-lo pela Encarnação. Isto ocorre porque a base gnóstica do protestantismo (e tbm, de uma certa maneira, do nestorianismo) recusa-se a admitir que Nosso Senhor tenha realmente assumido a nossa natureza. É por isso, por exemplo, que Lutero afirmava que o pecado do homem não é jamais apagado, mas apenas encoberto por Deus. Para ele, Nosso Senhor mentiria, afirmando que o homem não tem pecado, para que ele entre no Céu. É mais fácil para um gnóstico crer em um deus que minta que em um Deus que se faz verdadeiramente homem, com mãe e tudo.
» Monofisismo (Séc. V)
O Monofisismo originou-se como uma reação ao Nestorianismo. Os monofisistas (liderados por um homem chamado Eutyches) ficaram horrorizados pela implicação Nestoriana de que Cristo era duas pessoas com duas diferentes naturezas (divina e humana). Então eles partiram para o outro extremo alegando que Cristo era uma pessoa com uma só natureza (uma fusão de elementos divinos e humanos). Portanto eles passaram a ser reconhecidos como Monofisistas devido à sua alegação de que Cristo possuía apenas uma natureza (Grego: mono= um; physis= natureza).
Os teólogos Católicos ortodoxos imediatamente reconheceram que o Monofisismo era tão pernicioso quanto o Nestorianismo porque esse negava tanto a completa humanidade como a completa divindade de Cristo. Se Cristo não possuia a natureza humana em sua plenitude então Ele não poderia ser verdadeiramente homem e se Ele não possuía a natureza divina em plenitude, então Ele também não era verdadeiramente Deus.
Escute também: O que é uma heresia?
Esta heresia persiste em alguns círculos católicos bem-intencionados, mas errados, que subestimam a importância da natureza humana de Cristo.
» Iconoclastas (Séc. VII e VIII)
Essa heresia surgiu quando um grupo de pessoas conhecidos como iconoclastas (literalmente, destruidores de ícones) apareceu. Esses alegavam que era pecaminoso fazer estátuas ou pinturas de Cristo e dos Santos apesar de exemplos bíblicos que provam que Deus mandou que se fizesse estátuas religiosas (por exemplo, em Ex 25,18-20 e 1Cr 28,18-19), inclusive representações simbólicas de Cristo (Num 21,8-9 e Jo 3,14).
Tem um em cada esquina hoje em dia…
» Catarismo (Séc. XI)
O Catarismo foi uma complicada mistura de religiões não-Católicas trabalhadas com uma terminologia Cristã. O Catarismo se dividia em muitas seitas diferentes que tinham em comum apenas o ensinamento de que o mundo tinha sido criado por uma divindade má (portanto toda matéria é má) e que por isso devemos adorar apenas a divindade do bem.
Os Albigenses formavam uma das maiores seitas Cátaras. Eles ensinavam que o espírito foi criado por Deus e que por isso era bom, enquanto o corpo teria sido criado pelo Mal, portanto o espírito deveria ser libertado do corpo. Ter filhos era considerado pelos albigenses um dos maiores males já que isso era o mesmo que aprisionar um outro “espírito” na carne. Obviamente o casamento era proibido, embora a fornicação fosse permitida. Tremendos jejuns e severas mortificações eram paticadas e seus líderes adotavam uma vida de voluntária pobreza.
Alguns aspectos da gnose cátara hoje são parte integrante da mentalidade geral em nossa sociedade: o horror à concepção, o amor à fornicação (infelizmente há católicos que aderem a esta mentalidade e praticam sem as necessárias razões graves a abstinência periódica de relações conjugais nos dias férteis)…
» Protestantismo (Séc. XVI)
Os grupos Protestantes se dividem em uma ampla variedade de diferentes doutrinas. Todavia, virtualmente todos alegam acreditar no princípio da Sola Scriptura (“apenas a Escritura” – idéia que defende o uso apenas da Bíblia ao formular sua teologia) e Sola Fide (“apenas pela Fé – a idéia de que somos justificados somente pela Fé). Apesar disso, existe pouca concordância sobre o que essas duas doutrinas-chave realmente significam. Por exemplo, Lutero acreditava que a fé salvífica é expressa pelo batismo, pelo qual, segundo ele, uma pessoa renasce e seus pecados são perdoados, ao passo que muitos Fundamentalistas alegam ser essa uma falsa pregação e que o batismo é meramente um símbolo.
A grande diversidade de doutrinas Protestantes advêm da doutrina do julgamento privado, a qual nega a infalível autoridade da Igreja e alega que cada indivíduo pode interpretar a Escritura por si próprio. Essa idéia é rejeitada pela própria Bíblia em 2Ped 1,20, que nos dá a primeira regra para a interpretação bíblica: “Antes de tudo, sabei que nenhuma profecia da Escritura é de interpretação pessoal”. Uma significante tática dessa heresia é a tentativa de confrontar a Igreja com a Bíblia, negando que o magistério possua qualquer autoridade infalível para ensinar ou interpretar as Escrituras.
A doutrina do julgamento privado resultou em um enorme número de diferentes denominações. De acordo com o The Christian Sourcebook, existiam aproximadamente 21,000 denominações em 1986, com 270 novas se formando a cada ano. Virtualmente todas elas são Protestantes.
» Jansenismo (Séc. XVII)
Jansenius, bispo de Yvres, França deu início a essa heresia num jornal em que ele escreveu sobre Santo Agostinho, no qual ele redefinia a doutrina sobre a graça. Entre outras doutrinas, seus seguidores negavam que Cristo morreu pela salvação de todos os homens, alegando que Ele havia morrido apenas por aqueles que serão finalmente salvos (ou seja, os eleitos). Este e outros erros Jansenistas foram oficialmente condenados pelo Papa Inocêncio X em 1653.
O jansenismo, infelizmente, é hoje encontrado em muitos meios ditos “tradicionalistas”. Este debate é frequentemente provocado pelas objeções que muitos fazem à má tradução do Cânon Romano, que traz “por todos” (e não “para muitos”) como tradução de “pro multis”. Esta tradução está errada como tradução, mas não é teologicamente errada, pois afirma ser o Sacrifício de Cristo suficiente para todos. Os neo-jansenistas, porém, afirmam que teologicamente também está errada.
» Modernismo (Séc. XX)
Os modernistas ensinam, essencialmente, que o homem é incapaz de compreender a realidade e que as “verdades” são meramente idéias relativas. Para o modernista não existem verdades absolutas. As doutrinas que foram infalivelmente definidas pela Igreja podem portanto serem mudadas com os tempos, ou rejeitadas ou reinterpretadas para se adaptarem às modernas preferências.
O Modernismo está entre as mais sérias heresias porque permite a uma pessoa rejeitar qualquer doutrina que foi definida, inclusive aquelas mais cêntricas como a divindade e ressurreição de Cristo. Essa heresia permite a reintrodução de todos os erros das heresias anteriores, bem como novos ensinamentos falsos que os antigos heréticos jamais imaginaram.HistóriadaIgrejaModernaeContemp
O Modernismo é especialmente grave porque ele frequentemente advoga suas crenças usando uma terminologia aproximadamente ortodoxa. O erro é frequentemente expresso através de uma nova interpretação simbólica, por exemplo: Cristo não ressuscitou fisicamente dos mortos, mas a história de sua ressurreição produz uma importante verdade. Uma das táticas mais comuns usadas pela maioria dos modernistas é insistir na premissa de que eles estão dando a interpretação ortodoxa das verdades do Catolicismo.
Da última vez que estive lá, o ninho desta espécie ficava na lista “católicos” da Summer.
As heresias sempre nos acompanharam desde o início da Igreja até os nossos tempos atuais. Geralmente elas sempre tiveram início por membros da hierarquia da Igreja, mas eram combatidas e corrigidas pelos Concílios e Papas. Felizmente temos a promessa de Cristo de que as heresias jamais prevalecerão contra a Igreja: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mat 16,18), pois a Igreja é verdadeiramente, nas palavras do Apóstolo Paulo, “coluna e sustentáculo da verdade” (1Tim 3,15).
Por: Gercione Lima

As Artes, as Letras, a Teologia e a Liturgia no século IV

602074_nA arte cristã se desenvolveu no século IV libertada das influências pagãs. Com a conversão de Constantino a arte cresceu em forma de basílicas, objetos cristãos, ornamentos evangélicos, mosaicos cristãos, etc. Prudêncio falou das basílicas de Constantino, com: “pinturas multicores, refletindo nos lagos o seu ouro […]. Tetos com vigas de ouro, que fazem de toda a sala como o nascer do sol. Nos vãos vitrais rutilantes, semelhantes a prados repintados de flores” (Rops, Vol. I, p. 517).
Os Padres da Igreja veem nesta arte uma utilidade apologética. Disse São Basílio que “o que a linguagem da história ensina pelo ouvido, mostra-o o silencioso desenho pela reprodução”. E São Gregório de Nissa disse que o desenho nas paredes “presta os maiores serviços” e o mosaico “torna dignas da história as pedras que pisamos com os pés”. Depois Victor Hugo chamou a catedral da Idade Média de a “Bíblia de Pedra”. Surge assim nas paredes das igrejas um “livro de piedade e espiritualidade” que poderão ler os iletrados. Nasce com esta arte um novo sistema de ensino e tradição onde a figura gloriosa de Jesus está no centro. As esculturas em baixo relevo são abundantes nas igrejas e nos sarcófagos. O Cristianismo orientou a arte para o louvor a Deus e a Lei de Cristo.hist_igreja_menor
Também as letras cristãs se desenvolveram, pois muitos intelectuais foram conquistados pelo Evangelho; e a literatura cristã foi substituindo a pagã. Os Padres da Igreja foram impregnados pelos clássicos antigos, como Virgílio, que Santo Ambrósio citava e imitava, mas fugindo de uma retórica vazia. Cícero era citado e imitado da mesma forma, mas com um novo espírito cristão.
Eusébio de Cesareia (265-340) erudito e estudioso, escreveu a sua História Eclesiástica, sem o qual não conheceríamos muitos acontecimentos dos três primeiros séculos. Escreveu também a Crônica ou História Universal, onde retomou a obra de Julio Africano e estabeleceu um paralelo entre a Bíblia e a história profana; e nos deixou a “Vida de Constantino”. Eusébio foi o precursor de outros historiadores cristãos como Sulpício Severo, Orósio, Sócrates, Sozomeno e Teodoreto.
Na poesia cristã teremos o nome do grande Prudêncio (348-410), advogado espanhol; e Santo Efrém com seus milhões de versos a Virgem Maria. Com os Padres da Igreja, em grande número, se desenvolveu a teologia, a exegese, a filosofia e outras disciplinas, tanto em Alexandria, como em Antioquia na Capadócia.
Às margens do Mar Negro, encontramos os gigantes “Padres da Capadócia”: São Basílio Magno, doutor da Igreja; seu irmão São Gregório de Nissa e o amigo São Gregório Nazianzeno, doutor da Igreja, que foram decisivos na elucidação do mistério da Santíssima Trindade. E na África teremos o gênio Santo Agostinho. São Jerônimo, de Roma, e São João Crisóstomo de Constantinopla, serão dois grandes personagens das letras cristãs.
No século IV a Igreja praticamente concluiu a definição dos Livros Canônicos. Em 367 d.C. na Páscoa, Santo Atanásio escreveu uma epístola onde relacionou os livros aceitos como canônicos pelos cristãos; no parágrafo 7 listou também os livros que hoje conhecemos como “deuterocanônicos” do Antigo Testamento [rejeitados pelos protestantes], deixando de lado apenas os livros dos Macabeus.
A Igreja estabeleceu o cânon bíblico mais tarde em 393 e 397, nos concílios regionais de Hipona e Cartago no tempo de Santo Agostinho e pelo Papa Inocêncio I (401-417), em 405, ao dirigir-se ao bispo de Tolosa.
Veremos nesse século surgir a força extraordinária do monaquismo que começou no Egito com Santo Antão e os “Padres do deserto”, e que foi levado para o Ocidente por Santo Atanásio em seu refúgio em Roma e por outros santos.
No século IV houve um grande marco litúrgico; as cerimônias tiveram mais precisão e solenidade com características próprias no Oriente e Ocidente, porém os mesmos elementos essenciais; as diferenças são apenas em pormenores. O Concílio de Niceia (325) falou dos quarenta dias da Quaresma em preparação da Páscoa. Foram fixadas as grandes festas da Páscoa, Ascensão do Senhor e Pentecostes. O Natal foi fixado no Ocidente para o dia 25 de dezembro para cristianizar e substituir a festa do deus Sol invictus, festa pagã da religião Mitra. No Oriente adotou-se a data de 6 de janeiro. E surgiu, sobretudo com São Basílio e Santo Ambrósio, o canto dos Salmos.
Nesse século havia uma vida sacramental considerável; os fiéis comungavam não só aos domingos, mas até quatro vezes por semana em Cesareia; e São Basílio Magno (330-369) incentivava a comunhão diária. Santo Ambrósio escreveu Os mistérios, sobre os Sacramentos, sobretudo insistiu na presença real de Cristo na Eucaristia após as palavras da consagração.
São Cirilo de Jerusalém (315-386) assim falava aos fiéis:
“Na cavidade da mão recebe o Corpo de Cristo; dize Amém e com zelo santifica os olhos ao contato do corpo santo […]. Depois aproxima-te do cálice. Dize Amém e santifica-te tomando o Sangue de Cristo. A seguir, toca de leve os teus lábios, ainda úmidos, com tuas mãos, e santifica os olhos, a testa e os outros sentidos.”
Santo Efrém Sírio (306-444) falava da Eucaristia como “Glória ao remédio da vida”. Santo Agostinho (354-430) a chamava de “o pão de cada dia, que se torna como o remédio para a nossa fraqueza de cada dia.” E ainda dizia:
“Ó reverenda dignidade do sacerdote, em cujas mãos o Filho de Deus se encarna como no Seio da Virgem. A virtude própria deste alimento divino é uma força de união que nos une ao Corpo do Salvador e nos faz seus membros a fim de que nos transformemos naquilo que recebemos.”historia_da_igreja_antiga
São Cirilo de Alexandria (370-444) dizia que ao comungarmos o Corpo de Cristo nos transformamos em “Cristóforos”, portadores de Cristo. Nesse século cresce também a veneração aos santos, que se iniciou nos séculos anteriores com o culto aos mártires.
Eusébio de Cesareia (260-340) diz:
“Temos o costume de nos reunir sobre os seus túmulos, de fazer ali as nossas orações e de honrar assim as suas almas bem-aventuradas.”
Surgem muitas jaculatórias, talvez a mais famosa dirigida ao Mestre: “Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tende piedade de nós!”.
Retirado do livro: História da Igreja, A Idade Antiga. Ed. Cléofas.

O que foram as Cruzadas?

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Entenda o que, de fato, foram as Cruzadas que aconteceram na Idade Média
As “Cruzadas medievais” foram as expedições dos cristãos do Ocidente para libertar do domínio muçulmano o S. Sepulcro de Cristo em Jerusalém, que estava sendo destruído pelos turcos otomanos, muçulmanos. Começaram em 1095 e terminam em 1291, quando os turcos retomaram a Terra Santa. Não se pode entender um episódio do passado sem conhecer a mentalidade da época; senão cometemos grande injustiça.
A peregrinação a Jerusalém e aos lugares santos sempre foi uma das expressões de fé mais caras aos cristãos. No séc. IV a lmperatriz Helena, mãe de Constantino, foi à Palestina para descobrir e restaurar os testemunhos da vida, da morte e da ressurreição de Cristo, e ali construiu as grandes basílicas do Santo Sepulcro, da Natividade, da Anunciação e outras. São Jerônimo (†421), resolveu estudar a Bíblia na Terra Santa, estabelecendo-se na gruta de Belém. Aos poucos, no país de Jesus, foram surgindo numerosos mosteiros de homens e mulheres.
No séc. VII a expansão árabe muçulmana arrasou muitas comunidades cristãs na Síria, Palestina, Egito, norte da África, e Espanha em seguida. Jerusalém em 638 foi ocupada e, em parte, transformada em cidade Árabe muçulmana. As condições dos cristãos dali, e dos peregrinos, tornaram-se difíceis. O califa muçulmano Hakim, em 1009 mandou destruir a basílica do S. Sepulcro em Jerusalém e durante dez anos moveu perseguição a cristãos e judeus. Em 1071 Jerusalém caiu nas mãos dos Turcos seldjucitas. Os cristãos sofreram opressão, prisão, torturas, sequestros e mortes. Note, então, que toda violência, começou com os muçulmanos, e os cristãos agiram em legítima defesa.
O povo na Idade Média era profundamente cristão. Os valores da fé eram, o que fazia que a vida valesse a pena de ser vivida. E já havia as grandes Universidades de Paris (Sorbone), Oxford, Bolonha, Nápoles, etc. fundadas pela Igreja. Tudo que se ligasse com a fé, revestia-se de grande significado para os medievais.
Havia nessa época os famosos Cavaleiros, que serviam a Deus na bravura destemida, e até mesmo na guerra, quando a honra de Deus exigia a intervenção da espada. Eram como que “monges armados” que faziam voto de pobreza, obediência e castidade. Criaram-se assim as “Ordens militares” como os Templários e outras. Nestas o Cavaleiro se consagrava a Deus para O servir com destemor.
Sobre os Templários, dizia S. Bernardo († 1153): “Não sei se os devo chamar monges ou cavaleiros; talvez seja necessário dar-lhes um e outro nome, pois eles unem, à brandura do monge a coragem do cavaleiro” (De laude nova emilidae (IV,8).
O entusiasmo da fé explica que as multidões se prontificaram a partir para terras longínquas, desconhecidas, sujeitas a surpresas e ciladas, sem reabastecimento seguro, sem guias peritos, sem planos de viagem muito definidos, mas conscientes de que Deus o queria – “Deus lo volt”, foi o brado que no Concílio de Clermont, no ano de 1095, convocado pelo Papa Urbano II, deu origem às Cruzadas. Costuravam uma cruz de pano vermelho no ombro direito e partiam na fé.
Infelizmente, as ideias religiosas dos primeiros cruzados foram sendo, aos poucos, no decorrer de dois séculos, destruídas, de sorte que a imagem do Cavaleiro se foi modificando. Essa é a imagem que predomina em certos tratados sobre as Cruzadas.
Muitos pregadores puseram-se a percorrer a Europa, incitando os homens a participar. Grande multidão de ouvintes, de origem social diversa, assumiu então a cruz. Os expedicionários, provenientes da França, da Inglaterra, da Itália, eram dotados de benefícios espirituais pelo Papa; a quem ousasse violar ou roubar as suas propriedades durante a respectiva ausência, sofreria a pena de excomunhão.
Uma primeira Cruzada Popular, chefiada por Pedro o Eremita e Gualtero “sem Haveres”, fracassou, pois os seus membros ou pereceram na estrada ou foram exterminados pelos turcos. Foram afoitos e mal preparados.
A primeira Cruzada séria foi em 1096; quatro exércitos de senhores feudais chegavam a Constantinopla: Balduíno de Hainaut e Godofredo de Bouillon; os franceses do norte, da Normandia e os normandos da Itália. A cidade de Nicéia, perto de Constantinopla, foi reconquistada dos turcos, e voltou a ser domínio do lmperador bizantino. Após dois anos e meio de lutas os cruzados venceram o exército do califa Solimão em Doriléia e tomaram as importantes cidades de Edessa (1097) e Antioquia (1098), chegaram finalmente a Jerusalém e dela se apoderaram (1099). Essa sangrenta expedição custou a vida a cerca de meio-milhão de homens, terminou com a fundação de quatro centros latinos: o reino de Jerusalém, o principado de Antioquia, os condados de Edessa e de Trípolis, aos quais foram atribuídos governantes latinos. As grandes cidades da costa palestinense foram ocupadas por navegantes e comerciantes ocidentais. Os peregrinos recomeçaram a afluir à Terra Santa. Para protegê-los e defendê-los, foram criadas as Ordens de Cavaleiros Militares (Hospitalários, Templários, etc.).
Houve outras Cruzadas porque os territórios latinos no Oriente eram constantemente ameaçados. A segunda foi em 1147 porque os turcos reconquistaram e destruíram Edessa. Exortados por S. Bernardo, o rei de França, Luís VII, e o da Germânia, Conrado III, uniam suas tropas num só exército. Mas não conseguiram tomar nem Damasco, e regressaram sem êxito em 1149.
A terceira Cruzada foi em 1190. O sultão Saladino apoderou-se de Jerusalém em 1187. Por um apelo do Papa Urbano III, o rei Filipe Augusto da França, Frederico Barbaroxa da Alemanha, e Ricardo Coração de Leão, da Inglaterra, se uniram e partiram. Mas Frederico morreu afogado no rio Cydnus (Cilícia), o que provocou a dispersão do seu exército (1190). Os reis da França e da Inglaterra dirigiram-se por mar a S. João de Acre, que conseguiram ocupar em 1191. Embora lutassem juntos, os reis não eram unidos. Filipe Augusto, doente, voltou à Europa, e Ricardo também voltou em 1192.
Na quarta Cruzada o Papa Inocêncio III (1198-1216) aspirava a libertação de Jerusalém. Mas a Cruzada se afastou da sua orientação, sob a influência de Filipe da Suábia, de Veneza e dos gregos. Os cruzados conquistaram Constantinopla fazendo da mesma a capital de um Império latino, que durou até 1261, quando Miguel o Paleólogo retomou Constantinopla.
A quinta Cruzada, de 1219 a 1221, foi assumida por alemães e húngaros, que se dirigiram para o Egito; mas a cheia do Nilo obrigou-os a retirar-se. Na sexta Cruzada, chamada de “peregrinação sem fé” (1228-1229), o rei Frederico II, excomungado pelo Papa, resolveu empreender uma Cruzada, não tanto para libertar o S. Sepulcro, quanto para unir em sua pessoa os títulos de Imperador da Alemanha e rei de Jerusalém; obteve do sultão do Egito, por dez anos, o domínio sobre Jerusalém, Belém e Nazaré. Terminado esse prazo, Jerusalém recaiu nas mãos dos Árabes.
A sétima e oitava Cruzadas foram realizadas pelo grande rei São Luís IX, da França, para reconquistar a Cidade Santa. Em 1248, atacou o sultão Eyoub no Egito. Como em 1221, também dessa vez os cristãos tomaram Damieta, mas caíram diante de Mansourah. Foram todos encarcerados, só conseguindo a liberdade mediante enorme preço de resgate.historiaigrejadademedia
Em 1270, S. Luís renovou seus esforços, conseguindo a muito custo constituir um exército para empreender nova expedição. Mas o rei atingido de peste, faleceu em 25 de agosto de 1270. Após estes fatos, a pressão dos exércitos turcos se intensificou. Em 1291 encerrou-se a era das Cruzadas.
É verdade que também houve as “Cruzadas das crianças”?
Houve ainda as “Cruzadas das crianças”, significativa do espírito da época. Em 1212, um jovem pastor, chamado Estêvão, dizendo-se enviado por Deus, convocou as crianças da França para uma Cruzada. O exército de 30.000 jovens embarcou em Marselha. Dois condutores de frota haviam se comprometido a transportá-los ao Oriente gratuitamente; todavia venderam-nos aos mercadores de escravos no Egito. A maioria dos participantes morreu; um pequeno número recuperou mais tarde a liberdade.
Na mesma época, na Alemanha, vinte mil jovens, dirigidos por Alexandre, imperito, fracassaram.
Na verdade as Cruzadas não foram um fracasso ou um contra-testemunho dos cristãos. Não se pode deixar de sublinhar em primeiro lugar o que de positivo as Cruzadas representam. A fé e o amor dos cristãos, na Idade Média, demonstraram a grandeza do seu amor a Cristo. E, além disso, as Cruzadas trouxeram benefícios no plano cultural e científico. O contato entre latinos, gregos (bizantinos) e árabes trouxe um avanço na matemática, medicina, indústria, comércio e outros ramos das atividades humanas; desenvolveu a navegação e modificou as condições econômicas da sociedade feudal. Preparou o grande surto das artes e das ciências exatas nos séculos XV/XVI.
Entendendo bem o contexto medieval, as Cruzadas não foram uma “mancha negra”; ao contrário, atestam – segundo o contexto da época – a unidade dos povos da Alta Idade Média, que encontraram na sua fé a força para realizar façanhas heroicas, porém marcadas as limitações humanas. O homem moderno não consegue compreender o que isto significava para o homem medieval.
Prof. Felipe Aquino


Os Racionalistas e Jesus Cristo


Os racionalistas dos séculos XVIII e XIX, muitos deles inimigos viscerais da Igreja e do Cristianismo, que negaram ser Jesus o Filho de Deus, como Voltaire, no entanto, deram testemunho da sua real existência e inigualável grandeza humana.
É muito interessante ouvir o que esses críticos racionalistas disseram sobre Jesus. Foram homens cultos e preparados, expoentes, chefes de escolas, líderes. Os racionalistas não gastariam tanto tempo estudando um personagem fictício. Todas as citações que se seguem foram retiradas do livro Jesus Cristo é Deus? de J. A. Laburu, 2000.
Voltaire, détail du visage (château de Ferney)Ernest Renan (1823-1892), ao escrever a vida de Jesus, disse:
“Com seu perfeito idealismo, Jesus é a mais alta regra de vida, a mais destacada e a mais virtuosa. Ele criou o mundo das almas puras, onde se encontram o que em vão se pedem à terra, a perfeita nobreza dos filhos de Deus, a santidade consumada, a total abstração das mazelas do mundo, a liberdade enfim” (E. Renan, Vie de Jèsus, 14c, XV, XVII, XX, XXVIII) .
“Jesus […] criou o ensinamento prático mais belo que a humanidade recebeu” (p. 125).jesus_cristo_deus
“Jesus Cristo nunca será superado” (Idem p. 325).
“Jesus está no mais alto cimo da grandeza humana, […] superior em tudo aos seus discípulos, […] princípio inesgotável de conhecimento moral, a mais alta […] Nele se condensa tudo quanto existe de bom e elevado em nossa natureza” (Ibidem, pp. 465, 468, 474).
“A Igreja, esta grande fundação, foi certamente a obra pessoal de Jesus. Para ter-se feito adorar até este ponto, é necessário que Ele tenha sido digno de adoração” (Ibidem, p. 463).
Alfred Loisy (1854-1940), o apóstata modernista afirmou:
“Sente-se por tudo em seus discursos, em seus atos, em suas dores, não sei quê de divino, que eleva Jesus Cristo, não somente por sobre a humanidade ordinária, mas também por sobre o mais seleto da Humanidade” (Le Quatrième Evangile, 1903, p. 72).
“O Cristianismo representa incontestavelmente o maior e mais feliz esforço até agora realizado para elevar moralmente a Humanidade” (La Morale Humaine, p. 185-186).
A. von Harnack, o chefe do racionalismo alemão também falou de Jesus:
“A grandeza e a força da pregação de Jesus estão em que ela é, ao mesmo tempo, tão simples e tão rica, tão simples que até encerrada em cada um dos pensamentos fundamentais por ela expressados, tão rico que cada um dos seus pensamentos parece inesgotável, dando-nos a impressão de que jamais chegamos ao fundo das suas sentenças e parábolas.”
“Jesus pôs à luz pela primeira vez, o valor de cada alma humana e ninguém pode desfazer o que Ele fez. Qualquer que seja a atitude que, diante de Jesus Cristo, se adote, não se pode deixar de reconhecer que na História, foi Ele quem elevou a Humanidade a esta altura” (Das Wesen des christentums, 1901, pp. 33-34).
P. Wernle disse:
“É totalmente impossível representar-se uma vida espiritual como a de Jesus.”
Augusto Sabatier, pai do modernismo francês, disse:
“Jesus Cristo é a alma mais pura que jamais existiu; sincera, pura, que conseguiu elevar-se a uma altura a que o homem nunca poderá atingir.”
Channing, que negou radicalmente a divindade de Jesus, confessou:
“Creio que Jesus Cristo é mais que um homem. Os que não lhe atribuem a preexistência [isto é, os que como ele negavam-lhe a divindade] não o consideram, por isso, de maneira alguma, simples homem, mas estabelecem entre ele e nós profunda diferença. Aceitam, de bom grado, que Jesus Cristo, por sua grandeza e por sua bondade, supera toda e qualquer perfeição humana” (Discurs sur le caractere de Christ).
Johann Wofgang von Goethe (1749-1832):
“Curvo-me diante de Jesus Cristo como diante da revelação divina do princípio supremo da moralidade” (Laburu, p. 71).
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), expoente máximo do iluminismo francês:
“Se a vida e a morte de um Sócrates são as de um sábio, a vida e a morte de Jesus Cristo são a de um Deus” (Idem p. 71).hist_igreja_menor
David Friedrich Strauss, inimigo feroz do catolicismo:
“Cristo não podia ter sucessor que se lhe avantajasse […]. Jamais, em tempo algum, será possível ascender mais alto que Ele, nem imaginar-se nada que sequer o iguale” (Ibidem p. 71).
Por essas citações dos expoentes maiores do racionalismo, vemos que perante a sua crítica Jesus Cristo não só existiu como é o máximo em sabedoria moral, em retidão, em justiça, em verdade; embora não o tenham aceitado como Deus.
Retirado do livro: História da Igreja, A Idade Antiga. Ed. Cléofas.

História da Igreja: A Igreja e as Missões


cidade_vaticano_grO Padroado
A Igreja no Brasil, durante quase quatro séculos, foi marcada pela instituição do padroado. Tratava-se de uma estreita ligação do rei de Portugal (e, após a independência, dos Imperadores do Brasil) com o poder eclesiástico, no sentido de que aquele teria certos direitos e privilégios, como nomear bispos, conferir benefícios eclesiásticos ou receber dízimos das igrejas sob sua jurisdição.
A origem do padroado situa-se na Idade Média, ligada a dois fatores: o sistema feudal e as Ordens Religiosas militares.
O sistema feudal: Durante a Idade Média, especialmente no séc. X, desenvolveu-se a praxe segundo a qual o Senhor do feudo era o patrono das igrejas situadas em seu domínio. Desse modo, os senhores feudais escolhiam os vigários e curas para as ditas igrejas. No Séc. XVI, visto que os reis da Espanha e Portugal se tinham empenhado na propagação da fé católica nas terras então descobertas, foram-lhes concedidos pela Santa Sé privilégios semelhantes.
As Ordens Militares: Outro fator que se encontra na origem do padroado consiste na formação de Ordens Militares, compostas de leigos que seguiam uma regra de vida aprovada pela Santa Sé. Tendo surgido no tempo das Cruzadas, muito se desenvolveram na Idade Média. Entre elas, destaca-se a Ordem dos Templários, a qual, com o passar do tempo, acumulou muitos bens. Estes foram cobiçados por Filipe, o Belo, rei da França (séc. XIV), que pressionou o Papa, com diversas acusações à Ordem, para obter a supressão da mesma. Esta, de fato, ocorreu na França em 1312. Em Portugal, o rei D. Diniz, com o fim de aproveitar os bens da dita Ordem, formou contra semelhante, a Ordem da Cavalaria de Nosso Senhor Jesus Cristo (em 1313, aprovada em 1319), mais tarde unida às Ordens de Aviz e de Santiago.historiaigrejadademedia
Em 1456 foi outorgada, pelo Papa Calixto III, à Ordem de Cristo, a jurisdição espiritual nas terras conquistadas (Bula “Inter Coetera”). Com isto o Prior do Convento de Tomar, da Ordem de Cristo, recebia, sobre as regiões conquistadas, os mesmos poderes de um bispo em sua diocese. Este poder, reservado ao Prior de Tomar, foi logo cobiçado pelos reis, que para isso procuraram para si o título de Grão-Mestre da Ordem.
Em Bula de 1516 o papa Leão X concedeu ao rei de Portugal o Padroado sobre todas as igrejas das terras conquistadas. A jurisdição espiritual, porém, era reservada ao Prior do Convento de Tomar. Muitos, porém, interpretaram erroneamente a Bula papal, outorgando a prerrogativa da jurisdição espiritual aos reis de Portugal, que possuíam o título de Grão-mestre da Ordem.
Houve assim abusos da parte da Coroa, especialmente em certas épocas, como o exigir que as Bulas pontifícias (exceto as de “foro da consciência”) fossem aprovadas pela Coroa antes de chegar ao clero português e que os bispos tivessem a concessão da Corte para manter relações com a Santa Sé.
O sistema do padroado, a par desses aspectos negativos, teve também seu saldo positivo, quando exercido dentro dos limites das Bulas: facilitou a ereção de igrejas; providenciou a remuneração do clero e dos missionários e a dotação de dioceses, paróquias, colégios…, favoreceu ainda as missões e a unidade da Igreja nas terras conquistadas.
Quando da independência do Brasil, o Papa Leão XII separou de Portugal a Ordem de Cristo e atribuiu a ela e a seus Grão-mestres(então, os Imperadores), o padroado (Bula Praeclara Portugaliae, 1827). Permaneceu assim estreitamente unida a Igreja ao Estado no Brasil. Isto levou a ingerência indevidas do poder civil na Igreja; no tempo do Império, um dos casos mais graves foi o dos Padres Feijó e Antônio Maria de Moura, apresentados pela Regência, em 1833, para bispos; a sua indicação não foi aceita pela Santa Sé, visto terem os referidos padres certas idéias discordes da Igreja. Houve fortes tensões, chegando um membro da Câmara a propor o desvinculamento da Igreja no Brasil frente do Vaticano, cuja autoridade se transferiria para o Governo. Esta proposta não foi aprovada e a questão se resolveu com a renúncia de Pe. Feijó e Pe. Moura a mitra episcopal, tendo então o Governo apresentado novos nomes.
Outro grave conflito foi a chamada “Questão Religiosa”, durante o segundo Império.
A evangelização no Brasil Colônia
Os índios
Ao chegarem os portugueses ao Brasil, aqui encontraram os habitantes nativos, dispersos pelo, território, em vida semi-nômade e agrupados em diversas tribos. Em sua religião, possuíam vaga ideia de um Ser supremo e muito poderoso, a quem chamavam Tupã; criam também em espíritos, bons e maus (o espírito mau era denominado Anhangá). Algumas tribos cultuavam o Sol (Guaraci) e a Lua (Jaci). Não possuíam ídolos, templos ou sacerdotes, embora admitissem um feiticeiro ou curandeiro (o pagé).
Muitas teorias consideravam os índios seres inferiores, irracionais, incapazes de autodeterminação e assim destinados a ser dominados. Contra estas teorias lutou a Igreja, destacando-se nesse contexto o Breve do Papa Paulo III (Veritas ipsa, de 29.5.1537), que defendia a racionalidade dos indígenas, sua capacidade, por conseguinte, de se abrir a fé cristã e a abraçar; sendo seres livres, não poderiam ser obrigados a conversão nem submetidos à escravidão.
Primeira Evangelização
Embora estivesse os principais objetivos da ação da Coroa na terra recém-descoberta, não houve, até 1549, evangelização sistemática e continuada dos indígenas.
O primeiro trabalho de evangelização foi realizado certamente pelos degredados ou vítimas de naufrágio, talvez já pelos dois degredados aqui deixados por Cabral, pois é dito no relatório da expedição de Gonçalo Coelho (entre 1502 e 1503) que o capelão da nau batizou a muitos indígenas. Isto supõe um trabalho anterior de evangelização. Também os capelães das naus portuguesas e espanholas que aqui aportavam e permaneciam por algum tempo, dedicavam-se à evangelização, como, por exemplo, os padres Francisco Lemos e Francisco Garcia, no ano 1526 e seguintes.
Um número maior de indígenas, entretanto, foi evangelizado e batizado na época das feitorias (1516-1534). Como as condições eram ainda muito precárias, a evangelização foi bastante rudimentar.
A partir da formação de Capitanias, com a fundação das primeiras paróquias (1535), o trabalho de evangelização tornou-se mais organizado. A primeira missão se deu por iniciativa de franciscanos espanhóis, chefiados por Frei Bernardo de Armenta, que se dirigiam ao Rio Prata. Desembarcando em Santa Catarina no ano de 1538, iniciaram uma missão entre os índios Carijós: a missão de Mabiaçá ou Imbiaça. Houve muitos convertidos, o trabalho prosperou mas a missão acabou em 1548 quando os aprisionadores de índios os levaram para São Vicente e Ilhéus.
Os jesuítas
A evangelização sistemática dos indígenas começou propriamente com a chegada dos membros da Companhia de Jesus ao Brasil, a quem se deve de fato o maior mérito na evangelização neste período. Os primeiros jesuítas chegaram com o Governador-Geral Tomé de Souza à Bahia em 1549. Vieram em número de seis, sendo quatro padres e dois irmãos: Pe. Manoel da Nóbrega (superior), Pe. Leonardo Nunes, Pe. João de Azpilcueta Navarro, Pe. Antônio Pires e os irmãos Vicente Rodrigues e Diogo Jácome, mais tarde ordenados.
Os primeiros contatos com os indígenas se deram nas aldeias próximas a Salvador. De início, limitaram-se a batizar crianças e adultos em perigo de vida. Pouco depois dedicaram-se a preparar os adultos para o batismo. Seu ensino consistia, segundo o costume da época, numa breve explicação das verdades fundamentais da fé. Os maiores problemas, porém, concentraram-se no combate a hábitos arraigados entre os indígenas, como a antropofagia e a poligamia. Quanto a isto, do catecúmeno adulto era exigido, para o batismo: não matar seus semelhantes, não comer carne humana, viver com apenas uma mulher. O costume de mais árduo combate foi a antropofagia, para o quê foram necessárias leis proibitivas de Tomé de Souza e Mem de Sá.
No início de 1550 chegaram mais quatro jesuítas, que se localizaram em São Vicente, com sete meninos órfãos que vinham para ajudar na catequese. Em julho de 1553, chegaram outros sete missionários à Bahia, entre os quais o Pe. Luís da Grã, futuro provincial, e o Ir. José de Anchieta mais tarde ordenado sacerdote, e que foi beatificado em 1980, pelo Papa João Paulo II.
O método utilizado pelos jesuítas consistia em contatos diretos com os índios e na formação de aldeamentos indígenas, com a finalidade de atraí-los para hábitos mais civilizados e para a fé cristã. Há quem julgue atualmente que os jesuítas teriam imposto o Cristianismo reprimindo os indígenas e usando a força. Ora, devemos observar em primeiro lugar que os índios possuíam um caráter belicoso, que os levava a numerosos ataques aos brancos, o que era duramente punido pela autoridade civil. Por outro lado, os portugueses agiam muitas vezes somente com o intuito de explorar. Tais abusos sempre foram condenados pelos missionários, de modo que não lhes podem ser atribuídos os desmandos da autoridade civil. Se muitas vezes os missionários aproveitaram da relativa pacificação dos índios, devida a força civil, para estender seu trabalho de evangelização, isto não significa obrigar a fé e impor o Cristianismo a força. Pelo contrário, era norma da Santa Sé respeitar a liberdade dos ameríndios adultos no tocante à aceitação ou não da fé cristã.
Em síntese, neste período o trabalho de evangelização foi repleto de dificuldades e não chegou a ser muito profundo: havia falta de pessoas aptas que conhecessem a língua e os costumes dos nativos; faltava também apoio mais expressivo (quando não havia hostilidade) dos colonizadores; além disso, o caráter semi-nômade das populações indígenas e as enormes distancias criaram outros tantos obstáculos.
Carmelitas, Beneditinos, Franciscanos
O trabalho de catequese, embora entregue principalmente aos jesuítas, contou ainda com colaboradores. A par dos padres diocesanos e da missão franciscana em Santa Catarina, vieram estavelmente, após a chegada dos jesuítas, outras Ordens Religiosas, que se fixaram no fim do séc. XVI: carmelitas, beneditinos, franciscanos.
Os Carmelitas foram os primeiros a se fixar após os jesuítas. Chegaram a Pernambuco, com a expedição de Frutuoso Barbosa, em 1580. Fixaram-se em Olinda. Outro grupo, chegado pouco mais tarde, dirigiu-se para a capitania de São Vicente. Não se dedicaram às missões indígenas, mas ao trabalho com os brancos.
Os Beneditinos tiveram em 1581 autorizada a fundação de um Mosteiro na cidade de Salvador, o qual foi elevado a Abadia em 1584. Com as vocações da terra e os auxílios provenientes de Portugal, foram feitas novas fundações: Rio de Janeiro (1585), Olinda (1590), Paraíba (1596) e São Paulo (1598). Por serem Ordem monástica, não se dedicaram às missões indígenas, mas muito contribuíram para o aprofundamento doutrinal e espiritual dos habitantes da terra.
Os Franciscanos estiveram presentes já bem cedo, na missão de Imbiaça (1538-48), bem como em Porto Seguro em 1520 e 1546. Em 1583 trabalharam perto de São Paulo e também no Espírito Santo. Sua fixação, porém, deu-se a partir de 1585, quando Frei Melquior de Santa Catarina chegou ao Brasil com a permissão de aqui fundar conventos. Neste mesmo ano foi fundado o Convento de Nossa Senhora das Neves em Olinda. Posteriormente a Ordem passou à Bahia, Igaraçu, Paraíba, Espírito Santo, dedicando-se a catequese indígena e aos colonos brancos.HistóriadaIgrejaModernaeContemp
Lançando um olhar panorâmico sobre esta época, podemos ver que o trabalho dos missionários foi rico de boa vontade e desenvolvido de acordo com os meios e o pensamento de então. Não é correto dizer que a cultura indígena não foi respeitada. A par do combate árduo, mas necessário, aos costumes indígenas, como a antropofagia, a poligamia, as bebedeiras, houve grande respeito aos valores positivos da cultura indígena e grande capacidade no tratar com os índios. Por outro lado, nunca houve uso da força para converter ao Cristianismo. A ação missionária da Igreja no Brasil nessa época tem, portanto, valioso saldo positivo.
Eis como, em sua visita ao Brasil, o S. Padre João Paulo II apreciou o trabalho missionário:
“Numa carta de 1º de junho de 1560, revelando a sua ânsia de conduzir ao Senhor os povos deste país, o Padre Anchieta escrevia textualmente: ‘Por este motivo, sem nos deixar intimidar pelas calmarias, tempestades, chuvas, correntezas espumantes e impetuosas dos rios, procuramos sem descanso visitar todas as aldeias e vilas, quer dos índios, quer dos portugueses; e mesmo de noite acorremos aos doentes, atravessando florestas tenebrosas, a custo de grandes fadigas, tanto pela aspereza dos caminhos como pelo mau tempo.’
Com esta mesma finalidade, levando em consideração os dotes e qualidades naturais dos índios, a sua sede de saber, a sua generosidade, hospitalidade e o seu senão comunitário, Anchieta promoveu e desenvolveu as ‘aldeias’, centros onde a vida de cada um se fundia com a dos outros, de maneira adequada, no trabalho, na solidariedade, na cooperação. Coração de cada um desses centros era sempre a Casa de Deus, onde o Sacrifício Eucarístico era celebrado regularmente e onde o Senhor Sacramentado permanecia presente.
Apreciando a sede de saber dos ‘brasis’, o seu acentuado talento para a música, a sua habilidade e outros dotes, criou para eles centros de formação cultural e artesanal que, pouco a pouco, contribuíram para elevar o nível geral das gerações futuras”. (Homilia proferida durante a missa em São Paulo, 3 de julho de 1980).

A História do povo Judeu


Para entender a Bíblia é preciso conhecer um pouco da história do povo hebreu, pois o Antigo Testamento (AT) é a narração de sua história. Sem isso não sabemos que parte do AT se refere a essa história, e fica difícil de o entender.
Vejamos então, um resumo disso:
Arch_of_Titus_MenorahEm 1800 a.C., Abraão e Sara partiram da Mesopotâmia para a Terra Prometida, chamados por Deus. Abraão teve dois filhos: Isaac com Sara; e Ismael com a escrava Agar. De Isaac surgiu o povo judeu; de Agar os árabes.
Isaac se casou com Rebeca e deles nasceu Jacó, que se casou com Raquel;  deles nasceram 12 filhos, que serão as Doze tribos de Israel: Rubem, Simão, Levi, Judá, Issacar, Zabulon, José, Benjamim, Dã, Neftali, Gad e Aser.hist_igreja_menor
Em 1600 a.C., o povo judeu precisou ir para o Egito por causa da fome na Palestina; e ali ficaram 400 anos, e se multiplicaram.
Moisés (Êxodo), por volta do ano 1250 a.C., retira o povo do Egito e o leva para o deserto do Sinai. Ali Deus educa esse povo em suas leis. Faz uma Aliança com Moisés e lhe dá as tábuas da Lei: Os Dez Mandamentos.
Em 1200 a.C. – Josué penetra na Terra Prometida, atravessando o rio Jordão a pé enxuto, como tinham atravessado o mar Vermelho.
Houve um “Período dos Juízes”, 200 anos, até cerca do ano 1000 aC. Entre eles: Débora, Baraque, Jefté e Sansão.
Samuel foi o ultimo juiz e profeta; sagrou o primeiro rei de Israel, Saul, por volta do ano 1000 a.C. .
Davi foi o  primeiro rei de todos os hebreus; reinou 40 anos em Israel; 7 anos em Hebron e 33 em Jerusalém. É a imagem do Messias, que unifica e salva o povo de Deus.
A ele Deus prometeu através do profeta Natan que um dos seus descendentes seria o “Rei eterno” (2Sm 7, 1-17).
Davi foi sucedido por seu filho Salomão, no ano 970 a.C. Construiu o Templo de Jerusalém.
O filho de Salomão, Roboão  sucedeu-lhe depois de 40 anos; mas em  930 a.C. houve um Cisma: as 10 tribos do Norte separaram-se das tribos do Sul, Judá e Benjamim. Roboão ficou no sul com sede em Jerusalém. Jeroboão ficou no Norte, em Siquém na Samaria. Foram os tempos dos profetas Elias (850 a.C.) e Eliseu.
Os profetas Isaías (primeira parte – caps. 1 a 39) e Miquéias (725 a.C.) atuaram junto às tribos de Judá, enquanto os profetas Elias, Eliseu, Amós, Oséias (750), atuaram junto ao reino do Norte, que teve duração de 200 anos.
Em 722 a.C., o rei da Assíria, Sargão II conquistou a Samaria e levou as 10 tribos do Norte para o exílio.
Do período de 722 a.C. até a queda de Judá na mão dos Babilônios (578 a.C.), atuaram em Judá os profetas Jeremias, Sofonias, Naum, Habacuque e Ezequiel.
No ano de 622 a.C., o rei Josias,  de Judá, agora Israel, promoveu uma grande reforma religiosa e social, mas de poucos resultados.
Em 598 a.C., o rei Nabucodonosor, da Babilônia, dominou Jerusalém e levou as duas tribos do Sul para o exílio de setenta anos. O rei, os grandes do reino, os chefes das empresas e sete mil guerreiros foram deportados. O salmo 136 mostra bem este desespero.
O profeta Ezequiel, em 593 a.C., foi para o exílio, antes da segunda deportação que ocorreu em 587 a.C. .
Nabucodonosor deixou em Jerusalém, como vice-rei, Sedecias, que se revoltou contra a Babilônia. Nabucodonosor a incendiou em 589 a.C. Jerusalém ficou sob o governo dos caldeus.
No tempo do exílio atuaram os profetas Ezequiel e Abdias, e é desta época a segunda parte do livro de Isaías (40 a 55).
Em 538 a.C., o rei da Pérsia, Ciro, tomou a Babilônia, Zorobabel. Houve a reconstrução das muralhas da cidade e
do Templo profanado. Após o exílio atuaram o governador Neemias e o sacerdote Esdras; os profetas Ageu (520 a.C.), Zacarias (520 a.C.), Abdias, Malaquias, Joel, e a última parte de Isaías (11 últimos capítulos, 56 a 66).
Os Profetas mostraram  o futuro Messias.
No ano de 338 a.C. a Palestina foi conquistada por Alexandre Magno rei da Macedônia, que venceu os persas em 331 a.C..  Alexandre teve vida curta (†323 a.C.) e seus quatro generais e as suas dinastias passaram a governar os territórios que ele deixou, dividindo entre eles o grande império grego.
Ptolomeu I Lago ficou com o Egito e, a partir de 295 a.C. com a terra de Judá. O domínio desta família se estendeu até o ano 198 a.C.. O rei seguinte, Antíoco IV Epífanes (175-163), profanou o Templo de Jerusalém ao construir nele um altar ao deus Zeus (Júpiter).
O sacerdote Matatias levantou-se como chefe de guerrilha e guerra santa contra os sírios, com os seus filhos João, Simão, Judas, Eleazar e Jônatas (1Mac 2, 1-4).  Foi a época da revolta dos Macabeus; liderados por Judas Macabeu (166-160 a.C.), Jônatas (160-142 a.C.) e Simão (142-134 a.C.), que  saíram vitoriosos e a Judéia viveu 130 anos de independência, o que aconteceu poucas vezes.
Em 160 a.C. os monges judeus essênios (“filhos da luz”), em Qumran, cerca de 4000 pessoas, aguardavam ansiosamente a chegada do Messias. Em 1947 descoberta houve a descoberta das onze grutas de Qumran, com o encontro de manuscritos da Bíblia de antes do ano 70. O livro de Isaias foi encontrado inteiro. Esses monges judeus foram aniquilados no ano 70dC, quando o general Tito tomou Jerusalem.
De 134 a 104 a.C. reinou na Judeia João Hircano, filho de Simão Macabeu; Aristóbulo I, filho de João Hircano. De 104 a 76 a.C. reinou Alexandre Janeu, filho de João Hircano; de 76 a 67 a.C. reinou Alexandra, neta de Alexandre Janeu; de 67-63 a.C. reinou Aristóbulo II, filho de Alexandre Janeu, quando o general romano Pompeu invadiu a Judéia.
Em 63 a.C., o general romano Pompeu o Grande, invadiu a Palestina e a dominou anexando-a ao Império Romano. Sob o domínio dos romanos, reinou de 63-40 a.C., Hircano II, filho de Alexandre Janeu.
Em 40 a.C. os partos invadiram a Judeia. De 37 a 4 a.C., Herodes o Grande, que não era judeu, mas idumeu,  reinou na Judéia por determinação do imperador Júlio Cesar, até 4 a.C. .Foi ele quem perseguiu Jesus.  Não confundir com Herodes Ântipas (o “tetrarca Herodes”), seu filho, que mandou degolar João Batista, já por volta do ano 30 d.C. (depois de Cristo). E nem confundir com Herodes Agripa que mandou matar o Apóstolo São Tiago maior.historia_da_igreja_antiga
O procurador romano nomeava o Sumo Sacerdote dos judeus, que era o chefe do Sinédrio. O quinto procurador romano da Judeia foi Poncio Pilatos (27-37 d.C.) nomeado pelo imperador romano Tibério Augusto, sucessor de Cesar Augusto. Do ano 37 a 44 d.C., a Judéia e a Samaria foram governadas por Herodes Agripa I, sobrinho de Herodes Ântipas (o “tetrarca Herodes”). Foi Agripa quem perseguiu os cristãos, matou o apóstolo Tiago maior, e prendeu Pedro (At 12, 1-23).
Herodes Agripa I deixou os filhos Marcos Júlio  Agripa (Agripa II), Berenice e Drusila. Da morte de Agripa I (44 d.C.) até a queda de Jerusalém (70 d.C.) foi um período muito violento para Israel. Em 70 d.C. o general Tito dominou Jerusalém por causa de uma revolta dos judeus e destruiu o Templo que Herodes o Grande tinha reconstruído, e que era o do tempo de Jesus.

Influência da Virgem Maria na vida da Igreja


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1. Depois de ter refletido sobre a dimensão Mariana na vida eclesial, disponho-nos agora a pôr em evidência a imensa riqueza espiritual que Maria comunica à Igreja, com o seu exemplo e a sua intercessão.
Desejamos, antes de mais, deter-nos a considerar brevemente alguns aspectos significativos da personalidade de Maria, que oferecem a cada fiel indicações preciosas para acolher e realizar plenamente a própria vocação.
Maria precedeu-nos na via da fé: crendo na mensagem do anjo, ela é a primeira a acolher, e de modo perfeito, o mistério da Encarnação (cf. Redemptoris Mater, 13). O seu itinerário de crente inicia ainda antes do princípio da maternidade divina e desenvolve”se e aprofunda”se durante toda a sua experiência terrena. É audaz a sua fé, que na Anunciação crê no humanamente impossível e em Caná impele Jesus a realizar o primeiro milagre, provocando a manifestação dos seus poderes messiânicos (cf. Jo. 2,1″5).
Maria educa os cristãos a viverem a fé como caminho empenhativo e envolvente, que, em todas as épocas e situações da vida, requer audácia e perseverança constante.salverainha
2. A fé de Maria está ligada à sua docilidade à vontade divina. Crendo na Palavra de Deus, pôde acolhê-la plenamente na sua existência e, mostrando-se disponível ao soberano desígnio divino, aceitou tudo o que lhe era requerido do Alto.
A presença da Virgem na Igreja encoraja assim os cristãos a porem-se cada dia à escuta da Palavra do Senhor, para compreenderem o seu plano de amor nas diversas vicissitudes quotidianas, cooperando com fidelidade para a sua realização.
3. Desse modo, Maria educa a comunidade dos crentes para olhar rumo ao futuro, com pleno abandono em Deus. Na experiência pessoal da Virgem, a esperança enriquece-se de motivações sempre novas. Desde a Anunciação, Maria concentra no Filho de Deus, encarnado no seu seio virginal, as expectativas do antigo Israel. A sua esperança revigora”se nas fases sucessivas da vida de Nazaré e do ministério público de Jesus. A sua grande fé na palavra de Cristo que tinha anunciado a sua ressurreição ao terceiro dia, não a fez vacilar nem sequer diante do drama da Cruz: ela conservou a esperança no cumprimento da obra messiânica, esperando sem hesitações, depois das trevas da Sexta-Feira Santa, a manhã da ressurreição.
No seu difícil peregrinar na história, entre o “já” da salvação recebida e o “não ainda” da sua plena realização, a comunidade dos crentes sabe que pode contar com o auxílio da “Mãe da Esperança” que, tendo experimentado a vitória de Cristo sobre as potências da morte, lhe comunica uma capacidade sempre nova de espera do futuro de Deus e de abandono às promessas do Senhor.
4. O exemplo de Maria faz com que a Igreja aprecie melhor o valor do silêncio. O silêncio de Maria não é só sobriedade no falar, mas sobretudo capacidade sapiencial de fazer memória e de acolher, num olhar de fé, o mistério do Verbo feito homem e os eventos da sua existência terrena.
É este silêncio acolhimento da Palavra, esta capacidade de meditar no mistério de Cristo, que Maria transmite ao povo crente. Em um mundo cheio de confusão e de mensagens de todo o gênero, o seu testemunho faz apreciar um silêncio espiritualmente rico e promove o espírito contemplativo.
Maria testemunha o valor de uma existência humilde e escondida. Normalmente todos exigem, e por vezes pretendem, poder valorizar inteiramente a própria pessoa e as próprias qualidades. Todos são sensíveis à estima e à honra. Os Evangelhos referem em várias ocasiões que os Apóstolos ambicionavam os primeiros lugares no reino, discutiam entre si quem era o maior e que Jesus lhes teve de dar, quanto a isto, lições sobre a necessidade da humildade e do serviço (cf. Mt. 18,1-5; 20, 20-28; Mc. 9,33-37; 10,35-45; Lc. 9,46-48; 22,24-27). Maria, ao contrário, jamais desejou as honras e vantagens de uma posição privilegiada; procurou sempre cumprir a vontade divina, levando uma existência segundo o plano salvífico do Pai.
A quantos não raro sentem o peso duma existência aparentemente insignificante, Maria manifesta quanto pode ser preciosa a vida, se é vivida por amor de Cristo e dos irmãos.
5. Maria, além disso, testemunha o valor duma vida pura e repleta de ternura por todos os homens. A beleza da sua alma, totalmente doada ao Senhor, é objeto de admiração para o povo cristão. Em Maria a comunidade viu sempre um ideal de mulher, cheia de amor e de ternura, porque viveu na pureza do coração e da carne.
Perante o cinismo duma certa cultura contemporânea que, muitas vezes, parece não reconhecer o valor da castidade e banaliza a sexualidade, separando-a da dignidade da pessoa e do projeto de Deus, a Virgem Maria propõe o testemunho duma pureza que ilumina a consciência e conduz a um amor maior pelas criaturas e pelo Senhor.
6. E ainda: aos cristãos de todos os tempos, Maria mostra-se como aquela que prova uma viva compaixão pelos sofrimentos da humanidade. Essa compaixão não consiste somente numa participação afetiva, mas traduz-se numa ajuda eficaz e concreta diante das misérias materiais e morais da humanidade.
A Igreja, seguindo Maria, é chamada a assumir uma atitude idêntica para com os pobres e todos os sofredores da terra. A atenção materna da Mãe do Senhor às lágrimas, às dores e às dificuldades dos homens e das mulheres de todos os tempos, deve estimular os cristãos, de modo particular ao aproximar-se do terceiro milênio, a multiplicar os sinais concretos e visíveis dum amor que faça os humildes e os sofredores de hoje participarem nas promessas e esperanças do mundo novo, que nasce da Páscoa.
7. O afeto e a devoção dos homens para com a Mãe de Jesus ultrapassam os confins visíveis da Igreja e impelem os ânimos a sentimentos de reconciliação. Como uma Mãe, Maria quer a união de todos os seus filhos. A sua presença na Igreja constitui um convite a conservar a unanimidade de coração, que reinava na primeira comunidade (cf. At 1,14) e, por conseguinte, a procurar também as vias da unidade e da paz entre todos os homens e todas as mulheres de boa vontade.
Na sua intercessão junto do Filho, Maria pede a graça da unidade do gênero humano, em vista da construção da civilização do amor, superando as tendências à divisão, às tentações da vingança e do ódio, e à fascinação perversa da violência.
8. O sorriso materno da Virgem, reproduzido em boa parte na iconografia mariana, manifesta uma plenitude de graça e de paz que quer comunicar-se. Essa manifestação de serenidade do espírito contribui de modo eficaz para conferir um rosto jubiloso à Igreja.
Acolhendo na Anunciação o convite do anjo a alegrar-se (Káire= alegra-te; Lc. 1,28), Maria é a primeira a participar na alegria messiânica, já predita pelos profetas para a “filha de Sião” (cf. Is 12,6; Sof 3,14-15; Zac 9,8), e transmite-a à humanidade de todos os tempos.
O povo cristão, invocando”a como “causa nostrae laetitiae”, descobre nela a capacidade de comunicar a alegria que nasce da esperança mesmo no meio das provas da vida e de guiar quem a ela se confia para a alegria que não terá fim.
* L”Osservatore Romano, Ed. Port. n.47, 25/11/95, p. 12 (576)
Do Livro: A Virgem Maria – 58 Catequeses do Papa João Paulo II

A Intercessão dos Santos e a Oração pelos Mortos na História da Igreja


No século III já havia plenamente a certeza da intercessão dos santos diante de Deus, o dogma da Comunhão dos Santos; a Igreja sofredora da terra estava unida à vencedora no céu. O culto dos mártires começou neste tempo e desabrochou no século IV. Tertuliano (†220), incentivando o amigo Ambrósio a confessar a fé, escreve-lhe que depois da morte, ele poderá pedir pelos seus “de um modo mais eficaz do que durante a vida”. Em Alexandria, a pequena mártir Potamina, diz ao soldado Sasílides que a levou ao suplício, que depois de morta intercederá por ele junto do Senhor e que virá buscá-lo para fazer dele um santo. E São Cipriano pedia aos que iam sofrer o martírio que não se esquecessem dele quando entrassem na glória.
Da mesma forma brotou a certeza da oração pelo sufrágio das almas dos falecidos; Tertuliano deixou escrito:
“A esposa roga pela alma de seu esposo e pede para ele refrigério, e que volte a reunir-se com ele na ressurreição; oferece sufrágio todos os dias aniversários de sua morte.” (De monogamia, 10). “Durante a morte e o sepultamento de um fiel, este fora beneficiado com a oração do sacerdote da Igreja” (De anima 51; Apud Revista PR, 264, 1982, pp. 50-51).aintercessoecultodossantos
São Cipriano (†258), bispo de Cartago, refere-se à oferta do sacrifício eucarístico em sufrágio dos defuntos como costume recebido da herança dos bispos, seus antecessores (cf. epist. 1,2). Nas suas epístolas é comum encontrar a expressão: “oferecer o sacrifício por alguém ou por ocasião dos funerais de alguém” (Revista PR, 264, 1982, pp. 50-51). Falando da vida de Cartago, no século III, afirma Vacandart:
“Podemos de certo modo conceber o que terá sido a vida religiosa de Cartago em meados do século III. Aí vemos o clero e os fiéis a cercar o altar, […] ouvimos os nomes dos defuntos lidos pelo diácono e o pedido de queo bispo ore por esses fiéis falecidos; vemos os cristãos […] voltar para casa reconfortados pela mensagem de que o irmão falecido repousa na unidade da Igreja e na paz do Cristo” (Revue de Clergé Français 1907 t. Lil 151; Apud Revista PR, 264).
Nos séculos seguintes essa crença vai ser sedimentada. São João Crisóstomo (349-407), bispo e doutor da Igreja de Constantinopla, afirma:
“Levemos-lhe socorro e celebremos a sua memória. Se os filhos de Jó foram purificados pelos sacrifícios de seu pai (Jó 1,5), porque duvidar que as nossas oferendas em favor dos mortos lhes leva alguma consolação? Não hesitemos em socorrer os que partiram e em oferecer as nossas orações por eles” (Hom. 1Cor 41,15).
“Os Apóstolos instituíram a oração pelos mortos e esta lhes presta grande auxílio e real utilidade” (In Philipp. III 4, PG 62, 204. PR, 264).
São Cirilo, bispo de Jerusalém (†386) escreveu:
“Enfim, também rezamos pelos santos Padres e Bispos e defuntos e por todos em geral que entre nós viveram; crendo que este será o maior auxílio para aquelas almas, por quem se reza, enquanto jaz diante de nós a santa e tremenda vítima.”
osdogmasdaf“Da mesma forma, rezando nós a Deus pelos defuntos, ainda que pecadores, não lhe tecemos uma coroa, mas apresentamos Cristo morto pelos nossos pecados, procurando merecer e alcançar propiciação junto a Deus clemente, tanto por eles como por nós mesmos.”
“Em seguida [na Oração Eucarística], mencionamos os que já dormiram: primeiro os Patriarcas, Profetas, Apóstolos, Mártires, para que Deus em virtude de suas preces e intercessões, receba nossa oração. Depois, rezamos pelos nossos santos pais e bispos falecidos, e em geral por todos os que já dormiram antes de nós. Acreditamos que esta oração aproveitará sumamente às almas pelas quais é feita, enquanto repousa sobre o altar a santa e tremenda vítima” (Catequeses Mistagógicas. 5, 9, 10, Ed. Vozes, 1977, p. 38).
Santo Epifânio (†403), bispo da ilha de Chipre, escreveu:
“Sobre o rito de ler os nomes dos defuntos (no sacrifício) perguntamos: que há de mais nisso? Que há de mais conveniente, de mais proveitoso e mais admirável que todos os presentes creiam viverem ainda os defuntos, não deixarem de existir, e sim existirem ao lado do Senhor? Com isso se professa uma doutrina piedosa: os que oram por seus irmãos defuntos abrigam a esperança (de que vivem), como se apenas casualmente estivessem longe. E sua oração ajuda aos defuntos, mesmo se por elas não fiquem apagadas todas as dívidas […]. A Igreja deve guardar este costume, recebido como tradição dos Pais […]. Com isto, se ensina que o Pai, o Deus unigênito e o Espírito Santo, tanto por escrito como sem escritura, nos deram doutrinas, e que nossa Mãe, a Igreja, nos legou preceitos, os quais são indissolúveis e definitivos” (Adv. haer. 75, c. 8: PG 42, 514s; PR, 264).
Nas Atas de Santa Perpétua de Cartago, do início do século III, mártir, na África, ela aparece orando por seu irmão Dinócrate, o qual morrera jovem: pedia que ele fosse transferido do lugar de padecimento em que se achava, para um “lugar de refrigério, de saciedade e de alegria”. Finalmente, viu Dinócrate, de coração puro, revestido de bela túnica, a gozar de refrigério, saciedade e alegria, como uma criancinha que sai da água e se dispõe a brincar (Passio, Santa Perpétua VIIs; PR, 264).
Os “Cânones de Santo Hipólito” (160-235), que se referem à Liturgia do século III, contém uma rubrica sobre os mortos:
“[…] caso se faça memória em favor daqueles que faleceram […]” (Canones Hippoliti, em Monumenta Ecclesiae Liturgica; PR, 264).
O bispo Serapião de Thmuis (século IV), no Egito, compôs uma coletânea litúrgica, aonde se pode ver a intercessão pelos irmãos falecidos:
“Por todos os defuntos dos quais fazemos comemoração, assim oramos: ‘Santifica essas almas, pois Tu as conheces todas; santifica todas aquelas que dormem no Senhor; coloca-as em meio às santas Potestades (anjos); dá-lhes lugar e permanência em teu reino’” (Journal of Theological Studies t. 1, p. 106; PR, 264).
“Nós te suplicamos pelo repouso da alma de teu servo (ou de tua serva) N., dá paz a seu espírito em lugar verdejante e aprazível, e ressuscita o seu corpo no dia que determinaste” (PR, 264).
As Constituições Apostólicas, do fim do século IV, redigidas com base em documentos bem mais antigos, no livro VIII da coleção, diz:
“Oremos pelo repouso de N., afim de que o Deus bom, recebendo a sua alma, lhe perdoe todas as faltas voluntárias e, por sua misericórdia, lhe dê o consórcio das almas santas” (Idem).
Confirmando toda essa tradição, em todas as missas, em qualquer das formas da Oração Eucarística, a Igreja ora pelas almas. E o Catecismo da Igreja Católica confirma tudo isso:
“Reconhecendo cabalmente esta comunhão de todo o corpo místico de Jesus Cristo, a Igreja terrestre, desde os tempos primeiros da religião cristã, venerou com grande piedade a memória dos defuntos […].”
“A nossa oração por eles [no Purgatório] pode não somente ajudá-los, mas também torna eficaz a sua intercessão por nós” (CIC §958).
O Papa João Paulo II reafirmou essa doutrina segura:
“Numa misteriosa troca de dons, eles [no Purgatório] intercedem por nós e nós oferecemos por eles a nossa oração de sufrágio” (LR, 08 de novembro de 1992, p. 11)hist_igreja_menor
“[…] a sua recordação [dos defuntos] faz parte da nossa existência, mas, sobretudo porque as suas almas intercedem por nós junto de Deus” (LR, 02 de novembro de 1994).
Dessa certeza surgiu o dia de Finados, celebrado no dia 2 de novembro. A todos os que morreram “no sinal da fé” a Igreja reserva um lugar importante na Liturgia: há uma lembrança diária na Missa, com o Memento (= lembrança) dos mortos, e no Ofício divino. No dia de Finados a Igreja autoriza que cada sacerdote possa celebrar três Missas em sufrágio das almas pelos falecidos. Essa foi uma concessão do Papa Bento XV em 1915, quando durante a Primeira Guerra Mundial, julgou oportuno estender a toda Igreja este privilégio de que gozavam a Espanha, Portugal e a América Latina desde o século XVIII.
A comemoração oficial dos falecidos é devida ao abade de Cluny, Santo Odilon, em 998, mas, muito antes, em toda parte se celebrava a festa de todos os santos e o dia seguinte era dedicado a memória dos fiéis falecidos. Em Roma, em 1311, foi sancionada oficialmente a memória dos falecidos.
Retirado do livro: História da Igreja, A Idade Antiga. Ed. Cléofas.

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